CDHM recebe presidente da FUNAI
Nesta quarta-feira (11), a Comissão de Direitos Humanos e Minorias recebeu o presidente da FUNAI, Marcelo Augusto Xavier, em audiência pública, para esclarecer sobre as ações desenvolvidas pelo órgão para os povos indígenas e sobre representação feita à Procuradoria do Distrito Federal que aponta abuso de autoridade.
A audiência contou com a participação dos deputados Joenia Wapichana (REDE/RR), Professora Rosa Neide (PT/MT), Neri Geller (PP/MT), Nelson Barbudo (PSL/MT), Nilto Tatto (PT/SP), Sérgio Souza (MDB), Leonde Brito (PT/AC), Erika Kokay (PT/DF), Vivi Reis (PSOL/PA), Coronel Tadeu (PSL/SP), Delegado Pablo (PSL/AM), José Medeiros (PODE/MT), Túlio Gadelha (PDT/PE), Aline Sleutjes (PSL/PR), Delegado Éder Mauro (PSD/PA) e Coronel Armando (PSL/SC).
“É uma nova FUNAI, eu não tenho dúvida disso”, afirmou Marcelo ao entregar ao presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, deputado Carlos Veras (PT/PE), o livro “FUNAI, autonomia e protagonismo indígena”, que reúne ações desenvolvidas pela instituição.
O presidente da FUNAI destacou que durante a pandemia foram investidos 50 milhões de reais em ações preventivas em terras indígenas, que incluíam aproximadamente 950 mil cestas básicas, 221 mil kits de higiene e limpeza, além de créditos de 235 milhões de reais para a criação de barreiras sanitárias com o objetivo de proteger os indígenas.
Única parlamentar indígena
“O órgão indigenista federal foi criado justamente para proteger e fazer consolidar os direitos dos povos indígenas, tais como estão garantidos em nossa Constituição Federal. É preciso deixar essa mensagem bastante clara”, afirmou a presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Povos Indígenas, deputada Joenia Wapichana (Rede/RR), primeira parlamentar federal indigena eleita.
“Concordamos que deve ter projetos e programas que incentivem e encorajem a produção indígena, a economia indígena. No entanto, existe um direito que é principal para isso e sobre o qual há muita preocupação, que é o direito à terra. A gente vê que existem pendências na linha da demarcação e da proteção das terras indígenas”, disse.
A parlamentar destacou a instrução normativa da FUNAI (IN-9/20), que, segundo várias entidades indigenistas, legitima a grilagem e permite a emissão de títulos de propriedade para os invasores das terras. Joenia também questionou a redução do orçamento e da estrutura da FUNAI, e da paralisia das demarcações e homologações de novas áreas.
“Não seria uma tentativa de legalização da ilegalidade, da invasão, do esbulho das terras indígenas, principalmente das terras não homologadas?”, questionou, indicando que a instrução seria uma inversão das atribuições legais do órgão.
Preocupação com diminuição de orçamento
“Nos preocupa a esqueletização orçamentária da FUNAI. Nós não temos visto ações da própria FUNAI para recompor o seu próprio orçamento. De 2013 a 2020 houve uma redução de mais de 30% do total de recursos empenhados no âmbito da FUNAI”, disse a deputada Erika Kokay. Para ela, é importante garantir recursos para que o órgão possa cumprir sua missão constitucional em defesa dos povos indígenas.
Tratamentos desiguais
A deputada Vivi Reis (Psol-PA) apontou a existência de uma diferença de tratamento do órgão em relação às lideranças e, ainda, que a denúncia contra Sônia Guajajara teria sido feita com o objetivo de criminalizar os representantes contrários ao governo federal. “A FUNAI fechou as portas para as lideranças indígenas. O discurso está realmente muito afinado com o projeto da bancada ruralista e do agronegócio. Queremos que se faça um espaço amplo de escuta das lideranças e não só de alguns indígenas que estão cooptados com um projeto de garimpeiros e de grileiros”, declarou a deputada.
Sobre representação feita junto à Procuradoria da República no Distrito Federal, que aponta eventual prática de crime de abuso de autoridade e improbidade administrativa, em decorrência de inquéritos policiais contra os líderes indígenas Sônia Guajajara e Almir Suruí por difamarem o governo, Marcelo Xavier alegou que as lideranças teriam inflado dados.
PL 191
Marcelo Xavier afirmou que a FUNAI investiu 30 milhões em projetos voltados para a geração de renda nas aldeias, com o objetivo de fortalecer o protagonismo. O presidente destacou ainda que o órgão iniciou processo para compra de 40 tratores para entrega em terras indígenas. E citou exemplos como o da Terra Indígena de Pareci, Nambiwara e Manoki, em Mato Grosso, com 20 mil hectares de área plantada, ocupando 1,7% da área indigena e estaria gerando 20 milhões ao ano.
“Eu sou favorável ao PL 191, porque acho que pode ser a solução para áreas indígenas. O PL pode trazer uma geração de renda, possibilidade da própria atividade, desde que tudo seja feito de forma sustentável. Nós estamos em 2021, é possível o desenvolvimento da atividade mineral em terras indígenas de forma sustentável”, afirmou Xavier.
Ações de fiscalização e Instrução Normativa 9/2020
Sobre ações de fiscalização, ele afirmou que foram utilizados 17,2 milhões de reais em cerca de 500 ações de combate ao garimpo e ao desmatamento ilegal em terras indígenas. Ressaltou ainda que, segundo o Centro de Monitoramento Remoto (CRM), de 2019 a 2020 houve uma redução de 23,3% no desmatamento em terras indígenas da Amazônia Legal.
Marcelo ainda deu destaque à Instrução Normativa n° 9/2020. “Falam que ela serviria para a grilagem de terra, para criar conflito fundiário, muito pelo contrário, a IN 9 veio trazer segurança jurídica”, citando que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região referendou a instrução como legal.
“Com ela, compatibilizamos direitos de indígenas e de não indígenas até que venha o decreto homologatório”, disse, apontando que só constam no sistema áreas homologadas por decreto presidencial
Frente Parlamentar da Agropecuária
Para o deputado Sérgio Souza (MDB/PR), o parlamento deveria avançar na regulamentação do artigo 231 da Constituição, que trata do reconhecimento aos direitos indígenas.
“Eu sou da bancada dos produtores de alimentos. Inclusive sou o presidente da Frente Parlamentar Agropecuária. Nós defendemos que o índio tenha liberdade, que ele possa dispor do seu território da melhor maneira para sua subsistência e para garantia dos seus costumes. Nós queremos que o índio tenha a condição do seu sustento. O índio é hoje o grande proprietário de terras neste país. Nós temos menos de um milhão de população indígena e algo em torno do 14% do território nacional é terra indígena demarcada, e tem mais uns 6% aí por se demarcar”, afirmou Souza.
Pandemia Covid-19 e ADPF 709
Questionado pelas deputadas Erika Kokay e Vivi Reis sobre a distribuição de hidroxicloroquina aos povos indígenas, declarou que somente a SESAI poderia responder o questionamento. “A FUNAI não cuida da distribuição de remédios em terras indígenas, até por atribuição legal”, disse Marcelo Xavier.
Sobre a ADPF 709, do Supremo Tribunal Federal, Marcelo afirmou que a FUNAI ficou com duas obrigações: a garantia da segurança alimentar dos povos indígenas e a constituição de barreiras sanitárias, e que elas foram executadas pela instituição.
Marcelo Xavier afirmou ainda que 85% dos povos indígenas já estariam vacinados com a primeira dose e 76% com as duas doses.
Considerações finais
Marcelo Xavier reconheceu que estão pendentes de homologação cerca de 10 milhões de hectares de terras indígenas delimitadas e declaradas e que existem 493 pedidos de novas áreas em fase inicial e 120 em estudo, mas apontou que existe insegurança jurídica sobre o tema e que a FUNAI aguarda uma decisão do Supremo Tribunal Federal para retomar as demarcações.
“Em tempos de acirramento, esta Casa precisa ter equilíbrio político, não podemos disseminar a intolerância, o ódio, a gente tem que fazer o debate político. Esta Casa tem uma responsabilidade muito grande pela condução dos trabalhos e esta Comissão vai continuar sendo a voz daqueles e daquelas que que têm os seus direitos humanos violados”, finalizou Carlos Veras.
Fábia Pessoa/CDHM