Projeto que criminaliza violência política contra mulheres é aprovado no Senado

enfrentamento a esse tipo de violência faça parte dos estatutos partidários. Dados apontam que violência atinge ao menos 75% de candidatas a prefeita em capitais
15/07/2021 20h40

Reprodução Facebook

Projeto que criminaliza violência política contra mulheres é aprovado no Senado

O Senado aprovou por unanimidade nesta terça-feira (13) projeto que combate a violência política contra a mulher. O Projeto de Lei 5.613/2020, da deputada Rosângela Gomes (Republicanos/RJ), considera violência política contra as mulheres toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, criar obstáculo ou restringir os direitos políticos de mulheres, não apenas durante as eleições, mas no exercício de qualquer função política ou pública. Além disso, também serão punidas práticas que depreciem a condição da mulher ou estimulem a discriminação em razão do sexo feminino ou em relação a cor, raça ou etnia.

O PL faz diversas modificações no Código Eleitoral (Lei 7.737, de 1965), como a proibição de propaganda eleitoral discriminatória contra a mulher e pena em caso de divulgação de notícias falsas.

O projeto estabelece aumento de 1/3 até a metade se o crime for cometido por meio da imprensa, rádio e televisão ou da rede de computadores, redes sociais ou transmitido em tempo real. O mesmo agravamento será aplicado à divulgação de notícias falsas que envolverem menosprezo ou discriminação à condição de mulher e sua cor, raça ou etnia.

Também serão aplicadas penas a quem produzir, oferecer ou vender vídeo com conteúdo inverídico acerca de partidos ou candidatos.

A senadora Daniella Ribeiro (PP/PB), relatora do projeto, avaliou que a proposta traz regras necessárias para coibir as agressões e violações de direitos enfrentadas por mulheres na política, em especial na campanha eleitoral. Segundo a senadora, as mulheres costumam sofrer no período das campanhas maior exposição à violência política por parte dos partidos, da família, de candidatas e candidatos, da mídia, comprometendo a participação igualitária.

“A violência política contra a mulher pode ter um impacto que vai além das mulheres que a sofrem diretamente, pois, além de buscar alijar aquela que é alvo das agressões da política e diminuir o alcance de sua atuação, pode passar a mensagem de que a esfera pública não é lugar para as mulheres“, explicou a senadora.

Daniella Ribeiro destacou levantamento realizado pelo jornal O Estado de São Paulo, que aponta que das 50 mulheres que disputaram as prefeituras das capitais no ano passado, 44 relataram violência. Do total, 88% afirmam ter sofrido violência política de gênero nas eleições de 2020 e 72,3% acreditam que os episódios prejudicaram a campanha. Segundo o levantamento, a violência psicológica é a mais recorrente (97,7%) e a internet é o espaço onde as mulheres são mais atacadas (78%), seguida da campanha de rua (50%).

A senadora Simone Tebet (MDB/MS), líder da bancada feminina no Senado, afirmou que esse tipo de violência contra as mulheres prejudica a democracia porque as afasta de contribuir com o país fazendo política. Tebet destacou que o PL é resultado de uma colaboração entre vários setores da sociedade. “É um projeto que veio do 3º setor, da Defensoria Pública brasileira, do Ministério Público, da magistratura, foram mulheres defensoras, promotoras e juízas, que, junto com a Câmara dos Deputados, com o Senado Federal, resolveram dar um basta à violência política que a mulher sofre”, disse.

Para a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), a aprovação do projeto é um marco para o Brasil. “Esse projeto é um divisor de águas, é fundamental para o avanço da participação da mulher na política. A mulher tem que estar onde ela quer estar, ou seja: na política, no Judiciário, no Legislativo, no Executivo, enfim, nos mais variados espaços de poder, na sociedade civil, no espaço privado. Nós somos maioria nas universidades, nós estudamos muito e precisamos também ser, pelo menos de forma paritária e em igualdade, em todos esses espaços de poder no Brasil“, afirmou.

 

Partidos políticos

O PL modifica a Lei 9.096/1995, que trata dos partidos políticos, para estabelecer que o estatuto do partido deve trazer normas para prevenção, repressão e combate à violência política contra a mulher. A partir da publicação da Lei, os partidos políticos terão 120 dias para adequar seus estatutos.

Modifica também a Lei 9.504/1997, para definir que, nas eleições proporcionais, os debates também deverão respeitar a proporção de candidaturas de homens e mulheres. Hoje cada partido ou coligação precisa reservar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo, mas não assegura a participação proporcional nos debates.

 

Crimes contra a honra

O PL inclui no Código Eleitoral artigo que pune quem assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, utilizando-se de menosprezo ou discriminação à condição de mulher, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo. Nesses casos, a pena será de 1 a 4 anos de reclusão e multa, com aumento de 1/3 caso o crime seja cometido contra gestante, mulher maior de 60 anos ou com deficiência.

Haverá aumento também nas penas em casos de calúnia, injúria e difamação dirigidas às candidatas, se houver menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia e se o crime for cometido por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitido em tempo real.

 

Audiência Pública da CDHM

Em audiência pública realizada pela CDHM no último dia 16 de junho, vereadoras e vereadores afirmaram que a violência politica atinge especialmente mulheres, pessoas LGBTQIA+, negros e integrantes de partidos de esquerda, e envolve desde situações de silenciamento cotidiano, boicote a projetos, até questionamentos sobre a capacidade para o exercício do mandato.

As vereadoras, que enfrentam a enorme maioria das situações de violência, pediram apoio do Congresso Nacional e da CDHM para construir alternativas que coíbam a violência política. Entre as sugestões estavam a notificação das câmaras municipais pedindo proteção, o acionamento do Ministério Público para acompanhar os casos, a necessidade de um projeto de lei contra a violência política, além de campanhas que possam frear esse tipo de violação nas redes.

O brutal assassinato da vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, e do motorista Anderson Gomes, em março de 2018, foi lembrado por vereadoras e deputadas, como exemplo da gravidade do cenário de violência política vivenciado no Brasil

 

Audiência com Presidente do TSE

No último 12 de maio, o Presidente da CDHM, Carlos Veras, acompanhado pela deputada Sâmia Bomfim (PSOL/SP), 3ª Vice-Presidente da Comissão, e pelo deputado Helder Salomão (PT/ES), se reuniu com o Presidente do TSE, o Ministro Luís Roberto Barroso, com o objetivo de buscar apoio do Tribunal para combater a violência política baseada no gênero e na raça.

Os parlamentares entregaram relatórios recentes sobre a situação das mulheres na política: “Violência contra Mulheres Negras”, do Instituto Marielle Franco,  “Violência Política e Eleitoral no Brasil”, do Terra de Direitos e Justiça Global e o Dossiê “Assassinatos e Violência contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2020”.

 

Observatório Parlamentar da RPU

Audiência pública realizada no último dia 7 de maio no âmbito do Observatório Parlamentar da RPU, sediado na CDHM, avaliou o cumprimento das recomendações feitas ao Brasil pela Revisão Periódica Universal para aumentar a participação de mulheres nos espaços de poder. A Revisão Periódica Universal é um mecanismo de avaliação da situação dos direitos humanos nos 193 países membros da ONU.

Foram analisadas as recomendações do Timor Leste, de promover uma maior participação das mulheres na política e no governo, e da Bélgica, de implementar medidas efetivas de inclusão das mulheres em todos os níveis dos processos de tomada de decisão.

A avaliação do relatório preliminar foi de que até aquele momento, as recomendações não haviam sido cumpridas. Segundo o estudo ATENEA – Mecanismos para acelerar a participação política das mulheres na América Latina e no Caribe, o Brasil estava em 2019 entre os países com os piores indicadores da América Latina no que diz respeito à igualdade de gênero na política. O país ocupava o 9º lugar entre os 11 países latino-americanos.

Em 2018, o Brasil ocupava o 157° lugar no ranking de Mulheres nos Parlamentos da Inter-Parliamentary Union, composto por 196 países, colocando o país em último lugar na América do Sul e penúltimo nas Américas, no que tange à representação parlamentar feminina. O ranking de outubro de 2020 mostra que o Brasil passou a ocupar o 143° lugar, mas continuou a ocupar o último lugar na América do Sul.

Ana Carolina Querino, representante da ONU Mulheres Brasil, destacou na ocasião que o Brasil, apesar da Lei de Cotas, que já existe há 25 anos, somente nas últimas eleições alcançou percentual próximo ao de 30% de candidatas.

Por não ter sofrido alterações no mérito, o PL 5.613/2020 não precisará voltar à Câmara e segue para sanção presidencial.

 

Com informações da Agência Senado

 

Fábia Pessoa/CDHM