Cinquenta anos depois daquela noite no bar Stonewall

Era uma noite de verão em Nova Iorque naquele 28 de junho de 1969. Os frequentadores do bar Stonewall passavam por mais uma revista abusiva da polícia, o que era rotina. Os frequentadores, na maioria negros, travestis e latinos eram humilhados, agredidos e chantageados. Porém, naquela noite resolveram dar um basta e houve uma revolta contra a polícia. O movimento se estendeu por outros dias e ficou conhecido como “o levante Stonewall”, que seria o começo da luta da população LGBT por seus direitos. A vergonha dava lugar ao orgulho. A ideia se expandiu mundo afora e esta semana completa 50 anos.
25/06/2019 20h35

Foto: Fernando Bola

Cinquenta anos depois daquela noite no bar Stonewall

Para marcar essas cinco décadas de trajetória, seis Comissões da Câmara dos Deputados realizaram nesta terça-feira (25/6), o Seminário "Memória, Verdade e Justiça - 50 Anos de luta LGBTI+". A iniciativa é das Comissões de Cultura, Defesa dos Direitos da Mulher, Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, Direitos Humanos e Minorias, Educação, Legislação Participativa, Seguridade Social e Família; Trabalho, Administração e Serviço Público.

“Quando combatemos a exclusão e o preconceito, estamos trabalhando a favor da democracia. Sou uma evangélica assumida e a primeira coisa que eu devo ter é respeito pela pessoa, pelas suas opções, pelas suas escolhas. Não quero ser apenas simpática, mas precisamos de homens e mulheres de coragem para botar o dedo na ferida”, afirma Benedita da Silva (PT/RJ), presidente da CCULT.

O jornalista Glenn Greenwald participou da abertura do seminário. “Eu era uma criança e um adolescente gay nos Estados Unidos dos anos 80 e 90, no tempo do Reagan. Nunca pensei que um dia poderia sentar ao lado do meu marido, um deputado federal, aqui no Congresso. Nunca tenha vergonha de nada. Eu não separo as causas, as causas contra machismo, racismo e LGBTfobia estão conectadas. Acredito mais do que nunca no futuro deste país”. Greenwald é casado com David Miranda (PSOL/RJ).  

Para Marcelo Freixo (PSOL/RJ), “a palavra orgulho é muito poderosa politicamente e a agenda LGBT não é uma agenda de gueto, é uma agenda da democracia”.

Falha do Estado

No seminário, o ex-deputado Jean Wyllys foi homenageado. Ele coordenou as oito últimas edições do seminário e atualmente vive na Europa, após ter renunciado ao mandato nesta legislatura por conta das ameaças de morte e da campanha difamatória que vinha sofrendo. Através de um vídeo, lamentou o fato de o Estado brasileiro não lhe ter garantido proteção.

Criminalização da homofobia

A presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa Idosa, a deputada Lídice da Mata (PSB-BA) comemorou a decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF), que equiparou o crime de homotransfobia ao racismo. Ela lembrou, porém, que o Brasil ainda é o país que mais assassina pessoas LGBT no mundo. A deputada defendeu a aprovação do projeto chamado Estatuto das Famílias (PLS 470/13). Apresentado por ela mesma quando era senadora, o texto condensa temas relativos ao direito de família e contempla as famílias não tradicionais, como as formadas a partir de uniões homoafetivas. A proposta foi arquivada no final da legislatura passada, mas, segundo a parlamentar, pode ser resgatada a pedido de outros senadores.

Já Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI, pediu que o Congresso Nacional aprove lei criminalizando a homofobia e a transfobia para dar mais segurança jurídica para essa população. A Comissão de Direitos Humanos e Minorias já aprovou, nesse sentido, o Projeto de Lei 7582/14, mas o texto ainda tem que ser analisado por duas comissões antes de ser votado pelo Plenário da Câmara.

Nathália Vasconcellos, da Rede Brasil Trans, cobrou iniciativas do Poder Público para garantir a empregabilidade das pessoas trans. Hoje, ressaltou ela, 90% dessa população emprega-se na prostituição.

Números

Segundo o Grupo Gay da Bahia, em 2018 foram mortos, em situações violentas incluindo o suicídio, 420 LGBTs. Produzido há 39 anos ininterruptos, o relatório identificou, no ano 2000, 130 mortes; em 2010, foram 260. De acordo com a Associação Nacional dos Travestis e Homossexuais (Antra), em 2017 foram assassinatos 179 pessoas trans - em apenas 18 casos os suspeitos foram presos. Já de acordo com a organização não-governamental International Trangender Europe (TGEU), que monitora casos em todo o mundo, entre 2008 e 2016 ocorreram, no Brasil, pelo menos 868 homicídios de pessoas trans. Além disso, um levantamento produzido na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) chamado Lesbocídio aponta que, entre 2014 e 2017, foram vítimas de morte violenta, incluindo suicídios, 126 mulheres lésbicas no Brasil.

“O levante de Stonewall significa revolução dos afetos, da dignidade e da revolução dos corpos”, pondera Erika Kokay (PT/DF), que pediu a realização da audiência pública pela CDHM. Ela afirma ainda que “para aqueles que acham que o ódio tem que ser a norma, nós estamos fazendo o discurso do afeto, do amor em todas as suas formas”. 

Pedro Calvi / CDHM

Com informações da Agência Câmara