Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.065, DE 30 DE AGOSTO DE 2021 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.065, DE 30 DE AGOSTO DE 2021

Dispõe sobre a exploração do serviço de transporte ferroviário, o trânsito e o transporte ferroviários e as atividades desempenhadas pelas administradoras ferroviárias e pelos operadores ferroviários independentes, institui o Programa de Autorizações Ferroviárias, e dá outras providências.

EMI nº 00043/2021 MINFRA ME

Brasília, 20 de agosto de 2021

     Senhor Presidente da República,

     1. Submetemos à apreciação do Senhor a presente proposta de Medida Provisória, que dispõe sobre o novo marco de exploração indireta de serviços de transporte ferroviário e disciplina as atividades das administradoras ferroviárias e dos operadores ferroviários independentes.

     2. A Medida Provisória em tela pretende: desburocratizar os investimentos ferroviários privados no Brasil,por meio da positivação do instituto da autorização para exploração indireta do serviço de transporte ferroviário previsto na alínea d do inciso XII do art. 21da Constituição Federal; e aumentar a segurança jurídica do modo ferroviário, dando-se status de lei em sentido estrito à dispositivos que tratam de autorregulação ferroviária, de trânsito e de transporte ferroviários e de operações urbanísticas desempenhadas pelas administradoras ferroviárias. Ademais, dada a relevância do tema, também é instituído o Programa de Autorizações Ferroviárias - PAF,de maneira a estimular o interesse do setor privado na obtenção de autorizações.

     3. A recente calamidade pública incorrida pela pandemia de COVID-19 reforça a necessidade urgente de investimentos em infraestrutura como indutor à retomada econômica. A viabilização célere de um modelo de exploração desburocratizado que possibilite a realização de investimentos privados para a exploração econômica do serviço de transporte ferroviário propiciará novas oportunidades de trabalho, na ordem estimada de 80 (oitenta) mil novos empregos ao longo dos dez primeiros anos, em um momento de fragilidade no mercado de trabalho, consideravelmente afetado pela pandemia.

     4. Outro ponto importante a ser mencionado está relacionado ao fato de que já há três Unidades da Federação que criaram recentemente o instituto da autorização ferroviária estadual, como forma de incentivar o aumento do investimento privado em infraestrutura: Mato Grosso, Pará e Minas Gerais. Além disso, outros três Estados da Federação já sinalizam no mesmo sentido: Paraná, Mato Grosso do Sul e Pernambuco. Esse cenário reforça cabalmente a urgência da medida em nível federal, proporcionando o incentivo econômico para todos os entes da federação, além de auxiliar sobremaneira a organização e a padronização do instituto da autorização ferroviária em todo o território nacional.

     5. Atualmente, o setor ferroviário é responsável pela movimentação de 21% das cargas no país, uma proporção muito inferior à de países com dimensões continentais semelhantes. Apesar da expansão no volume de carga escoada, da melhoria na eficiência operacional e da redução dos índices de acidentes promovidos pelas concessões ferroviárias, esse modelo ficou caracterizado, na prática, pelo baixo incentivo à concorrência e pela escassez de oferta de novas infraestruturas ferroviárias, além da priorização de corredores logísticos em detrimento de trechos menos rentáveis, que foram gradativamente tornados ociosos ou mesmo abandonados.

     6. Nesse contexto, aproximadamente 30% da malha ferroviária encontra-se subutilizada ou não possui operação comercial. Em termos de extensão total, possuímos a mesma ordem de grandeza do ano de 1922, cerca de 29 mil km, incluindo-se ferrovias subutilizadas. Quando observamos apenas a extensão ferroviária em plena atividade, regredimos à 1910 com cerca de 20 mil km de trilhos em operação no Brasil. A participação do modo ferroviário na matriz de transportes brasileira é a mais baixa entre países de dimensões continentais e economias relevantes, como os Estados Unidos da América (EUA), Rússia e China. O transporte de passageiros na malha federal é meramente residual, existindo apenas para fins turísticos e em dois contratos de concessão da Vale S.A., em dissonância do que se pode observar em países desenvolvidos, onde o transporte ferroviário de passageiros tem participação modal mais significativa, principalmente porque é parcialmente financiado pelas receitas imobiliárias no entorno das estações.

     7. O novo marco que ora submetemos positiva na legislação as possibilidades de exploração de serviço de transporte ferroviário trazidas pelo artigos 21, inciso XII, alínea d, 170 e 173 da Constituição Federal, acrescentando ao já testado e restrito modelo de exploração como serviço público, que vem vigendo hegemônico desde 1955, o modelo de exploração como atividade econômica de mercado, como podemos observar de forma secular nos EUA, que possui a mais extensa e diversificada malha ferroviária do mundo, com mais de 220 mil km de trilhos instalados e 600 ferrovias privadas em operação.

     8. As inovações que ora apresentamos inspiram-se nas bem-sucedidas aberturas de mercado implementadas nos setores de telecomunicações, energia e de infraestrutura portuária, em que as outorgas por autorização pela União têm promovido importante parcela dos investimentos privados naqueles mercados.

     9. Assim, a Medida Provisória ora proposta objetiva expandir as possibilidades de exploração do serviço de transporte ferroviário, considerando a histórica dificuldade de diversificação do setor, buscando viabilizar a realização imediata de novos investimentos dada a flexibilidade inerente ao regime de exploração por autorização, inclusive para o reaproveitamento de trechos ferroviários sem operação, bem como desburocratizando a construção de infraestruturas ferroviárias de última milha, em instalações próprias, em fábricas, minerações, instalações portuárias, aeroportos, dentre outros, que sequer dependerão de contratos de concessão, permissão ou autorização, e sim, mero registro na Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, nos termos do art. 17 da Medida Provisória.

     10. E s s a inovação aumentará a capilaridade das ferrovias, pois poderá ser consorciada com as propostas trazidas na seção dos investimentos praticados por terceiros interessados nas administradoras ferroviárias. A lógica do novo marco é que o mercado possa, de forma livre, pactuar contratos voluntários entre as empresas e seus clientes e usuários para o aumento da capacidade ferroviária e obtenção de receitas complementares, sem prévia autorização da ANTT, pois a amortização de tais investimentos será uma responsabilidade do próprio mercado desenhar, sem nenhum ônus ou risco potencial para o Estado. Apenas quando o mercado identificar que não poderá amortizar totalmente o investimento nos prazos dos contratos públicos é que solicitará a anuência Ministerial para efetivação dos contratos privados em prazos de amortização superiores ao contrato de serviço de transporte ferroviário, à luz do que já se pratica no setor aeroportuário brasileiro, com valiosos retornos em receitas não tarifárias, e do setor ferroviário asiático, em que receitas não tarifárias representam entre 33% e 80% das receitas das ferrovias de passageiros, mitigando, portanto, a necessidade de subsídio estatal para o seu desenvolvimento.

     11. Em linha com o praticado nos principais polos ferroviários internacionais, o presente marco legal proverá liberdade de mercado à indústria ferroviária, flexibilizando os negócios, tornando-o mais previsível e reduzindo o intervencionismo estatal, facilitando sobremaneira o encontro da demanda por infraestrutura ferroviária da "porteira para fora" da indústria de agropecuária e de mineração com a oferta de infraestrutura por novas entidades prestadoras de serviços logísticos e de mobilidade e pelas próprias concessionárias ferroviárias, que terão mais instrumentos para investir em suasmalhas.

     12. Espera-se com a edição desta Medida Provisória a efetivação imediata de requerimentos de autorização para conexão de Terminais de Uso Privado com a malha ferroviária federal e desta para novos polos geradores de carga na fronteira agrícola, principalmente no Centro-Oeste. Em duas décadas, estima-se que estes investimentos privados possam acrescentar mais R$ 30 bilhões na malha ferroviária brasileira, aumentado a densidade, a distância-média e a capilaridade do modo ferroviário brasileiro.

     13. Em relação à urgência da medida, cabe mencionar que se faz premente solução que permita a realização dos novos investimentos planejados para o setor e, por conseguinte, a expansão da economia e da competitividade do País, especialmente após os efeitos adversos causados pela pandemia. Não se pode olvidar a necessidade de se dar segurança jurídica às iniciativas estaduais, prestigiadas com a uniformização de marco nacional a disciplinar diversos aspectos do trânsito e do transporte ferroviários. Assim, o presente marco legal servirá para impulsionar, tempestivamente, diversos projetos de novos trechos ferroviários, principalmente aqueles voltados para destinações econômicas específicas, em que o espírito de empreendedorismo do setor privado não consegue ser atendido, de forma célere e dinâmica, pelo setor público, representando importante marco legal para a expansão da economia e da competitividade do País.

     14. Cabe relembrar que a introdução da autorização como instrumento de outorga, que nesta Medida Provisória se aplica ao setor ferroviário, já foi implementada com êxito nos setores de telecomunicação, por meio da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, e de portos, por meio da Lei nº 12.815, de 5 de julho de 2013, tendo como resultado a significativa expansão da infraestrutura atinente e a atração de expressivos novos investidores privados, tanto nacionais quanto internacionais, aosseus mercados.

     15. Destarte, propomos a adoção do conceito do serviço de transporte ferroviário explorado em regime de autorização. A exploração por autorização será formalizada em Contrato de Adesão a ser celebrado, após procedimento inaugurado por requerimento de interessado ou chamamento público. Sempre que houver necessidade, será promovido processo de seleção público, a ser disciplinado por ato do Poder Executivo. No Contrato de Adesão constarão disposições quanto a objeto, prazo, cronograma de implantação, direitos e deveres da autorizatária, responsabilidade por inexecução, as hipóteses de extinção de contrato, obrigatoriedade da prestação de informação, as penalidades e sanções cabíveis, o foro para solução de divergências, e as condições para promoção de desapropriações.

     16. Havendo interesse, a concessionária ferroviária com contrato vigente, em situações específicas ligadas à entrada em operação de nova ferrovia construída a partir de autorização ferroviária federal posterior, poderá solicitar a adaptação para o regime de exploração por autorização, desde que os requisitos exigidos sejam cumpridos, cujo pleito será decidido ao cabo pelo Ministério da Infraestrutura ouvidos os devidos órgãos de defesa da concorrência. Persistirão nesses casos as obrigações contratadas com o poder público no regime de concessão, no restante do prazo do contrato adaptado para autorização, facultando-se à autorizatária a possibilidade de renovação sucessiva da autorização com o devido pagamento pela extensão do prazo.

     17. Por meio de autorizações, a administradora ferroviária terá liberdade para a proposição de seu traçado, preços, níveis de serviço, bem como suas especificações, de forma coordenada e colaborativa, em conjunto com os demais membros da entidade de autorregulação técnica, instituição que atuará de modo colaborativo e complementar com a ANTT, promovendo soluções e conciliando conflitos quando necessário.

     18. Desse modo, considerando a experiência técnica e o dinamismo das administradoras ferroviárias, a Medida Provisória prestigia a autorregulação ferroviária, que poderá propor alterações normativas, arbitrar conflitos e diligenciar quanto à gestão operacional. Assim, a ANTT atuará como supervisora da entidade de autorregulação, bem como concentrará seus esforços no aprimoramento, na uniformização e na padronização de normativos condizentes à garantia da segurança do transporte.

     19. No âmbito de transporte e trânsito, disposições infralegais imprescindíveis são incorporadas à legislação, disciplinando quanto ao cruzamento ferroviário, bem como quanto às competências das administradoras ferroviárias para propiciar melhores condições de segurança operacional.

     20. Visando aumentar a eficiência do planejamento urbanístico, e propiciar aproveitamento eficiente do solo e beneficiar a mobilidade urbana, os projetos de implantação de infraestruturas ferroviárias abrangerão projeto urbanístico do entorno orientados pelo trânsito ferroviário, em linha com as experiências internacionais mais eficientes. Dessa maneira, são trazidas inovações para as legislações de desapropriações, a fim de se incluir o reparcelamento do solo como um mecanismo eficiente de financiamento das novas infraestruturas ferroviárias, bem como se mitigar a necessidade de desapropriações, que também poderão ser executadas pelas empresas autorizatárias, permissionárias e concessionárias ferroviárias.

     21. A Medida Provisória propõe ainda medidas que desburocratizem as diligências da administradora ferroviária autorizatária para a concretização do empreendimento, possibilitando, por exemplo, a alienação, cessão ou arrendamento de bens móveis e imóveis. Por fim, em consonância com as modernizações realizadas no setor aéreo e portuário, há disposições para que as alterações na relação descritiva das ferrovias que integram no Subsistema Ferroviário Federal decorram por ato do Poder Executivo, o que irá conferir a agilidade necessária que o instituto da autorização ferroviária exigirá para inclusões de trechos ferroviários no Sistema Nacional de Viação.

     22. O setor ferroviário vive momento extremamente oportuno: de um lado, temos a prorrogação antecipada de alguns contratos, com projeção de investimentos superiores a 40 bilhões de reais; de outro, temos projetos já concedidos (Ferrovia Norte-Sul e Ferrovia de Integração Oeste- Leste) e aqueles com expectativa de serem também outorgados ou executados por meio de Investimento Cruzado (Ferrogrão e Ferrovia de Integração CentroOeste). Resta ao modo ferroviário o terceiro e derradeiro alicerce para dar celeridade e segurança jurídica aos investimentos privados: a outorga para exploração de ferrovias por autorização.

     23. A Medida Provisória, em suma, confere a segurança jurídica necessária para a realização de novos empreendimentos em infraestrutura ferroviária, vitais para a economia brasileira. Permite ainda a realização imediata de investimentos em autorizações, revitalizando ferrovias existentes. Além disso, a Medida Provisória provê maior previsibilidade e segurança jurídica aos investidores ferroviários ao disponibilizar regulamento que uniformiza os requisitos para exploração ferroviária mediante regime de autorização, uma vez que já há legislações publicadas por governos estaduais sob distintas premissas regulatórias, dificultando - pela inexistência de padronização - o ambiente de negócios ao investidor privado.

     24. O aumento da disponibilidade, a garantia da continuidade e a melhoria da qualidade dos serviços ferroviários contribuirão também para a retomada do crescimento econômico, a geração de empregos, o aumento da produtividade, a redução do custo logístico e o incremento dos níveis de investimento no País.

     25. São essas, Senhor Presidente, as razões pelas quais submetemos à consideração do Senhor a anexa proposta de Medida Provisória.

     Respeitosamente,

TARCÍSIO GOMES DE FREITAS
PAULO ROBERTO NUNES GUEDES


Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 30/08/2021


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 30/8/2021 (Exposição de Motivos)