Comissão debate o atendimento às vítimas do contraceptivo Essure no Brasil
A Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres promoveu, nesta segunda-feira (16), uma audiência pública para tratar do atendimento das mulheres brasileiras vítimas do dispositivo anticoncepcional Essure. O método contraceptivo, que é definitivo, foi implantado em diversas pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) como alternativa à cirurgia de ligadura das trompas.
A presidente da Comissão, Elcione Barbalho (MDB-PA), abriu a reunião: “É um absurdo essa situação. Muitas mulheres estão sofrendo com a utilização desse contraceptivo. Este é um assunto que precisamos discutir com profundidade. Precisamos fazer mais por essas mulheres que tanto precisam da nossa ajuda”.
No Brasil e em diversos países, mulheres que utilizaram o Essure passaram a relatar efeitos colaterais graves como deslocamento e expulsão do dispositivo, gravidez extrauterina (fora do útero), dores, sangramentos intensos, alergias, desmaios, perda de libido, danos à saúde mental, entre outros.
Aqui, a maioria das pacientes estão concentradas nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Pará, Tocantins e no Distrito Federal. De acordo com o Ministério da Saúde, a decisão de utilização do método aconteceu por parte dos estados, de forma independente.
"O Ministério da Saúde não implantou este método na nossa rede SUS nacional. Este método foi implantado de forma independente por alguns estados da federação. Porém, não estamos obstantes dessa discussão - a primeira tarefa foi emitir uma nota técnica que traz as recomendações sobre os possíveis efeitos adversos, além do cuidado e monitoramento das pacientes que utilizam o Essure", afirmou Antônio Rodrigues Braga Neto, diretor do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas do Ministério da Saúde (Dapes/MS).
As vítimas
A representante da Associação de Mulheres Vítimas do Essure no Brasil, Kelli Luz, afirma que as vítimas não foram informadas sobre as desvantagens do dispositivo e que as pacientes assistiram a palestras antes de optarem pela utilização. De acordo com Luz, nas palestras foram relatados apenas os benefícios da implantação: procedimento simples, rápido e sem a necessidade de internação ou afastamento das atividades cotidianas.
Presidente da Associação de Mulheres Vítimas do Essure no Brasil, Kelli Luz - Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
"Este é um tipo de laqueadura. O Essure é inserido pelo canal vaginal e nas palestras nos foi dito que não seria necessária anestesia, corte ou repouso. Essas mulheres que usaram o Essure são da periferia, sustentam suas famílias e não poderiam ficar afastadas de seus trabalhos, por isso escolheram esse método. Na época que foi utilizado aqui, já estavam ocorrendo problemas graves nos Estados Unidos", relatou Kelli.
Para a representante das vítimas, houve descaso por parte das autoridades que decidiram pela compra e distribuição do contraceptivo mesmo com pacientes estadunidenses relatando sofrer por efeitos colaterais:
A retirada do Essure precisa ser feita através de cirurgia de histerectomia parcial ou completa, que inclui a retirada das trompas e do útero. De acordo com Kelli Luz, as pacientes aguardam atendimento pelo sistema público de saúde para que possam passar pela cirurgia, mas encontram dificuldades: “Os médicos pedem exames caros e que não são oferecidos pela rede pública. As mulheres ficaram debilitadas, não conseguem mais trabalhar, perderam seus casamentos. Além disso, somos ridicularizadas e culpabilizadas por termos ‘escolhido’ o método”.
Acompanhamento
A subsecretária de Atenção Integral à Saúde da Secretaria de Estado da Saúde do Distrito Federal, Marina da Silveira Araújo, afirmou que o Centro Especializado de Saúde da Mulher (Cesmu) retomará o atendimento das mulheres que utilizam o Essure no DF. De acordo com Marina, o primeiro acolhimento será feito pelo Cesmu, com atendimento multidisciplinar, onde serão feitos os encaminhamentos.
"Se houver a necessidade de uma atenção especializada para a retirada do dispositivo, sendo este o desejo da mulher e a indicação por parte dos médicos, vistos os efeitos colaterais, elas serão encaminhadas para as unidades regionais da saúde. O problema é realmente sério. As vítimas precisam de apoio não só médico, mas também psicológico e precisam ser acolhidas e reintegradas na sociedade", esclareceu Marina.
Segundo a defensora pública Rita Lima, em um primeiro levantamento da Defensoria Pública do Distrito Federal, foram pelo menos dois mil casos de implantação do Essure na unidade federativa. Os casos chegaram à defensoria quando as mulheres passaram a enfrentar dificuldade de atendimento pela rede pública.
"Temos recebido relatos de complicações fisiológicas a partir da implantação do dispositivo que vão desde alteração no fluxo menstrual até perfuração de órgãos e a necessidade de cirurgia de histerectomia. O que, inevitavelmente, afeta a saúde mental das mulheres. Nos preocupa no DF a demora no agendamento dos procedimentos, que se mostram necessários em razão dos efeitos colaterais enfrentados pelas mulheres", apontou a defensora.
Rita, declarou, ainda, que falta atendimento humanizado às mulheres que chegam aos consultórios: “Não podemos admitir que as mulheres continuem a ser atendidas como se fossem as culpadas por uma escolha que fizeram. Quando tratamos da relação que envolve estado e cidadão, não podemos atribuir responsabilidade às usuárias do sistema de saúde".
Texto: Lanna Borges