Parlamentares e sociedade civil recebem relator especial da ONU sobre o direito à liberdade de reunião e associação
O relator especial da ONU sobre o direito à liberdade de reunião e associação pacífica, Clément Nyaletsossi Voule, participou de reunião na Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (30/3).
Seu objetivo no Brasil é de receber informações sobre uso da força durante protestos organizados por movimentos sociais e povos indígenas, campanha política e liberdade de associação antes das eleições, o direito de participação nos assuntos públicos e a situação dos sindicatos e grupos vulneráveis no Brasil no exercício de seu direito à liberdade de associação.
Participaram do encontro integrantes da Mesa da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, parlamentares integrantes da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e dos Direitos Humanos com Participação Popular e da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Organizações da Sociedade Civil, assim como representantes da sociedade civil.
Carlos Veras (PT/PE), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, entregou ao emissário das Nações Unidas relatório, produzido no âmbito do Observatório da Revisão Periódica Universal, que avalia o cumprimento das recomendações recebidas sobre direito à manifestação e à organização.
A vice-presidenta da Comissão, Érika Kokay (PT/DF), entregou a Voule o relatório produzido do âmbito da iniciativa a respeito da participação política das mulheres. “A maior parte das recomendações não foi cumprida”, afirmou. “É um diagnóstico muito triste. Quando a democracia é atacada, os direitos humanos são atingidos. E quando os direitos humanos são atingidos, a democracia é atacada”, comparou.
Sâmia Bonfim (PSOL/SP), Líder do PSOL na Câmara dos Deputados, entregou ao relator dossiê sobre violência política contra parlamentares do partido. Ela relembrou o assassinato de Marielle Franco como emblemático na perseguição de defensoras de direitos humanos, mulheres, negras e pessoas LGBTQUIA+ na política. Fernanda Melchionna (PSOL/RS) também lembrou de Marielle Franco e pontuou os ataques não só a políticos mas também a jornalistas.
Eleições
Veras também externou preocupação com as ameaças às próximas eleições-gerais: “Alguns setores podem querer negar o resultado das urnas, seja ele qual for; nos preocupamos também com as fakes news e com a violência política, principalmente, contra mulheres, pessoas negras e população LGBTQIA+. Queremos eleições livres e democráticas no Brasil”.
O deputado Airton Faleiro (PT/PA) manifestou preocupação com o incentivo ao amplo armamento, que pode inclusive ser utilizado como instrumento para impedir eleições ou frustrar seu resultado. Abordou, ainda, preocupação com ataques aos territórios de comunidades tradicionais.
Criminalização dos movimentos sociais
Alexandre Conceição, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), demonstrou preocupação com os despejos no Brasil e reforçou que está em um curso, no Brasil, um processo aprofundado de criminalização dos movimentos sociais. “São propostas que nos preocupam, mas não nos acovardam". Leonardo Santana, da Rede Justiça Criminal, expressou preocupação com o avanço de nova lei antiterrorismo e com a proposta recém-apresentada de excludente de ilicitude.
Participação popular
O deputado Afonso Florence (PT/BA), da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Organizações da Sociedade Civil, criticou o decreto expedido em 2019 que restringiu os conselhos de participação popular.
Luise Gonçalves Villares, da Cáritas do Brasil, também alertou para a redução da participação popular na formulação e execução das políticas públicas com o esvaziamento dos conselhos sociais. “É fundamental que esses conselhos funcionem da sua forma instituída e que não tenham mais ameaças às instituições, que são testadas a todo o momento”, afirmou.
Representando o Grupo Esquel, Silvio Rocha Santana observou que a legislação de proteção aos direitos humanos e à democracia está sob ataques diretos e imediatos. “Não é apenas uma questão institucional, afeta toda a sociedade. Afetam os corações e mentes dos cidadãos do nosso país que ficam com medo de atuar nas decisões públicas”, complementou.
Sindicalização
Jefferson Rodrigo do Nascimento, da Oxfam do Brasil, por sua vez, ressaltou o impacto da reforma trabalhista sobre os sindicatos rurais. “O setor laboral de trabalhadoras e trabalhadores assalariados rurais está entre os mais pobres do Brasil, com as trabalhadoras rurais recebendo 16% a menos do que trabalhadores homens. Organizações parceiras como a CONTAR e a ADERE têm destacado diversas tentativas de desarticulações de sindicatos rurais, comprometendo inclusive sua capacidade de fiscalização da prática de trabalho análogo à escravidão”.
Perseguição a opositores
Rudrigo Rafael Souza e Silva, do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), abordou a repressão a manifestações, como no dia 29 de maio de 2021, quando dois trabalhadores ficaram sem visão após violência contra ato público, no Recife.
Abordou ainda a vigilância efetuada pelo governo a movimentos sociais, dando como exemplo dossiê produzido pelo Ministério da Justiça, à época sob comando de André Mendonça.
A deputada Vivi Reis (Psol/PA), vice-presidenta da CDHM, reforçou que, na sua visão, a estrutura do governo federal tem sido usada para espionar e perseguir opositores e denunciou violações de direitos humanos de ambientalistas, lideranças indígenas e ativistas dos direitos humanos. “Pessoas são assassinadas e não há resposta nenhuma”, disse.
Resultados
Após ouvir os participantes, o relator da ONU disse que está em missão oficial no Brasil ouvindo autoridades e representantes da sociedade civil para analisar o cumprimento dos direitos fundamentais à liberdade de reunião e à manifestação e, que no dia 8 de abril, apresentará uma análise preliminar da situação brasileira.
Falaram também na reunião Laís de Figueirêdo Lopes, da OAB/SP e Igor Ribeiro Ferrer, da Plataforma MROSC.
Mariana Sacramento