Violência contra a mulher é maior no campo dizem debatedoras
Foto - Gustavo Sales Câmara dos Deputados
Carmem Foro e Érika Kokay no debate sobre violência contra as mulheres no campo
O combate à violência contra a mulher no campo foi tema do projeto Pauta Feminina nesta sexta-feira (13/08), desenvolvido pela Secretaria da Mulher da Câmara, em parceria com a Comissão dos Direitos da Mulher e a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag). O evento, que integra a programação da campanha “Agosto Lilás”, homenageou os 21 anos da Marcha das Margaridas e o Dia de Luta contra a Violência no Campo. A Marcha leva este nome em memória à Margarida Maria Alves, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba, assassinada em 12 de agosto de 1983 na porta de sua casa.
O debate foi coordenado pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF) que, na abertura, citou a violência política de gênero, a baixa representação feminina na política e lembrou que, recentemente, a Secretaria da Mulher, por meio da Procuradoria da Mulher, criou o Observatório Nacional da Mulher na Política. Érica disse que participou da primeira edição da Marcha das Margaridas e lembrou os altos índices de violência contra a mulher no Brasil, quinto país no mundo em número de feminicídios. “Segundo pesquisa divulgada pelo DataFolha, a pedido do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 17 milhões de brasileiras (24,4%) sofreram algum tipo de violência ou agressão durante a pandemia. Somente em 2020, uma a cada quatro mulheres com mais de 16 anos foi atacada física, psicológica ou sexualmente. Se a pandemia trouxe inúmeras dificuldades para a população, em geral, foi ainda mais severa para as mulheres e, em especial, as mulheres do campo, que têm ainda mais dificuldades de denunciar”, disse a deputada.
A coordenadora da Marcha das Margaridas, Mazé Morais, lembrou a história do movimento e os 38 anos da morte de Margarida Alves, cuja história se tornou referência de luta contra a violência no campo e em defesa da reforma agrária. Ela informou dados de relatório sobre conflito no campo no Brasil, elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), que aponta que entre 2011 e 2020 foram registradas 77 tentativas e 37 assassinatos de mulheres por conflitos fundiários e ambientais, além de agressões, ameaças, estupros e outros crimes de violência contra a mulher.
Ela destacou também a importância do Estado de não ignorar a proteção das mulheres e o enfrentamento da violência em âmbito familiar ou não. “Ignorar é um dos principais obstáculo à garantia dos direitos humanos e fundamentais da mulheres do campo“, disse.
Sônia Coelho, representando a Marcha Mundial das Mulheres, ressaltou que hoje ainda persiste o contexto em que foi assassinada Margarida Alves, da escravização e da violência econômica, patriarcal e racista contra a mulher no campo. “Esta violência é acentuada pela expansão do agronegócio e das mineradoras, somada às condições desiguais que vivem as mulheres do campo, com menos acesso à educação, baixa escolaridade, restrição à titulação de terras, falta de autonomia econômica, restrição ao acesso a insumos e crédito e desvalorização do seu trabalho“. Para ela, aos 15 anos a Lei Maria da Penha não chegou ainda no campo e, sozinha, não resolve a vida das mulheres, nem no campo nem na cidade.
Representando a Campanha pela Divisão Justa do Trabalho Doméstico, construída coletivamente, Laeticia Jalil disse que a violência se coloca também na invisibilidade do trabalho doméstico, acentuada durante a pandemia. “Junto com o esfacelamento das políticas sociais, cresceu a violência territorial contra as mulheres rurais e a pandemia fez com que elas acumulassem ainda mais o trabalho doméstico, além das dificuldades pela precarização do Sistema Único de Saúde (SUS) e a redução de creches e escolas“.
Laeticia apresentou dados de pesquisa feita com 1.600 mulheres rurais do Nordeste sobre os reflexos da pandemia: 78% disseram que a violência aumentou; 65% responderam que conhecem mulheres que foram violentadas durante o período de isolamento social; e 82% dizem que assumiram sozinhas todo o trabalho doméstico e de cuidados.
Naiara Santana, da coordenação do Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do Nordeste (MMTR-NE), citou os 15 anos da Lei Maria da Penha e disse que a legislação ainda precisa ser cumprida efetivamente, ”inclusive e principalmente nas comunidades rurais”. Citou o trabalho do Fórum Nacional de Enfrentamento contra a Violência da Mulher do Campo, das Florestas e das Águas, que presta serviços de orientação, acolhimento e prevenção.
Pelo Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), Helena Gomes falou sobre a importância da Marcha das Mulheres e dos problemas que afetam as quebradeiras de coco babaçu, “que sofrem grande violência doméstica e laboral“. Mencionou a tragédia que afeta mulheres, crianças e adolescentes violentadas e as dificuldades que enfrentam para atendimento e cumprimento de medidas protetivas.
Raquel Braz, da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAG), de Alagoas, agradeceu a indicação para a audiência, feita pela deputada Tereza Nelma (PSDB-AL), procuradora da Mulher, e lembrou que “até hoje os culpados pela morte de Margarida Alves não foram punidos, assim como de outras mulheres no campo assassinadas“. Ela lamentou o aumento da violência no campo e constatou a dificuldade de acesso das mulheres à única Casa da Mulher de Alagoas, e o fato de no Estado e em muitas outras localidades do País as Delegacias Especializadas ficarem nas capitais.
Pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), Carmem Foro disse que Margarida Alves “vive e inspira“. Citou a Marcha das Margaridas, realizada a cada quatro anos, e lembrou que no ano passado e neste, o movimento promoveu atos virtuais em função da pandemia de Covid-19. Em 2019, a maior marcha de mulheres da América Latina ocupou as ruas de Brasília com mais de 100 mil mulheres do campo, da floresta e das águas, na luta por seus direitos. “Nossa luta é por Margarida e por tantas que foram assassinadas no campo, na luta pela terra e pelo direito“. Destacou, ainda, a importância das lideranças de mulheres indígenas e quilombolas; os altos índices de violência sexual contra crianças, meninas e jovens no campo; e o triste fato de 61% dos feminicídios serem de mulheres negras. “Precisamos continuar a denunciar. E continuar nossa luta com coragem“, afirmou.
Para assistir à íntegra do debate, acesse o portal E-Democracia.
14/08/2021 - Ascom - Secretaria da Mulher