Congresso lembra Agosto Lilás e comemora 16 anos da Lei Maria da Penha
Foto: Alan Rones - Câmara dos Deputados
Parlamentares e autoridades durante cerimônia de lançamento da campanha Agosto Lilás
A cada sete horas uma mulher é assassinada no Brasil somente por ser mulher. O feminicídio foi tipificado como crime em 2015 e é, muitas vezes, o desfecho de uma violência que vem crescendo dentro de casa. Para combater preventivamente esse tipo de crime, e para que ela não resulte em mortes, foi criada há 16 anos a Lei Maria da Penha.
As procuradorias da Mulher da Câmara e do Senado fizeram uma solenidade para marcar o Agosto Lilás, mês de combate à violência contra a mulher, e lembrar esses 16 anos da lei de proteção às mulheres em situação de violência doméstica.
A própria Maria da Penha, mulher vítima de violência que deu nome à lei, participou do evento de forma virtual e pediu que o Brasil siga as recomendações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, entre elas a que prevê a educação para a não violência para as próximas gerações. “As recomendações preconizam que o Estado brasileiro deve incluir em seus planos pedagógicos disciplinas destinadas à compreensão da importância sobre o respeito à mulher e aos seus direitos e ao manejo dos conflitos intrafamiliares. Acreditamos que a mudança de cultura precisa passar impreterivelmente pela educação”, disse.
A procuradora da Mulher na Câmara, deputada Tereza Nelma (PSD-AL), destacou que a Secretaria da Mulher e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estão trabalhando desde 2021 num acordo de cooperação técnica para garantir um fluxo das denúncias de violência contra a mulher: “A Procuradoria da Mulher possui atribuição regimental de receber, examinar e encaminhar denúncias de violência contra as mulheres brasileiras no País e no exterior. Já foram encaminhadas cerca de 200 denúncias para os órgãos do Executivo e do Judiciário exigindo respostas e soluções para os diversos casos", informou.
Solenidade - A solenidade de lançamento da campanha Agosto Lilás contou com acendimento das luzes do Congresso Nacional. A campanha é realizada anualmente no mês de agosto, em comemoração ao aniversário da Lei Maria da Penha, e visa reforçar o debate sobre o enfrentamento da violência contra as mulheres. Este ano, o tema é "Um instrumento de luta por uma vida livre de violência". A Orquestra Sinfônica das Forças Armadas Brasileiras (FAB) fez uma apresentação especial para os convidados e convidadas.
A campanha é uma iniciativa da Secretaria da Mulher, Procuradoria da Mulher e Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados e da Procuradoria Especial da Mulher e liderança da bancada feminina do Senado Federal.
A procuradora especial da Mulher do Senado Federal, senadora Leila Barros (PDT-DF), pediu um minuto de silêncio em memória às mulheres vítimas de violência. "Em 2021, uma mulher foi morta a cada sete horas, em média, vítima de feminicídio em nosso País, segundo dados oficiais. Como se vê, só a lei não basta. É preciso um trabalho cotidiano para promover a mudança cultural necessária a pôr fim a essa triste realidade", afirmou.
Rede básica - Tereza Nelma também salientou a importância das delegacias especializadas e das casas-abrigo para mulheres: "A eficácia da lei depende da plena execução por parte de todos os órgãos envolvidos no processo. Mulher é prioridade quando?", provocou.
Já a líder da bancada feminina no Senado, senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), defendeu mais recursos orçamentários para as políticas em defesa das mulheres: "O Orçamento não tem que ser fictício, ele tem que existir. É por isso que é fundamental que todas nós, enquanto mulheres, possamos exigir e cobrar do Poder Executivo brasileiro e de todos os estados o cumprimento daquilo que é direcionado para as mulheres, sem contingenciar ou remanejar, para que aquilo que esteja na lei possa ser uma realidade praticada todos os dias na sociedade", disse Eliziane.
Judiciário - A ouvidora do Conselho Nacional da Justiça (CNJ), Tânia Reckziegel, confirmou a importância desse reforço sob o ponto de vista do Judiciário: "Quando os processos chegam ao Judiciário é porque falhamos; a rede falhou; a sociedade falhou, porque, na grande maioria dos casos, a mulher morreu vítima de feminicídio", lamentou.
Para a representante do Consórcio Maria da Penha, a antropóloga e professora da UnB Lia Machado, apesar de grandes desafios ainda a serem superados, a Lei Maria da Penha é motivo, sim, de comemoração, uma vez que como lei preventiva conseguiu mudar a opinião popular sobre violência doméstica. Ela defendeu o fim dos estereótipos de gênero e lembrou que o direito à saúde e à felicidade é de todos os membros da família.
Representante da ONU Mulheres Brasil, Anastasia Divinskaya manifestou o empenho da organização em continuar o trabalho no Brasil para garantir os direitos humanos a todas as mulheres, desde a infância. Por fim, a coordenadora de parcerias do Instituto Avon, Renata Rodovalho, apresentou dados de estudo sobre os efeitos das delegacias da mulheres para redução dos feminicídios. O trabalho foi conduzido por pesquisadores do Insper, FGV, UFRJ e Universidade de Toronto. "Ainda é preciso lidar com a questão racial quando a gente fala de enfrentamento à violência contra a mulher no Brasil. Mulheres pretas e pardas só se beneficiaram da redução de letalidade por mortes violentas naqueles municípios onde, além das delegacias das mulheres, encontrava-se um cenário de alta escolaridade, infraestrutura urbana, transporte e comunicação", observou.
Lei Maria da Penha - A Lei 11.340, de 2006 ganhou o nome de Maria da Penha em homenagem à farmacêutica bioquímica que ficou paraplégica devido a agressões sofridas em 1983 do então marido, o economista e professor universitário colombiano Marco Antonio Heredia Viveros. Ele primeiramente atirou na esposa, simulando um assalto. Depois tentou eletrocutá-la enquanto ela tomava banho. Somente em outubro de 2002, a seis meses do prazo de prescrição do crime, Viveros foi condenado e preso, mas cumpriu apenas dois anos (um terço) da pena e acabou solto em 2004.
O episódio chegou formalmente ao conhecimento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), que condenou o Brasil por não ter adotado providências necessárias a cessar a violência contra Maria da Penha e punir seu agressor. A comissão instou o país a mudar sua legislação e suas práticas relacionadas ao combate à violência contra a mulher.
Hoje, a Lei Maria da Penha é considerada legislação de referência em todo o mundo no combate à violência contra a mulher. Entre outros aspectos, a lei tipificou a violência doméstica como uma das formas de violação aos direitos humanos e determinou que os crimes relacionados passassem a ser julgados em varas especializadas, com competências criminal e cível. Anteriormente a violência doméstica estava sendo julgada nos juizados especiais criminais (que decidem sobre crimes de menor potencial ofensivo), também conhecidos como varas especiais de pequenas causas, mas o rito acelerado acabava levando à impunidade. Os agressores eram no mais das vezes condenados a pagar por seus crimes com penas alternativas, entre as quais a distribuição de cestas básicas a entidades voltadas a pessoas carentes
Apesar da legislação avançada, o Brasil continua exibindo números assustadores no campo das relações de gênero. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022 apontou leve redução no número de feminicídios em 2021 na comparação com 2020. Mesmo assim, 1.341 mulheres foram assassinadas no ano passado como forma de supressão do seu direito à independência, à autonomia, à liberdade e uma identidade própria. Além disso, o documento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta o crescimento de outras formas de violência contra a mulher, como a psicológica.
Assista aqui à íntegra da cerimônia!
Confira também reportagem da TV Senado!
Com informações da Agência Câmara de Notícias e Senado Notícias