Morro da Providência: relatório destaca uso indevido de obra

15/08/2008 09h00

Um mês depois de visitar o Rio de Janeiro para acompanhar o envolvimento de militares do Exército na morte de três jovens do Morro da Providência — entregues a traficantes de um morro rival em junho — os deputados Raul Jungmann (PPS-PE) e Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ) apresentaram ontem na Câmara suas impressões sobre o caso. Enviados pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, os dois parlamentares e o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) condenaram o que definiram como "utilização eleitoreira" de recursos orçamentários e o emprego das Forças Armadas como polícia, além de reivindicar o pagamento de indenização para as famílias das vítimas.

Apesar do tom enfático do documento, o relator Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ) não pediu responsabilizações no caso. Diz ter feito "um relatório objetivo, preciso, de análise de todos os fatos e conclusões". O parlamentar justificou ainda que o documento será encaminhado para "quem tem competência" para atribuir responsabilidades, mas não deixou de alfinetar o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ). O texto sugere utilização eleitoreira de emenda parlamentar na obra do programa Cimento Social. "Houve clara destinação ilegítima de recursos orçamentários com fins eleitorais para beneficiar a campanha do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ)", pontua o primeiro dos cinco itens apresentados na conclusão.

O relatório destaca ainda a necessidade de melhor definição do papel das Forças Armadas e indica a proibição, por meio de lei complementar, do emprego das Forças Armadas em atividades de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) de forma que se confundam com o poder de polícia do estado. "Para que isso não ocorra é fundamental que se regulamente o uso das Forças Armadas", explicou Raul Jungmann. Segundo o deputado, depois do recesso um grupo de trabalho da comissão vai apresentar uma sugestão de regulamentação da GLO. "Essa questão nunca foi devidamente e precisamente regulamentada", observou.

Crivella é candidato a prefeito do Rio e, em resposta às críticas, afirmou que é um "equívoco" atribuir caráter eleitoreiro às obras, uma vez que foram os ministros Marcio Fortes, das Cidades, e Dilma Rousseff, da Casa Civil, que definiram a obra como necessária. O senador também lembrou que a primeira fase não recebeu verba de emenda parlamentar e o que existe, na verdade, é uma emenda de R$ 20 milhões da bancada do estado para a segunda fase do empreendimento — que foi interrompido depois da trágica morte dos jovens.

CONCLUSÕES DO RELATÓRIO DOS DEPUTADOS DA COMISSÃO DE SEGURANÇA:

Utilização eleitoreira de recursos orçamentários
# Teria ocorrido clara destinação ilegítima de recursos orçamentários com fins eleitorais para beneficiar a campanha do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ)

Definição do papel das Forças Armadas
# É preciso proibir, por meio de lei complementar, o emprego das Forças Armadas em atividades de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) de forma que se confundam com o poder de polícia, atribuição do Estado

Emendas parlamentares
# É preciso que se criem mecanismos para impedir que haja desvio da finalidade estrita das emendas, evitando que atendam interesses econômicos particulares

Competência da justiça comum federal
# Embora tenha sido garantida no caso do Morro da Providência, é preciso explicitar legalmente que em caso de crime comum dos integrantes das Forças Armadas, os militares sejam julgados pela Justiça Federal

Indenização das famílias das vítimas
# A União precisa adiantar a indenização às famílias atingidas pelos atos ilícitos de seus agentes, mesmo estando em curso ações de indenização

Fonte: Correio Braziliense