Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.176, DE 5 DE JUNHO DE 2023 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.176, DE 5 DE JUNHO DE 2023

Institui o Programa Emergencial de Renegociação de Dívidas de Pessoas Físicas Inadimplentes - Desenrola Brasil e altera a Lei nº 12.087, de 11 de novembro de 2009.

EM nº 00059/2023 MF

Brasília, 5 de Maio de 2023

     Senhor Presidente da República,

     1. Submeto a sua apreciação proposta de Medida Provisória que visa instituir o Programa Nacional de Renegociação de Dívidas de Pessoas Físicas Inadimplentes - Desenrola Brasil, com o objetivo de incentivar, em caráter extraordinário, a renegociação de dívidas privadas de pessoas físicas, principalmente as de baixa renda, que não têm conseguido quitá-las em decorrência do agravamento da conjuntura econômica após a Pandemia da Covid-19, com quadro de dificuldades para obtenção de crédito e aumento significativo de pessoas inadimplentes.

     2. Nos últimos anos, o índice de inadimplência das famílias vem crescendo. Atualmente, há cerca de 70 milhões de brasileiros considerados inadimplentes, o que representa aproximadamente 42% da população adulta brasileira. Dentre os inadimplentes, quatro em cada dez famílias estão com dívidas em atraso acima de três meses. As principais dívidas com inadimplência são as de cartão de crédito, contas básicas (água, luz, gás e telefonia) e varejo.

     3. A maior parte dos inadimplentes, cerca de 43 milhões de brasileiros, está nas famílias com renda de até dois salários-mínimos. Nessas famílias se encontra o número mais expressivo dos consumidores que reportam não terem condições de pagar as dívidas já em atraso. Em dezembro do ano passado, 17,1% dos consumidores de baixa renda informaram que não conseguirão quitar as suas dívidas. Essas famílias são as que mais comprometem a renda com dívidas e precisam direcionar quase um terço da sua renda apenas para pagamento de obrigações.

     4. Ao atrasar os pagamentos, geralmente, essas pessoas têm os seus nomes inscritos nos cadastros de inadimplentes, podendo perder acesso a novos créditos ou ter esse acesso mais restrito, o que amplia as dificuldades, por exemplo, para adquirir um cartão de crédito, financiar a aquisição de itens essenciais e bens para incremento da qualidade de vida, e conseguir um empréstimo pessoal. A restrição de acesso ao crédito piora a situação do devedor e prejudica a sua recuperação financeira.

     5. Com o intuito de mudar essa realidade atual do perfil de endividamento das famílias brasileiras, principalmente as de baixa renda, propõe-se a criação do Programa Desenrola Brasil para incentivar a renegociação de dívidas, em condições que favoreçam a regularização das pessoas inscritas em cadastros de inadimplência.

     6. Para que essas dívidas possam ser abrangidas pelo Desenrola Brasil, os credores interessados deverão solicitar formalmente sua habilitação e oferecer descontos sobre a totalidade dos créditos que preencham os requisitos para o ingresso no Programa, podendo ainda excluir créditos de pequeno valor dos cadastros de inadimplentes, de acordo com parâmetros estabelecidos por ato do Ministro da Fazenda.

     7. Os devedores, por sua vez, deverão aderir ao Programa, podendo quitar os seus débitos com recursos próprios ou por meio de contratação de nova operação de crédito.

     8. Dada a dinâmica do Programa e considerando que a renegociação no Desenrola Brasil representa uma melhoria de condições de crédito, estabelece-se que a nova operação de crédito contratada com desconto no âmbito do Programa Desenrola Brasil não compromete a aferição do mínimo existencial, para fins de apuração das situações de superendividamento.

     9. As instituições financeiras deverão ser habilitadas como agentes financeiros no Programa, de acordo com as normas estabelecidas em ato do Ministro de Estado da Fazenda.

     10. O Desenrola Brasil é dividido em 2 eixos principais: Faixa 1: Operações com garantia; e Faixa 2: Renegociações com base na apuração de crédito presumido. As operações no âmbito de Desenrola deverão ser contratadas até 31 de dezembro de 2023.

     11. Poderão fazer parte do Desenrola Brasil - Faixa 1 as dívidas de natureza privada de pessoas físicas inscritas em cadastro de inadimplentes até 31 de dezembro de 2022 que tenham renda mensal igual ou inferior a dois salários-mínimos ou estejam inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico). A renda mensal referida será verificada de acordo com critérios e parâmetros definidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda.

     12. Na Faixa 1, os agentes financeiros poderão realizar renegociações com pessoas físicas inscritas em cadastro de inadimplentes, por meio de operações de crédito com garantia de cobertura de risco de inadimplência.

     13. A garantia prevista no Desenrola Brasil - Faixa 1 será oferecida pelo Fundo Garantidor de Operações (FGO), sendo limitada ao principal da dívida renegociada com o agente financeiro e ao valor de até R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por devedor. Para acessar a garantia, os agentes financeiros deverão observar os prazos, as taxas de juros e as demais condições definidas em ato do Ministro de Estado da Fazenda.

     14. Os recursos do FGO destinados ao Programa serão os disponíveis na data de publicação desta Medida Provisória para as operações de crédito de que trata a Lei nº 13.999, de 18 de maio de 2020 - FGO Pronampe, sendo destinados para a concessão de garantia das operações do Desenrola Brasil.

     15. Caso a dívida renegociada seja inadimplida, os agentes financeiros deverão cobrar a dívida em nome próprio com o mesmo método e rigor que utilizam na recuperação de créditos próprios fora do Programa Desenrola Brasil. A recuperação desses créditos correrá por conta dos agentes financeiros, que deverão empregar os melhores esforços para tanto.

     16. Após a honra da garantia pelo fundo, as instituições poderão adotar estratégia de renegociação semelhante à usualmente utilizada para créditos próprios fora do Programa Desenrola Brasil, com a possibilidade de oferecimento de descontos.

     17. Os créditos honrados e não recuperados serão leiloados pelos agentes financeiros, no prazo de até dezoito meses, contado da data da primeira parcela inadimplida, observadas as condições estabelecidas no estatuto do FGO. Os créditos não arrematados serão oferecidos novamente em leilão, no mesmo prazo, e poderão ser alienados àquele que oferecer o maior lance, independentemente do valor de avaliação. A parcela do crédito sub-rogada pelo FGO eventualmente não alienada será considerada extinta de pleno direito.

     18. Os valores não utilizados no Programa ou recuperados pelo FGO serão destinados para a garantia das operações de crédito do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).

     19. No Desenrola Brasil - Faixa 2, por sua vez, os agentes financeiros deverão oferecer a possibilidade de renegociação de dívidas também para pessoas físicas de acordo com as condições disciplinadas em ato do Ministro de Estado da Fazenda.

     20. Para esse tipo de renegociação, os agentes financeiros poderão, a partir do ano-calendário de 2024 até o ano-calendário de 2028, apurar como crédito presumido alguns tipos de créditos decorrentes de diferenças temporárias, de forma semelhante à estabelecida pela Lei nº 14.257, de 1º de dezembro de 2021, que instituiu o Programa de Estímulo ao Crédito - PEC, em caso de existência de resultados negativos (prejuízos) ou entrar em falência ou liquidação extrajudicial.

     21. Ao se alterar as características de certos tipos de créditos decorrentes de diferenças, os agentes financeiros conseguem elevar seus níveis de capital. Esse maior aproveitamento dos créditos decorrentes de diferenças temporárias e melhor tratamento prudencial ficam condicionados à concessão de empréstimos ao público-alvo do Programa. Com isso, a própria concessão de empréstimos de renegociação aumenta os índices de capital regulatório e abre espaço para uma maior oferta de crédito por parte dessas instituições.

     22. O Desenrola Brasil também poderá contemplar a renegociação de dívidas de natureza privada de pessoas físicas inscritas em cadastros de inadimplentes que não se enquadrem nas Faixas 1 e 2. Estas dívidas poderão ser renegociadas, no bojo do Programa, diretamente entre devedor e credor e sem a interveniência de agentes financeiros habilitados. Busca-se, dessa forma, maximizar os benefícios ao alcance dos devedores que participem do Desenrola.

     23. Em relação à supervisão do Desenrola Brasil - Faixa 1 e Faixa 2, caberá ao BCB fiscalizar o cumprimento, pelas instituições financeiras participantes, das condições estabelecidas para as operações de crédito realizadas no âmbito do Programa.

     24. A operacionalização de Programa de tamanho alcance e complexidade demandará serviços especializados e infraestrutura tecnológica que compreenda as seguintes etapas e serviços: i. comunicação com bases de dados do governo federal; ii. disponibilização de acesso a credores, devedores e agentes financeiros, para habilitação no Programa; iii. oferecimento de suporte aos devedores na renegociação e consolidação de dívidas, e na contratação de nova operação de crédito; iv. consolidação e atualização dos dados financeiros e de pagamentos, relativos a operações de crédito e obrigações de pagamento de pessoas físicas, incluindo cadastros em entidades gestoras de bancos de dados; v. formatação e realização de processo competitivo para a oferta dos descontos dos créditos renegociados; vi. compensação e liquidação de recursos financeiros relativos às dívidas renegociadas; e vii. integração dos sistemas de gestão do FGO.

     25. A fim de operacionalizar os serviços necessários do Desenrola Brasil, com otimização de recurso público e buscando menor risco e prazo, o FGO poderá contratar, como operadora do Desenrola Brasil, entidade com capacidade técnica para prestar serviços de liquidação e compensação, que ficará responsável pela realização das atividades listadas no parágrafo anterior.

     26. Para o desempenho de todas essas tarefas, a operadora contratada será remunerada exclusivamente pelos participantes do Programa, sendo vedada a efetuação de qualquer cobrança ao devedor. Ela deverá assegurar que as informações recebidas para fins da consolidação de dados financeiros serão utilizadas exclusivamente para operacionalização do Desenrola Brasil.

     27. Os órgãos federais deverão compartilhar com a entidade operadora dados e informações necessários à execução do Programa, observados os sigilos legais, com o intuito de verificação de critérios de elegibilidade ao Programa Desenrola Brasil, autenticação, obtenção e validação de informações relacionadas à execução do Programa, assim como de prevenção a fraudes.

     28. Caberá a ato do Ministro de Estado da Fazenda regulamentar as demais condições necessárias à implementação do Programa para dar cumprimento ao disposto nesta Medida Provisória.

     29. Em relação aos impactos fiscais da medida, frise-se que a proposta autoriza que os recursos necessários para a concessão de garantia das operações do Desenrola Brasil - Faixa 1 sejam os disponíveis na data da publicação desta Medida Provisória no FGO, de que trata a Lei nº 13.999, de 18 de maio de 2020 - FGO Pronampe. Desse modo, a operacionalização do Programa não demandará aportes adicionais de recursos públicos no referido fundo garantidor.

     30. No que diz respeito ao Desenrola Brasil - Faixa 2, em cumprimento ao disposto no art. 14, inciso I, da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal, cabe informar que a medida em tela não gera renúncia de receita em 2023 e que o Ministério da Fazenda irá considerar nas estimativas de receitas dos orçamentos dos anos 2024 a 2026 os valores estimados pelo BCB das renúncias fiscais, ou seja, R$ 19,4 milhões em 2024, R$ 7,8 milhões em 2025 e R$ 12,6 milhões em 2026. Desse modo, não há incompatibilidade da referida medida com as premissas e os objetivos da política econômica nacional definidos nos Anexos de Metas Fiscais que integrarão as respectivas Leis de Diretrizes Orçamentárias.

     31. Finalmente, quanto à urgência e relevância da medida, ambas se justificam pela necessidade de atuação tempestiva para lidar com os efeitos da inadimplência na vida de milhões de brasileiros, em particular, dos mais vulneráveis, que é a população de baixa renda. O Desenrola Brasil tem o potencial de reduzir o endividamento, facilitando a retomada do acesso ao mercado de crédito, propiciando aos brasileiros uma vida mais digna e equilibrada financeiramente e, por consequência, contribuindo para um melhor desempenho da economia.

     32. Essas, Senhor Presidente, são as razões que justificam a elaboração proposta de Medida Provisória que ora submetemos à sua elevada apreciação.

     Respeitosamente,

FERNANDO HADDAD


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 06/06/2023


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 6/6/2023 (Exposição de Motivos)