Bancadas femininas da Câmara e do Senado coordenam reunião entre parlamentares do BRICS

Reunião de Mulheres Parlamentares do BRICS reafirmou papel estratégico das mulheres nas agendas de transformação digital, justiça climática e representação política
05/06/2025 09h34

Foto: Mariana Luciano/Câmara dos Deputados

Bancadas femininas da Câmara e do Senado coordenam reunião entre parlamentares do BRICS

Recepção das delegações na Reunião de Mulheres Parlamentares do BRICS

Entre os dias 3 e 5 de junho o Congresso Nacional está sediando o 11º Fórum Parlamentar do BRICS. Em 2025, o Brasil assumiu a presidência rotativa do grupo, sob o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global por uma Governança mais Inclusiva e Sustentável”. O evento, sediado em Brasília, marca um avanço significativo na consolidação da cooperação interparlamentar entre os países membros e tem como parte da programação oficial a Reunião de Mulheres Parlamentares do BRICS, realizada nesta terça (3). 

O encontro evidenciou o papel estratégico das parlamentares na formulação de políticas públicas mais inclusivas e na busca por soluções conjuntas para os desafios globais e ocorreu sob a liderança das Bancadas Femininas da Câmara dos Deputados e Senado Federal. Participaram da reunião delegações do Brasil, África do Sul, China, Cuba, Egito, Emirados Árabes Unidos, Índia, Irã e Rússia na capital federal. 

A agenda contou com três sessões de trabalho: Mulheres na Era da Inteligência Artificial: Entre a Proteção de Direitos e Inclusão Feminina na Economia Digital; Fortalecendo as Mulheres para enfrentar a Crise Climática: Perspectivas do BRICS; e Construindo o futuro: as Mulheres Parlamentares e a Agenda BRICS 2025. Ao final, uma atividade extra com a participação de representantes de bancos de desenvolvimento e empresas públicas brasileiras também integrou a programação.

Segundo a coordenadora-geral da Bancada Feminina da Câmara, deputada Jack Rocha (PT-ES), é fundamental que as propostas apresentadas na reunião se transformem em resultados concretos. “Nossa presença amplia horizontes, diversifica perspectivas e fortalece a qualidade das políticas públicas. Quando mulheres ocupam espaços de poder, a sociedade se beneficia de soluções mais inclusivas e sustentáveis”, acrescentou a deputada.

A líder da Bancada Feminina, senadora Leila Barros (PDT-DF), também destacou que a cooperação internacional só será efetiva com a participação política ativa das mulheres. “O encontro de hoje é um espaço para construir pontes sólidas entre os parlamentos dos países membros. O objetivo é acelerar políticas públicas que respondam aos desafios enfrentados por todas as mulheres no planeta”, afirmou.

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Abertura da Reunião de Mulheres Parlamentares do BRICS — Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Mulheres e inteligência artificial 

Na primeira sessão de trabalho, intitulada Mulheres na Era da Inteligência Artificial: Entre a Proteção de Direitos e Inclusão Feminina na Economia Digital, enfatizou-se a importância de garantir que o avanço tecnológico seja orientado para a inclusão e não aprofunde desigualdades existentes. Participaram do debate parlamentares dos Emirados Árabes Unidos, China, Índia, Irã e Brasil, que destacaram o papel dos Parlamentos na formulação de normativas que assegurem o respeito aos direitos humanos no ambiente digital.

Presididas pela deputada Delegada Katarina (PSD-SE), a sessão contou com contribuições que ressaltaram a necessidade de criar mecanismos internacionais de prevenção à violência digital e de proteção à integridade de mulheres e meninas, bem como de tipificar, nos marcos legais nacionais, crimes praticados contra mulheres em meios digitais. 

Representantes de outros parlamentos compartilharam experiências sobre a inclusão de mulheres na inteligência artificial e alertaram para um dado global: apenas 22% dos especialistas na área são mulheres, segundo a parlamentar Sara Falaknaz, dos Emirados Árabes Unidos, evidenciando desequilíbrios na criação e no controle dessas tecnologias. A mesma parlamentar destacou a transformação digital como instrumento estratégico para promover a participação feminina, citando a liderança de mulheres em setores como o espacial, onde já representam mais da metade da força de trabalho no seu país.

A parlamentar Shabari Byreddi, da Índia, também evidenciou os desafios criados pelo avanço da inteligência artificial, alertando que, sem regulação adequada, a tecnologia tende a reproduzir desigualdades existentes. Destacou que as transformações digitais, embora promissoras, têm excluído mulheres dos setores estratégicos da nova economia, ampliando barreiras de acesso ao trabalho e à inovação. Em vez de corrigir distorções, os sistemas automatizados frequentemente operam com vieses estruturais que aprofundam a assimetria de oportunidades, exigindo ação coordenada dos parlamentos para garantir uma transição tecnológica mais justa.

A deputada Iza Arruda (MDB-PE), coordenadora-geral do Observatório Nacional da Mulher na Política, também ressaltou a importância de instrumentos legislativos para enfrentar os riscos decorrentes do avanço tecnológico, com ênfase na proteção das mulheres. Em sua intervenção, destacou a Lei nº 15.123/2025, recentemente aprovada como proposta prioritária da Bancada Feminina, que prevê o agravamento da pena para o crime de violência psicológica quando cometido com o uso de ferramentas de inteligência artificial. “O universo digital não pode ser terra sem lei. Crimes on-line têm que ser punidos com rigor”, afirmou a deputada.

A deputada também chamou atenção para o crescimento da violência política contra mulheres no ambiente digital, impulsionada pelo uso de tecnologias como a inteligência artificial na produção de conteúdos manipulados, informando que que tramita no Senado Federal o Projeto de Lei nº 3821/2024, que visa criminalizar a manipulação digital de imagens, especialmente em casos relacionados à violência de gênero. Para a parlamentar, a persistência da impunidade nesses casos desestimula a participação política das mulheres e compromete a integridade das instituições democráticas.


Dep. Iza Arruda (MDB-PE) discursou sobre inteligência artificial e também sobre impactos da crise climática sobre as mulheres — Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

As demais parlamentares também defenderam a responsabilização efetiva das plataformas digitais, com legislações rigorosas e políticas de transparência, e alertaram para os desafios da sub-representação feminina nas áreas de STEM e dos impactos de algoritmos enviesados. Destacaram a importância de políticas que estimulem o empreendedorismo digital e ampliem o acesso de mulheres às tecnologias. 

Apesar dos desafios apresentados, a parlamentar Qian Fangli, do Congresso Nacional do Povo da China, destacou os avanços expressivos das mulheres chinesas na economia digital. Informou que mais de 74 milhões atuam nesse setor, com forte presença no comércio eletrônico e em plataformas de transmissão ao vivo, onde exercem papel de liderança. Segundo ela, as mulheres não apenas participam, mas são criadoras e impulsionadoras da inovação digital, beneficiadas por políticas públicas voltadas à sua inclusão. Atualmente, representam mais de 50% dos empreendedores da internet e 45% da força de trabalho no setor tecnológico, evidenciando o impacto de estratégias nacionais voltadas à promoção da liderança feminina na era digital.

A sessão evidenciou a importância estratégica da cooperação multilateral entre os países do BRICS e nações parceiras para a construção de uma governança da inteligência artificial que seja inclusiva, equitativa e ancorada em direitos. Recomendou-se a criação de fóruns permanentes de diálogo, troca de boas práticas e ações coordenadas como condição essencial para consolidar avanços e garantir impactos sustentáveis.

Mulheres no enfrentamento da crise climática 

A segunda sessão de trabalho, Fortalecendo as Mulheres para Enfrentar a Crise Climática: Perspectivas do BRICS, presidida pela senadora Eudócia Caldas (PL-AL), foi marcada por discursos enfáticos sobre o papel estratégico das mulheres na resposta à emergência climática e por reforços à necessidade de uma agenda climática inclusiva, com políticas financiadas e lideradas por mulheres, especialmente aquelas que vivem em contextos de maior vulnerabilidade.

A deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG) iniciou sua intervenção lembrando que, por séculos, as mulheres indígenas foram historicamente excluídas da política institucional no Brasil. “O Congresso Nacional demorou 109 anos para eleger a primeira mulher, 195 para eleger uma mulher indígena e 200 anos para termos uma mulher indígena presidindo uma comissão. Fui a primeira, com orgulho, em 2023, na Comissão da Amazônia, e hoje estou à frente da Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres”, afirmou. A parlamentar ressaltou que a política indígena está diretamente ligada à proteção ambiental, defendendo que “não existe parlamento sem floresta, sem água, sem planeta”.

As discussões convergiram para o reconhecimento do papel ativo das mulheres na construção de respostas à crise climática. Nora Ali, do Egito, destacou que as mulheres são mais dependentes de recursos naturais e guardiãs de práticas sustentáveis. “As mulheres não são meramente vítimas das mudanças climáticas, mas parceiras nos esforços de adaptação”, afirmou. Roza Chemeris, da Rússia, ressaltou os múltiplos papéis das mulheres diante dos desafios ambientais, enfatizando a necessidade de apoio institucional para que possam ocupar espaços de decisão. “As mulheres desempenham um papel vital na educação das gerações futuras para que atuem de forma responsável na proteção e mitigação das mudanças climáticas”, complementou a parlamentar.

​​As parlamentares do BRICS foram unânimes ao reconhecer que os efeitos da crise climática não atingem as mulheres da mesma forma. Nqabisa Gantsho, da África do Sul, chamou a atenção para a vulnerabilidade acentuada das mulheres em situações de desastre, citando dados das Nações Unidas que indicam que elas têm 14 vezes mais chances de morrer nesses contextos. Para enfrentar essa realidade, defendeu o fortalecimento da autonomia social e econômica das mulheres. “Vamos nos comprometer com ações concretas para que mulheres não sejam apenas sobreviventes, mas arquitetas da solução para mudança climática”, afirmou.

Nesse sentido, a senadora Leila Barros (PDT-DF) ressaltou o papel estratégico do BRICS no enfrentamento da crise climática, destacando a importância de ações lideradas por mulheres no Sul Global. Entre as propostas apresentadas, estão a criação de um fundo do BRICS para mulheres e clima, plataformas de educação climática, um pacto de liderança feminina, apoio a negócios verdes e a criação de um observatório sobre mulheres e clima. “Que nossa presença não se limite à retórica, mas que se traduza em ações concretas”, afirmou a senadora.

Celia Xakriaba

Dep. Célia Xakriabá (MDB-PE) ressaltou a importância da representação das mulheres indígenas na politica brasileira — Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Sessão multitemática

A terceira e última sessão da programação abordou o papel do BRICS em um contexto de crise de legitimidade das instituições multilaterais. As parlamentares alertaram para os obstáculos impostos pela discriminação estrutural e pela violência que ainda limitam a presença de mulheres em espaços de decisão, inclusive nos parlamentos, destacando que apenas 27% dos assentos parlamentares no mundo são ocupados por mulheres, o que reforça a urgência de incorporar, de forma efetiva, a pauta da igualdade nas políticas públicas dos países do BRICS.

A deputada Dandara (PT-MG), que presidiu a sessão, abriu sua fala destacando o encontro como símbolo da articulação entre os Legislativos de diferentes países e do compromisso do BRICS com a justiça social e a participação feminina. “A justiça de gênero é condição para qualquer pacto de sustentabilidade que queira ser duradouro. Portanto, este não é só um espaço protocolar: é também a ponte entre o desenvolvimento econômico e a redistribuição de tempo, de poder e de recursos”, afirmou.

Nesse contexto, parlamentares reforçaram a importância de que os compromissos assumidos pelo BRICS resultem em políticas concretas voltadas à inclusão e ao fortalecimento da atuação das mulheres. A vice-presidente do Parlamento de Cuba, Ana María Mari Machado, defendeu que o diálogo no BRICS reflita as demandas reais dos povos, em especial das mulheres. Destacou o monitoramento legislativo contínuo em Cuba e mencionou a criação de um plano de ação nacional e de um observatório voltado à autonomia econômica feminina.

As parlamentares brasileiras também apontaram caminhos para fortalecer a presença e a atuação das mulheres nos espaços de poder. A deputada Coronel Fernanda (PL-MT), Procuradora da Mulher na Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, defendeu que a saúde da mulher seja tratada como prioridade nas agendas de governança global, com atenção às desigualdades agravadas pela pobreza, violência doméstica e sobrecarga de trabalho não remunerado. Já a senadora Professora Dorinha (União-TO) criticou a forma superficial como a Declaração de Kazan aborda a participação feminina e defendeu ações estruturantes para ampliar sua representação nos parlamentos, incluindo cotas eleitorais, programas de formação e garantias contra a violência política.

Complementando as intervenções sobre a importância da participação feminina nos processos decisórios, a parlamentar Maryam Abdollahi, do Irã, destacou que o BRICS tem hoje a oportunidade de se consolidar como catalisador de justiça, dignidade humana e desenvolvimento sustentável. Defendeu que as mulheres estejam no centro das estratégias de transformação global, trazendo perspectivas essenciais para uma visão mais inclusiva e resiliente. Segundo ela, a Agenda BRICS 2025 é uma chance concreta de reformar estruturas internacionais desiguais, e isso só será possível com a escuta e a integração efetiva das vozes femininas em todas as etapas da formulação e implementação de políticas.

Mulheres como agentes e beneficiárias de financiamentos

Ao final da reunião, foi realizado um painel especial, presidido pela deputada Jack Rocha (PT-ES) e pela senadora Leila Barros (PDT-DF), com o objetivo de estreitar o diálogo entre parlamentares e instituições financeiras de desenvolvimento. O encontro contou com a participação do BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, além de representantes de agências de fomento, como o Sebrae, a Petrobras e programas voltados a negócios internacionais. O foco central foi a ampliação do papel das mulheres como agentes e beneficiárias das políticas de financiamento promovidas por essas instituições. As representantes destacaram iniciativas voltadas ao empreendedorismo feminino, à geração de renda e à redução de desigualdades estruturais

Luciana Silva Barbosa de Carvalho, executiva do Banco do Brasil, enfatizou a importância de linhas de crédito que não penalizem trajetórias femininas, muitas vezes marcadas por duplas jornadas e preconceito, destacando ações de capacitação com recorte de gênero. Shana Nogueira, do BNDES, informou que mulheres representam 60% dos beneficiários do microcrédito da instituição e que mais de 50 mil empreendimentos liderados por mulheres foram financiados em 2024. Também ressaltou o programa de alavancagem de startups, que já apoiou mais de 400 empresas femininas. Já Inês Magalhães, vice-presidente de Habitação da Caixa Econômica Federal, afirmou que a pobreza no Brasil tem gênero, cor e faixa etária — “é mulher, negra e jovem” — e defendeu que essas dimensões sejam consideradas na formulação das políticas de financiamento. Destacou ainda o Programa Minha Casa, Minha Vida como uma das principais referências em políticas públicas inclusivas.

Apesar dos avanços apresentados pelas instituições financeiras, a deputada Juliana Cardoso (PT-SP) chamou atenção para os obstáculos que ainda dificultam o acesso efetivo das mulheres ao crédito. Lamentou a burocracia e as exigências impostas no processo de concessão, observando que muitas não sabem a quem recorrer ou como acessar os recursos disponíveis. “Não sabem o formato para acessar o financiamento. Até porque um financiamento, dependendo como for, é muito burocrático. E essa burocracia não cabe aonde essas mulheres estão mais precisando”, afirmou.

O debate também tratou do Novo Banco de Desenvolvimento — conhecido como Banco do BRICS. Parlamentares dos países emergentes reforçaram a importância de que a instituição multilateral amplie seu apoio a projetos e empreendimentos liderados por mulheres do Sul Global, promovendo financiamento inclusivo e sensível às desigualdades regionais.

A deputada Iza Arruda (MDB-PE) voltou a pedir a palavra na sessão extra para destacar que a crise climática não é um evento futuro, mas uma realidade já presente em diversas regiões, como o semiárido brasileiro, onde “tem rosto, nome e gênero: as viúvas da seca”, em referência às mulheres que assumem sozinhas a gestão do lar e da subsistência familiar. Em sua fala, destacou o Projeto de Lei nº 2525/2023, de sua autoria, que institui a Política Nacional de Convivência com a Seca no Nordeste, voltada para ações contínuas de regeneração da caatinga. Segundo a parlamentar, reconhecer a seca como fenômeno natural e previsível, e não como calamidade, é essencial para fortalecer comunidades resilientes e garantir investimentos permanentes. “Proteger a caatinga é proteger o clima. Precisamos colocar as mulheres no centro da política pública e fortalecer o protagonismo local”, defendeu.

Compromissos firmados

A Reunião de Mulheres Parlamentares do BRICS 2025 reafirmou o compromisso dos países do bloco com uma atuação conjunta e contínua em prol da inclusão e da justiça social. O encontro evidenciou a força da diplomacia parlamentar das mulheres na construção de soluções para os desafios globais e na promoção de transformações estruturais. As propostas e reflexões apresentadas serão encaminhadas ao 11º Fórum Parlamentar do BRICS como contribuição à formulação de uma agenda internacional orientada pela equidade. As parlamentares também defenderam a continuidade da Reunião como espaço permanente e anualizado no calendário do Fórum, reforçando sua institucionalização como instância essencial de diálogo e cooperação.

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