Anistia a partidos que descumprem cotas prejudica candidaturas femininas, dizem especialistas
Foto: Billy Boss - Câmara dos Deputados
Margarete Coelho coordenou os debates sobre mulheres e eleições
Especialistas criticaram a Proposta de Emenda à Constituição que trata de candidaturas femininas (PEC 18/2021) no seminário “Avanços legislativos e a preparação das candidaturas femininas para as eleições de 2022”, nesta segunda-feira (21/03). O evento é promovido pelo Observatório Nacional da Mulher na Política, ligado à Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados.
A PEC, aprovada pelo Senado, está sendo analisada por uma comissão especial da Câmara e prevê anistia aos partidos que não tiverem cumprido a cota mínima de 30% de candidaturas femininas ou que não destinaram os valores correspondentes a essas candidaturas nas últimas eleições. O parecer da relatora da PEC, Margarete Coelho (PP-PI), prevê punição para as legendas que não cumprirem a cota de 30% de candidaturas femininas, mas mantém a anistia para a não aplicação dos recursos nessas candidaturas (no mínimo 30%) e dos recursos para programas de incentivo às mulheres (5%). Segundo Margarete Coelho, a pandemia prejudicou a aplicação dos recursos em 2020.
A deputada acredita que, com seu parecer, os danos da PEC para as mulheres serão reduzidos. Ela explicou que fez apenas ajustes pontuais no texto, para que a proposta não volte para o Senado, onde foi aprovada com ampla maioria.
Segundo Margarete, há uma decisão de todos os partidos, com exceção do Novo, de votar essa PEC e aprová-la também na Câmara, e a bancada feminina avaliou que era melhor negociar ajustes no texto em vez de rejeitá-lo. “De nada iria adiantar nós termos 80 votos contra, com todas as mulheres no Plenário com faixas e bandeirolas na mão. A proposta passaria. Então, preferimos a negociação e a redução de danos”, comentou.
Violência política - Margarete Coelho pediu compreensão dos movimentos pelos direitos femininos com o processo parlamentar e disse que, muitas vezes, a violência política parte de outras mulheres. “A violência política é um dos fatores de afastamento das mulheres dos espaços de poder. Algumas saem completamente devastadas, traumatizadas do processo eleitoral, em decorrência da violência política”, enfatizou.
A relatora saudou a aprovação recente de regras que, segundo ela, representam avanços para as mulheres, como a contagem em dobro dos votos dados a negros e mulheres e indígenas em eleições para a Câmara dos Deputados para fins de distribuição entre os partidos dos recursos do fundo eleitoral (Emenda Constitucional 111/21). Além disso, foram sancionadas a Lei 14.192/2021, que estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher; e a Lei 14.197/2021, que inclui a violência política contra as mulheres entre os crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Por sua vez, a deputada Angela Amin (PP-SC) defendeu a participação mais equilibrada das mulheres nas direções executivas dos partidos.
Foto: Billy Boss - Câmara dos Deputados
Em 2018, o STF determinou que os partidos repassem pelo menos 30% dos fundos eleitoral e partidário para as candidaturas femininas e que o mínimo de 30% seja observado nas propagandas eleitorais de rádio e TV. Mesmo assim, segundo a professora, a regra não foi cumprida, e as mulheres concorreram com menos recursos (25%) do que os homens (75%) nas eleições para deputado federal em 2018. Ela explicou que a distribuição das verbas públicas é feita pelas executivas nacionais dos partidos e que falta transparência e participação das mulheres no processo.
A professora afirmou ainda que o sistema proporcional de listas fechadas para a eleição no Legislativo é considerado melhor para as mulheres do que o sistema profissional com lista aberta, que é o caso brasileiro. Além disso, salientou que as cotas de cadeiras de mulheres no Parlamento são um dos principais mecanismos para aumentar o número de mulheres eleitas.
Muitos países da América Latina já têm legislação prevendo 50% de cadeiras de mulheres. No Brasil, onde não há cota nesse sentido, as mulheres representam 15% do Congresso Nacional. Outras nações do continente americanos têm índices muito superiores, como México, com 48% de representação feminina no Parlamento; Bolívia, com 46%; e Argentina, com 42%. O Brasil ocupa o 142º lugar no ranking da União Interparlamentar (UIP) sobre representatividade feminina política em 180 países.
Cota de cadeiras - “É um absurdo anistiar os partidos, porque é mesmo que dizer: 'sigam não cumprindo as regras'”, concordou a representante do Fórum de Mulheres de Partido, Miguelina Vecchio. Ela também defendeu o voto em lista fechada e cota de cadeiras para mulheres no Parlamento. Na visão dela, mesmo uma reserva de 15% das cadeiras para as mulheres seria significativa nos municípios, porque mais de 900 câmaras de vereadores no País não têm nenhuma integrante.
Ela sustentou ainda que os 30% de recursos públicos reservados para as candidaturas femininas não podem ser destinados para as eleições majoritárias, como para prefeitas e governadoras, porque isso descapitaliza as candidaturas para o Legislativo. Para Margarete Coelho, no entanto, a distinção pode levar ao desestímulo de mulheres se candidatem a cargos majoritários.
Mudança cultural - Cofundadora da associação de advogadas Elas Pedem Vista, Ana Carolina Bastos disse que, quando as mulheres passam a participar mais da política, todos ganham, pois há índices mais baixos de corrupção e mais pluralidade na formulação das leis. Ela criticou o fato de só homens estarem debatendo, por exemplo, direitos reprodutivos das mulheres. Segundo a jurista, do ponto de vista legal, já há vários instrumentos para que mais mulheres estivessem participando da política, o que significa que a legislação não tem sido efetiva.
Ana Carolina destaca que é preciso avançar na perspectiva cultural. “Tentar fazer com que o ambiente político seja menos hostil para as mulheres, para que elas sejam mais incentivadas a ocupar esses espaços, desmitificar o papel feminino de ser quem cuida do lar”, explicou. “Elas têm de ser encorajadas a ocupar lideranças de partidos, para que possam sentar à mesa para a verdadeira tomada de decisões sobre o futuro do País”, acrescentou.
Março Mulher - O seminário integra a programação da campanha Março Mulher, de debates sobre temas como conquistas sociais, políticas e econômicas, bem como para conscientizar a sociedade a respeito das desigualdades e dos desafios enfrentados pelas mulheres.
Assista à íntegra do seminário: manhã e tarde!
Fonte: Agência Câmara de Notícias