Polícia Federal admite dificuldade de comprovar crime em “golpe do boleto”
Antonio Augusto / Câmara dos Deputados
Otavio Leite defende mudanças no Código Penal para punir práticas como o "golpe do boleto".
A Polícia Federal (PF) abriu inquérito para investigar associações acusadas de aplicar o chamado “golpe do boleto”, quando entidades fantasmas enviam, pela internet, a cobrança de taxas e tarifas, na verdade inexistentes, a microempreendedores individuais (MEI). A prática gera quase mil reclamações por mês no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
O representante da PF, José Augusto Campos, afirmou, porém, que é difícil comprovar a existência de estelionato porque as empresas investigadas alegam que prestam ou vão prestar serviço aos empreendedores. “É complicado porque fica entre o legal e o ilegal. Dentro do boleto, as companhias dizem que a cobrança não é obrigatória, mas de uma maneira bem dissimulada. Parece algo oficial, muitas empresas utilizam nomes parecidos com entidades que são respeitáveis”, declarou Campos.
As medidas para combater o “golpe do boleto” foram tema de audiência pública na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (13). Nesse golpe, os boletos de cobrança são direcionados aos novos empreendedores como se fossem tributos obrigatórios e de órgãos oficiais – os destinatários são informados que, se não pagarem as taxas, estarão sujeitos a penalidades. Muitas faturas chegam a custar R$ 300. As entidades que enviam as mensagens mudam de nome em minutos, o que dificulta a investigação.
A gerente da Unidade de Políticas Públicas do Sebrae, Ines Schwingel, citou algumas associações, segundo ela, que realizam o golpe, como a Associação Comercial Empresarial do Brasil (ACEB) e a Associação Comercial do Estado de São Paulo (Acesp). Ela também destacou ainda um falso portal para formalização do microempreendedor que aparece facilmente em ferramentas de busca. Ines salientou que o site oficial é o Portal do Empreendedor, do governo federal. A taxa única a ser paga pelos microempreendedores é a mensalidade de R$ 33,90 (INSS), com alguns pequenos acréscimos por meio de carnê emitido por meio do portal.
“Quando o novo empreendedor envia seus dados cadastrais pela internet, esses dados são distribuídos em várias bases de dados de órgãos públicos, incluindo a Receita Federal e juntas comerciais. Entre quatro e sete dias depois, ele recebe boleto de pagamento de uma dessas associações fraudulentas, que têm acesso a esses dados. A PF está a caminho de investigar como elas conseguem as informações”, comentou.
O representante da Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, José Constantino de Bastos Júnior, informou que existe a perspectiva de que, em 2014, comece a ser emitido um boleto anual, com as doze parcelas, que seria a única obrigação do microempreendedor para sua regularidade.
Ações
Desde junho de 2009, mais de 3,5 milhões de novos empreendedores fizeram o cadastro como MEI e podem ser prejudicados pelo golpe. A Secretaria da Micro e Pequena Empresa pediu a abertura do inquérito policial, mas também ressaltou algumas ações que vão ajudar a coibir o problema. Em abril, por exemplo, circular aprovada pelo Banco Central determinou que as empresas estão proibidas de enviar boletos bancários sem autorização do cliente, os chamados boletos de proposta.
O presidente da comissão, deputado Otavio Leite (PSDB-RJ), disse que vai pedir informações ao Comitê Gestor da Informática (CGI) para saber por que domínios são concedidos para instituições que se intitulam “quase como que representantes oficiais do governo”.
Alterações na lei
Segundo o parlamentar, o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) aparentemente tipifica o “golpe do boleto” como infração, o que precisa ser mudado. “O código é de 1940; hoje estamos na era virtual, precisamos compreender a nova realidade. Se necessário, devemos estabelecer mais rigor na lei”, disse.
O representante da Polícia Federal concordou que, se existisse uma determinação mais explicita proibindo a ação das associações, seria mais fácil de existir a punição. “A policia é restrita à lei. Se existir um dispositivo especifico para trabalharmos, iremos atrás, porém com a legislação existente fica difícil”, sustentou.
Colaboração – Caroline Pompeu