Documento de Referência da Consultoria Legislativa
DIRETORIA LEGISLATIVA
CONSULTORIA LEGISLATIVA
ASSUNTO: CRIAÇÃO DE ESTADOS
CONSULTOR: Márcio Silva Fernandes
DATA: AGOSTO de 2011
CRIAÇÃO DE ESTADOS
1) INTRODUÇÃO E HISTÓRICO
O debate acerca da criação de novos Estados no Brasil cresce no momento em que se completam vinte e três anos desde a última alteração na divisão política do país, ocorrida com a promulgação da Constituição Federal em 1988.
A nova Carta Política criou o Estado de Tocantins, pelo desmembramento da parte ao norte do Estado de Goiás (art. 13 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT), além de Roraima e Amapá, pela transformação dos antigos territórios federais em novos Estados (art.14 - ADCT).
Anteriormente, a Lei Complementar nº 31/77 havia criado o Estado de Mato Grosso do Sul, desmembrando parte do território pertencente ao Estado de Mato Grosso.
Dessa forma, o processo de desenvolvimento do Brasil ocorrido desde a promulgação da Constituição em 1988 tem levado parcelas de alguns Estados a buscar autonomia, criando um novo Estado a partir do desmembramento de parte de outra unidade federativa. Os defensores da divisão esperam, assim, acelerar o desenvolvimento nas áreas desmembradas em relação ao Estado original.
2) VANTAGENS E DESVANTAGENS DA CRIAÇÃO DE NOVOS ESTADOS
A criação de novos Estados no Brasil encontra argumentos favoráveis e contrários, de modo que cada caso deve ser analisado individualmente a fim de se verificar se tal criação será benéfica ou não à população que pretende se emancipar.
Para os que argumentam favoravelmente à criação de novos Estados, as grandes extensões territoriais de algumas unidades federativas, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste, dificultam o desenvolvimento do Estado e geram mais desigualdades em relação aos Estados mais desenvolvidos do Sul e Sudeste.
Tais dificuldades decorrem da concentração da população na capital, que se vê obrigada a prestar um grande contingente de serviços públicos a seus habitantes, enquanto grandes áreas no interior permanecem abandonadas pela administração pública estadual. As grandes distâncias limitam a prestação de serviços à população local e a implementação de ações de interiorização e de desenvolvimento.
A criação dos novos Estados incentivaria ainda o povoamento de suas regiões mais distantes, permitindo melhor distribuição da população pela área desmembrada. Exemplos de regiões afastadas que se beneficiariam são as localizadas em faixas de fronteira.
Além disso, a criação de novos Estados tende a melhorar a representação política, tanto em nível estadual quanto federal, na medida em que os deputados e senadores eleitos representarão uma extensão territorial menor e poderão trabalhar mais proximamente à população, fortalecendo a democracia.
Por outro lado, algumas desvantagens da criação de novos Estados devem ser levadas em consideração, sobretudo em relação ao aumento dos gastos públicos decorrentes da implantação da máquina administrativa que irá funcionar na nova unidade federativa. Estimativas constantes de estudo realizado pelo IPEA apontam para um valor de R$ 832 milhões anuais, associados apenas ao custo fixo de manutenção de um Estado no Brasil. Há, ainda, custos associados ao tamanho da população e à produção existente no Estado.
Apesar das limitações descritas no art. 235 da Constituição, a implantação de um novo Estado consumirá grande volume de recursos com a contratação de servidores públicos e construção de prédios, entre outros gastos. Por outro lado, investimentos necessários em rodovias, escolas e hospitais, por exemplo, tendem a ser protelados em um primeiro momento, ante a necessidade de implantar a estrutura administrativa.
Além disso, a criação de um novo Estado implicará em nova repartição das receitas da União já existentes, por meio do Fundo de Participação dos Estados, reduzindo, em consequência, a participação dos demais, já que o total permanecerá o mesmo.
Faz-se necessário verificar, ainda, a viabilidade do novo Estado, mediante análise das possibilidades de arrecadação própria de receitas em confronto com o volume de gastos previstos, de modo a garantir-se que a nova unidade federativa reunirá condições para manter-se, independentemente de transferências externas do governo federal, preservando-se, dessa forma, a sua autonomia.
3) PROCEDIMENTO PARA A CRIAÇÃO DE NOVOS ESTADOS
O art. 18, §3º, da Constituição Federal, norteia a criação de novos Estados, ao estabelecer que "os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar."
A criação de novos estados pode decorrer da incorporação de um Estado por outro, do desmembramento de parte de um Estado para anexação a outro Estado ou, o que é mais comum, da subdivisão de um Estado em duas ou mais partes, que obtêm autonomia.
Dessa forma, o primeiro passo para se criar um novo Estado corresponde à realização de um plebiscito junto à população diretamente interessada.
A convocação do plebiscito dá-se pela aprovação, em ambas as Casas do Congresso Nacional, de um decreto legislativo nesse sentido. O projeto de decreto legislativo deve ser apresentado por iniciativa de um terço, no mínimo, dos Deputados ou dos Senadores, conforme determinação do art. 3º da Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998.
Uma vez aprovado o decreto legislativo, o Presidente do Congresso Nacional dará ciência à Justiça Eleitoral com jurisdição no Estado atingido, para que seja marcada a realização de plebiscito junto à população diretamente interessada, bem como sejam expedidas as normas necessárias.
Segundo o art. 6º da Lei nº 9.709/98, "entende-se por população diretamente interessada tanto a do território que se pretende desmembrar, quanto a do que sofrerá desmembramento; em caso de fusão ou anexação, tanto a população da área que se quer anexar quanto a da que receberá o acréscimo". Ou seja, todo o território do Estado que sofrerá o desmembramento deverá ser consultado. Esse dispositivo foi recentemente julgado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, que considerou que mesmo a população da área que permanecerá no antigo Estado deve ser consultada, pois também ela será atingida pela subdivisão.
O resultado da consulta popular será aferido por maioria simples da população consultada e proclamado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Sendo o resultado favorável à criação do novo Estado, o projeto de lei complementar respectivo será proposto perante qualquer das Casas do Congresso Nacional, sendo revisado pela outra posteriormente e encaminhado à sanção presidencial.
Como manda o art. 48, VI, da Constituição Federal, será ouvida a Assembleia Legislativa do Estado que sofrerá alteração territorial, devendo tal audiência ser realizada pela Casa do Congresso Nacional em que se iniciar o projeto de lei complementar. Além da audiência dos seus membros, a Assembleia Legislativa encaminhará ao Congresso Nacional detalhamentos técnicos concernentes aos aspectos administrativos, financeiros, sociais e econômicos da área geopolítica afetada.
O Congresso Nacional, ao apreciar o projeto de lei complementar que cria o novo Estado, não se vincula nem ao resultado favorável do plebiscito nem à opinião apresentada pela Assembleia Legislativa do Estado afetado.
O projeto de lei complementar deverá disciplinar as questões tratadas no art. 3º da Lei Complementar nº 20, de 1974. Cabe frisar que algumas normas dessa Lei Complementar não foram recepcionadas pela Constituição de 1988, como a que dava ao Presidente a prerrogativa de nomear Governador ou a que autorizava o Governador do novo Estado a editar decretos-lei.
O novo Estado deverá obedecer sempre às limitações impostas pelo art. 235 da Constituição Federal nos primeiros dez anos. Algumas normas obrigatórias a serem obedecidas dizem respeito ao número de deputados que comporão a Assembleia Legislativa, ao número máximo de Secretarias de Governo, ao número de membros do Tribunal de Contas e do Tribunal de Justiça do Estado, à forma de provimento dos cargos de desembargador, entre outras.
Por força do disposto no art. 234 da Constituição Federal, é vedado à União assumir, em decorrência da criação de Estado, encargos referentes a despesas com pessoal inativo e com encargos e amortizações da dívida interna ou externa da administração pública, inclusive da indireta.
Aprovada a lei complementar mencionada, caberá ao Tribunal Superior Eleitoral marcar as primeiras eleições para os cargos de Governador, Vice-Governador, Deputados Federais e Estaduais e Senadores do novo Estado.
Caberá aos primeiros membros eleitos para a Assembleia Legislativa exercerem o papel de constituintes, aprovando e promulgando a Constituição do novo Estado.
4) PROPOSTAS DE CRIAÇÃO EM TRAMITAÇÃO NA CÂMARA DOS DEPUTADOS
Encontram-se em tramitação vários projetos de decreto legislativo na Câmara dos Deputados tendo por objetivo a convocação de plebiscito sobre a criação de novos Estados ou de Territórios Federais, pelo desmembramento de parcelas de Estados existentes.
Entre as unidades federativas com proposta de subdivisão, encontram-se o Maranhão (criação do Estado do Maranhão do Sul - PDC 497/2001), Mato Grosso (criação dos Estados do Araguaia e do Mato Grosso do Norte - PDC 49/2003), Bahia (criação do Estado do Rio São Francisco - PDC 631/98 e PDC 355/11), Amapá (criação do Território Federal do Oiapoque - PDC 1097/2001), Piauí (criação do Estado do Gurguéia - PDC 439/94) e Amazonas (criação dos Territórios Federais do Rio Negro, do Juruá e do Solimões - PDC 725/2000).
Ressalte-se ainda a aprovação recente dos Decretos Legislativos nºs 136 e 137, ambos de 2011, que convocam plebiscitos sobre a criação, respectivamente, dos Estados do Carajás e de Tapajós, a serem desmembrados do Estado do Pará.
Material atualizado até a data da publicação (05/09/2011).