Monitoramento dos Resíduos de Serviços de Saúde
A experiência do Departamento Médico da Câmara dos Deputados
Com o objetivo de atender a legislação que trata do gerenciamento dos resíduos de serviços de saúde a Câmara dos Deputados, criou no âmbito do seu Departamento Médico - DEMED, grupo de trabalho multidisciplinar, o qual recebeu a incumbência de proceder ao levantamento dos resíduos gerados, elaborar e implementar o plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde — PGRSS, determinado pela Resolução ANVISA nº 306, de 07/12/2004 e pela Resolução CONAMA nº 358, de 29/04/2005.
Juntamente com a implementação do PGRSS, criou-se uma equipe de investigação multidisciplinar, coordenada pelo Núcleo de Gestão Ambiental da Câmara dos Deputados — Ecocâmara, e composta por representantes do DEMED, da administração do edifício e de encarregados e serventes da empresa terceirizada, responsável pelo recolhimento e limpeza do DEMED. Essa equipe de investigação está responsável pelo monitoramento do Plano, principalmente no que se refere ao acompanhamento da qualidade dos descartes dos resíduos sólidos gerados nos diversos setores do DEMED. É esta experiência que iremos relatar no presente artigo.
1- Caracterização do estabelecimento médico
O atendimento feito pelo Departamento Médico da Câmara dos Deputados é privativo da instituição e sua missão é dar assistência à saúde aos parlamentares, funcionários e seus dependentes. Dentre os diversos serviços prestados estão: consultas médicas, exames laboratoriais, atendimento de emergência, execução de programas de acompanhamento de patologias crônicas como diabetes e hipertensão, acompanhamento à gestante, campanhas de vacinação, feira de saúde, entre outros.
O atendimento em medicina nuclear ou similar não faz parte do elenco de suas atividades, bem como unidade quimioterápica.
Ocupando uma área de 3.212 m2, o atendimento é feito em dois turnos - das 7 às 19 horas (divididos em dois turnos), com serviço 24 horas para a emergência e plantão nos fins de semana e feriados.
No ano de 2004 foram realizados cerca de 278 mil atendimentos e 123.000 exames laboratoriais. Deste total de atendimentos, 12.000, por exemplo, foram na emergência, 10.000 na radiologia, 4.000 na Ecografia, entre outros. Em torno de 24.500 pessoas estão cadastradas com direito a atendimento pelo DEMED.
2- Estudo Preliminar
Visando conhecer os quantitativos e as peculiaridades dos diferentes resíduos gerados no Departamento Médico, referentes a sua forma de descarte e, também criar indicadores que possibilitassem a avaliação continuada do impacto da aplicação dos princípios do Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde - PGRSS, estabelecido pela ANVISA, realizou-se estudo preliminar detalhado, seguindo a seguinte metodologia:
Pesagem diária de todos os resíduos gerados, no período de sete dias (fevereiro de 2004), inclusive durante o plantão à noite e no sábado e domingo, discriminando-os por turno.
Segregação a posteriori dos tipos de resíduos e respectiva pesagem dos resíduos comuns (Grupo D) e dos demais resíduos considerados de risco (Grupos A, B e E). Este estudo foi feito em três dias distintos, escolhidos de forma aleatória.
- As duas tabelas abaixo apresentam os resultados obtidos:
Tabela 1. Estudo quantitativo: período de 2 a 8 de fevereiro de 2004
Turno |
Peso (kg) |
Total (kg) |
---|---|---|
Matutino |
327,8 |
542,5 |
Vespertino |
214,6 |
|
Tabela 2. Estudo qualitativo: resultados após a segregação dos resíduos
Data/Turno | Tipo de resíduo | Porcentagem (%) |
---|---|---|
4/2/2004 - Matutino |
Risco Potencial |
34,7 |
Comum (Grupo D) |
65,3 |
|
12/2/2004 - Matutino |
Risco Potencial |
33,8 |
Comum (Grupo D) |
66,2 |
|
18/2/2004 - Vespertino |
Risco Potencial |
25,0* |
Comum (Grupo D) |
75,0* |
|
Média |
Risco Potencial | 31,2% (169,3 kg por semana) |
Comum (Grupo D) | 68,8% (373,2 kg por semana) |
* O resultado foi obtido através dos volumes aproximados
Como mencionado anteriormente, para a realização deste estudo foi formada e treinada uma equipe de serventes e encarregados, a qual recebeu todas as informações e orientações necessárias. Esta equipe, coordenada por técnicos, tanto do DEMED como do Núcleo de Gestão Ambiental da Câmara — Ecocâmara, realizam o monitoramento, o qual é repetido três vezes ao ano.
Os resultados deste estudo preliminar, realizado em fevereiro de 2004, mostraram que das quase 2 toneladas/mês de resíduos gerados pelo DEMED, apenas cerca de 31,20 % eram resíduos com risco potencial (veja os gráficos abaixo). Estes sim, tendo em vista as suas características patológicas, deveriam ser encaminhados para a incineração. Incineração é o tratamento final obrigatório adotado no Distrito Federal, de acordo com o estabelecido no § 2º, artigo 29 da Lei Distrital nº 41, de 13 de setembro de 1989.
O desafio que se colocava à equipe responsável pela elaboração, implementação e acompanhamento do plano de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde era, portanto, estabelecer e adotar para o DEMED, um sistema de segregação adequado, que garantisse, com segurança, a segregação dos resíduos do Grupo A. Neste caso, nos referimos aos cerca de 31,2 % do total, e o seu envio para incineração. Os restantes 68,8%, devido as suas características não perigosas, poderiam ter destinos diferenciados, tais como a reciclagem ou a disposição em local destinado aos resíduos chamados domésticos, ou não contaminados.
3- Expectativa
Como demonstrou o estudo preliminar, realizado em fevereiro de 2004, os resíduos de serviços de saúde — RSS, enquadrados nos Grupos A e B, perfaziam cerca de 30% do total, logo a expectativa de redução do volume total enviado para a incineração, estava em torno de 70% .
Esperava-se que após a implementação do sistema de segregação adequado, seria possível alcançar uma redução de 70% do total dos resíduos de serviços de saúde — RSS, encaminhados à Usina de Incineração de Ceilândia.
A usina de incineração é controlada pelo Governo do Distrito Federal, por intermédio da BELACAP e operada pela empresa Qualix Serviços Ambientais.
A expectativa da equipe responsável pelo PGRSS do DEMED com a contínua melhoria do processo de segregação e o reforço das ações educativas e de treinamento continuado dos servidores e funcionários, é reduzir, de forma paulatina, os volumes enviados para a incineração.
4- Implementação do PGRSS
Após a conclusão dos trabalhos de elaboração do PGRSS foi feita a apresentação do Plano aos servidores e funcionários do DEMED, da área administrativa e dos serventes e encarregados envolvidos.
A sua implementação teve seu início em junho de 2004, primeiramente com a distribuição dos coletores apropriados, como determina a norma legal da ANVISA.
Ao mesmo tempo, o programa de monitoramento dos resultados e o estabelecimento de indicadores foi criado e colocado em prática, como será descrito a seguir.
Algumas obras de engenharia foram realizadas, visando adequar as instalações físicas às novas exigências legais.
Para as atividades de tratamento de químicos — Grupo B, novos procedimentos foram adotados e parceria com empresa licenciada pelo órgão de meio ambiente local, objetivando o descarte seguro.
Em junho de 2005, o CEFOR — Centro de Formação e Treinamento da Câmara dos Deputados capacitou mais de 80 servidores do DEMED. Da mesma forma, a empresa prestadora dos serviços de limpeza e higienização no DEMED realizou a capacitação de seus funcionários, cumprindo 6 (seis) horas/aula, e conteúdo programático estabelecido em conjunto com a equipe responsável pelo PGRSS.
De forma individual, cada membro do Grupo de Trabalho que elaborou o plano , capacitou seus pares, dando a todos a oportunidade de tomar conhecimento do sistema adotado, esclarecendo as dúvidas e apresentando os novos procedimentos de segregação.
5- Programa de Monitoramento do sistema de segregação
Monitoramento é o estudo e o acompanhamento - contínuo e sistemático - do comportamento de fenômenos, eventos e situações específicas. Serve para conhecer o estado e as tendências qualitativas e quantitativas dos aspectos estudados e as influências exercidas pelas atividades humanas ou por outros fatores e a sua interferência, por exemplo, sobre o meio ambiente.
Como mencionado, antes da implementação do Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviço de Saúde - PGRSS, não havia nenhum tipo de segregação. Todos os resíduos gerados, inclusive os efluentes químicos, eram coletados pela BELACAP e incinerados, ou descartados na rede de esgoto. A ausência de um processo de segregação e gestão adequados de resíduos no DEMED, comprometia a qualidade da disposição final dos resíduos contaminados e não contaminados.
6- Metodologia do Monitoramento
O monitoramento quali-quantitativo dos resíduos gerados no DEMED gera informações diversas, as quais possibilitam avaliar a situação presente, relativa a eficiência, tanto no momento da segregação dos materiais, praticada pelos servidores e funcionários nos consultórios, laboratórios, copas, reservados, etc., como no recolhimento, fornecendo subsídios importantes para a definição e a adoção de novos procedimentos.
Assim, as informações geradas devem transmitir clareza aos técnicos, aos tomadores de decisões e à comunidade envolvida sobre a situação que se quer analisar. Se a informação não é bem entendida, não há clareza para avaliar os resultados, podendo haver distorções, decisões inadequadas ou até mesmo erradas.
A implantação de atividades de monitoramento necessita de uma seleção prévia de indicadores. Indicadores são parâmetros que expressam as condições qualitativas ou quantitativas do que está sendo medido e avaliado. Devem descrever, de forma compreensível e significativa:
- o estado e as tendências da geração de resíduos;
- a situação (qualidade e quantidade) em que eles são recolhidos e disponibilizados para a destinação final;
- a presença de resíduos do grupo A, B ou E descartados de forma misturada com demais resíduos;
- o desempenho dos servidores no ato da segregação e dos serventes no procedimento de recolhimento;
- as reduções dos quantitativos enviados para incineração, reciclagem e/ou reaproveitamento interno ou externo.
A metodologia utilizada no monitoramento realizado pelo DEMED é simples e constitui-se no estudo quantitativo, ou seja, na pesagem dos resíduos gerados e segregados separadamente.
O estudo qualitativo constitui-se na observação do conteúdo dos sacos plásticos recolhidos, anotando e fotografando diversos aspectos e pesados em seguida. Esta investigação pode e deve ser repetida em épocas diferentes. No caso do DEMED, determinou-se a realização de 3 monitoramentos por ano, permitindo acompanhar a eficiência da implantação do Programa.
7- Resultados Alcançados
Abaixo apresentamos graficamente os resultados dos monitoramentos realizados em diferentes épocas, desde o início da implementação do PGRSS.
8- Análise Quantitativa
Obs.: Biológico são os resíduos do Grupo A; Papel e Plásticos são classificados como Grupo D — recicláveis e Diversos são do Grupo D não-recicláveis.
O monitoramento qualitativo mostrou que existem ainda diversos tipos de resíduos não contaminados, ou seja, do Grupo D, como por exemplo, embalagens de plástico, de papel ou plástico-papel, tanto de medicamentos ou dos diversos materiais médico-hospitalares, que vêm sendo descartados no coletores para resíduos do Grupo A. Este fato indica que é possível investir mais na segregação adequada reduzindo o volume dos resíduos descartados como Grupo A.
O monitoramento é uma ação que não pode ser esquecida quando se implementa o Plano de Gerenciamento dos RSS.O custo para realizar o monitoramento é baixo, porém o retorno é significativo.
9- Conclusão :
Como mostram os resultados, desde outubro de 2004, até novembro de 2005, houve uma redução de 80 % do volume de resíduos encaminhados à incineração.
Grande parte do sucesso destes resultados é conseqüência do esforço e do trabalho contínuo de treinamento e sensibilização, tanto dos geradores - servidores e funcionários, como dos serventes responsáveis pelo recolhimento dos resíduos. Para 2006, a meta será reduzir ainda mais este volume e para isso um trabalho corpo-a-corpo, de sensibilização deverá ser feito.
Numa escala maior, ou seja, para os estabelecimentos de grande porte, geradores de volumes significativos de resíduos, o monitoramento também poderá ser feito. Para ser realizado com sucesso, deverá ser estabelecido um procedimento capaz de fornecer dados que transmitam com certa precisão o grau de eficácia e eficiência do sistema de segregação implementado. Esses indicadores são de grande valia, principalmente para o planejamento e a avaliação das ações de intervenção, voltadas à não geração ou a minimização dos volumes de resíduos, estratégias que, segundo as Resoluções da ANVISA nº 306/2004 e do CONAMA nº 358/2005, devem ser praticadas.
Relatório produzido pelo Núcleo de Gestão Ambiental EcoCâmara
Jacimara Guerra Machado — Assessora Técnica do Núcleo
Silmara de Almeida Gonçalves- Coordenadora do PGRSS do Departamento Médico da Câmara dos Deputados
Hugo Alves de Matos Silva — Estagiário de Engenharia Ambiental da Universidade Católica de Brasília