Especialistas apontam problemas do sistema prisional brasileiro
Nesta terça-feira (06), o Cedes reuniu deputados e representantes do governo federal, de estados, do Conselho Nacional do Ministério Público e da Ordem dos Advogados do Brasil para discutir o sistema prisional. Os debatedores foram unanimes em apontar a necessidade de reinserir o detento na sociedade depois da pena. Eles também rebateram, com dados, a sensação de que há impunidade no país.
Realidade brasileira
O Brasil é o quarto país do mundo em número de presos e o único desses quatro em que o número só aumenta. Em 1990, o país tinha 90 mil presos. Hoje são 607 mil. “Banalizamos o uso de prisões”, disse Valdirene Daufemback, diretora de Políticas Penitenciárias do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça. Para ela, a finalidade do sistema prisional deveria ser a inclusão social dos presos. “Atualmente, o sistema se preocupa mais com o passado, ou seja, mais com o que o preso fez do que com o futuro”, disse.
Ela manifestou preocupação principalmente em relação ao aumento do número de mulheres presas, que é de 567% desde o ano 2000. A maioria das detentas foi presa por tráfico de drogas. Segundo a diretora, a prisão das mulheres desestrutura famílias inteiras, o que facilita a reprodução das condições que resultam no aumento da criminalidade.
Capacitação
Os debatedores apresentaram dados que mostram a crise no sistema penitenciário, mas também mostraram que há bons exemplos no setor, como o de Santa Catarina. O estado tem um déficit de 4,7 mil vagas no sistema prisional, que abriga 17,8 mil presos. Nos últimos quatro anos, o estado, que tem prisões consideradas modelo no país, investiu em educação dos presos e capacitação dos agentes penitenciários. Mais de mil detentos se formaram pelo Pronatec e, no ano passado, 1,7 mil se inscreveram para disputar vagas no Enem – Exame Nacional do Ensino Médio.
Edemir Alexandre Camargo Neto, diretor do Sistema Penitenciário de Santa Catarina, disse que, nesse período, o número de fugas caiu de 525 para 140, assim como o de evasão dos presos que cumprem pena em regime semi-aberto e aberto. “Foi difícil convencer os gestores de que fatores como educação e formação profissional são importantes para diminuir a violência”, disse. A mudança de mentalidade foi facilitada pela criação da Academia de Justiça e Cidadania, que formou 4,7 mil servidores. A capacitação dos servidores, principalmente dos agentes penitenciários, foi apontada como um dos principais fatores para que o sistema prisional passe a ressocializar o preso.
Existe, no Ministério da Justiça, a proposta de criação do cargo de Oficiais de Execução Penal no lugar dos atuais agentes penitenciários – mas a medida depende de emenda à Constituição.
Segurança máxima
Apesar de ter apenas quatro estabelecimentos prisionais (Catanduvas-PR, Porto Velho-RO, Mossoró-RN e Campo Grande-PB), o Sistema Penitenciário Nacional, formado por penitenciárias de segurança máxima, é considerado um exemplo de excelência nesse quesito. “Os presos têm direito à assistência à saúde, nunca houve fugas, nunca foi encontrado um celular nas celas e os agentes penitenciários são respeitados nas cidades”, afirmou Valquíria Souza Teixeira de Andrade, diretora do Sistema Penitenciário Federal (Depen). O sistema, porém, foi criado para abrigar presos provisórios, de maneira complementar ao dos estados.
Mais Pessoal
Marcos Aurélio Sloniak, diretor da Escola Penitenciária do Distrito Federal, afirmou que é preciso mudar a cultura do agente penitenciário: “O foco não pode ser só a segurança e a disciplina”. Para ele, o servidor responsável pela guarda dos presos tem que entender que a reintegração social do detento, com assistência do Estado, é uma das principais maneiras de diminuir os índices de violência.
Em Brasília são 14,7 mil detentos para 7 mil vagas. O déficit ficou mais grave a partir de 2005. De lá para cá, o número de presos duplicou. Além da superpopulação carcerária, outro problema em Brasília é que o número de agentes não é suficiente para viabilizar mecanismos de ressocialização, como educação nos presídios.Os dados foram fornecidos por Alexandre Vieira de Queiroz, da Coordenação de Acompanhamento do Sistema Carcerário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). “Em Brasília, há situações em que 23 agentes cuidam de 3 mil presos. Como você vai levar educação para o sistema com esse efetivo?”, perguntou.
Para Queiroz, o sistema prisional brasileiro, além de caro, não recupera os detentos. “Temos que buscar soluções alternativas”, disse. Ele citou projeções que indicam que, em 2022, o Brasil terá 1 milhão de presos. “E em 2075, se continuar neste ritmo, um em cada dez brasileiros estará preso, o que é evidentemente inviável”, concluiu.
Penas alternativas
As más condições de estabelecimentos penais pelo país também foram mencionadas como um dos fatores que dificultam a ressocialização e reforçam a necessidade de penas alternativas.
De acordo com o representante da OAB, 700 detentos vivem em contêineres no Pará. No Paraná, um terço dos presos fica encarcerado em delegacias. “Muitas vezes a pena alternativa pode ser mais benéfica”, disse Queiroz.
O advogado Gustavo do Vale Rocha, conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público, apontou outro fator responsável pelo índice de criminalidade no país, ao mesmo tempo em que complica a gestão do sistema prisional: o número de presos que não deveria estar nas prisões.
Dos mais de 600 mil detentos do país, 40% são presos provisórios, ou seja, estão aguardando julgamento. E 40% destes devem ser condenados a regime aberto ou absolvido. “O encarceramento não diminui a violência. Não há condições de ressocialização na maioria dos presídios, e o número de prisões só aumenta porque o clamor público exige cada vez mais prisões”, enfatizou.
Os trabalhos do Centro de Estudos e Debates Estratégicos (Cedes) se transformam em proposições legislativas ou recomendações enviadas ao governo federal – como já aconteceu com estudos relativos ao petróleo da camada do pré-sal, programa espacial brasileiro, terras raras, biodiesel, dívida pública, TV digital e outros.
Fonte: Agência Câmara Notícias
Reportagem - Antonio Vital
Edição - Luciana Cesar
Centro de Estudos e Debates Estratégicos
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