Orkut traz dicas para suicidas
CorreioWeb - 23/04/2006
Ullisses Campbell
Do Correio Braziliense
11h33 - Depois de estimularem a pedofilia, vender drogas na internet e exaltar racismo e homofobia, usuários do maior site de relacionamento no Brasil estão ensinando as pessoas a praticar suicídio. Mais de 30 comunidades do Orkut revelam como o internauta pode tirar a própria vida. A situação é tão grave que a Polícia Civil de 12 estados, inclusive a do Distrito Federal, tenta chegar até os donos dos computadores que estão estimulando o suicídio.
Como o Orkut virou território para práticas criminosas, a Justiça de São Paulo quebrou, há duas semanas, o sigilo de oito comunidades à pedido do Ministério Público. Mas a empresa que administra a rede de relacionamentos, a Google, que tem sede nos Estados Unidos, ainda não forneceu os dados das pessoas que cometeram crimes de pedofilia e racismo na rede de relacionamentos. "Os representantes da Google no Brasil podem ser presos por desobediência, caso não colaborem com a investigação do Ministério Público", avisa o procurador federal Sérgio Suiama.
O Orkut é uma comunidade virtual com 12 milhões de pessoas, sendo que 71% delas são brasileiras. Para fazer parte desse universo, é preciso receber um convite de um amigo que já possui um perfil publicado na rede. Cada usuário tem uma home page, onde recebe recados, posta fotos e revela suas preferências, do sexo à literatura. Os internautas podem ainda criar comunidades e chamar seus conhecidos para fazer parte dela. É justamente aí que mora o perigo.
Numa das comunidades que ensinam as pessoas a praticarem o suicídio, o criador do fórum diz que já se matou três vezes e a cada vez que ressuscita reencarna numa vida melhor. "Ao deixar um bilhete de despedida, não diga que fui eu quem induzi você a cometer o suicídio. Lembre que o ato é de sua inteira responsabilidade", ressalta L.M. Lopes, que assina a criação da comunidade que reúne mais de mil membros. No mesmo fórum de discussão, há uma adolescente de 17 anos que reclama do fato de já ter tentado se matar três vezes tomando remédios, ao seguir orientação da comunidade. "Não agüento mais fazer lavagem estomacal", lamenta.
Preconceitos
Como é possível criar as comunidades e se manter sob o mais absoluto sigilo, os internautas mal intencionados fazem a festa no Orkut. Há uma chamada "Eu odeio idoso". Nela, os participantes relatam que se irritam quando tem velhinho na fila do banco e quando os jovens têm de se levantar para dar o lugar aos idosos no asento do ônibus. "Por que os velhos adoram passear no horário de pico?", pergunta Gabriel, um dos participantes da comunidade.
Seis comunidades, que juntas tem 12 mil membros, ressaltam que "fazer racha de carros é muito bom". Os integrantes contam que "roubam" o carro dos pais durante a madrugada. Em outra comunidade, identificada na semana passada pelo Ministério Público Federal, jovens da classe média de São Paulo criaram um grupo de discussão para planejar como executar moradores de ruas.
Em nota oficial, a Google Brasil informa que os representantes norte-americanos da empresa estarão no Brasil nesta semana para se reunir com o Ministério Público Federal, em Brasília. A empresa disse ainda que enfrenta dificuldades para encontrar os autores das páginas do Orkut que implicam em prática de crime. A Google relata que está desenvolvendo filtros para detectar e apagar automaticamente as comunidades em questão.
Perigo
Quando se fala em crimes na internet, o maior desafio das autoridades brasileiras é combater a pedofilia. A organização não-governamental Safernet, sediada na Bahia, já identificou e denunciou à Polícia Federal mais de 5 mil pessoas que estavam distribuindo imagens contendo cenas de sexo explícito envolvendo crianças. Uma das comunidades ainda ativa no Orkut diz que "sexo entre crianças é saudável".
Delegado da Polícia Federal, Adalto de Almeida Martins é especialista em combate aos crimes virtuais. Ele diz que o próprio conceito da internet dificulta a identificação dos criminosos. "Muitos sites são escritos em português e acessados apenas por brasileiros, mas ficavam sediados no exterior, longe do alcance da Justiça", explica. A PF também enfrenta problemas para solucionar crimes cibernéticos cometidos no Brasil por falta de pessoal qualificado.
As penas para crimes de ódio, como racismo, ou para pornografia infantil, variam de dois a cinco anos de prisão. "Já a homofobia, infelizmente, não é crime no Brasil", ressalta o procurador Sérgio Suiama.