Nadadora fala sobre corte dos Jogos Olímpicos e suspeita de premeditação
Renato Araujo/Câmara dos Deputados
Ana Carolina Vieira, ao participar da audiência por videoconferência, negou ter saído na véspera da prova ou ter sido desrespeitosa com a comissão técnica em Paris
A Comissão do Esporte ouviu nesta terça-feira, 10/12, a nadadora Ana Carolina Vieira, cortada da delegação brasileira dos Jogos Olímpicos de Paris 2024, seus advogados - Patrícia Cristina de Britto e Octávio Rolim, e Milton Jordão, advogado da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA). Todos participaram por meio de videoconferência.
O objetivo do deputado Douglas Viegas (União-SP), autor do requerimento para a realização da audiência pública, era entender o caso e discutir o direito à ampla defesa e ao contraditório dos atletas brasileiros. “Desde o momento em que soube do corte, isso mexeu comigo. Eu já estive no lugar dela. Eu não conseguia encontrar motivos que justificassem a decisão. Quanto mais via como tudo estava sendo conduzido, mais sentia indignação. Tirar os Jogos Olímpicos de uma atleta que conseguiu índice olímpico por mérito próprio para disputar as olimpíadas? Eu não consigo entender”, afirmou Viegas.
No dia 28 de julho de 2024, a Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA) e o Comitê Olímpico do Brasil (COB) emitiram comunicado conjunto informando que a atleta estava sendo cortada dos Jogos Olímpicos por ter saído da Vila Olímpica sem autorização, acompanhada do também nadador Gabriel Santos, na sexta-feira, 26/07. Além disso, Ana Carolina teria contestado, de forma agressiva e desrespeitosa, uma decisão técnica da seleção brasileira de natação. Enquanto Gabriel foi apenas advertido e pode disputar os Jogos, Ana Carolina embarcou no mesmo dia, domingo, de volta para o Brasil. Para a atleta e seus advogados, o corte pode ter sido planejado.
A nadadora disse aos parlamentares que saiu da Vila Olímpica na quinta-feira, 25/07, e que não tinha nenhuma prova na sexta-feira, apenas no sábado, e que é casada com Gabriel Santos desde 2020. O casal teria informado aos profissionais do Time Brasil o desejo de sair, perguntado qual o transporte mais seguro e feito o trajeto de ida e volta em veículos disponibilizados pela própria organização.
Ana Carolina afirmou ainda que em nenhum momento teria sido desrespeitosa com a comissão técnica. Disse que foi chamada na sexta-feira, com as outras nadadoras, para uma reunião sobre a mudança de uma integrante do nosso revezamento um dia antes da prova e que deram a oportunidade para as atletas se pronunciarem e que ela e as demais se manifestaram. “Dei minha opinião, assim como as outras meninas, no sentido de que aquela alteração poderia afetar diretamente a chance do Brasil conquistar uma final e, consequentemente, disputar uma medalha olímpica. Quem diria que ao defender a boa performance do meu país eu estaria caindo em um plano pré-moldado para mim e assinando o meu desligamento dos Jogos?”, declarou a nadadora.
Para a advogada Patrícia Cristina de Britto, que representa a atleta, nem pessoas acusadas de crimes hediondos são privadas do devido processo legal e do direito à ampla defesa. O que seria mencionado, segundo ela, até no termo de punição imposto à Ana Carolina, que menciona o Artigo 60 do Estatuto do COB (“...respeitados o contraditório e a ampla defesa”).
“Ela foi lá na quinta-feira, porque na sexta-feira não tinha prova. Foi na sexta-feira que fizeram reunião, momento em que a Ana e outras atletas questionaram em defesa do próprio time. No sábado, nadou brilhantemente. Nesses três dias, em momento algum, falaram em advertência por conta da foto ou da reunião. No domingo, chamaram a Ana foi chamada e disseram você está sendo punida e expulsa. Na nota divulgada disseram que ela teria saído na sexta-feira e que ela teria sido desrespeitosa”, declarou a advogada, complementando que o marido de Ana Carolina teria questionado o chefe da equipe brasileira de natação, Gustavo Otsuka, sobre a data da saída, e ele teria reconhecido que estava errada. Para a defesa da nadadora, o erro pode ter sido proposital: “Porque em outras reportagens, ele fala que os atletas tem que ter responsabilidade quando no dia seguinte vai ter competição. Ora, a Ana saiu na quinta, na sexta não tinha competição... mas, no sábado tinha! Por isso a nota saiu dizendo que ela saiu na sexta, são várias perguntas sem resposta. Enquanto isso, a vida dela está destruída, seja emocional, psicológica, financeiramente. Várias empresas com as quais ela tinha contrato, todas romperam”.
O presidente do COB, Paulo Wanderley, e o presidente da Comissão de Atletas do COB, Fabiano Peçanha, foram convidados a participar da audiência pública, porém não confirmaram presença nem encaminharam representantes. Já o presidente da CBDA, Diego Albuquerque, no cargo desde novembro, designou o advogado Milton Jordão como representante.
“A respeito do episódio, essa gestão não tem nenhuma participação. Não podemos, em hipótese alguma, deixar de vir aqui. O que se apurou até aqui é que se tratou de decisão de ordem disciplinar. Óbvio que se pode com a contribuição dos atletas, discutir isso, se construir um modelo que atenda a esses anseios, que os atletas possam ser ouvidos”, disse Jordão, complementando que não haveria, por parte da CBDA, nenhum tipo de perseguição em relação à atleta.
“O que a CBDA quer, é que ela, que é uma atleta valorosa, possa voltar a competir, a trazer alegrias”, afirmou o advogado da confederação, destacando ainda que a CBDA tem um papel mais secundário no caso, em relação ao COB, dado o pouco tempo do novo presidente no cargo.
Depois de ouvir todas as participações, o deputado Luiz Lima (PL-RJ), ele próprio nadador com duas Olimpíadas na carreira (Atlanta 1996 e Sydney 2000), destacou os resultados no histórico da nadadora – disponível no site da CBDA, se mostrou indignado com o tratamento recebido pela nadadora e com a ausência de representantes do COB na audiência.
“Ela foi expulsa sem direito de defesa. Ela não roubou, não matou, não usou drogas, não bateu no adversário, uma atleta limpa que foi tirar foto com o marido e que, mesmo que tivesse um ato de indisciplina, isso nunca poderia ter sido levado à imprensa antes de julgamento. Foi atitude de moleque a que esses caras tiveram com a menina. Como é que uma instituição que recebe recurso público trata essa menina assim?”, disse o parlamentar.
Para Douglas Viegas, a audiência precisa ser um marco na história do esporte: “Precisamos que os atletas se sintam protegidos, eles precisam ter uma voz de defesa. Um lugar onde eles possam ser ouvidos. E o dia de hoje precisa ser um marco também para limpar o nome da atleta Ana Carolina Vieira, que foi detonado em todo o território e nas redes sociais”.