Exposição e manifesto na Câmara celebram os 90 anos do voto feminino no Brasil
A Secretaria da Mulher e o Centro Cultural da Câmara dos Deputados promovem, até 28 de outubro, a exposição “90 anos do voto feminino no Brasil”, com ilustrações de personagens históricas e a evolução dos direitos políticos das mulheres. O voto feminino só entrou no Código Eleitoral Brasileiro em 1932, após pressão e mobilização da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, fundada por Bertha Lutz dez anos antes.
A deputada Erika Kokay (PT-DF), ao abrir oficialmente a exposição representando a bancada feminina, enfatizou que muitas normas relacionadas aos direitos das mulheres só se converteram em leis devido à luta das deputadas e senadoras e o aumento da presença de mulheres na política: “Nós avançamos no número de mulheres eleitas nesta legislatura em relação à legislatura passada, mas ainda estamos muito distantes do percentual de mulheres na nossa sociedade. É preciso entender que cada conquista e avanço de equidade de gênero representam avanços na construção da democracia e da justiça. E esse avanço tem que ser cuidado e protegido, para que possamos fazer deste País uma verdadeira democracia”, declarou.
Já a procuradora da Mulher na Câmara, deputada Tereza Nelma (PSD-AL), lembrou que "as mulheres querem, sim, a igualdade de espaço e estar nos espaços de poder. Nesse sentido, esta exposição é muito importante para contar a história de tantas mulheres sufragistas que lutaram para que hoje tenhamos mulheres deputadas, senadoras, vereadoras, prefeitas e governadoras em nosso País".
Debate - A abertura da exposição foi realizada na terça-feira (11/10), precedida por um debate que se transformou em manifesto em defesa dos direitos das mulheres. Aos 74 anos de idade, a ex-deputada constituinte Moema São Thiago (CE) lamentou que, 34 anos após direitos assegurados na nova Constituição, as mulheres ainda tenham que enfrentar violência e entraves políticos.
“Quando a gente vê o espaço das mulheres conquistado na Argentina e em outros países, a gente percebe o quanto ainda estamos atrasados. Isso é proposital porque, ao longo da história da luta das mulheres no Brasil, você vê a subestimação e, sobretudo, a manipulação, que agora está no auge. Então, meu primeiro compromisso com vocês seria o de, daqui, sair uma carta de não ao fascismo. Não passará a tentativa antidemocrática de rasgar a Constituição social”, garantiu.
Moema lembrou que “em 1933, vivemos a conquista do voto feminino; em 1934 tivemos a posse da primeira deputada federal brasileira, Carlota Pereira de Queirós. Também criamos a Constituição de 1988 e à época, nós, mulheres, não representávamos sequer 5% da Câmara dos Deputados. Éramos apenas 26 deputadas eleitas. Hoje, ocupamos 17,7% das cadeiras desta Casa. Ou seja, em 34 anos, não conseguimos chegar a 20%. Isso mostra o quanto nosso Parlamento está atrasado. Precisamos no unir, pois a luta da mulher deve ser vista como algo suprapartidário”, afirmou.
A nova composição da bancada feminina que tomará posse em fevereiro de 2023 terá 91 mulheres, o equivalente a apenas 18% do total de deputados federais. Presente ao debate, uma das primeiras coordenadoras da Secretaria da Mulher na Câmara, a ex-deputada Jô Moraes (MG), reforçou o tom de manifesto em defesa dos direitos femininos.
“Mais do que o evento dos 90 anos, nós realizamos aqui hoje um ato de celebração da resistência das mulheres. Vivemos um momento muito delicado da vida do país, onde o que está em ameaça são o papel e o empoderamento das mulheres. Resistiremos porque a liberdade é feminina, a igualdade é feminina, a justiça é feminina e este país tem que continuar emancipando suas mulheres”.

A exposição sobre os 90 anos do voto feminino no Brasil ocupa o Corredor Tereza de Benguela, um dos acessos ao Plenário da Câmara. O trabalho é resultado de extensa pesquisa, que também enfrenta dificuldades históricas, como contou a socióloga e cientista política Ana Maria Prestes Rabelo, uma das curadoras da exposição.
“Encontrar o que as mulheres falaram, fizeram e deixaram é muito mais difícil. Não estamos nos registros, especialmente na política, porque a política foi feita pelos homens para os homens. Até para a gente contar nossa história tem muita luta. Nossa torcida é que a exposição ilumine o caminho de entendimento do porquê ainda não somos hoje nem 20% desta Casa e somos pouquíssimas nos Executivos estaduais e municipais e em todos os espaços de poder nesse País”, afirmou Ana.
Outra curadora da exposição, a jornalista Angélica Kalil, ressaltou o papel desse resgate histórico para alimentar a luta e a mobilização das novas gerações de mulheres nos espaços de poder. “Acho que a gente está vivendo um momento histórico e precisa entender que as mulheres têm que estar também nos espaços de decisão política. Achei muito emocionante fazer esse trabalho e ver como as mulheres que vieram antes da gente foram pavimentando o caminho. E agora a gente pega isso e continua pavimentando para as próximas”.
Cultura cívica - Autora de livros como “A história do voto feminino no Brasil” e da biografia da pioneira Bertha Lutz, a historiadora Teresa Cristina de Novaes Marques lembrou como as mulheres eram excluídas do direito de votar: “A Constituição era redigida de forma ambígua, balizada em categorias que ninguém conhecia o alcance, sempre redigida com palavras de gênero masculinas (como “o cidadão, o brasileiro”). Assim, quando as mulheres se alistavam como eleitoras, o juiz se refugiava na gramática e entendia que aquele texto se aplicava unicamente aos homens. Essa ambiguidade do texto constitucional foi uma saída política de negativa ao direito ao voto das mulheres. Até que em 1929, Myrthes Campos, a primeira mulher advogada a ingressar no antigo Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil, sugeriu uma intervenção política e o voto feminino se deu pela negociação com Getúlio Vargas”, explicou.
Para a historiadora, a exposição na Câmara é um instrumento de “cultura cívica”: “A cultura cívica não deve apenas fornecer os elementos para o culto da pátria, da nação, da belicosidade. Não. Devemos construir um laço de respeito e carinho por quem lutou por coisas que hoje nós usufruímos, por quem já esteve aqui e preparou o caminho para se chegar a esse ponto”, afirmou.
A coordenadora da bancada feminina e a procuradora da Mulher na Câmara, deputadas Celina Leão (PP-DF) e Tereza Nelma (PSD-AL), destacam em texto de apresentação da exposição a relevância de se celebrar o empenho de todas as mulheres que participaram do movimento sufragista, no século 19, até as que resistem hoje no cenário político.
A exposição conta com apoio do Instituto Avon. Durante o debate, a representante do Instituto, Daniela Grelin, reforçou que a exposição traz à lembrança coletiva a importância da participação equitativa das mulheres nos espaços de poder, que nunca foi um presente: “É resultado de muita luta e, por meio desta exposição, queremos honrar essas mulheres e convocar muitas outras à reflexão sobre uma sociedade inclusiva, representativa e livre. Esse é um trabalho constante e cabe a nós escrevermos um capítulo dessa história. O direito das mulheres começa pelas urnas e, por isso, é importante que as mulheres se unam para fazer com que as políticas que nos afetam não sejam feitas sem nós”, concluiu.
Assista à reportagem da TV Câmara sobre a exposição dos 90 anos do voto feminino no Brasil. Para rever a integra do debate, clique aqui.
Ascom - Secretaria da Mulher, com Agência Câmara de Notícias