Moção de Apoio ao Supremo Tribunal Federal

30/05/2008 13h00

MOÇÃO DE APOIO

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados da República Federativa do Brasil, apoiada por pessoas e instituições da sociedade civil engajadas na promoção da igualdade racial, dirige-se ao Supremo Tribunal Federal – STF acerca do tema relativo à duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADI que serão apreciadas por esse Tribunal: a ADI 3330, contra o programa PROUNI, e a ADI 3197, contra a lei de cotas nos concursos vestibulares estaduais do Rio de Janeiro.

Causa-nos espécie que ambas as ações visem se contrapor a políticas públicas de valorização da população negra, a qual apresenta evidentes indicadores de elevada desigualdade social, econômica e educacional se comparada à população branca, resultado da exclusão estabelecida durante gerações por políticas sociais desastrosas que preservaram o desequilíbrio de oportunidades entre os diferentes grupos raciais, ao invés de propiciar isonomia.

Isso ocorre após exatos 120 anos de abolição da escravatura, quando não houve qualquer reparação material aos indivíduos escravizados e seus descendentes, nenhuma indenização, muito menos uma justa distribuição de terras. Esse racismo estrutural reforçou os mais variados preconceitos e práticas discriminatórias.

As políticas públicas somente poderão coibir as desigualdades de nossa república se focalizarem nas demandas específicas das populações afetadas pela discriminação. É preciso reconhecer as diferenças de tratamento para, enfim, combatê-las. Não se pode simplesmente ignorar que o critério racial foi criado socialmente, como não se pode negar o mecanismo real do racismo em funcionamento na nossa sociedade.

Políticas afirmativas para a população negra, como o PROUNI ou os diferentes sistemas de cotas nas universidades, buscam identificar e selecionar as pessoas em função de cor/raça tão somente com o afã de estabelecer um processo de reparações a comunidades há muito tempo desconsideradas pelo poder público e pelos interesses privados, logo, não geram privilégios, e sim equiparação.

A criminalização do racismo é conquista necessária, mas, visto que no Brasil o racismo está fortemente relacionado ao impedimento do acesso das populações negras à educação, em especial ao ensino superior, é preciso combater a discriminação racial também por outros mecanismos, mediante uma educação multicultural e inclusão de pessoas negras nos espaços de gestão pública.

Medidas para a melhoria da educação de base devem ser tomadas, porém a atual condição educacional da população negra, vítima de uma estrutura historicamente instituída, exige ações emergenciais, tanto para garantir justiça social quanto para incentivar novas percepções quanto aos espaços ocupados pelos negros e estimular uma reformulação da atual lógica racialista de distribuição do poder, para que, como defendia o Doutor Martin Luther King Jr., ativista dos direitos civis assassinado há 40 anos, as pessoas realmente sejam avaliadas pelo conteúdo de seu caráter, e não pela cor de sua pele.

É no atual contexto de conhecimento das injustiças perpetradas contra a população afrodescendente ao longo de séculos que as políticas compensatórias, como o sistema de cotas para os negros, foram adotadas pela iniciativa de instituições como a Universidade de Brasília, que com sucesso decuplicou o número de pessoas negras em seu corpo discente (de 2% para 20%).

Foi nessa mesma conjuntura que o Estado brasileiro assumiu o compromisso internacional de adotar medidas de reparação à discriminação histórica que atinge determinados grupos, em vários acordos dos quais o Brasil é signatário.

As compensações à população negra ora em curso têm cunho temporário, durarão por um período determinado, enquanto não existirem condições próprias à equidade entre negros e não-negros no acesso à educação e ao trabalho de qualidade, ao reconhecimento efetivo da contribuição de negras e negros, em todos os aspectos, para a construção deste país.

Imbuídos deste espírito republicano, explicitamos aos Eminentes Ministros do STF nosso apoio inconteste a ações afirmativas como o PROUNI e os sistemas de cotas para negros, para nós em plena conformidade como os princípios constitucionais.

Brasília, 29 de maio de 2008.

 

 

 

Deputado Pompeo de Mattos

Presidente