Deputados e Ministério da Saúde discordam sobre mamografia antes dos 50 anos para prevenir câncer

A realização do exame de mamografia como forma de prevenir o câncer de mama antes dos 50 anos dividiu opiniões em debate na Câmara dos Deputados. A audiência foi promovida nesta quinta-feira (14/10) pelas comissões de Defesa dos Direitos da Mulher e de Seguridade Social e Família, e pela Comissão Especial de Combate ao Câncer no Brasil, em parceria com a Secretaria da Mulher.
14/10/2021 14h20

Arte Tiago Fagundes Agência Câmara

Deputados e Ministério da Saúde discordam sobre mamografia antes dos 50 anos para prevenir câncer

Debate sobre câncer de mama no Brasil

Embora ocorra maior propensão à doença entre mulheres com mais de 50 anos, o aumento do câncer de mama entre mulheres mais jovens tem chamado a atenção: estimativas apontam que em mulheres abaixo dos 35 anos, a incidência atualmente está entre 4% e 5% dos casos, faixa etária que, historicamente, representava apenas 2% dos casos, segundo o Instituto Oncoguia. 

A deputada Tereza Nelma (PSDB-AL), uma das autoras do pedido de audiência sobre o tema, é paciente oncológica e defende a antecipação da mamografia no Sistema Único de Saúde (SUS) para mulheres abaixo de 50 anos – a idade atualmente indicada. Ela é relatora do Projeto de Decreto Legislativo (PDL 679/2019) do Senado Federal que susta a portaria do Ministério da Saúde que mantém o uso da mamografia para o rastreamento do câncer de mama em mulheres na atual faixa etária (50 a 69 anos). O parecer de Tereza Nelma recomenda a aprovação do projeto e aguarda votação na Comissão de Seguridade Social e Família. Ela defende a antecipação dos exames de rastreamento de câncer de mama a partir dos 40 anos pelo SUS. 

"O câncer de mama tem sido cada vez mais frequente em mulheres jovens, apesar de representar apenas 10% das vítimas. É comum mulheres jovens terem cânceres mais agressivos, com tendência a crescerem e a se espalharem mais rapidamente. E mais ainda, o diagnóstico se torna mais difícil, dada a maior densidade do tecido mamário", explicou a deputada. 

No parecer ao PDL 679/2019, Tereza destaca que a Sociedade Brasileira de Mastologia recomenda que as mulheres comecem a realizar o exame de mamografia, anualmente, a partir dos 40 anos de idade. Para mulheres que estão no grupo de risco, a idade deve ser a partir dos 35 anos. Já para pacientes entre 50 e 69 anos, o intervalo máximo deve ser de até dois anos entre os exames.

Diretriz legal - Presidente da Comissão Especial da Câmara que avalia o combate ao câncer no Brasil, o deputado Weliton Prado (Pros-MG) também é favorável ao projeto que susta a portaria do Ministério da Saúde. Conforme ele, a portaria descumpre a Lei 11.664/2008, segundo a qual o SUS “deve assegurar a realização de exame mamográfico a todas as mulheres a partir dos 40 anos de idade”. Ele afirmou que a portaria não pode estar acima da lei.

De acordo com o parlamentar, mesmo com histórico familiar, muitas mulheres demoram muitos meses para conseguir fazer o exame no SUS. Prado acredita que o exame não é feito antes do 50 anos no SUS por uma questão financeira. "Temos que cumprir a lei e fazer a mamografia a partir dos 40 anos de idade, como é feito em vários países do mundo", defendeu.

Maria Eliane Ramos do Nascimento, paciente oncológica e servidora terceirizada da Câmara, destacou a importância do auto cuidado e do atendimento precoce porque ela própria descobriu o câncer de mama aos 36 anos de idade: "Foi um diagnóstico rápido e costumo dizer que renasci", afirmou, destacando o fato de ter descoberto a doença rapidamente, o que possibilitou o tratamento e a cura. 

Custo-Benefício – Ana Patrícia de Paula, do Ministério da Saúde, destacou que as diretrizes do SUS para a realização de mamografia apenas a partir dos 50 anos seguem as recomendações da literatura médica e levam em conta a relação custo-benefício. “O rastreamento fora dessa faixa acaba ocasionando risco muito grande de falso positivo, sobretratamento e sobrediagnóstico. Dependendo dos estudos, você pode encontrar de 20% a 56% de falso positivo na mamografia quando você faz na população abaixo de 50 anos de idade”, explicou. Ela garantiu, ainda, que em caso de alto risco de câncer a mulher fora da faixa etária de 50 a 69 anos pode fazer os exames pelo SUS.

Riscos para as mulheres - O médico Arn dos Santos, do Instituto Nacional de Câncer (Inca), reiterou que o câncer de mama é uma doença rara em mulheres jovens. Segundo ele, para mulheres abaixo de 50 anos não há evidências científicas de que os exames de check up trazem benefícios e podem, inclusive, trazer riscos para a saúde, já que a radiação é cumulativa e há tipos de câncer induzidos pela radiação.

Ele também alertou para o risco de sobrediagnósticos e sobretratamentos – ou seja, tratar um câncer que não iria evoluir. "[O check up em mulheres jovens] não reduz a mortalidade, não evita que a mulher morra e não evita que ela tenha um câncer mais avançado. Por isso não recomendamos que seja feito o exame de mamografia ou qualquer outro exame de rotina em mulheres assintomáticas", reforçou Santos. Ele acrescentou que, mesmo para mulheres com mais de 50 anos, fazer os exames de check up com periodicidade maior do que dois anos também não traz benefícios.

Em vez de fazer exames de rastreamento sem indicação, o médico do Inca recomenda a realização do autoexame, para a própria mulher detectar o nódulo. Ainda conforme ele, o SUS deve priorizar casos com sinais e sintomas, confirmar o diagnóstico e antecipar o tratamento nesses casos. Arn dos Santos observou que não há impedimento para o SUS pagar a mamografia em mulheres jovens, para confirmar o diagnóstico, e afirmou que o SUS efetivamente vem pagando o exame nesses casos.

Mudança na lei - A deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC) acredita que, se não há certeza sobre os benefícios da mamografia para mulheres entre 40 e 49 anos, a lei deve ser mudada. "Ainda não estou convicta de que fazer a mamografia de rastreamento pode causar mais danos à saúde que benefícios", disse. A deputada Lídice da Mata (PSB-BA), que mediou o debate, defendeu que a lei atual seja cumprida e rechaçou a ideia de que há leis que "pegam" e são cumpridas e outras não. Ela disse que há choque de opiniões e dados sobre a possibilidade de rastreamento sem risco à mulher e se mostrou preocupada com a dissociação em que o é legislação e o que é recomendado pelos especialistas de saúde.  

Já a presidente do Instituto Lado a Lado, Marlene Oliveira, disse que mulheres com predisposição genética deveriam ter acesso a um teste genético para ajudar a ter um diagnóstico precoce.

Outubro Rosa - No Brasil, o Instituto Nacional do Câncer (Inca) estima que, a cada ano, 60 mil brasileiras são diagnosticadas com câncer de mama, daí a importância de exames periódicos para identificação precoce da doença. O câncer de mama é segundo tipo que mais acomete as brasileiras, representando em torno de 29% de todos os cânceres que afetam o sexo feminino. O câncer de mama só fica atrás do câncer de pele não melanoma.

O debate integra a programação do Outubro Rosa, promovido pela Câmara dos Deputados e Senado Federal, em promoção conjunta da Secretaria da Mulher (SecMulher) – por meio da Procuradoria da Mulher e do Grupo de Trabalho (GT) de Saúde; das Comissões dos Direitos da Mulher (CMulher), de Seguridade Social e Família (CSSF) e Comissão Especial de Combate ao Câncer no Brasil; e também das Frentes Parlamentares Mista da Saúde, e Mista da Luta contra o Câncer, além do GT Desafios da Oncologia no Brasil (pela CSSF), além do Senado Federal, por meio da Procuradoria Especial da Mulher e da Liga do Bem.

 

Acesse a íntegra da audiência pública e também a programação do Outubro Rosa

Fonte: Agência Câmara de Notícias