Cidades e transportes

Técnico do Ipea ressalta que transporte privado é um “desastre” para as cidades

09/07/2013 - 16:23  

Segundo o técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Carlos Henrique de Carvalho, os últimos anos têm mostrado um aumento no acesso ao transporte privado, que ficou mais barato, e uma redução da demanda de usuários por meios públicos de locomoção.

“O impacto disso é muito grande para as cidades. As classes mais baixas estão tendo acesso a um bem durável, mas do ponto de vista da qualidade de vida urbana é um desastre”, disse, durante comissão geral no Plenário da Câmara. Ele citou como problemas as mais de 40 mil mortes por ano por acidentes de trânsito, além do aumento da poluição e dos engarrafamentos cada vez maiores.

Ele foi um dos autores da nota técnica “Tarifação e Financiamento do Transporte Público Urbano”, do Ipea, que analisou o transporte público nos últimos anos. De acordo com o estudo, enquanto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação no País, teve alta de 125% entre janeiro de 2000 e dezembro de 2012, o aumento das tarifas dos ônibus foi de 192% – 67 pontos percentuais acima da inflação.

A pesquisa do Ipea evidencia que, para as famílias brasileiras mais pobres, o impacto médio do gasto com transporte público na renda domiciliar é de 13%, enquanto a média total, que inclui famílias de todas as faixas de renda, é de 3,4%. Entre 2003 e 2009, esse comprometimento foi amortecido pelo aumento geral de renda, mas, como o transporte privado ficou relativamente mais barato, grande parte do adicional de renda foi canalizada à aquisição de meios particulares de transporte.

Para a deputada Rosane Ferreira (PV-PR), o incentivo governamental em transportes privados traz prejuízo aos cidadãos com a perda de tempo, aos cofres públicos com gastos mal utilizados, e à saúde da população com a poluição atmosférica. Ela é favorável à priorização do transporte de massa com utilização de meios de transporte que não consumam energia e a substituição das fontes fósseis por renováveis.

Gestão
O coordenador da Associação Nacional dos Transportes Públicos, Antenor José dos Santos, defendeu mais atitude e gestão para viabilizar melhorias no transporte urbano. “Precisamos de atitude, gestão e ação. De leis e expertise técnica o Brasil já está bem servido”, afirmou.

Ele criticou a lógica de privilegiar os automóveis em relação a outros meios de locomoção como bicicletas ou ônibus. Santos reclamou que o Brasil tem apenas 1.500km de ciclovias, enquanto Bogotá, capital da Colômbia, possui 420km e tem mais 220km em construção, integrados ao sistema de transporte.

O coordenador da Associação Nacional dos Transportes Públicos e diretor da ONG Roda Viva, Nazareno Stanilau Affonso, defendeu a aplicação da Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei 12.587/12), que destina ao automóvel 30% da rua. Os outros 70%, de acordo com a lei, devem ser destinados aos pedestres, às bicicletas e ao transporte público.

De acordo com o ativista, as prefeituras não conseguem gerir o sistema de transporte porque estão sucateadas. “Hoje temos sistemas em perfeita condição de controlar onde está cada ônibus, mas as prefeituras não conseguem analisar esse dados” , afirmou.

Crise antiga
O presidente da Diretoria Executiva da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, Otávio da Cunha Filho, destacou que a crise no transporte vem de longa data. Segundo ele, ao longo dos anos tem sido possível observar o aumento do número de automóveis e a simultânea redução do número de ônibus circulantes. “Em 2010, 50% das pessoas se deslocaram pelo sistema público de transportes, e 50% pelo individual. Se continuarmos assim, em 2030 teremos 65% utilizando o transporte particular e apenas 35% o público”, alertou.

Ele defende um melhor aproveitamento dos recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), para que sejam transformados em projetos efetivamente eficientes em termos de mobilidade urbana. Cunha Filho é favorável ainda a priorizar os ônibus nas vias públicas e a que todos os municípios com mais de 200 mil habitantes sejam obrigados a dispor de planos de mobilidade urbana desenvolvidos com participação da sociedade.

Reportagem – Tiago Miranda e Murilo Souza
Edição – Marcos Rossi

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