Audiência pública sobre fonte de custeio do desporto de surdos dá novos rumos ao relatório da proposta

Parecer do vice-presidente da Cespo, deputado Julio Cesar Ribeiro, deverá adequar percentual sobre o valor total da arrecadação de loterias para repasse à CBDS
13/09/2021 20h30

Ascom Cespo

Audiência pública sobre fonte de custeio do desporto de surdos dá novos rumos ao relatório da proposta

Deputado Julio Cesar e Diego Tonietti: sugestões para adequar o relatório visando ao desenvolvimento do desporto de surdos

O parecer do PL 150/2021, que trata sobre o repasse de recursos de loterias e concursos prognósticos para a Confederação Brasileira de Desporto de Surdos (CBDS), tomou novo rumo após a audiência pública realizada na tarde desta segunda-feira, 13, pela Comissão do Esporte da Câmara. O relatório é do primeiro vice-presidente da Cespo, deputado federal Julio Cesar Ribeiro (Republicanos-DF), que foi favorável à aprovação da matéria. Porém, como houve pedidos de vista feitos em reuniões deliberativas do colegiado no mês de agosto, o parlamentar solicitou, via requerimento, que fosse realizada audiência com a participação de atletas, representantes do governo e de entidades ligadas ao esporte no país para levantar sugestões sobre outras possíveis fontes de custeio para o desporto de surdos.

 

O projeto propõe alterar dispositivos da Lei 13756/18 para repassar à CBDS 3% de recursos via loterias ou concursos de prognósticos. A verba deve ser aplicada exclusivamente em programas e projetos de fomento, desenvolvimento e manutenção do desporto, formação, recursos humanos, preparação técnica, manutenção, locomoção de atletas em participação de eventos desportivos, e no custeio de despesas administrativas. Julio Cesar disse que iria considerar a sugestão do chefe de gabinete da Secretaria Especial do Esporte, Diego Tonietti. Segundo ele, 30% dos recursos da Caixa Econômica Federal via Lei das Loterias ficam retidos por conta do mecanismo DRU, ou Desvinculação de Receitas da União, que permite ao governo federal usar o percentual de tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas. A ideia apresentada por Tonietti na audiência foi inserir no relatório um dispositivo para que não haja a cobrança desse percentual de receita por parte da União. Julio Cesar informou que, além disso, deverá trabalhar em cima de um novo percentual - de 0,01% - sobre o total da arrecadação das loterias para o repasse à CBDS.

 

“Para o financiamento de políticas públicas voltadas ao desporto e paradesporto no Brasil, a Secretaria Especial do Esporte conta com duas fontes, a 100, gerada por meio de impostos, e a 118, que conta com o repasse das loterias. No ano passado, foram R$ 62 milhões provenientes da fonte 100, e R$ 217 milhões da fonte 118, e desse recurso, R$ 145 milhões foram para garantir o custeio do Bolsa Atleta, voltado aos esportistas de alto rendimento. Uma alteração nesse orçamento poderia até comprometer o mais importante programa de patrocínio direto do governo aos atletas e paratletas. Também não consideramos viável retirar percentual do valor dos prêmios das loterias, pois estes são o principal atrativo para os apostadores”, destacou Diego Tonietti.

 

A audiência pública contou com a participação da presidente da Confederação Brasileira de Desportos de Surdos, Diana Kyosen. Em sua exposição, Diana considerou que a deficiência de políticas públicas e de fontes de custeio é vista nessa comunidade esportiva como uma falta de reconhecimento do governo brasileiro aos feitos dos atletas. Os surdos não fazem parte das categorias de olímpicos ou paralímpicos. As competições que disputam são idênticas às de esportistas sem deficiência, alterando as sinalizações auditivas para visuais. 

 

“Não há segurança para o desenvolvimento de iniciativas que elevem a participação dos surdoatletas a patamares maiores nas competições disputadas pela falta de apoio principalmente do governo federal. Nossa Constituição prevê a igualdade entre os cidadãos brasileiros, mas percebemos que há uma exclusão dos surdos dentro do desporto nacional. Essas pessoas tem que arcar com viagens, uniformes, hospedagens e outras despesas para poderem competir, ou ficam à mercê de parcerias. Não podem ser tratadas como se estivessem à margem do mundo esportivo. A falta de visibilidade dificulta a valorização dos Jogos Surdolímpicos, por exemplo, e a obtenção de incentivos financeiros de empresas privadas, o que leva os esportistas até a desistirem. Para promover essa equidade, é necessário investimento, e os surdoatletas tem direito a isso”, declarou Diana Kyosen.

 

José Agtônio Guedes, secretário nacional de Paradesporto, disse que as demandas dos surdoaletas são justas e genuínas, assim como de, pelo menos, outras 18 organizações que atuam junto a esportistas portadores de algum tipo de deficiência que não possuem qualquer suporte via governo federal.

 

“O nosso desafio é promover essa equidade por meio de recursos e politicas públicas independentemente do tipo de deficiência do atleta e da modalidade que ele pratica. Dessa forma, considero oportuno sugerir a formação de um grupo de trabalho no âmbito do parlamento que atue para buscar soluções quanto às fontes de custeio que possam contemplar todos os segmentos e promover essa igualdade que tanto buscamos no paradesporto brasileiro”, pontuou o secretário.

 

Já Marco La Porta, vice-presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), disse que o debate deve considerar a busca por uma solução que promova a equidade e não a divisão dos recursos para o esporte. Ele também chamou a atenção para a importância da prática esportiva visando à melhora da saúde, educação e inclusão social, além de destacar as campanhas dos brasileiros em Tokyo 2020 tanto nos jogos Olímpicos como nos Paralímpicos.

 

Luciano Cabral, presidente da Confederação Brasileira do Desporto Universitário, concordou com Diana Kyosen sobre as dificuldades para o planejamento de ações para promover o desporto de surdos sem um incentivo financeiro permanente. Contudo, ele disse que um desconto no valor do repasse feito a entidades já contempladas por recursos públicos pode gerar sérios transtornos ao orçamento dessas organizações, que ele considera limitado.

 

“É claro que ficar na dependência da execução de convênios para o desenvolvimento do desporto de surdos é um problema que precisa ser resolvido, mas retirar daqueles que tanto lutaram para conquistar e manter esse suporte financeiro não é a solução”, avaliou.

 

Participantes da audiência, as atletas surdas Suzana Alves, do futsal, e Deborah Dias, do handebol, mostraram bastante preocupação com a falta de apoio por parte do governo. Suzana informou que desde o ano de 2016 não recebe os recursos via Bolsa Atleta, e clamou pela atenção das autoridades quanto ao desporto de surdos e às modalidades praticadas por mulheres. Segundo ela, boa parte dos surdoatletas mal tem local apropriado para o treinamento. Já Deborah disse que deveria haver investimentos a partir das categorias de base, e a valorização dos profissionais que trabalham na preparação dos esportistas com deficiência auditiva, que na sua maioria é de voluntários.

 

“Com as considerações feitas na audiência pública de hoje acredito que avançamos bastante para um relatório que chegue a um denominador comum”, afirmou o deputado Julio Cesar Ribeiro.

 

O PL 150/2021 é de autoria do deputado federal Marcelo Aro (PP-MG). A Confederação Brasileira de Desporto de Surdos é a associação máxima do desporto surdo no Brasil, filiada ao International Committee of Sports for the Deaf, ao PanAmerican Deaf Sports Organization e à Confederación Sudamericana Deportiva de Sordos. Tem 36 anos de existência e 20 federações nos estados, 120 associações em diferentes cidades no país, e cerca de 5 mil atletas.

 

*Vídeo completo da audiência no link - cd.leg.br/8YwtZX

 

*Por ascom Cespo - Patrícia Fahlbusch, DRT 051791