Cidades maduras

Entre 2012 e 2017, a população brasileira com 60 anos ou mais de idade cresceu 18,8%. Ou seja, a população está vivendo mais. O número é da pesquisa Características Gerais dos Domicílios e dos Moradores 2017, que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentou em abril deste ano. Já a Revisão 2018 da Projeção da População do Brasil do IBGE, divulgada na última semana de julho aponta que, em 2039, o número de pessoas com mais de 65 anos será superior ao número de crianças e jovens com menos de 15 anos. Em 2060, uma de cada 4 pessoas terá mais de 65 anos.
06/08/2018 12h25

Foto: Janielly Cabral

Cidades maduras

Para debater essa situação e ver de perto experiências de atendimento ao idoso, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) e a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa (CIDOSO) fizeram diligências e um seminário em João Pessoa (PB).

Diligências

A primeira instituição visitada foi o Lar da Providência Carneiro da Cunha, fundado há 107 aos. Lá, são atendidos 94 idosos, sendo 74 mulheres e 16 homens. Todos recebem seis refeições por dia. O Lar é mantido através de convênios com o governo do estado, prefeitura, doações e de uma mensalidade paga pelos moradores.

Além disso, recebe alimentos do Programa Mesa Brasil e do Banco de Alimentos, que formam uma rede nacional de aproveitamento de alimentos, que distribui excedentes ou fora dos padrões de comercialização, mas que ainda podem ser consumidos. 

O destaque no serviço da instituição é o acolhimento de idosos com algum tipo de demência, como Alzheimer. Ficam em uma área separada dos demais e têm atendimento especializado, inclusive com refeições em forma de dieta enteral em alguns casos. São 16 idosos nessa situação.

“São idosos negligenciados pela família, que não sabe ou não quer cuidar deles. Mas o custo é muito maior do que o dos idosos independentes. São profissionais com mais experiência, a alimentação é outra e os medicamentos mais caros. Somos o único local em João Pessoa que recebe idosos com vários tipos de demência”, explica a assistente social Michele Vasconcelos.

No município de Conde, a CDHM conheceu as obras do Lar do Idoso, uma iniciativa da igreja Assembleia de Deus. O lugar deve receber 100 pessoas e a triagem já começou. O serviço deve começar a funcionar no primeiro semestre do ano que vem.

A construção está em fase de regularização e convênios vão ser feitos para compra de equipamentos e contratação de pessoas, como psicólogos, médicos e assistentes sociais.

De acordo com o pastor Isac Venerano, gestor da instituição, o Lar do Idoso marca os 100 anos da Assembleia de Deus no estado. “Temos a responsabilidade de cuidar dos nossos idosos. Queremos que essa obra tenha impacto muito positivo aqui na região e sirva de referência para que outros asilos como esse sejam construídos pelo país”, destaca o pastor.

Já o Programa Cidade Madura, mais uma experiência conhecida pela CDHM, existe em seis cidades da Paraíba. São condomínios com casas para até dois idosos cada uma. São casais ou duplas de familiares idosos. O Programa existe em João Pessoa, Guarabira, Campina Grande, Cajazeiras, Sousa e Patos, num total de 280 moradias.

Em cada condomínio, os idosos contam com pista de caminhada, horta, academia de ginástica, centro de convivência, núcleo de saúde, salas multiuso e redário.

Cada dupla de idoso recebe a casa do governo do estado. As contas de água, luz e condomínio são pagas pelos beneficiados, assim como a alimentação.

“O Programa Cidade Madura é uma grande oportunidade para darmos mais atenção aos idosos, sobretudo, porque muitos não têm família próxima e precisam de cuidado e carinho. Vivendo nesses condomínios, eles convivem como se fosse em família, mas de forma independente”, pondera a assistente social de Secretaria de Desenvolvimento Humano (SEDH) e coordenadora do Programa, Magda Daniele.

“Quem me trouxe para cá foi Deus, foi um presente vir morar aqui, estar no Cidade Madura me traz vida. Esse é o melhor lugar para um idoso viver”, afirma a moradora do condomínio em João Pessoa, Francisca de Sousa, 76 anos.

“Direitos dos idosos, novos olhares”

Em 2012, a população brasileira com 60 anos ou mais era de 25,4 milhões. Nos últimos cinco anos houve, segundo o IBGE, um crescimento de 4,8 milhões de novos idosos. As mulheres são maioria expressiva nesse grupo, com 16,9 milhões (56% dos idosos), enquanto os homens idosos são 13,3 milhões (44% do grupo).

Na Paraíba, ainda segundo o IBGE, em 2016, 11,4% da população no estado eram de idosos, a maior nos estados do Nordeste. Deste total, 56,2% são mulheres.

O levantamento, feito através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), mostra também que a Paraíba é o quinto estado do país em número de idosos, em primeiro está o Rio de Janeiro com 14,9%, em segundo o Rio Grande do Sul com 13,5%, seguido de São Paulo com 11,9% e Minas Gerais com 11,8%. O Amapá, por sua vez, é o estado com menor percentual de idosos, com apenas 7,2% da população.

E justamente por ter a maior população idosa do Nordeste, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias também promoveu em João Pessoa o seminário “Direitos dos Idosos, novos olhares”.

Para o procurador-geral de Justiça do Ministério Público da Paraíba, Valberto Cosme de Lira, ações que mostram boas práticas de atendimento ao idoso contribuem para reduzir os números da violência contra essa faixa da população.

“Os Centros de Referência Especializados da Assistência Social do estado, registraram de janeiro a maio deste ano 1.333 violações de direitos dos idosos. A maior parte, quase 600 casos, foram de negligência, seguido de violência psicológica com 288 registros e de violência patrimonial com 272 ocorrências”, denuncia o procurador-geral.

Diana Freitas de Andrade, defensora regional de Direitos Humanos da Defensoria Pública da União, pediu que as instituições divulguem os serviços da Defensoria para os idosos, como ações junto à Previdência. “Podemos atuar em casos envolvendo o INSS, como aposentadorias.  Temos que lembrar também que a reforma da previdência, proposta pelo governo federal, quer diminuir e restringir os benefícios que foram conquistados pela população. Felizmente foi engavetada por um tempo, mas serviu de alerta porque essa reforma tornava o envelhecimento da população um problema, e não é! Envelhecimento da população é algo saudável, um indicador positivo. Temos que defender os benefícios previdenciários, que são direitos fundamentais do cidadão. Em mais de 70 por cento dos municípios brasileiros, os benefícios da previdência valem mais que o fundo de recursos do município”, ressalta Diana.

O representante da arquidiocese da Paraíba, padre Egídio Carvalho Neto, argumenta que, com o aumento da mortalidade infantil e do número de jovens assassinados, resulta em uma sociedade de pessoas idosas. “E estamos preparados para isso? Em 2003 a igreja lançou a Campanha da Fraternidade sobre o idoso. Naquela época, há seis anos tramitava no Congresso o estatuto da pessoa idosa no Brasil. E durante a Campanha ele foi aprovado. Foi uma das contribuições da igreja católica para os idosos, além da pastoral do idoso e do Projeto Mimo do Céu, que atende 21 bairros distribuindo pães e leite de soja para 45% da população da cidade com mais de 60 anos e tem problemas de diabetes e ósseos. Quando a gente mata a pessoa idosa, despreza ela, estamos fazendo um país sem identidade nenhuma”, conclui o padre.

Recursos das loterias para os idosos

Vandinei Viegas , do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, lembra que já foi solicitado ao governo federal que parte dos recursos arrecadados em loterias, também seja destinada ao Fundo  Nacional do Idoso. Hoje, o Fundo autoriza a dedução do imposto de renda devido pelas pessoas físicas e jurídicas as doações efetuadas aos respectivos fundos municipais, estaduais e nacional, mas não o repasse de forma direta. “Outra iniciativa que poderia ajudar na implantação das políticas públicas seria destinar, também, parte dos prêmios lotéricos não reclamados para os idosos”, sugere.

Também participaram do seminário, Jaciana Magalhães, da Secretaria de Desenvolvimento Humano do estado; Katiuska Duarte, do Conselho Estadual de Assistência; o deputado estadual Frei Anastácio (PT/PB), que é presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa; Vanessa Lima, do Comitê Estadual de Enfrentamento ao Tráfico e Desaparecimento de Pessoas da Paraíba e a Irmã Maria do Rosário, do Lar da Previdência.

Ainda acompanharam o debate cerca de 50 idosos que frequentam os Centros de Referência Especializados da Assistência Social.

Multiplicar os bons exemplos

“No Cidade Madura vimos 80 idosos vivendo com dignidade e é uma experiência que deve ser multiplicada. No Lar da Providência, os idosos são tratados com amor, afeto e atenção. Algumas, são pessoas com enfermidades e outras renegadas pela própria família. Também conhecemos uma experiência evangélica, um lugar que vai ter horta, academia da ginástica e atendimento especializado. Com tudo isso, temos que olhar não só o negativo, mas também o positivo. Temos que cuidar da vida daqueles que contribuíram com o nosso país e fizeram a nossa história. Vamos levar o relatório dessas diligências aos responsáveis dos poderes públicos para que essas experiências se multipliquem”, avalia o deputado Luiz Couto (PT/PB), presidente da Comissão da CDHM.

Luiz Couto também deve encaminhar à Caixa Econômica Federal pedido de informações sobre o funcionamento dos recursos das loterias destinados às ações sociais, e também sobre o destino dos prêmios não reclamados.

 “Nos países desenvolvidos o processo de envelhecimento da população se deu lentamente, acompanhado da evolução econômica, do crescimento dos níveis de bem-estar e da redução das desigualdades sociais. No Brasil, o processo é acelerado. Precisamos de novas ações em várias frentes. Temos que enfrentar esse desafio, e contribuir para o envelhecimento ativo e saudável desse grupo cada vez maior de brasileiros”, avalia Luiz Couto.

Ainda na sexta-feira (3), o presidente da CDHM participou da Caminhada contra o Tráfico e Desaparecimento de Pessoas na Paraíba. No estado, entre 2011 a 2017, foram registrados 167 casos de pessoas vítimas desse tráfico, entre crianças e adultos. Esses dados são do Disque Denúncia Estadual 123 e do banco de dados do Ministério de Desenvolvimento Social, através do registro mensal de atendimento (RMA).

Assista aos vídeos e veja fotos das diligências nos links abaixo.

https://bit.ly/presidenteCDHM

https://bit.ly/fotosParaiba

https://bit.ly/LarDoIdoso

https://bit.ly/CidadeMadura

https://bit.ly/LarDaProvidencia

 

Pedro Calvi / CDHM

Edição de foto e vídeo: Fernando Bola