Justiça baiana dá posse de 43 mil hectares para famílias de geraizeiros no oeste do estado

No dia 30 de junho, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) negou o último recurso do empreendimento Fazenda Estrondo, no oeste baiano. A Fazenda era um condomínio de 23 propriedades, com 24 empresas ligadas ao agronegócio. A decisão da justiça determina que os 43 mil hectares do terreno são de posse coletiva das 120 famílias que vivem nas comunidades geraizeiras de Formosa do Rio Preto. Essas comunidades são descendentes de povos indígenas e de quilombolas e sofriam ameaças de expulsão das terras, inclusive com ataques a tiros. A área está localizada no coração da região conhecida por Matopiba, que é uma fronteira agrícola entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Entre as empresas que têm negócios dentro do condomínio estão a holandesa Bunge e a americana Cargill.
14/07/2020 16h50

Foto: Assessoria parlamentar

Justiça baiana dá posse de 43 mil hectares para famílias de geraizeiros no oeste do estado

Deputados Frei Anastácio (PT/PB) e Valmir Assunção (PT/BA, reunidos com judiciário da Bahia, durante diligência em dezembro de 2019

Em dezembro de 2019, durante uma diligência promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), os deputados Frei Anastácio (PT/PB) e Valmir Assunção (PT/BA) recomendaram às autoridades judiciárias e de segurança que adotassem medidas para proteger as comunidades geraizeiras da região e garantir-lhes a propriedade da terra tradicionalmente ocupada. As recomendações foram feitas em uma reunião com representantes do governo da Bahia e do Poder Judiciário.


Já naquele encontro, Frei Anastácio recomendou, por exemplo, que o Tribunal de Justiça da Bahia garanta a manutenção de posse coletiva da área. De acordo com o parlamentar, o Condomínio Fazenda Estrondo estaria expandindo suas terras com base em títulos falsos de propriedade. "Constatamos gravíssimas violações de direitos contra as famílias e seus territórios, e há fortes indícios de que a própria fazenda foi declarada com títulos falsos, o que pode corresponder a um dos casos mais expressivos de grilagem da Bahia”, disse o deputado.


Em outubro de 2019, a CDHM promoveu uma audiência pública para discutir a situação dos gerazeiros. Um levantamento da Associação do Desenvolvimento Solidário e Sustentável (Ades), com dados do Incra, apontava que a Fazenda Estrondo seria o resultado da apropriação ilegal de 444 mil hectares de terras nas proximidades da nascente do Rio Preto, afluente da Bacia do Rio São Francisco. As fraudes cartoriais que possibilitaram a grilagem foram realizadas no final dos anos 1970, mas somente nos anos 2000 a área começou a ser desmatada para o plantio de soja, milho e algodão.


Reportagem do Jornal Brasil de Fato conta que “a primeira derrota da Estrondo ocorreu em maio de 2017. Porém, após recorrer na Justiça, o empreendimento conseguiu reduzir a área reservada à comunidade para 9 mil hectares, mas o TJ-BA suspendeu a decisão e manteve os 43 mil hectares. Desde então, a violência aumentou na região”. A matéria relata por exemplo que, em agosto de 2019, “seguranças armados abordaram Fernando Ferreira Lima, um geraizeiro que trabalhava com o gado da comunidade, e pediram-lhe para descer do cavalo. Quando o homem saltou, foi atingido por um tiro que pegou na perna e o animal foi alvejado com outros três disparos. O rebanho foi levado pelos funcionários da Estrondo”.

 

Ainda de acordo com a reportagem, o Condomínio Fazenda Estrondo é considerado um dos maiores casos de grilagem de terras do Brasil e foi até incluído no Livro Branco da Grilagem de Terras do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em 1999. A publicação reunia a história de terras ocupadas ilegalmente por particulares no país.

 

“É notório que o Condomínio Estrondo agiu de várias formas para expulsar os geraizeiros de suas áreas. Os relatos de ameaças, perseguição e criminalização de lideranças locais eram muito preocupantes. Acho que, de forma coletiva, encontramos meios de proteção dos direitos dessas comunidade’”, pondera o presidente da CDHM, Helder Salomão.

 

Pedro Calvi / CDHM

Edição Mariana Trindade / CDHM