CDHM Reage em Defesa de Brasileiros na Espanha
Ofício 127/2008-P Brasília, 25 de fevereiro de 2008
A Sua Excelência o Senhor
RICARDO PEIDRÓ CONDE
Embaixador da Espanha no Brasil
Com cópias para a Presidência e a Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos
Deputados e ao Ministério das Relações Exteriores.
Senhor Embaixador, diante do crescente número de denúncias contra o governo espanhol de deportações de brasileiros sem justificativa e de tratamento desumano e degradante - afrontosos aos direitos humanos - é do dever moral e próprio das atribuições desta Comissão de Direitos Humanos e Minorias, a qual presidimos, expressar às autoridades públicas espanholas, por intermédio de Vossa Excelência, nosso protesto contra esse tratamento.
No momento em que crescem as trocas comerciais, culturais, científicas e tecnológicas entre Brasil e Espanha, num contexto de globalização, era de se esperar que ambos os países adotassem procedimentos aduaneiros mais ágeis e a facilitação do trânsito dos cidadãos entre os países. Paradoxalmente, o que vemos da parte da Espanha é a adoção de restrições que se materializam em um aumento elevado de casos de maus-tratos a brasileiros que aportam ao seu país, seja a turismo, a trabalho e mesmo em trânsito para
outros países.
É revoltante a falta de reciprocidade de tratamento entre espanhóis e brasileiros nessa matéria. Enquanto os brasileiros recebem os ibéricos neste país com habitual hospitalidade e amabilidade, são tratados por autoridades nos aeroportos da Espanha com desrespeito e brutalidade injustificáveis. Sabe V. Exª o quanto os turistas e homens de negócio de seu país são tratados aqui, com respeito e cortesia. Qual seria a razão desse desrespeito às normas civilizadas e aos tratados internacionais de direitos humanos que conferem a todos o direito a tratamento digno onde quer que esteja?
Ganhou destaque entre muitos outros casos de tratamento degradante o que vitimou a pesquisadora da Universidade de São Paulo Patrícia Camargo Magalhães, que estava de passagem pela Espanha a caminho de evento científico em Portugal. Antes de ser sumariamente deportada, esta cidadã amargou três dias de prisão no aeroporto de Madri, confinada numa saleta de 9 m2 , junto a 30 pessoas originárias de países latino-americanos e africanos, todos obrigados a dormir e alimentar-se no chão, por causa da superlotação,
privados de objetos de higiene pessoal, inclusive escova de dentes, e de medicamentos, inclusive de uso contínuo.
Outra cidadã brasileira, Elisabete de Souza Roberto, que visitava irmãs que vivem legalmente na Espanha, ao chegar foi também detida no dia 9 deste mês de fevereiro, às 9h, acompanhada da filha de 17 meses de idade. Permaneceu nas mesmas condições degradantes, tendo sido privada inclusive de medicamentos e da "papinha" da filha, que só teve autorização para ser alimentada por volta das 17h. Funcionários da imigração trataram essa cidadã e suas irmãs com truculência inaceitável.
O fato de brasileiras serem vítimas habituais de quadrilhas de traficantes de pessoas e exploradores sexuais não confere a esses nacionais qualquer suspeição. O que deveria ser objeto de ação mais eficaz, da parte de todos os governos, inclusive do Brasil, da Espanha e dos demais lugares onde agem esses bandos, é perseguir e punir os verdadeiros criminosos, não as vítimas nem as supostas vítimas.
A forma como brasileiras e brasileiros têm sido tratadas nos aeroportos espanhóis, segundo numerosas denúncias, não deixa dúvidas sobre o preconceito e a discriminação que movem esse comportamento, afrontosos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outros tratados internacionais.
Em razão de tais fatos, esta Comissão apresenta, com todo o respeito devido a V. Exª mas com a firmeza necessária, nosso protesto contra as violações de direitos humanos citadas, e apela ao governo espanhol no sentido de que haja reciprocidade no tratamento entre seus nacionais.
Informamos, ainda, que esta Comissão passará a acompanhar de forma sistemática o tratamento atribuído aos brasileiros nos aeroportos da Espanha, no sentido de verificar a eventual necessidade de proposição de iniciativas legítimas nos organismos internacionais apropriados, inclusive junto aos sistemas internacionais de direitos humanos.
Atenciosamente,
Deputado Luiz Couto
Presidente
À SUA EXCELÊNCIA O SENHOR JAVIER SOLANA – SECRETÁRIOGERAL E ALTO REPRESENTANTE PARA POLÍTICA EXTERNA E SEGURANÇA COMUM DA UNIÃO EUROPÉIA;
À COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DO PARLAMENTO EUROPEU, por meio da Representação da Delegação da Comissão Européia no Brasil - SHIS, QI 07, Bloco A, Lago Sul, Brasília - DF
A COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E MINORIAS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, localizada no Anexo II, Sala 185-A, Pavimento Superior - CEP 70.160-900, Brasília-DF, por seu Presidente, Deputado POMPEO DE
MATTOS (PDT-RS) infra-assinado, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência apresentar RECLAMAÇÃO
Ao Secretário-Geral e Alto Representante para Política Externa e Segurança Comum da União Européia e à Comissão de Direitos Humanos do Parlamento Europeu, pelas razões de fato e de direito a seguir expostos:
DOS FATOS
Diante do número preocupante de denúncias de cidadãos que têm chegado a esta Comissão dos Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, integrante do Poder Legislativo do Brasil, venho, como presidente do Colegiado, reclamar contra o Governo da Espanha perante organismos da Comunidade Européia, por atos degradantes e discriminatórios e por abuso de autoridade praticados por policiais da Delegacia de Imigração daquele País contra cidadãos brasileiros.
Dados divulgados pela Embaixada do Brasil em Madrid indicam que, só no mês de fevereiro deste ano, 452 brasileiros foram impedidos de entrar na Espanha. Numerosos depoimentos de brasileiros têm denunciado terem sido vítimas de desrespeito e humilhação, antes de serem deportados, a exemplo do tratamento a 15 nacionais que retornaram ao Brasil no último dia 07 de março, sob a alegação de que não estavam com a documentação em ordem.
Não se questiona aqui a soberania da Espanha nem da União Européia em editar e aplicar suas leis de imigração e medidas de segurança.
Reclamamos, isto sim, é da forma truculenta e arbitrária com que autoridades espanholas têm aplicado tais normas a brasileiros, o que caracteriza, segundo diversos denunciantes, discriminação e maus-tratos, incluindo detenções arbitrárias no aeroporto de Barajas, tratamentos sem precedentes no grupo de países que compõe a Comunidade Européia.
As autoridades espanholas têm justificado os excessos na contenção de acesso de brasileiros à Comunidade Européia em razão do dever de se fazer respeitar as normativas impostas, não pela Espanha isoladamente, mas pela União Européia.
Respeitamos e compreendemos as obrigações a que estão sujeitas as autoridades nacionais européias face ao Tratado Schengen, no que se refere a medidas de cooperação mútua para o controle de ingresso de estrangeiros.
Mas o que se nota, em realidade, é que essas mesmas normas são aplicadas distintamente entre os países da Comunidade Européia. E é principalmente da Espanha que chegam de forma mais sistemática e em maior número os casos de repatriação de brasileiros nas condições citadas.
No momento em que crescem o turismo e as trocas comerciais, culturais, científicas e tecnológicas entre Brasil e a União Européia, num contexto de globalização, era de se esperar que todos os países adotassem procedimentos de facilitação do trânsito dos cidadãos entre os países. Paradoxalmente, o que vemos da parte da Espanha são restrições a brasileiros que aportam àquele país, seja a turismo, a trabalho e mesmo em trânsito para outros países.
Enquanto isso, no Brasil europeus são tratados habitualmente com respeito e cortesia. Qual seria a razão desse desrespeito às normas civilizadas e aos tratados internacionais de direitos humanos que conferem a todos o direito a tratamento digno onde quer que esteja?
Ganhou destaque entre muitos outros casos de tratamento degradante o que vitimou a pesquisadora Patrícia Camargo Magalhães, da tradicional Universidade de São Paulo, de passagem pela Espanha para participar de evento científico em Portugal. Antes de ser sumariamente deportada, esta cidadã amargou três dias de prisão no aeroporto de Madrid, confinada numa saleta de 9 m2 , junto a 30 pessoas originárias de países latino-americanos e africanos, todos obrigados a dormir e alimentar-se no chão, por causa da superlotação, privados de objetos de higiene pessoal, inclusive escova de dentes, e de medicamentos, inclusive de uso contínuo.
Outra cidadã brasileira, Elisabete de Souza Roberto, relatou o drarma que viveu quando decidiu visitar as irmãs que vivem legalmente na Espanha. Ao chegar, no dia 9 deste mês de fevereiro, às 9h, foi detida, na companhia de sua filha de 17 meses de idade. Permaneceu em condições degradantes, tendo sido privada inclusive de medicamentos e dos alimentos da filha, que só teve autorização para ser alimentada por volta das 17h.
O fato de brasileiras serem vítimas habituais de quadrilhas de traficantes de pessoas e exploradores sexuais não confere a esses nacionais qualquer suspeição. O que deveria ser objeto de ação mais eficaz, da parte de todos os governos, inclusive do Brasil e dos países da União Européia onde agem esses bandos, é perseguir e punir os verdadeiros criminosos, não as vítimas nem as supostas vítimas.
A forma como brasileiras e brasileiros têm sido tratadas nos aeroportos espanhóis, segundo numerosas denúncias, não deixa dúvidas sobre o preconceito e a discriminação que movem esse comportamento, afrontosos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outros tratados internacionais.
DO DIREITO
A necessidade de medidas restritivas no ingresso de estrangeiros não dá a nenhuma autoridade de qualquer país a prerrogativa de atentar contra os direitos humanos assegurados pelos Tratados e Acordos Internacionais, pois temos que ter em mente que a dignidade da pessoa humana deve prevalecer quando em confronto com a atividade repressiva do Estado. Portanto, as atitudes das autoridades espanholas ligadas à Delegacia de Imigração ferem vários instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos.
Na DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS temos como aplicáveis ao caso, pelo menos, os seguintes dispositivos:
"Artigo II
Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição."
"Artigo V
Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante."
"Artigo VII
Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação."
"Artigo IX
Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado."
Até mesmo as "Regras Mínimas para o tratamento dos Reclusos", adotadas pelo 1º Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinqüentes - Genebra,1955 - aprovadas pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas em suas resoluções 663 C (XXIV), de 31 de Julho de 1957 e 2076 (LXII), de 13 de Maio de 1977 - Resolução 663 C (XXIV) do Conselho Econômico e Social, estabelecem, como o próprio nome diz, as regras mínimas para o tratamento de criminosos, condição esta não cabível aos brasileiros detidos. Ainda que os fossem, teriam direito a tratamento digno devido até mesmo a pessoas fora da lei.
"8. As diferentes categorias de reclusos devem ser mantidas em estabelecimentos penitenciários separados ou em diferentes zonas de um mesmo estabelecimento penitenciário, tendo em consideração o respectivo sexo e idade, antecedentes penais, razões da detenção e medidas necessárias a aplicar.
9. 1) As celas ou locais destinados ao descanso notório não devem ser ocupados por mais de um recluso. Se, por razões especiais, tais como excesso temporário de população prisional, for necessário que a administração penitenciária central adote exceções a esta regra, deve evitar-se que dois reclusos sejam alojados numa mesma cela ou local.
2) Quando se recorra à utilização de dormitórios, estes devem ser ocupados por reclusos cuidadosamente escolhidos e reconhecidos como sendo capazes de serem alojados nestas condições. Durante a noite, deverão estar sujeitos a uma vigilância regular, adaptada ao tipo de estabelecimento prisional em causa."
"Locais destinados aos reclusos 10. As acomodações destinadas aos reclusos, especialmente dormitórios,
devem satisfazer todas as exigências de higiene e saúde, tomando-se devidamente em consideração as condições climatéricas e especialmente a cubicagem de ar disponível, o espaço mínimo, a iluminação, o aquecimento e a ventilação."
"Higiene pessoal
15. Deve ser exigido a todos os reclusos que se mantenham limpos e, para este fim, ser-lhes-ão fornecidos água e os artigos de higiene necessários à saúde e limpeza."
Já o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966), na sua Parte II, assim preceitua:
Artigo 2º §1. Os Estados-partes no presente Pacto comprometem-se a garantir a todos os indivíduos que se encontrem em seu território e que estejam sujeitos à sua jurisdição os direitos reconhecidos no presente Pacto, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, situação.
Artigo 7º
Ninguém poderá ser submetido a tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido, sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médicas ou científicas.
Artigo9º §1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. Ninguém poderá ser preso ou encarcerado arbitrariamente. Ninguém poderá ser privado de sua liberdade, salvo pelos motivos previstos em lei e em conformidade com os procedimentos nela estabelecidos.
§2. Qualquer pessoa, ao ser presa, deverá ser informada das razões da prisão e notificada, sem demora, das acusações formuladas contra ela.
§3. Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência e a todos os atos doprocesso, se necessário for, para a execução da sentença.
§4. Qualquer pessoa que seja privada de sua liberdade, por prisão ou encarceramento, terá o direito de recorrer a um tribunal para que este decida sobre a legalidade de seu encarceramento e ordene a soltura, caso a prisão tenha sido ilegal.
Artigo 10 §1. Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa humana.
Artigo 13 Um estrangeiro que se encontre legalmente no território de um Estado-parte no presente Pacto só poderá dele ser expulso em decorrência de decisão adotada em conformidade com a lei e, a menos que razões imperativas de segurança nacional a isso se oponham, terá a possibilidade de expor as razões que militem contra a sua expulsão e de ter seu caso reexaminado pelas autoridades competentes, ou por uma ou várias pessoas especialmente designadas pelas referidas autoridades, e de fazer-se representar com este objetivo."
CONCLUSÃO
Diante do exposto, apresentamos, como presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados do Brasil, ao Excelentíssimo Senhor Secretário-Geral e Alto Representante para Política Externa e Segurança Comum da União Européia, bem como ao Parlamento Europeu, por intermédio de sua Comissão de Direitos Humanos, com o respeito devido e a firmeza necessária, nosso protesto contra as violações de direitos humanos citadas.
Apelamos às autoridades da União Européia, para que criem meios de assegurar que a implementação de suas medidas de controle de imigração e acesso de estrangeiros transcorram nos limites dos instrumentos internacionais de direitos humanos.
Informamos, ainda, que esta Comissão passará a acompanhar, de forma mais sistemática, o tratamento atribuído aos brasileiros nos aeroportos da Espanha, no sentido de verificar a eventual necessidade de proposição de iniciativas legítimas nos organismos internacionais apropriados, inclusive junto aos sistemas internacionais de direitos humanos.
Solicitamos que seja informada a esta Comissão eventuais ações por parte da União Européia a respeito do tema tratado nesta Reclamação.
Brasília, 11 de março de 2007.
Atenciosamente,
Deputado POMPEO DE MATTOS
Presidente