STF suspende processos judiciais que impedem demarcação de terras indígenas e parecer da AGU; presidente da CDHM enviou sugestões para o ministro Fachin
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, determinou a suspensão nacional de processos judiciais, principalmente ações possessórias e anulatórias de processos demarcação de terras indígenas, bem como os recursos vinculados a essas ações, “sem prejuízo dos direitos territoriais dos povos indígenas”. A decisão de Fachin é baseada no artigo 1.035, § 5º, do Código de Processo Civil. A decisão foi publicada nesta quarta-feira (6).
Na quinta-feira (7), Fachin suspendeu ainda o parecer da Advocacia-Geral da União que orientava, até então, decisões envolvendo terras indígenas.
06/05/2020 15h30
O ministro do STF ressalta que a medida vale até “a ocorrência do término da pandemia da COVID-19 ou do julgamento final da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 1.017.365 (Tema 1031), o que ocorrer por último, salvo ulterior decisão em sentido diverso”.
Já nesta quinta-feira (7), o ministro Fachin concedeu liminar suspendendo todos os efeitos do Parecer n.º 001/2017/GAB/CGU/AGU até o final julgamento de mérito do RE 1.017.365 (Tema 1031), que já foi submetido à sistemática da repercussão geral pelo STF .
No texto da liminar, Fachin determina à FUNAI que se abstenha de rever todo e qualquer procedimento administrativo de demarcação de terra indígena, com base no Parecer n.º 001/2017/GAB/CGU/AGU até que seja julgado o Tema 1031 . De imediato determino a inclusão em plenário virtual por votação assíncrona para exame do referendo da liminar" . A decisão foi enviada para a Procuradoria-Geral da República, que tem prazo de cinco dias para se manifestar.
AGU
O parecer da AGU, de 2017, prevê 19 requisitos para análise de procedimentos demarcatórios. Entre eles, o que proíbe ampliar a demarcação, o de que deve haver participação dos municípios e estados em todas as fases do processo administrativo e o que criou um marco temporal no sentido de que as populações indígenas que não estavam sobre suas terras durante a Constituição de 88 não têm direito à demarcação.
CDHM
No dia 8 de abril, o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), Helder Salomão (PT/ES), enviou ofício ao ministro Fachin informando sobre o agravamento das violações aos direitos fundamentais indígenas. No mesmo documento, o parlamentar endossava os pedidos feitos pela Comunidade Indígena Xokleng da Terra Indígena Ibirama-La Klaño e por diversas entidades atuantes em direitos humanos de suspender uma decisão da Advocacia-Geral da União (AGU) usada para decidir questões ligadas a terras indígenas. Os indígenas Xokleng, no interior de Santa Catarina, tiveram a demarcação de suas terras suspensa a partir da interpretação do parecer da AGU. Decisão logo revertida por Fachin, como um caso isolado.
2019
Em novembro do ano passado, o presidente da CDHM já havia enviado para Edson Fachin um relato de diversas denúncias de violações de direitos humanos sobre conflitos fundiários em terras indígenas. Entre eles, a depredação dos territórios por desmatamento, a contaminação por agrotóxicos, atividades ilegais de mineração, abertura de estradas e a demora do governo federal para finalizar processos de demarcação de terras e a lentidão de processos judiciais que têm como origem a disputa por essas terras.
“Pedimos ao STF, além da suspensão imediata do parecer da AGU, a realização de audiências públicas sobre o tema com ampla participação da sociedade civil, e a inclusão na pauta do plenário do recurso extraordinário, o que vai trazer segurança jurídica e amparo aos indígenas”, destacou Salomão.
Terras indígenas
De acordo com relatório do Conselho Indigenista Missionário, a maior violência contra os povos indígenas é a destruição de seus territórios. Apesar de 13% do território nacional ter sido demarcado como terra indígena, aproximadamente 85% dos 561 territórios sofrem algum tipo de invasão.
Segundo a Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada, a mineração ameaça 108 milhões de hectares de áreas protegidas e reservas indígenas no Brasil. O intenso processo de desmatamento e as invasões criminosas na Amazônia Legal, onde estão localizadas 98% das terras indígenas, têm sido estimulados e legitimados pela impunidade, apoiada pela redução significativa da fiscalização ambiental e pela intenção do governo federal de abrir estes territórios para a exploração de todos os seus recursos naturais.
Só em 2018, foram registrados 109 casos de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio. Nos nove primeiros meses de 2019, o Cimi já havia contabilizado 160 casos. Entre 2009 e 2018, foram contabilizados 922 assassinatos de indígenas no Brasil, quatro vezes mais do que os 197 homicídios de índios ocorridos nos 23 anos anteriores (1985 a 2008). No entanto, dos mais de 300 assassinatos que a Comissão Pastoral da Terra registrou desde 2009 na Amazônia por conflitos fundiários, apenas 14 foram levados a julgamento.
O número de demarcações de terras diminuiu nos últimos anos. Nenhuma terra indígena foi demarcada em 2017. Em 2018, a única demarcação, da terra indígena Baía do Guató, foi suspensa pela Justiça. Em 2019, nenhuma terra foi identificada, declarada ou homologada.
Pedro Calvi / CDHM
Com informações do CIMI e STF