15/03 - Combate ao racismo e preconceitos
Deise Benedito, advogada e especialista em relações étnico raciais e gênero, mostrou que, para compreender os mecanismos atuais do racismo e da discriminação racial em nosso país, é necessário recorrer aos fatos históricos. Os indígenas, mesmo antes da chegada dos povos africanos, já vinham sendo escravizados. De 5 milhões, hoje são menos de 1 milhão.
Nos navios negreiros que partiam da África, as pessoas eram amontoadas. Muitas morriam antes mesmo de desembarcar no Brasil. Como George Floyd, afro-americano morto nos Estados Unidos em 2020, elas também não conseguiam respirar. As que conseguiam sobreviver eram separadas de seus familiares, vendidas, castigadas por se insurgirem. Por não quererem se adaptar a uma vida, que na verdade lhes era tirada. A existência dos quilombos vem justamente pela busca dessa liberdade, como espaços de resistência.
A atitude violenta e preconceituosa em relação à população negra foi construída ao longo de muitos anos. As fugas em busca da liberdade, por exemplo, eram transformadas em verdadeiras caçadas, com cartazes espalhados pelas cidades, identificando os escravizados como violentos e perigosos. A desconstrução dessa identidade é uma luta desde sempre para os negros - uma luta que desperta muitas reações contrárias, mas que deve continuar.
Deise descreve o papel das corajosas abolicionistas, como Esperança Garcia, a primeira mulher negra que aprendeu a ler e se tornou advogada. É de autoria dela a primeira petição ao governador contra as barbaridades infligidas aos negros. Mais tarde, destaca o primeiro senador negro, Abdias do Nascimento, que defendeu amplamente a população negra.
Nos dias de hoje, o combate às drogas se concentra nos negros, que refletem a falta de políticas públicas, em vez de perseguir os grandes traficantes em bairros nobres. Na situação de pandemia, quem mais morreu foi a população negra, justamente a que não parou: empregadas domésticas, cobradores, pedreiros. No lado oposto, pouco se vê o negro protagonista, nos bancos, consultórios.
Ao final de sua apresentação, Deise Benedito recomendou aos deputados jovens: “Analisem a história do nosso país. Olhem para os negros, os ribeirinhos, as minorias. Tenham um olhar transversal sobre essas questões. O que tem de bonito no jovem é a curiosidade, e a curiosidade é movida pela mudança”.
O convidado Geraldo Leite, consultor legislativo da Câmara dos Deputados, iniciou sua fala chamando atenção para as distintas dimensões que tornam a compreensão do racismo um verdadeiro desafio. É um tema que exige o entendimento das dimensões individual, institucional e estrutural que ele abrange.
Segundo Geraldo, o Brasil é retratado mundo afora como democracia racial, ou “paraíso mestiço”, pelas imagens de convivência entre negros e brancos nas praias e no Carnaval do Rio de Janeiro. Na prática, dados de violência escancaram acentuadas desigualdades: a maioria de homicídios ocorre entre a população negra. Ao mesmo tempo, nos cargos gerenciais e no meio político, os negros são minoria. Não se imagina um negro ocupando posições estratégicas. Como ele teve menos oportunidades, acaba tendo menos presença nesses espaços sociais, e assim fique afastado da construção de políticas de melhoria para a nação e que combatam essas desigualdades, a exemplo das leis de cotas raciais. Por ser velado, o racismo torna-se mais difícil de ser tratado.
O Brasil foi o maior território escravista e o último país da América a abolir a escravidão. A história mostra a construção do país por meio da mão de obra negra. Mesmo assim, ainda vemos leis que dificultam ainda mais a vida dessa população, diferenças salariais, naturalização e reprodução de posições sociais, entre outros elementos que ratificam a existência do racismo enraizado em nossa sociedade.
Geraldo deixou aos jovens a reflexão: o racismo não é um mero problema pessoal e moral, de preconceito, na relação entre indivíduos. É preciso compreendê-lo em todas as suas dimensões, enxergá-lo em sua inteireza e assim enfrentá-lo, para que o Brasil seja no futuro uma democracia racial, “onde pretos, indígenas, brancos, quaisquer que sejam as pessoas, sua história, sua origem, cor da pele, tenham oportunidades.”
Após tantas informações esclarecedoras, os parlamentares jovens apresentaram suas perguntas, culminando em um debate emocionante e de alto nível. Foram discutidas cotas raciais nas eleições, a cultura de senzala que se perpetua no trabalho das empregadas domésticas, as relações entre o racismo e o capitalismo, a questão estrutural que se sobrepõe à econômica, a importância de políticas públicas e o olhar sobre o tráfico de drogas como um problema de saúde pública, e não de segurança.
Vem conferir:
As próximas audiências debaterão o desenvolvimento cívico e emocional de adolescentes no sistema socioeducativo, no dia 19 de março, e as moradias populares e as pessoas em situação de rua, no dia 22 de março. Você também pode participar, enviando comentários e perguntas aos convidados! Acompanhe: https://midias.camara.leg.br/pjb/participe/