Legislação Informatizada - MEDIDA PROVISÓRIA Nº 830, DE 21 DE MAIO DE 2018 - Exposição de Motivos
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MEDIDA PROVISÓRIA Nº 830, DE 21 DE MAIO DE 2018
Extingue o Fundo Soberano do Brasil, criado pela Lei nº 11.887, de 24 de dezembro de 2008, e o Conselho Deliberativo do Fundo Soberano do Brasil.
EM nº 00052/2018 MF
Brasília, 3 de Maio de 2018
Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
1. Submeto à elevada consideração de Vossa Excelência minuta de Medida Provisória que trata de proposta de extinção do Fundo Soberano do Brasil (FSB) e dispõe sobre destinação dos recursos que atualmente compõem o fundo.
2. A minuta de Medida Provisória em tela é de grande importância, por fazer parte de um conjunto de medidas com o fito de garantir o equilíbrio entre receitas de operações de credito e despesas de capital em 2018, conforme preconiza a regra de ouro, nos termos do inciso III do Art. 167 da Constituição Federal e do § 2º do Art. 12 da Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF). Além disso, a presente proposta ajusta a situação do Fundo ao contexto macrofiscal prospectivo do país, que mudou radicalmente desde a criação do FSB.
3. Em relação ao primeiro tema, a Constituição Federal, em seu Art. 167, inciso III, estabelece a chamada regra de ouro das finanças públicas, que veda "a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta". A LRF reforça esta regra por meio do § 2º do Art. 12: "O montante previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser superior ao das despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária".
4. Para o cumprimento desses dispositivos legais, o Governo Central deve promover medidas de gerenciamento financeiro ao longo do ano para reduzir a necessidade de realização de operações de crédito para financiar as despesas correntes, bem como para coibir a execução orçamentária de despesa sem que haja suficiente disponibilidade financeira no final do exercício. Dentre as medidas mencionadas, destacamos a antecipação de parte dos contratos de empréstimo do BNDES à União, no valor de R$ 130 bilhões (dos quais R$ 30 bilhões já se efetivaram) , o cancelamento de restos a pagar não processados, a extinção de fundos públicos e a desvinculação de superávits financeiros de fontes de recursos.
5. A regra de ouro não chegou a ser restrição à execução da política fiscal do Governo Central até o exercício 2015, uma vez que a apuração de resultados primários positivos até o ano de 2013 resultava em maior disponibilidade de fontes de receitas primárias para financiar as despesas correntes, não necessitando, dessa forma, a alocação de recursos de operações de crédito para este fim.
6. Esse quadro foi alterado com a deterioração das condições fiscais do Governo Central a partir do exercício de 2014. Em 2016 e em 2017, os retornos dos recursos transferidos pelo Tesouro Nacional ao BNDES, respectivamente, no montante de R$ 100 bilhões e R$ 50 bilhões, apesar de terem sido realizados com o objetivo de reduzir a dúvida bruta, ajudaram no equacionamento da regra de ouro ao final de cada exercício. Em 2018, a situação é ainda mais complexa, com estimativa de deficiência de R$ 203 bilhões, a ser equacionada com as medidas mencionadas no parágrafo 4, as quais demandam atuação tempestiva para que sejam disponibilizadas as fontes de recursos o mais rapidamente possível. Nesse contexto, a extinção do FSB e a alocação de seus recursos para pagamentos da Dívida Pública Federal ganham grande relevância, na medida em que isso aumentaria em aproximadamente R$ 27 bilhões as disponibilidades de fontes para cumprir a "regra de ouro".
7. O Fundo Soberano do Brasil foi criado em 2008, com a publicação da Lei nº 11.887, de 24 de dezembro de 2008, seguido de um aporte inicial no mesmo ano da ordem de R$ 14,24 bilhões, o que representava à época cerca de US$ 6,01 bilhões. A totalidade desses recursos foram aplicados em fundo de investimento privado denominado Fundo Fiscal de Investimento e Estabilização - FFIE, cuja composição era inicialmente de títulos de renda fixa domésticos. As condições que permitiram o aporte no FSB foram uma situação fiscal favorável e a realização de um superávit primário superior à meta prevista na LDO.
8. No final de 2008, o governo central obteve um excesso de superávit primário da ordem de 0,5% do PIB, que constituiu o funding para aporte inicial ao FSB. Naquele período, o país vinha de uma crescente acumulação de reservas internacionais devido aos expressivos saldos no balanço de pagamentos. Por exemplo, em 2000, o Brasil encerrou o ano com um montante de apenas US$ 33 bilhões de reservas internacionais sob administração do Banco Central do Brasil, e este valor saltou em 2008 para algo próximo a US$ 200 bilhões.
9. A conjuntura da época parecia indicar que o país poderia reunir as condições estruturais necessárias para possuir um fundo soberano, notadamente pelos superávits em conta corrente obtidos em 2008 e pelas perspectivas trazidas pela obtenção do grau de investimento do país. Esta percepção era reforçada também pelas recentes descobertas das reservas de petróleo do pré-sal que, dada a sua relevância, indicava perspectivas de intensos fluxos de divisas na economia, inclusive de receitas fiscais oriunda da exploração deste ativo governamental.
10. Cumpre ressaltar que a criação do FSB se deu num contexto de excessiva liquidez internacional e de elevação dos preços das commodities no mercado mundial, o que implicava a possibilidade de atuação no mercado cambial para a aquisição de excesso de dólares que ingressava no país. A existência do FSB abria a possibilidade de diminuição do custo de carregamento das reservas internacionais com importantes efeitos de sinalizações e formação de expectativas na percepção do risco global do balanço geral de ativos e passivos do setor público.
11. No entanto, o contexto macrofiscal conjuntural e prospectivo do país mudou radicalmente no período mais recente, tornando cada vez menos óbvios os benefícios de se manter a operacionalidade do FSB.
12. Pela ótica financeira, a dinâmica fiscal impôs questionamentos à racionalidade da existência do FSB. Entre eles, está o custo de financiamento para a viabilização do fundo já que, pelo fato do Brasil nunca ter apresentado superávit nominal, sempre foi necessário o governo captar recursos em mercado. Nesse contexto, a falta de poupança fiscal no Brasil (déficit nominal) implicava a necessidade de se endividar para formar um fundo que possivelmente teria uma rentabilidade menor que os juros do endividamento.
13. A experiência demonstrou que as condições estruturais para justificar a existência do FSB não estavam completamente dadas. Primeiro, porque os excessos de superávits fiscais não se confirmaram nos anos posteriores. Segundo, mudanças no marco regulatório da exploração de petróleo e questões conjunturais de preços internacionais retiraram o ímpeto da iniciativa privada eimputaram um pesado ônus à Petrobras na exploração dos recursos do pré-sal. Terceiro, diversas questões macroeconômicas ainda não estavam devidamente endereçadas de forma que flutuações nos juros, inflação e câmbio refletiam esses desequilíbrios, sobretudo na área fiscal.
14. De fato, esta reversão macroeconômica começou a ficar mais nítida em fins de 2013, com a compressão do espaço fiscal e a elevação das taxas de inflação para patamares próximos ao teto da meta estabelecida pela autoridade monetária. Em 2014, os resultados fiscais, até então positivos, se reverteram, atingindo valores negativos pela primeira vez desde a década de 90. A piora nas expectativas de consumidores e empresas em relação à evolução da economia levou a uma queda significativa no consumo e no investimento agregados com efeitos diretos sobre a demanda agregada e o crescimento econômico de 2014.
15. Em 2015 e 2016, verificou-se deterioração das expectativas dos agentes econômicos, que passaram a questionar mais fortemente a sustentabilidade da política fiscal e o desequilíbrio entre as tendências de crescimento das receitas e das despesas fiscais. Houve a percepção do grau de complexidade da situação fiscal em função da existência de diversos elementos estruturais, como a excessiva rigidez orçamentária e a vinculação de boa parte das receitas a determinados grupos de gastos públicos, muitos deles relacionados a políticas, regras e programas criados no passado, em contextos distintos do atual.
16. Em 2017, mesmo diante da visível recuperação cíclica da economia e da maior estabilidade política, o panorama corrente e prospectivo permaneceu bastante desafiador. Os sinais econômicos parecem indicar que a recuperação econômica deve passar necessariamente pela reconquista da credibilidade da política fiscal, sobretudo pela necessidade de um forte ajuste fiscal a ser alcançado por criação de novas receitas e/ou redução do crescimento das rígidas despesas orçamentárias, algo inconveniente num momento em que as tensões distributivas se exacerbam.
17. A lei de criação do FSB determina que saques poderiam ser realizados para mitigar efeitos do ciclo econômico. Por outro lado, a deterioração fiscal recente ocorreu em parte como uma consequência do ciclo econômico. Assim a extinção do FSB ora sugerida não está desalinhada com objetivo original do fundo.
18. A norma ora proposta também dispõe sobre o uso dos recursos do FSB, pertencentes à União. Atualmente esses recursos encontram-se alocados, parte em aplicação na Conta Única registrados em nome do fundo, e parte sob a forma de cotas do Fundo Fiscal de Investinto e Estabilização - FFIE. Vale adicionar que a parte dos recursos aplicada na Conta Única tem origem em resgates efetuados no FFIE desde 2012. Todavia, são recursos de uso restrito e que, com a extinção do FSB, passam a estar aptos a serem utilizados para pagamento da Dívida Pública Federal, facilitando o cumprimento da regra de ouro e dos limites da legislação fiscal.
19. A lei original do FSB prevê a prestação de contas por meio da apresentação de relatório de desempenho de frequência trimestral, que é submetido ao Congresso Nacional, e relatório de administração de frequência semestral aprovado pelo Conselho Deliberativo do FSB. Caberá, portanto, a realização de uma última prestação de contas com a elaboração de ambos os relatórios.
20. A medida proposta não gera custos adicionais para a União tendo em vista que trata em essência de uma realocação de recursos financeiros de forma a permitir um aperfeiçoamento na execução da política fiscal.
21. Finalmente, conforme todo o embazamento acima, cabe explicitar que o tema atende os requisitos constitucionais de relevância e de urgência. O cumprimento da "regra de ouro", por ser imposto pela Constituição Federal e pela LRF, é de fundamental importância. Nesse sentido, para seu cumprimento esse ano, há necessidade de efetivação de uma série de medidas. A extinção do FSB com alocação de seus recursos para pagamentos da Dívida Pública Federal ganha grande relevância nesse contexto, aumentando em aproximadamente R$ 27 bilhões as disponibilidades de fontes para cumprir a "regra de ouro". A urgência ganha ainda traços mais claros dado que o cronograma de pagamentos da dívida públicas que prevê vencimentos em valores significativos nos próximos meses.
22. São estes, Senhor Presidente, os motivos pelos quais submeto à consideração de Vossa Excelência a minuta de Medida Provisória em anexo.
Respeitosamente,
EDUARDO REFINETTI GUARDIA
- Portal da Presidência da República - 22/5/2018 (Exposição de Motivos)