Década de 80
MUNDO
Em 1989, também a China viu a Praça da Paz Celestial ser tomada por manifestantes pedindo o fim do socialismo autoritário. A década era mesmo dos liberais, tanto que o neoliberalismo ganha força e torna-se globalizante. Entretanto, foi considerada "perdida" para a América Latina, em razão da estagnação econômica vivida na região.
No Golfo Pérsico, começa e termina a guerra Irã-Iraque. Na América do Sul, o Sendero Luminoso inicia sua guerrilha no Peru, enquanto no Atlântico Sul, entre abril e julho de 1982, a Argentina e o Reino Unido se enfrentam na Guerra das Malvinas. A guerra civil estoura em El Salvador, Sudão e Libéria, e prossegue na Colômbia, Angola, Moçambique e Líbano. Em 1986, os Estados Unidos bombardeiam a Líbia em retaliação a ações terroristas apoiadas pelo governo líbio.
Na África, a fome mata milhões de pessoas. Imagens de etíopes famélicos e moribundos despertam a solidariedade planetária e ensejam o Live Aid (1985), megaconcerto de rock realizado simultaneamente em Londres e Filadélfia e assistido ao vivo por 1,5 bilhão de telespectadores, numa das maiores transmissões por satélite de todos os tempos. Eram as telecomunicações mostrando a que vieram, mas também era o flagrante da imensa desigualdade no desenvolvimento entre as nações.
A existência da aids é divulgada pela primeira vez em junho de 1981 e daí a poucos anos a doença será declarada uma pandemia. Em 1986, ocorre o desastre nuclear de Chernobil. Na Colômbia, o problema é o narcotráfico e seus poderosos cartéis. Já a Coréia do Sul, Cingapura, Taiwan e Hong Kong se transformam em "Tigres Asiáticos", tamanho o salto dado por suas economias industrializadas e voltadas para exportação.
Datam desse decênio o desenvolvimento das primeiras interfaces gráficas (Windows e MacOS), o lançamento da estação espacial soviética Mir e a popularização dos computadores pessoais, que deixam de ser vistos como um brinquedo e começam a ser usados como ferramentas de trabalho.
Personagens do mundo
- Mikhail Gorbachev (1931-): Presidente soviético (1985-1991) responsável pelo fim da Guerra Fria.
- Ronald Reagan (1911-2004): Primeiro presidente dos EUA (1981-1989) a declarar guerra ao terrorismo internacional.
- Margaret Thatcher (1925-): Primeira mulher a liderar uma nação no Ocidente, como primeira-ministra do Reino Unido (1979-1990).
- François Mitterrand (1916-1996): Primeiro presidente socialista da França (1981-1995).
- Felipe González (1942-): Primeiro-ministro (1982-1996) responsável pela modernização da Espanha.
- Lech Walesa (1943-): Timoneiro da redemocratização polonesa à frente do sindicato livre Solidariedade.
- Papa João Paulo II (1920-2005): Pontificado (1978-2005) marcado em seu início pela luta contra o comunismo na Polônia e pelo fim da Guerra Fria.
- Saddam Hussein (1937-2006): Ditador do Iraque de 1979 a 2003.
- Aiatolá Khomeini (1900-1989): Líder da Revolução Islâmica e governante do Irã de 1979 a 1989.
- Muammar al-Kadafi (1942-): Chefe de Estado da Líbia desde 1969.
- Raúl Alfonsín (1927-): Primeiro presidente civil argentino (1983-1989) após oito anos de ditadura militar.
- Samora Machel (1933-1986): Primeiro presidente de Moçambique (1975-1986).
- Bispo Desmond Tutu (1931-): Nobel da Paz em 1984 por sua firme oposição ao regime sul-africano de apartheid.
BRASIL
Política interna
A abertura política marca o governo de seis anos (1979-1985) do presidente João Batista Figueiredo, o último do regime militar. Em 1979, a decretação da anistia possibilita o retorno dos líderes e militantes políticos exilados, ao passo que uma reforma partidária acaba com o sistema bipartidário, extinguindo a Arena e o MDB, e propõe a formação de novas agremiações. Em 1980, surgem o Partido Democrático Social (PDS), novo partido governista, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Popular (PP) e o Partido Democrático Trabalhista (PDT). Ainda em 1980, o Congresso aprova projeto do governo que restabelece a eleição direta para governadores e extingue a figura do senador "biônico" (eleito indiretamente), assegurando, contudo, os mandatos em curso. Em 1982, o Legislativo tem parte das suas prerrogativas devolvidas, e, com a realização das eleições em novembro, a oposição conquista maioria na Câmara dos Deputados e elege 10 governadores, 9 do PMDB e 1 do PDT. Por sua vez, o PDS mantém-se majoritário no Senado e obtém 12 dos 22 governos estaduais, garantindo ao governo maioria no Colégio Eleitoral, responsável pela eleição do presidente da República.
As mudanças no cenário político despertam em 1983 um movimento por eleições diretas para presidente, o qual ganha força com a apresentação pelo deputado peemedebista Dante de Oliveira de uma emenda constitucional com idêntico objetivo. O movimento, que ficaria conhecido como "Diretas Já", cresce espetacularmente em 1984 e empolga a população, com a realização de comícios em diversas cidades contando com a presença de artistas e lideranças políticas e a participação de multidões nunca antes vistas no Brasil. As maiores manifestações reúnem cerca de 1 milhão de pessoas no Rio e 1,7 milhão em São Paulo. Contudo, não impedem que a Emenda das Diretas seja derrotada no Congresso no dia 25 de abril, ao faltarem 22 votos para a sua aprovação.
Três meses depois, a Frente Liberal, uma dissidência do PDS, faz um acordo com o PMDB mediante o qual o senador José Sarney (ex-PDS) é indicado candidato a vice na chapa de Tancredo Neves (PMDB) à presidência da República. Nascia aí a Aliança Democrática, que em 15 de janeiro de 1985 derrotaria o PDS na eleição no Colégio Eleitoral, obtendo 480 votos de um total de 686. Entretanto, Tancredo Neves não chega a assumir a presidência. No dia 14 de março, na véspera da posse, ele adoece e é hospitalizado, vindo a falecer após 38 dias de internação. Assim, José Sarney torna-se o presidente da República, cargo que exercerá por cinco anos, até 15 de março de 1990.
O governo Sarney ficou marcado pela reconstrução da democracia e por sucessivos planos de combate à inflação. Em maio de 1985, uma emenda constitucional restabelece as eleições diretas para as prefeituras dos Municípios considerados áreas de segurança nacional, concede o direito de voto aos analfabetos e abranda as exigências para registro de novos partidos. Como resultado, surgem 23 novas legendas – Partido da Frente Liberal (PFL), Partido Democrata Cristão (PDC), Partido Liberal (PL), Partido Municipalista Brasileiro (PMB), etc. –, ao passo que o Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB) voltam à legalidade. Em novembro, o Congresso aprova a emenda que convoca a Assembléia Nacional Constituinte que irá elaborar a atual Constituição. As eleições para a Constituinte ocorrem em 15 de novembro de 1986 e ela se instala em 1 de fevereiro de 1987.
Promulgada a 5 de outubro de 1988, a nova Carta foi a primeira na história do País a aceitar emendas populares, numa prova do seu caráter democrático e pluralista. Por afirmar a independência dos três poderes, a eleição direta em todos os níveis, o horário eleitoral gratuito, o voto dos analfabetos e maiores de 16 anos, o direito de greve, a liberdade de organização sindical e partidária, a demarcação das terras indígenas, entre diversas outras garantias individuais, sociais e trabalhistas, ficou conhecida como "Constituição Cidadã".
No final de 1989, após 29 anos sem eleições diretas para presidente, o povo vai às urnas e escolhe Fernando Collor de Mello para sucessor de Sarney. Consolidava-se o processo de redemocratização.
Atentados
A abertura política não transcorreu sem que determinados grupos e organizações, como o Comando de Caça aos Comunistas (CCC), tentassem interrompê-la mediante a prática de atentados terroristas. As ações ocorrem de 1976 a 1984, concentrando-se em 1980. Em 27 de agosto desse ano, por exemplo, explodem três cartas-bombas no Rio de Janeiro: no jornal Tribuna Operária, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), causando a morte de uma funcionária, e na Câmara Municipal. Já entre abril e setembro, bancas de jornal são atacadas em diversas cidades por venderem jornais de esquerda. O caso de maior repercussão, no entanto, ocorre na noite de 30 de abril de 1981, no centro de convenções Riocentro. Durante um show comemorativo do Dia do Trabalho com a presença de cerca de 20 mil pessoas, uma bomba explode num carro parado no estacionamento e mata um sargento e fere gravemente um capitão do Exército, quando, pelas evidências, ambos se preparavam para cometer um atentado de grandes proporções.
Economia
Arrocho salarial, queda do poder aquisitivo da população, má distribuição de renda, desemprego crescente, inflação em disparada, alternância de recessão com crescimento, dificuldade para pagar os compromissos da dívida externa; esses foram percalços constantes na década de 80. Combinados, vão ocasionar estagflação (estagnação econômica com inflação) em 1981 e hiperinflação daí por diante, levando os governos desse período a fazer da estabilização econômica a sua principal meta. No de Sarney, são adotados sucessivos pacotes econômicos: Plano Cruzado I, Plano Cruzado II, Plano Bresser, Plano Verão. Implantado em março de 1986, o Plano Cruzado I fez uma reforma monetária (cortou três zeros do cruzeiro e o substituiu pelo cruzado), extinguiu a correção monetária, congelou os preços e salários (estes acrescidos de um abono), aumentando o poder de compra do trabalhador e elevando o consumo. Tomados de euforia, os consumidores passaram a fiscalizar os preços, transformando-se em "fiscais do Sarney", como foram chamados. Mas, como o setor produtivo não se mostrou capaz de atender à demanda aquecida, começou a haver escassez de produtos e cobrança de ágio. Por esses e outros motivos, nem esse nem os demais planos citados conseguiram erradicar a inflação alta, que nos últimos 12 meses da gestão chegou a 2.751%.
Trabalhismo
O início da década é marcado por uma onda de greves, destacando-se a dos metalúrgicos do ABC paulista entre abril e maio de 1980. A paralisação leva o governo a intervir nos sindicatos e a prender os líderes grevistas, entre eles Luiz Inácio Lula da Silva, enquadrando-os na Lei de Segurança Nacional. Em 1981, surge a Conferência Nacional das Classes Trabalhadoras (Conclat), que daria origem à Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983, e à Central Geral dos Trabalhadores (CGT), em 1986.
Política externa
O governo Figueiredo seguiu a doutrina do pragmatismo responsável de seu antecessor, centrada no pragmatismo comercial e no universalismo das relações diplomáticas. Em 1980, pela primeira vez desde 1964, uma delegação do Congresso Nacional vai a Moscou em visita oficial. Também é posto em prática o acordo comercial assinado com a China em 1978. O Brasil se reaproxima da Argentina e os dois países formam uma comissão bilateral para propor ações de interesse comum. Figueiredo visitou diversos países africanos e esteve no Japão.
No governo Sarney, o Brasil aprofunda as relações com a Argentina e participa da formação do Grupo de Apoio a Contadora e do Grupo do Rio (ou Mecanismo Permanente de Consulta e Concertação Política da América Latina e do Caribe). Em 1985, Sarney reage à política de apartheid da África do Sul proibindo o intercâmbio cultural com aquele país, bem como a exportação de armas e petróleo. Em 1986 as relações diplomáticas com Cuba são reatadas e em 1989 o País é eleito membro não-permanente do Conselho de Segurança da ONU.
População
Na década de 80, se confirmam as tendências de desaceleração do crescimento demográfico e de contínua urbanização. Entre 1980 e 1991, a população aumenta de 119 para 147 milhões de pessoas, um acréscimo de 23,5%, contra 28% em 1970-1980 e 33% em 1960-1970. A população urbana, que no início da década correspondia a 67% do total, passa a representar ao seu final 75%, com 80 e 111 milhões de pessoas, respectivamente. Por sua vez, a população rural diminui, caindo de 39 para 36 milhões.
Personagens do Brasil
- Ulysses Guimarães (1916-1992): Na campanha pelas eleições diretas, 40 mil quilômetros de viagens pelo País e o reconhecimento como "Senhor Diretas".
- Aureliano Chaves (1929-2003): Vice-presidente da República no governo Figueiredo, um dos fundadores da Frente Liberal, ministro de Minas e Energia no governo Sarney e candidato à presidência pelo PFL em 1989.
- Roberto Marinho (1904-2003): Influente jornalista e empresário de comunicação com capacidade de interferir em eleições presidenciais.
- Antônio Ermírio de Moraes (1928-): Intensa atividade social, empresarial e política.
- Sobral Pinto (1893-1991): Defensor dos perseguidos políticos e da liberdade.
- Mário Juruna (1943-2002): Primeiro índio brasileiro a se tornar deputado federal (1983-1987).
- Chico Mendes (1944-1988): Seringueiro sindicalista conhecido internacionalmente por sua luta pela preservação da Amazônia.
- Zilda Arns (1934-): Fundação em 1983 da Pastoral da Criança.
- Carlos Drummond de Andrade (1902-1987): Publicação de cinco novos livros de poesia, além de vários volumes de prosa.
- Manoel Carlos (1933-): Novelista na década em que as telenovelas brasileiras começam a ser exportadas e a fazer sucesso internacional.
- Milton Nascimento (1942-): Contribuição à MPB com 10 novos discos.
- Nelson Piquet (1952-): Campeão mundial de Fórmula 1 em 1981, 1983 e 1987.