Mobilização dos povos indígenas se opõe à votação de parecer à PEC 215

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias recebeu um grupo de 50 indígenas do Estado do Tocantins mobilizados em Brasília contra a possível votação do parecer à PEC 215 em comissão especial nesta quarta-feira (3) na Câmara. A recepção aos indígenas foi pontuada pela apresentação de livro sobre o genocídio de indígenas no período da ditadura militar e também por uma denúncia em áudio sobre suspeita de participação de entidade patronal da agricultura na confecção do relatório a ser apresentado em comissão especial.
02/12/2014 18h15

Patricia Soransso

Mobilização dos povos indígenas se opõe à votação de parecer à PEC 215

Povo indígena do Tocantins em encontro com deputados da CDHM

Recebidos pelo vice-presidente da CDHM, deputado Nilmário Miranda, os indígenas agitavam seus chocalhos a cada manifestação de seus representantes ou dos parlamentares pela não aprovação da Proposta de Emenda à Constituição 215/00, que transfere ao Poder Legislativo o direito de apreciar as demarcações de terras indígenas.  

Wagner Krahô Kanela pediu o apoio dos parlamentares comprometidos com a causa indígena para que busquem impedir a aprovação da PEC. “A PEC 215 não interessa ao índio”, afirmou. Ele agradeceu à CDHM e também à Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas pela promoção do encontro e afirmou que uma eventual promoção da senadora Katia Abreu à ministra da Agricultura seria prejudicial aos interesses da comunidade indígena no país.

Ash Ashaninka, da aldeia Maracanã, do Rio de Janeiro, afirmou que os povos indígenas pretendem enviar um emissário à Organização das Nações Unidas (ONU) para denunciar que os direitos constitucionais indígenas estão prestes a serem violados.

O deputado Ivan Valente (PSol/SP) disse que mesmo com a apresentação do relatório redigido pelo deputado Osmar Serraglio (PMDB/PR), dificilmente será votado na comissão em razão da possibilidade do pedido de vista regimental. Para o deputado Chico Alencar (PSol/RJ) seria “uma possibilidade trágica” aprovar na abertura da Semana Nacional dos Direitos Humanos  a PEC na comissão especial. Alencar pediu mobilização dos que defendem os interesses indígenas para impedir a votação da proposta ainda este ano.  O deputado Ságuas Moraes (PT/MT) afirmou estar comprometido com a continuidade da defesa dos interesses indígenas e da Frente Parlamentar na próxima legislatura.

No encontro, uma denúncia foi apresentada à Comissão pelo secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário, Cleber Buzato. Ele apresentou áudio, que afirma ser gravação legal, de  suposta interceptação telefônica feita pela Polícia Federal no Mato Grosso, captando uma conversa entre um líder ruralista chamado Sebastião e um fazendeiro chamado Moisés, cujo teor comprovaria a participação do Conselho Nacional da Agricultura na confecção do relatório final da PEC 215/00, a ser apresentado e votado em comissão da Câmara.

Também durante o encontro foi apresentado à Câmara o livro “A Ditadura Militar e o Genocídio do povo Waimiri-Atroari”, pelo representante do CIMI e do Comitê da verdade, Memória e Justiça do Amazonas, Egídio Schuaden.

A obra apresenta o resultado de pesquisa histórica realizada por meio de depoimentos, relatórios, jornais e revistas sobre as ações da ditadura militar na região. O livro denuncia o massacre de cerca de dois mil indígenas das etnias Waimiri-Atroari nos dez anos  (1969-1979) da construção da BR-174, rodovia que liga Manaus, no Amazonas, a capital do Estado de Roraima, Boa Vista. O massacre, de acordo com a publicação, foi conduzido pelo Exército, com a colaboração de forças paramilitares e do governo amazonense daquele período contra os indígenas que tentaram evitar a construção da rodovia. O livro também conta os problemas que se seguiram na região com a instalação de atividade mineradora, de pastos para a produção agropecuária e da hidrelétrica de Balbina.   “Foi o povo que mais sofreu com a construção dessa estrada”, afirmou o indigenista que há mais de 50 anos atua na área.

Gilney Viana, preso político da ditadura e ex-deputado federal, informou que o massacre dos Waimiri-Atroari constará do livro 3, anexo ao relatório que será apresentado aos brasileiros pela Comissão da Verdade no próximo dia 10. Gilney defende que o genocídio conste do relatório principal.

De acordo com o ex-deputado, “as Forças Armadas foram utilizadas para combater os índios por ignorância, por falta de critério e porque não falavam português. Jogaram bombas e panfletos sobre as aldeias, como se fossem guerrilheiros”.