Menino sujo

Era uma vez um menino sujo, faminto e sozinho chamado Samuel. Um dia encontrou um homem embaixo de uma árvore, tentando cozinhar um punhado de arroz com mortadela.

— Que é que tá fazendo aí, menino? — perguntou o homem.
— Oi, tio. Posso ficar com o senhor?
— Cadê sua mãe?
— Sei não.
— Tá sozinho?
— Tô sim.

O homem olhou para aquele menino perdido e lembrou sua infância pobre e seu passado triste, que nem aquele fogo que tentava acender conseguia queimar. Chamou o menino e dividiu com ele o punhado da única refeição do dia.


Era com o dinheiro da venda das pás de lixo que fabricava que o homem se sustentava. E agora tinha o menino de quem não sabia a origem. Trabalhou muito, juntando garrafas, construindo pás, catando lixo, lavando carro, montando e desmontando coisas. Às vezes arrecadava 30, às vezes 40, até 50 cruzeiros conseguia juntar num dia bom. Com muita luta, sol, chuva, dor e esperança se uniu para criar uma cooperativa de reciclagem.


Samuel, agora vestido e alimentado, seguia o homem, aonde quer que ele fosse. E ficaram amigos, como pai e filho. E cresceram juntos. De vez em quando sorriam de si mesmos e da vida que levavam. Trabalhavam juntos, aprendiam e ensinavam. Juntos. E assim ficaram por três anos. Até que o menino resolveu tomar o próprio rumo e um dia se despediu do homem que fazia de tudo um pouco.

— Tchau, tio.
— Tchau, menino. Se cuida! — aconselhou.

Senhor Cícero nunca mais ouviu falar de Samuel. “Por onde andará?”. Por vezes se pergunta se ainda continua vivo aquele menino que lhe ensinou um pouco a ser criança, num mundo em que, por vezes, se misturava com o próprio lixo.                   

Isolda Marinho