Anielle Franco mostra “retrato da desigualdade racial” e ações inclusivas para a superação do racismo
Políticas públicas permanentes de superação do racismo estão entre as prioridades da ministra da Igualdade Racial, após cinco meses à frente da pasta. Anielle Franco fez balanço das primeiras ações e apresentou sua agenda estratégica, durante audiência realizada na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados (CMulher) na quarta-feira (17/05).
O requerimento com o pedido de audiência foi apresentado pela deputada Laura Carneiro (PSD-RJ), 2ª coordenadora-adjunta da bancada feminina, apoiado pelas deputadas Sâmia Bomfim (PSOL-SP), 3ª coordenadora-adjunta e Ana Pimentel (PT-MG). A presidente da CMulher, deputada Leda Borges (PSDB-MG), inicialmente justificou a ausência da requerente, Laura Carneiro, por motivo de saúde, e anunciou a presença, acompanhando a ministra, de Roberta Eugênio, secretária executiva do Ministério; Iêda Leal, secretária do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial; e Márcia Lima, secretária de Políticas de Ações Afirmativas e Combate ao Racismo.
Em sua explanação, a ministra apresentou uma série de dados estatísticos do que chamou de “retrato da desigualdade racial” e que espera ver superado em breve. Os números revelam que os negros e pardos, que equivalem a 56,2% da população, aparecem como 77% das vítimas de homicídio e 70% dos brasileiros que passam fome. As mulheres negras representam 62% das vítimas de feminicídio e, a cada quatro horas, uma delas é vítima de violência doméstica no país. Elevadas taxas de desemprego, de sub-representação nos espaços de poder, de violência política e de racismo completam o quadro.
Anielle citou o assassinato da irmã – a vereadora carioca Marielle Franco, em 2018 – e outros casos recentes de violência urbana com motivação racial. “Chegamos com um projeto de País onde não tenha uma vereadora negra que tome 13 tiros em seu corpo e as pessoas façam piada; onde uma mãe, como a Thamires (Rosa), não tenha que passar por agressividade por ter a filha de seis anos agredida por ser negra (dentro de uma escola pública), em São Paulo; onde uma líder religiosa de terreiro não tenha o filho com a guia arrancada à força dentro de uma escola. Que a gente pense, cada vez mais, em uma educação inclusiva, não excludente”, afirmou. De acordo com dados apresentados pela ministra, as mulheres negras representam 62% das vítimas de feminicídio.
A ministra informou que, em parceria com outros ministérios, monitora diferentes casos de racismo. Em breve, a pasta pretende divulgar o Plano Nacional de Comunicação Institucional Antirracista e lançar o Disque 138 para recebimento de denúncias. Outras ações já estão em curso, como o Programa Esporte sem Racismo e a Formação de Iniciativas Antirracistas (Fiar), sobretudo no serviço público. Ela também comemorou o início da vigência da lei 14.532/2023, que equipara a injúria racial ao racismo, inclusive quanto à classificação de crime inafiançável e imprescritível. “A igualdade racial como princípio da democracia é como nós já ouvimos em um slogan da Coalizão Negra por Direitos: ‘Com racismo, não há democracia’. É importante que a gente una força, respeito e empatia”.
Políticas públicas - Anielle pretende lançar, em breve, um novo Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), criado em 2013. A intenção é melhorar a interação de políticas públicas federal, estaduais e municipais. Outra meta é fortalecer as leis de cotas, com foco tanto na entrada quanto na permanência de negros nas universidades ou empresas.
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ), coordenadora da bancada feminina na Câmara, avalia que a medida é fundamental para a aplicação efetiva do Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010). “Além de ações afirmativas, a igualdade racial precisa de políticas públicas para que possamos alcançar igualdade de direitos de cores diferentes”, afirmou.
A ministra destacou ainda o lançamento do Aquilomba Brasil, versão aperfeiçoada do Programa Brasil Quilombola, criado em 2007. Recentemente, o governo federal homologou três novos territórios quilombolas (Brejo dos Crioulos [MG], Lagoa dos Campinhos [SE] e Serra da Guia [SE]), beneficiando mais de 3,3 mil pessoas de 663 famílias.
Para a deputada Ana Pimentel, ao longo dos últimos anos o País viveu "desconstruções nas políticas públicas que incentivaram a misoginia e o racismo". Ela ressaltou a necessidade de garantir a participação e o protagonismo das mulheres em programas de geração de emprego e renda e também o Bolsa Família. Já a deputada Juliana Cardoso (PT-SP), ressaltou o papel da ministra, lembrou a memória de Marielle Franco e indagou sobre a interface do Ministério da Igualdade Racial com questões ligadas à demarcação de terras de populações quilombolas e indígenas.
Participando da audiência, a deputada Franciane Bayer (Republicanos-RS) destacou a importância do diálogo e perguntou sobre o sistema nacional de promoção da igualdade racial. Jack Rocha, deputada pelo PT-ES, enfocou o recém-aprovado projeto que trata da igualdade salarial entre homens e mulheres e indagou sobre os desafios de um Ministério que representa mais de metade da população brasileira, que é negra, na construção de uma sociedade antirracista. A deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) reforçou a importância de se atuar pela aprovação do projeto no Senado Federal para garantir a igualdade econômica, e destacou a constituição de grupo de trabalho na Câmara que vai tratar da política nacional de economia de cuidados, "um trabalho doméstico, ainda majoritariamente feminino, que precisa ser reconhecido".
Racismo e população LGBTQIA+ - A deputada Erika Hilton (Psol-SP) destacou a relevância histórica de Anielle Franco à frente do Ministério da Igualdade Racial e a diversidade de sua equipe. “Esse País, que foi o último a abolir a escravidão, segue reproduzindo violências cotidianas contra a nossa população. É uma alegria ir ao vosso ministério e ver tantas mulheres negras belas atuando, trabalhando e reconstruindo o imagético sobre as mulheres negras e a população negra deste País, que sempre foram retratadas a partir de uma perspectiva de estereótipos, estigmas, mazelas, dor e sofrimento”, elogiou.
A deputada Daiana Santos (PCdoB-RS) também reforçou a necessidade de ações integradas e inter-setoriais para combater a discriminação contra a população LGBTQIA+. Ela perguntou sobre perspectivas de políticas para a qualificação de mães solo, principalmente negras, visando a inserção ou reinserção no mercado de trabalho, e entregou à ministra cópia de protocolo nacional antirracista, que determina que grandes estabelecimentos no território nacional desenvolvam medidas de prevenção contra o racismo.
Durante a audiência na Câmara, a ministra Anielle Franco informou ainda sobre caravanas de construção participativa do Plano Juventude Negra Viva e do Programa Brasil Cigano, além da mobilização para a aprovação da proposta de Estatuto dos Ciganos.
Ana Paula Lima, deputada pelo (PT-SC), no tempo de debates, perguntou sobre ações previstas pelo Ministério para os casos de racismo que têm ocorrido no meio esportivo. A deputada Erika Kokay (PT-DF) agradeceu a participação da ministra, destacou sua força ancestral e a importância do Ministério da Igualdade Racial para que sejam efetivamente combatidas ações e expressões racistas tão enraizadas culturalmente na sociedade brasileira. Por fim, a deputada Carol Dartora, do PT-PR, pontuou a necessidade de vincular as pautas de gênero e antirracista às políticas de prevenção da violência na infância.
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Com informações da Agência Câmara de Notícias