Observatório Parlamentar examina recomendações voltadas para Instituição Nacional de Direitos Humanos

Participantes apontaram que o Conselho Nacional de Direitos Humanos já atua como a INDH brasileira e defenderam a importância de mais recursos e estrutura para a instituição. Defensoria Pública da União considera que também preenche os requisitos necessários
16/08/2021 15h03

Captura e montagem: Fernando Bola/CDHM

Observatório Parlamentar examina recomendações voltadas para Instituição Nacional de Direitos Humanos

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias, por meio do Observatório Parlamentar da RPU, examinou na última sexta-feira recomendações feitas ao Brasil para fortalecer a Instituição Nacional de Direitos Humanos (INDH).

A audiência pública foi a 11ª realizada pelo Observatório Parlamentar da RPU, uma parceria da Câmara dos Deputados com o Alto Comissariado das Nações Unidas, que tem como objetivo verificar a evolução dos direitos humanos no Brasil.

As Instituições Nacionais de Direitos Humanos têm o propósito de promover os direitos humanos em cada país, estimular a elaboração de planos de ação e políticas públicas em direitos humanos, além de apresentar propostas legislativas e avaliar o cumprimento das obrigações internacionais pactuadas pelos Estados.

As INDHs são autônomas e independentes, não estão subordinadas aos Poderes Executivo, Legislativo ou Judiciário, apesar de serem majoritariamente financiadas pelo Estado. São consideradas fundamentais em um sistema nacional de proteção dos direitos humanos e promovem importantes relações entre o Estado, a sociedade civil e os organismos internacionais de direitos humanos.

Jan Jarab, Representante Regional do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, apontou a existência das INDHs como algo fundamental para os Estados democráticos. “É importante que os Estados possam se beneficiar de suas avaliações independentes para ajudar a resolver problemas de direitos humanos. Um papel que qualquer sociedade democrática deve exaltar e assegurar”.

“As instituições nacionais de direitos humanos podem representar um desafio para muitos governos, porque representam um novo modelo de instituições para o século XXI. São instituições autônomas do poder político, mas ainda assim são autoridades. Podem representar um desafio, porque seus mandatos possuem o dever de destacar as lacunas e riscos à proteção e promoção dos direitos humanos”, explicou Jarab.

Representantes do Governo

Para Milton Nunes Toledo, Chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a sociedade internacional já reconhece os esforços feitos no país para a promoção dos direitos humanos, pois os textos das recomendações tratam abertamente de continuar e aprofundar ações.

Milton Nunes argumentou que a avaliação do relatório preliminar de que a estrutura do Conselho Nacional de Direitos Humanos seria insuficiente para a execução das atividades não considera o enxugamento das estruturas administrativas feito em outras áreas também nos últimos anos. “Mesmo nas recomendações com avaliação negativa são mencionados progressos, como a criação de CNPJ próprio e atribuição de uma unidade gestora orçamentária exclusiva”, declarou.

Marcelo Ramos Araújo, Chefe da Divisão de Direitos Humanos do Ministério das Relações Exteriores, destacou que o papel do Itamaraty é dar suporte logístico às instituições que buscam a acreditação internacional de Instituição Nacional de Direitos Humanos, seja o Conselho Nacional de Direitos Humanos ou a Defensoria Pública da União.

Araújo lembrou que a tentativa de acreditação realizada em 2016 do CNDH foi rejeitada, e que entre os argumentos estaria a alegação de que a apresentação do pedido pelo Itamaraty vai contra o princípio da autonomia das INDHs.

CNDH é a INDH do Brasil

Para Yuri Costa, Presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos, o CNDH já é a INDH brasileira, tendo em vista seu reconhecimento pela sociedade civil, órgãos e instituições, além de seu fortalecimento ser citado explicitamente nas recomendações da Revisão Periódica Universal. “Mais do que o que uma INDH acreditada, o que o Brasil precisa ter é uma INDH de fato”.

“Depois de mais de seis anos de atuação, o CNDH acumula uma independência em sua atuação política extremamente visível. Independentemente do governo, o CNDH tem sempre tido uma postura política independente, crítica e sobretudo de proteção aos direitos humanos”, afirmou o Presidente do CNDH.

Yuri Costa apontou que episódio recente demonstrou desrespeito por parte do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos à autonomia do CNDH, que alterou quatro vezes a coordenação da secretaria executiva do Conselho. “Esse é um fato que evidencia como o CNDH ainda tem empecilho para o seu reconhecimento como INDH, a falta de entendimento e vontade política do Estado brasileiro”.

“O CNDH tem todos os requisitos para ser a INDH, precisa sim ter um incremento na sua estrutura, no seu orçamento, e isso é função do Governo. Não é um problema desse governo, é um problema histórico de subfinanciamento e de falta de estrutura, mas isso pode ser vencido com vontade política. O CNDH é a nossa INDH”, defendeu a jurista Deborah Duprat, que foi Vice-Procuradora-Geral da República de 2009 a 2013

Defensoria Pública da União como INDH

Jair Soares Júnior, Subdefensor Geral Federal da Defensoria Pública da União, defendeu que a instituição reúne todas as características para ser uma Instituição Nacional de Direitos Humanos. “A DPU tem trabalhado em prol do seu fortalecimento institucional na promoção e proteção dos direitos humanos, inclusive por meio de seu processo de acreditação apresentado à aliança global de INDHs. A estrutura e os instrumentos conferidos por lei à DPU, bem como sua atuação prática, refletem a atuação típica de uma Instituição Nacional de Direitos Humanos”.

Observatório Parlamentar da RPU

Leonardo Pinho, representante do Coletivo RPU, defendeu a importância do Observatório e das recomendações para o avanço dos direitos humanos no Brasil. “Que o Executivo cumpra as recomendações da RPU, cumpra a lei e principalmente a Constituição Brasileira, garantindo o direito ao controle e à participação social, e pare de intervir nos conselhos de políticas públicas, nos conselhos de direitos do Brasil e que, no caso do CNDH, cumpra seu papel e garanta toda a estrutura necessária pro seu pleno funcionamento”.

“Este Observatório, junto com o Alto Comissariado e organizações da sociedade brasileira, tem o compromisso de fazer o monitoramento sério, consistente, sistêmico das recomendações que o Brasil deve responder no plano internacional. Os direitos humanos no Brasil têm sido tratados com desprezo por algumas autoridades e nós não vamos nos calar, precisamos manter nossa posição em defesa dos direitos humanos”, finalizou o Deputado Helder Salomão (PT/ES), que presidiu a audiência pública.

A audiência contou ainda com a participação da promotora de justiça Ivana Farina, Conselheira do Conselho Nacional de Justiça, Everaldo Bezerra Patriota, da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Darci Frigo, da Plataforma Dhesca, e dos parlamentares Orlando Silva (PCdoB/SP) e Erika Kokay (PT/DF).

Avaliação do relatório preliminar

Relatório preliminar indicou que houve avanços em quatro recomendações: a da Nepal, de continuar esforços para fortalecer as instituições nacionais de direitos humanos; a de Portugal, de trabalhar para garantir que a Instituição Nacional de Direitos Humanos adquira o status "A" de acordo com os Princípios de Paris; a de Serra Leoa, de tornar o Conselho Nacional dos Direitos Humanos de acordo com os Princípios de Paris; e a da Polônia, de tornar as suas instituições nacionais de direitos humanos, especialmente o Conselho Nacional dos Direitos Humanos, em plena conformidade com os Princípios de Paris.

A recomendação de Uganda para fornecer ao Conselho Nacional dos Direitos Humanos os recursos necessários para aumentar sua independência para efetivamente desempenhar suas funções foi avaliada como não cumprida. O relatório indica que os recursos fornecidos pelo Estado brasileiro hoje permitem ao Conselho uma estrutura mínima de funcionamento, que precisa ser ampliada. Além disso, essa estrutura mínima foi garantida nos últimos anos por meio de emendas parlamentares ao orçamento.

As recomendações da Grécia, de fornecer ao Conselho Nacional dos Direitos Humanos a independência orçamentária, administrativa e política para implementar plenamente suas funções, e a da Guatemala, também relacionada à independência orçamentária, administrativa e política do CNDH, foram avaliadas como “em retrocesso”. O relatório sinaliza que, por mais que o Conselho seja politicamente independente, como parecem indicar seus posicionamentos, o Estado brasileiro ainda não lhe garante autonomia orçamentária e administrativa suficiente.

O relatório reconhece que algumas reivindicações, como a criação de CNPJ próprio e tornar-se uma Unidade Gestora, são avanços, mas episódio da destituição unilateral da coordenadora-geral do Conselho pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos humanos consistiu em um ato grave de desrespeito à autonomia do Conselho, não visualizado desde a sua criação.


Fábia Pessoa/CDHM