Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 944, DE 3 DE ABRIL DE 2020 - Exposição de Motivos

MEDIDA PROVISÓRIA Nº 944, DE 3 DE ABRIL DE 2020

Institui o Programa Emergencial de Suporte a Empregos.

EMI nº 00008/2020 BACEN ME

Brasília, 2 de Abril de 2020

     Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

     Trazemos à sua apreciação proposta de Medida Provisória dispondo sobre a criação, por parte do Governo Federal, de Programa Emergencial de Suporte a Empregos (Programa), que visa ao enfretamento das consequências econômicas e sociais decorrentes do estado de emergência causado pela pandemia do Coronavírus (Covid-19).

     2. As economias nacional e internacional, em decorrência dos desdobramentos da pandemia mundial de Covid-19, atravessam momento de forte contração na atividade econômica e grandes incertezas em relação ao ambiente econômico e social no próximo meses. A quebra de demanda resultantes das medidas de isolamento social adotadas na maioria dos estados e municípios têm atingido a maior parte, senão todos, os segmentos da economia real, gerando interrupções das cadeias produtivas e acentuada ociosidade na produção de bens industriais e serviços.

     3. Cumpre recordar que, em 20 de março do corrente ano, o Congresso Nacional reconheceu estado de calamidade pública em todo o País, com efeitos até 31 de dezembro de 2020 (Decreto Legislativo nº 6, de 2020, editado em atenção à Mensagem n° 93, de 18 de março de 2020, do Presidente da República).

     4. Em razão da referida conjuntura, entende-se que, se nada for feito, o mercado de trabalho será fortemente impactado nos próximos meses, sujeitando-se a aumento abrupto da taxa de desocupação e redução acentuada na renda das famílias. Dados preliminares indicam redução de até 80% (oitenta por cento) nas vendas ao varejo de bens duráveis e serviços e de cerca de 20% (vinte por cento) de bens não-duráveis.

     5. Para fazer frente a esse quadro, o Ministério da Economia propõe a criação de programa consistente na concessão de linha de crédito emergencial destinada a empresários, sociedades empresárias e sociedades cooperativas, exceto as de crédito, com receita bruta anual superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), com direcionamento exclusivo dos recursos para pagamento da folha de salários pelo período de dois meses. Dessa forma, o escopo do Programa abrange pequenas e médias empresas (PMEs), considerando o número de empregados que essas empresas podem ter e o padrão de faturamento associado a pequenas ou médias empresas.

     6. Ademais, dado o foco desejável na proteção de trabalhadores de menor renda, a cobertura do programa se restringirá à parcela dos salários até o valor de dois salários-mínimos. As empresas beneficiárias, em contrapartida, não poderão demitir sem justa causa empregados, durante a vigência do programa e até sessenta dias após recebimento, por elas, da última parcela da linha de crédito. A fim de assegurar a destinação dos recursos e o cumprimento dos objetivos do Programa, empresas e sociedades beneficiárias deverão ter suas folhas de pagamento processadas pelas instituições financeiras participantes, além de se comprometer a prestar informações verídicas e a não utilizar os recursos para finalidades distintas do pagamento de seus empregados.

     7. Outro aspecto importante do desenho do programa é o compartilhamento de recursos e de riscos entre a União e as instituições financeiras participantes. O valor total da linha de crédito emergencial é de R$ 40 bilhões, sendo R$ 20 bilhões por mês, dos quais 85% (oitenta e cinco por cento) provenientes do Tesouro Nacional (TN) e os outros 15% (quinze por cento) das instituições financeiras participantes. Em caso de inadimplemento, as perdas serão absorvidas pelo TN e pelas instituições financeiras participantes nessa mesma proporção. A União, por meio do TN, transferirá R$ 34.000.000.000,00 (trinta e quatro bilhões) de reais ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que atuará como agente financeiro da União no Programa que, estima-se, beneficiará 12,2 milhões de empregados em 1,4 milhão de PMEs.

     8. As instituições financeiras participantes poderão conceder operações de crédito no âmbito do Programa até 30 de junho de 2020, observada a taxa de juros de 3,75% aa. (três e setenta e cinco por cento ao ano) ao tomador final. Considerando o cenário econômico e os objetivos do Programa, as PMEs terão carência de seis meses para começar a pagar, e um prazo de 30 meses para pagamento, totalizando 36 meses.

     9. Para concessão do financiamento, cada instituição financeira participante vai utilizar modelos e políticas próprios de crédito, podendo considerar eventuais restrições de crédito. Para as operações contratadas no âmbito do Programa, sem prejuízo do disposto no § 3º do art. 195 da Constituição, ficam afastadas as exigências de demonstração de regularidade fiscal pelas empresas beneficiárias, observando-se no particular, quanto às operações realizadas por instituições financeiras federais, os preceitos da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

     10. Caberá ainda às instituições financeiras participantes envidar seus melhores esforços na recuperação dos créditos no âmbito do Programa, além de serem responsáveis pela veracidade das informações e pela exatidão dos valores a serem reembolsados à União, por intermédio do BNDES. Em caso de inadimplemento financeiro do mutuário, a cobrança da dívida será realizada pelas instituições financeiras em nome próprio, conforme suas políticas de crédito, não podendo adotar procedimento de recuperação de crédito menos rigoroso do que aqueles que usualmente empregarem em suas próprias operações de crédito. Cabe a essas instituições arcar com todas as despesas necessárias para a recuperação dos créditos inadimplidos.

     11. O BNDES, como agente financeiro da União no Programa e de acordo com instrumento a ser celebrado com a União, não terá remuneração, cabendo-lhe, entre outras obrigações, realizar os repasses, receber os reembolsos dos recursos das instituições financeiras participantes e prestar as informações solicitadas pelo TN e pelo Banco Central do Brasil (BC). Os eventuais recursos transferidos ao BNDES pela União e não repassados até o término do prazo para contratação serão devolvidos à União no prazo de até trinta dias, observada a remuneração, pro rata die, pela taxa média referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic).

     12. Ao BC, como autoridade de supervisão, competirá fiscalizar o cumprimento, pelas instituições financeiras participantes, das condições estabelecidas para as operações de crédito celebradas no âmbito do Programa. A Autarquia, juntamente com o Conselho Monetário Nacional (CMN), consoante as correspondentes competências, poderá disciplinar os aspectos necessários para operacionalizar e fiscalizar as instituições financeiras participantes quanto ao disposto na Medida Provisória, aplicando-lhes, em caso de infrações, as penalidades previstas na Lei nº 13.506, de 13 de novembro de 2017.

     13. A despeito de haver outros formatos possíveis para o Programa, que também protegeriam o emprego, tal como a redução de jornada e de salários, o desenho proposto, na forma de empréstimo, mitiga a exposição do contribuinte em comparação a transferências a fundo perdido. Aplicado em conjunção com outras medidas, o programa amortecerá a queda no emprego e, consequentemente, os gastos com transferências, a exemplo dos desembolsos com o Seguro Desemprego.

     14. O principal objetivo do Programa, como já apresentado, é mitigar os efeitos da forte queda na atividade econômica sobre o mercado de trabalho, garantindo a manutenção de empregos e a renda dos trabalhadores durante o período de emergência pelo o qual passamos. O programa adicionalmente cumpre ainda dois outros objetivos relevantes: i) fornecer crédito a PMEs; e ii) mitigar riscos para o Sistema Financeiro Nacional (SFN).

     15. Com relação ao primeiro objetivo, as PMEs têm dificuldade de acessar o mercado de capitais e, portanto, são mais dependentes de crédito bancário. A expansão do acesso ao crédito bancário por esse grupo de empresas nos últimos anos, se por um lado indica o sucesso da estratégia de melhoria no mercado de crédito livre, por outro, significa que essas empresas estão mais expostas a paradas bruscas no mercado de crédito. Ao financiar os desembolsos com a folha de salários, que representam em média 45% (quarenta e cinco por cento) das despesas operacionais das PMEs, o Programa lhes dá fôlego financeiro em um momento no qual o crédito será mais escasso e caro, dada a preferência por liquidez de todo o SFN, permitirá que as empresas e sociedades participantes atravessem esse período e possam no futuro retornar às suas atividades, preservando o valor dos seus ativos tangíveis e intangíveis.

     16. O emprego nas grandes empresas é tão importante quanto nas PMEs. No entanto, grandes empresas têm mais fôlego financeiro para aguentar a retração no crédito bancário porque têm melhor acesso aos mercados de capitais, que a propósito se expandiram e se sofisticaram muito nos últimos anos. Para elas, programas mais tradicionais de mercado de trabalho, como recurso para evitar demissões ou redução de jornada com redução salarial, podem ser mais efetivos.
 
     17. No que tange ao segundo objetivo, a manutenção da estabilidade financeira é crucial neste momento de crise aguda. O crédito emergencial concedido pelo programa aumenta a probabilidade de sobrevivência das PMEs à crise causada pelo Covid-19, e consequentemente evita a deterioração dos créditos bancários a essas mesmas empresas. É importante lembrar que existem outros mecanismos de proteção do SFN, que a propósito estão sendo empregados no momento pelo BC. O Programa é inovador por dividir a conta da manutenção da estabilidade com o próprio sistema financeiro, que contribui com parte dos recursos direcionados para o programa e divide os riscos inerentes a operações de crédito.
      
     18. O impacto orçamentário e financeiro decorrente da implantação da medida é estimado em R$ 34 bilhões, restrito ao corrente exercício financeiro. Para fins de adequação orçamentária, deverá ser aberto crédito extraordinário ao orçamento vigente, mediante edição de Medida Provisória especifica, com a identificação das fontes orçamentárias, sendo essa autorização legal condição para a realização da despesa.
      
19. Sob o prisma da legislação fiscal, decisão cautelar do Supremo Tribunal Federal na ADI nº 6.357 afastou, excepcionalmente, a exigência de demonstração de compensação orçamentária em relação à criação ou expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento do contexto de calamidade gerado pela disseminação de COVID-19, que, na presente medida, teria de observar o artigo 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 2000) e o artigo 114, caput, in fine, e § 14, da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020 (Lei nº 13.898, de 2020). O cumprimento das metas fiscais previsto na LDO resta ressalvado pelo Decreto Legislativo nº 6, de 2020, que reconheceu o estado de calamidade pública. Finalmente, registra-se que o art. 107, § 6º, inciso I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias afasta da base de cálculo para o cumprimento do Novo Regime Fiscal a abertura de créditos extraordinários nos termos do art. 167, §3º, da Constituição Federal, os quais criam dotação orçamentária para a presente despesa.
 
     20. Restam cumpridos, ainda, os artigos 26 e 27 da Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que a presente medida emergencial autorizará a destinação de recursos ao setor privado, com dotação orçamentária a ser criada em outra Medida Provisória, além de atendidas as condições previstas na Lei de Diretrizes Orçamentárias. O artigo 27 da LRF é atendido porque a medida fixa os encargos financeiros dos empréstimos em 3,75% ao ano.
 
     21. A presente medida está em linha com as providências que economias avançadas e emergentes têm adotado para fazer frente aos efeitos da epidemia do Covid-19. Recentemente, o Congresso dos EUA aprovou pacote no valor de aproximadamente US$ 2 trilhões, que contém recursos da ordem de R$ 350 bilhões para empréstimos a pequenas empresas. Políticas semelhantes também foram anunciadas nos últimos dias pela Alemanha, China, Coréia do Sul, Espanha, França e Rússia, entre outros países.
 
     22. Assim, demonstrada a relevância das medidas apresentadas, a urgência da matéria se justifica pela rápida deterioração da situação financeira das PMEs e da perspectiva de aumento relevante no número de demissões decorrentes da falta de alternativas para fazer frente a obrigações financeiras. Como já mencionado, as incertezas quanto ao desdobramento da pandemia mundial de Covid-19 sobre a economia nacional e internacional tornam ainda mais urgente a adoção de medidas que não apenas mitiguem o impacto sobre o nível de desemprego mas também garantam que, quando for possível a normalização da atividade econômica, essas empresas sejam capazes de retomar suas atividades e contribuir para a retomada do crescimento econômico.
     
     23. Pelas razões mencionadas e pela convicção de que as medidas propostas tendem a produzir efeitos imediatos positivos sobre a economia, postulamos que a inovação legislativa seja veiculada em Medida Provisória.
 
     24. São essas, Senhor Presidente, as razões que nos levam a propor a edição da Medida Provisória, que ora submetemos à sua apreciação.
 
     Respeitosamente,
 
ROBERTO DE OLIVEIRA CAMPOS NETO
PAULO ROBERTO NUNES GUEDES

Este texto não substitui o original publicado no Portal da Presidência da República de 03/04/2020


Publicação:
  • Portal da Presidência da República - 3/4/2020 (Exposição de Motivos)