Legislação Informatizada - LEI Nº 7.716, DE 5 DE JANEIRO DE 1989 - Veto

LEI Nº 7.716, DE 5 DE JANEIRO DE 1989

MENSAGEM DE VETO Nº 09 DE 05 DE JANEIRO DE 1989

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL:

     Tenho a honra de comunicar a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1º do artigo 66 da Constituição Federal, decidi vetar parcialmente o Projeto de Lei de Lei nº 052, de 1988 (nº 668/88, na origem), que "define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor."

     Assim se manifestou sobre o assunto o Ministério da Justiça:

     "O Deputado Carlos Alberto Caó tem a pretensão, expressada pelo projeto de lei em epígrafe, de definir os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.

     A proposta de lei nasceu da convicção, demonstrada na justificação do projeto de lei, de que o Brasil é um país racista e, assim sendo, o negro, apesar de ter conquistado sua liberdade, ainda não conseguiu integrar-se à sociedade como cidadão, o que é percebido na dificuldade de acesso do discriminado à vida econômica e política do País.

     Acredita o Deputado que se tipificar a conduta da discriminação racial como crime, atribuindo-se ao transgressor desta norma "penas que possam ser sentidas no seu cumprimento", o Brasil sairá do rol dos países discriminadores.

     À luz da Constituição vigente, não há vícios constitucionais a obstaculizar o progresso na proposição.

     A iniciativa do Deputado Carlos Alberto Caó, como toda iniciativa que vise a erradicar o racismo do seio de uma coletividade, merece louvores, pois elogiável é o procedimento do representante do povo que se preocupa e empreende esforços para que não sejam feitas diferenciações entre as pessoas.

     A prática do racismo é abominável e ao voltarmos os olhos para esse tipo de atitude tanto emocional quanto racionalmente não encontraremos razões para explicar os motivos que fazem um ser humano se julgar superior a outro e, por isto, querer humilhá-lo, sem nem ao menos ter total consciência da extensão do mal que pratica.

     A solução, cremos, é que seja empreendido um esforço conjunto com outras áreas das ciências sociais, pois assim os resultados poderão ser satisfatórios - só a lei poderá não resolver o problema a contento - Porém, no que concerne ao aspecto jurídico, aquiescemos com a opinião do Deputado Plínio Barreto que foi o relator da Comissão de Constituição e Justiça, por ocasião da tramitação do projeto de lei sobre preconceitos de raça ou de cor que veio a se transformar na Lei nº 1.390, de 3 de julho de 1951, opinião que apesar do transcurso do tempo, permanece atual:

     "Nunca haverá leis que os destruam. Nunca houve lei alguma que pudesse desarraigar sentimentos profundos e trocar a mentalidade de um povo. Mas isto não impede que, por meio de leis adequadas, se eliminem algumas das manifestações públicas desse preconceito."

     O racismo era punido no Brasil como contravenção. O enquadramento do racismo como delito surgiu entre nós de uma iniciativa legislativa do Senador Afonso Arinos, que resultou na Lei nº 1.390, de 3 de julho de 1951, mais conhecida pelo nome de Lei Afonso Arinos. Já no Governo do Presidente Sarney foi sancionada a Lei nº 7.437, de 20 de dezembro de 1985, que deu nova redação à Lei Afonso Arinos e ampliou o leque de repressão aos preconceitos, reprimindo, ainda como contravenção, a prática de atos resultantes de preconceito de raça, de maior abrangência da repressão aos preconceitos, não mais se dá a repressão tão só aos preconceitos de raça ou de cor. A Constituição recém promulgada no seu artigo 5º, item XLII, adequadamente passou a considerar a prática do racismo em crime inafiançável e imprescindível, a ser punido, nos termos da lei, com a pena de reclusão."

     Incidem os vetos sobre os seguintes dispositivos:

  1. O art. 2º do projeto de lei expressa que os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor serão inafiançáveis, imprescindíveis e insuscetíveis de suspensão condicional da pena, que é o mandamento da Lei Magna; todavia, o art. 2º tenta proibir o incidente da suspensão condicional da pena a quem tenha cometido o crime de preconceito de raça ou de cor merece reprovação. A Lei Maior dá direitos iguais a todos, sem distinção. A lei penal, por sua vez, a todos os que preenchem os requisitos por ela exigidos, dá o direito ao "sursis".

    Sabemos que a proibição de concessão do "sursis" pretendidas pelo projeto de lei visa a que não possa a pessoa que cometa o crime de racismo deixar de ser encarada. Apesar do crime ser um ato repulsivo, merecedor de sanção penal, cremos que admitir a exceção proposta é medida extremada, que não aconselha a ignorância do preceito geral imposto pela lei penal, o qual o julgador deve saber dosar da forma judiciosa que se espera de todos aqueles eu devem aplicar a lei.

  2. O artigo 15 do projeto de lei está versado na forma seguinte:

    "Art. 15 - Discriminar alguém por razões econômicas, sociais, políticas ou religiosas, em local de trabalho, em público, ou em reuniões sociais". Impertinente ao projeto que trata do preconceito de cor.

    Além disso não define os termos utilizados como razões econômicas, sociais e políticas. A generalidade não é aconselhável. Do mesmo modo no seu §2º as hipóteses mencionadas, no que concerne à imprensa, já foram previstas em lei, a "Lei de Imprensa" (Lei nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967) de melhor forma. Pelo texto oferecido a responsabilidade da divulgação do ato discriminatório pela imprensa, será do seu autor ainda que não tenha sido por ele motivada.

  3. O art. 17 do projeto de lei pretende ressurgir a figura da pena acessória. Esta não é mais contemplada pela Nova Parte Geral do Código Penal, que encarregou algumas das hipóteses tratadas como penas acessórias na antiga Parte Geral do Código Penal para incluí-las dentre os efeitos da condenação.
  4. O art. 19 do projeto de lei pretende impor o rito sumário para os crimes de preconceito de raça ou de cor, impondo também que no prazo de sessenta dias o processo esteja concluído, prolatada a sentença.

    Este procedimento é reservado para os delitos apenados com detenção e para as contravenções.

    No projeto as penas são de reclusão.

     Estas as razões que me levaram a vetar, parcialmente, o Projeto em causa e que ora submeto à elevada deliberação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

Brasília, em 05 de janeiro de 1989.

JOSÉ SARNEY

 

 


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 06/01/1989