Economia verde no Brasil é viabilizar uma agricultura sustentável

Mercedes Bustamante é uma das autoridades brasileiras em cerrado. Professora da Universidade de Brasília, atualmente cedida para o Ministério da Ciência e Tecnologia, e membro do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), ela diz que não se pode pensar em transição para uma economia verde no Brasil sem considerar a agricultura. No seu entender, um país cuja economia está baseada fortemente no cultivo de gêneros precisa criar mecanismos para cultivar sem degradar o meio ambiente. Nesta entrevista ela diz como e conta qual é a sua expectativa para a Rio + 20, em junho.
02/05/2012 11h59

O Globo

Economia verde no Brasil é viabilizar uma agricultura sustentável

"Não se pode pensar em economia verde sem considerar a agricultura", destaca Mercedes.

O GLOBO: Como será sua participação na Rio 20?

MERCEDES BUSTAMANTE: Estou cedida ao MCT para organizar uma exposição sobre os diferentes biomas brasileiros, que será montada no Pier Mauá. Ela faz parte da programação paralela da conferência e vai mostrar as riquezas dessas regiões e os desafios para preservá-los. Vou participar também de um fórum de cientistas, que será realizado na PUC, no dia 12 de junho. Vou falar sobre Mudanças Climáticas, focando em processos de mitigação.

O GLOBO: A senhora diz que a situação do cerrado ilustra bem o grande desafio que a humanidade tem pela frente. Por que?

MERCEDES BUSTAMANTE: No cerrado há uma agricultura de larga escala, a região é fronteira agrícola e é também uma área chave para a produção de biocombustível. Ou seja, é um bioma necessário para o desenvolvimento econômico do país e para garantir a segurança alimentar da população, que tem um enorme potencial para promover a inclusão social pela grande quantidade de empregos que pode gerar, mas que tem uma biodiversidade que precisa ser preservada pela riqueza e pelos serviços ambientais que oferece (como, por exemplo, o equilíbrio do ciclo hidrológico do país). Como continuar plantando, preservando as riquezas e serviços naturais, e promovendo a inclusão social, é o dilema do Brasil, quando se trata de cerrado, e de muitos países pelo mundo.

O GLOBO: Neste sentido, qual seria o peso do cerrado em um projeto de transição para uma economia verde? 

MERCEDES BUSTAMANTE: Quase toda a área do cerrado já foi convertida em lavoura. E não se pode falar em economia verde no Brasil sem considerar a agricultura, que é base da economia do país. Portanto, o cerrado tem um peso enorme. É preciso, então, pensar em mecanismos que favoreçam o cultivo sem degradar o meio ambiente. Assim, economia verde para o Brasil é viabilizar o binômio produção-conservação. Tornar a agricultura mais sustentável e, ao meso tempo, criar indústria de beneficiamento para a agregar valor à produção e gerar novos empregos. 

O GLOBO: Como é possível tornar a produção agrícola mais sustentável? 

MERCEDES BUSTAMANTE: Mudança do uso da terra. Não abrir novas áreas para lavouras, otimizar e aproveitar as que já existem, fazendo manejo do solo. Ou seja, recuperando áreas degradadas, criando sistemas multifuncionais de uso do solo (como, por exemplo, sistemas de agroflorestas ou plantios em regiões de criação de animais). 

O GLOBO: A senhora conhece o Rascunho Zero, documento preliminar feito pelas Nações Unidadas para a Rio + 20?

MERCEDES BUSTAMANTE: Sim. Acho que é um documento em processo de produção, que deve ser aperfeiçoado. Mas os princípios de uma economia de baixo carbono estão lá, temos é que encontrar as ferramentas para implementá-los.

O GLOBO: O que a senhora espera da Rio + 20? 

MERCEDES BUSTAMANTE: Os impactos ambientais das atividades humanas são evidentes. Temos informações científicas comprovando. A conferência deve ser um fórum, sobretudo, de tomada de decisão para criar mecanismos para enfrentar as questões ambientais e reduzir a desigualdade social.

Fonte: Jornal O Globo

Reportagem: Martha Neiva Moreira