Parlamentares defendem importância do modelo brasileiro de educação inclusivo para Ministro Milton Ribeiro

Em reunião com parlamentares das Comissões de Educação, dos Direitos da Pessoa com Deficiência e de Direitos Humanos e Minorias, o Ministro da Educação se desculpou por fala equivocada e disse que prioridade é o modelo inclusivo
02/09/2021 17h24

Fábia Pessoa/CDHM

Parlamentares defendem importância do modelo brasileiro de educação inclusivo para Ministro Milton Ribeiro

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, participou de reunião na tarde desta quarta-feira (1) com parlamentares das Comissões de Educação, dos Direitos da Pessoa com Deficiência e de Direitos Humanos e Minorias. A reunião decorreu da apresentação de requerimentos sobre a fala do ministro à imprensa.

Em entrevista concedida ao programa Novo Sem Censura, da TV Brasil, no último dia 9, ele afirmou que “a criança com deficiência era colocada dentro de uma sala de alunos sem deficiência. Ela não aprendia. Ela atrapalhava, entre aspas, essa palavra falo com muito cuidado, ela atrapalhava o aprendizado dos outros”.

Na reunião, Milton Ribeiro reconheceu que o comentário foi infeliz e que o tema é algo sensível e com linguagem própria. “Fiz referência a atrapalhar entre aspas, com todo o cuidado. Mas reconheço que a palavra tem conotação pejorativa e magoa as pessoas. Logo fui na rede social e pedi desculpas. Não é da minha formação religiosa colocar situações que coloquem esse desconforto, muito menos para deficientes”, disse.

O ministro argumentou que falava sobre as dificuldades enfrentadas pelos professores para dar atenção aos diferentes alunos, com e sem deficiência. E que o governo, na figura da primeira dama, tem dado atenção especial ao público, inclusive para os super dotados.

 

Risco de discursos equivocados

“Quando a criança desde cedo aprende a conviver com aquele que é diferente, ela passa ter uma visão de mundo também diferente. Aprende também a ser mais solidária, a estar no lugar do outro. A nossa luta é cotidiana, pelo respeito, pela inclusão, para que nossos filhos possam exercer seu direito de ir e vir sem sofrer qualquer tipo de preconceito e discriminação. Uma fala dessas dói demais, desestabiliza, quando a gente escuta dizer que nossos filhos atrapalham, que não têm a mínima condição de estar com os outros”, afirmou a deputada Rejane Dias (PT/PI), presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que é mãe de uma filha com deficiência intelectual severa.

O deputado Felipe Rigoni (PSB/ES) demonstrou preocupação com o que seria uma tendência a desestimular a inclusão, que o ideal é que todas as escolas sejam preparadas para atender pessoas com deficiência. E apontou que determinados comentários podem gerar afastar pessoas com deficiência das classes regulares.

“O norte tem que ser ‘um dia seremos todos inclusivos’, e não a preferência pelas escolas especiais. Elas têm um papel na sociedade. Agora, o norte precisa ser a inclusão. A gente precisa de um direcionamento, recursos, tempo, orçamento para que um dia possamos receber qualquer tipo de deficiência. Tenho muito receio de que se coloque preferencialmente que os alunos com deficiência vão para escolas especiais. O que acontece quando isso é dito é que vários diretores de escolas comuns começam a avisar aos pais que aquela escola não é para o filho deles, mesmo que ela esteja relativamente preparada”, apontou.

 

Prioridade deve ser a inclusão

Os parlamentares presentes reforçaram que a inclusão de crianças com deficiência na sala de aula regular é benéfica, tanto para os alunos com deficiência quanto para os que não possuem, pois favorece o respeito às diferenças e o cuidado com o próximo. Defenderam ainda que a política de inclusão de pessoas com deficiência em escolas regulares possui um arcabouço normativo, estruturado ao longo de décadas, como resultado de ampla discussão em nível nacional e internacional.

Dorinha Seabra Rezende, Presidente da Comissão de Educação, demonstrou preocupação quanto aos recursos para a construção e manutenção de salas de recursos, para formação continuada dos professores e para adaptação física para acessibilidade das escolas na educação regular na perspectiva da inclusão das pessoas com deficiência, preocupações que foram reforçadas pelos outros deputados presentes.

“A posição da Frente Parlamentar Mista de Educação é de que a função do MEC, das Secretarias Estaduais e Municipais, no que se refere aos alunos com deficiência, é de garantia de acesso aos conteúdos do currículo oficial brasileiro.”, comentou o deputado Israel Batista (PV/DF), presidente da FPME.

 

Decreto Inconstitucional 

O Decreto nº 10.502 cria a Política Nacional de Educação Especial. O deputado Helder Salomão (PT/ES) relembrou que, enquanto presidente da CDHM, solicitou às Nações Unidas análise sobre PDL que pretende sustar os efeitos do decreto. O Escritório Regional do Alto Comissariado das Nações Unidas manifestou-se a favor do PDL, por entender que o decreto viola aspectos da educação inclusiva previstos inclusive na Constituição brasileira.

Érika Kokay (PT/DF) também demonstrou preocupação com o Decreto. “O ideal é que todas as pessoas com deficiência estejam na escola regular, na escola inclusiva, e que a escola seja preparada para que você tenha todas as crianças e adolescentes, e isso deveria ser uma meta prioritária. Nós sabemos que existe um período de transição, mas tem que ser uma lógica permanente”.

Em análise das recomendações feitas ao Brasil para melhorar os direitos humanos das pessoas com deficiência, relatório preliminar produzido para o Observatório Parlamentar da RPU apontou que o Decreto n° 10.502 vai contra a implementação de uma política educacional inclusiva, nos termos da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Em audiência pública sobre o tema, Raphael Otávio Bueno, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), afirmou que o Ministério Público entende o Decreto como um retrocesso, que representa uma volta ao passado, com classes paralelas para pessoas com deficiência.

O Partido Social Brasileiro (PSB) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Decreto n° 10.502 (ADI 6.590), com base no argumento que o documento teria como real objetivo discriminar e segregar os alunos com deficiência, com direta violação ao direito à educação inclusiva. Em 2 de dezembro de 2020, o ministro Dias Toffoli, relator da matéria, em decisão monocrática, suspendeu o decreto. Em dezembro de 2020, o Plenário do STF, por maioria, referendou a decisão liminar para suspender sua eficácia.

 

Posição do MEC

Victor Godoy, Secretário-Executivo do MEC, afirmou que a pasta vem procurando auxiliar estados e municípios a utilizar recursos para reformas e formação de professores, inclusive com cursos EAD. Afirmou ainda que a prioridade da pasta é a alfabetização e a transição tecnológica na educação. Sobre o Decreto, o secretário explicou que existe uma cartilha que explica a centralidade dada à inclusão pelo Plano e que as classes especiais são exceção à regra, mas reconheceu a necessidade de rever parte da política, reforçando a prioridade dada à educação inclusiva.

O Ministro foi acompanhado ainda por Crisiane Nunes Bez Batti, Diretora de Política de Educação Bilíngue de Surdos, Nídia Regina de Sá, Diretora de Educação Especial, e Ilda Ribeiro Peliz, da Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação.

Participaram também da reunião os deputados Eduardo Barbosa (PSDB/MG) e Tabata Amaral (PDT/SP)

Como encaminhamento, os presidentes das três comissões solicitaram estudo sobre orçamento disponível e gastos para a construção e manutenção de salas de recursos, para formação continuada dos professores e para adaptação física para acessibilidade das escolas na educação regular na perspectiva da inclusão das pessoas com deficiência.

 

Fábia Pessoa/CDHM