Nota Pública
O Ministro da Segurança Pública de um governo que patrocina uma intervenção federal no estado do Rio de Janeiro denuncia a participação de agentes do Estado, inclusive agentes políticos, na preparação do crime, insinuando que as autoridades policiais locais teriam dificuldades para levar as investigações a bom termo, e coloca a Polícia Federal à disposição para com elas colaborar, mas o faz em termos informais, que absolutamente não indicam qualquer linha de ação consistente. O Gabinete da Intervenção Federal, por sua vez, minimizando as palavras do Ministro, assegura que “as investigações já estão sendo conduzidas sob orientação federal” e que “a integração dos órgãos de segurança pública do estado com a PF já está consolidada”.
Esta Comissão Externa tem conduzido seus trabalhos com transparência e responsabilidade, consciente de que seu papel é, em último termo, o de zelar pelo Estado Democrático de Direito, evitando qualquer atitude que possa ser mal interpretada como de autopromoção individual ou coletiva. A Comissão não subestima, ademais, a dificuldade envolvida no deslinde de uma operação criminosa realizada com alto grau de sofisticação e a necessidade de guardar sigilo sobre elementos essenciais do caso para preservar o bom andamento das investigações. Vemos, contudo, com extrema preocupação os sucessivos vazamentos de supostas linhas de investigação e de detalhes dos trabalhos policiais à imprensa, nunca explicados pela Chefia da Polícia Civil nem pelo Gabinete da Intervenção Federal, sequer quando formalmente interpelados por esta Comissão.
Ora, seria até irresponsável de nossa parte não nos manifestarmos incisivamente quando as autoridades em condições de esclarecer a população sobre os rumos da investigação não o fazem adequadamente. Depois de cinco meses de ocorridos os homicídios, não é razoável que não se tenha qualquer informação oficial sobre o trabalho até aqui realizado. Se a Polícia do Estado do Rio de Janeiro não responde aos pedidos de esclarecimento de uma Comissão Externa da Câmara dos Deputados, formalmente constituída para acompanhar as investigações, nem sequer a esclarece acerca dos motivos do silêncio, como pode a sociedade confiar em que um trabalho investigativo sério está sendo realizado?
Esta Comissão Externa espera que as autoridades policiais atualmente encarregadas do caso sanem rapidamente essa falha, dando resposta adequada às questões por ela apresentadas e, assim, tranquilizando a sociedade a respeito do andamento das investigações. Nessa expectativa, e com o intuito de evitar qualquer embaraço, por mínimo que seja, às investigações em curso, a Comissão decidiu adiar para o mês de setembro a apreciação formal de requerimento, já protocolado, que objetiva “suscitar junto ao Superior Tribunal de Justiça o Incidente de Deslocamento de Competência do inquérito instaurado para elucidar as causas, mandantes, executores e todos os responsáveis pela execução sumária” de Marielle Franco e de Anderson Gomes.
Registre-se que o Incidente de Deslocamento de Competência distingue-se fortemente da sugestão do Ministro da Segurança Pública. Não se trata de uma vaga e difusa sugestão de apoio federal às investigações, mas de um procedimento claro e preciso, embora complexo, previsto na Constituição Federal. Sua eventual adoção, aliás, não implicará em perda do trabalho já realizado pela Polícia Civil, que será integralmente aproveitado na nova instância de investigação. Requerer que Incidente de Deslocamento de Competência seja implementado constitui, por todas essas razões, uma possibilidade em aberto nesta Comissão Externa, que deliberará sobre o tema em setembro, tendo em conta, particularmente, a qualidade das informações obtidas junto às autoridades policiais atualmente encarregadas da investigação.
Brasília, 16 de agosto de 2018.
Deputado JEAN WYLLYS Deputado GLAUBER BRAGA
Coordenador Relator