Legislação Informatizada - DECRETO Nº 19.850, DE 11 DE ABRIL DE 1931 - Exposição de Motivos

DECRETO Nº 19.850, DE 11 DE ABRIL DE 1931

Crêa o Conselho Nacional de Educação.

     Sr. Chefe do Governo Provisor:

     Tenho a honra de submeter á esclarecdia consideração de V. Ex. a reforma do ensino superior da Republica.

     O projecto em que se ella consubstancia foi objeto da larga meditação, de demorado exame e de amplos os vivos debates, em que foram ouvidos e consultados todas as autoridades em materia de ensino, individuaes e collectivas, assim como, no seu periodo de orgzanização, auscultadas todas as correntes e expressões de pensamento, desde as mais radicaes ás mais consercadoras.

     Tal como passo ás mãos de V. Ex., elle representa um estado do equilibrio entre tendencias oppostas, de todas consubstanciando os elementos de possivel assimilação pelo meio nacional, de maneira a não determinar uma brusca ruptura com o presente, o que tornaria de adaptação difficil ou improvavel, diminuindo, assim, os beneficios que delle poderão resultar de modo immediato.

     Embora resultando, na sua estrutua geral, de transacções e compromissos entre varias tendencias, correntes e direcções de espirito, o projecto tem individualidade e unidade proprias, seguindo o pensamento, que lhe modelou a estructura, linhas largas, claras e precisas, que lhe demarcam orientação firme e positiva e asseguram proporção e equilibrio aos planos em que se distribuem os seus principios de organização administrativa e technica.

     O projecto se divide em tres partes, uma geral, relativa á organização das Universidades brasileiras; outra que contém a reorganização da Universidade do Rio de Janeiro e de todo o ensino superior da Republica, e a terceira, em que se cria o Conselho Nacional de Educação e se definem as suas attribuições.

UNIVERSIDADES BRASILEIRAS

     A primeira parte do projectos contém o estatuto das Universidades brasileiras e nella se adapta, como regra de organização do ensino superior da Republica, o systema universitario.

     A Universidade constituirá, assim, ao menos como regra geral, e em estado de aspiração emquanto durar o regimen transitorio de institutos isolados, a unidade administrativa e didactica que reune, sob a mesma direcção intellectual e technica, todo o ensino superior, seja o de caracter utilitario e immediata, visando assim, a Universidade o duplo objectivo de equipar teclmicamente a élites profissionaes da paiz e de proporcionar ambiente propricio ás vocações especulativas e desinteressadas, cujo destino, imprescindivem á formação da cultura nacional, é o da investigação e da sciencia pura.

     Assim como a Universidade não é apenas uma unidade didactica, pois que a sua finalidade transcende ao exclusivo proposito do ensino, envolvendo preocupações de pira sciencia e de cultura desinteressada, ella é, igualmente, e é sobretudo, porque este o caracter que a individua e a distingue das demais organizações do ensino, uma unidade social activa e militante, isto é, um centro de contacto, de colaboração e de cooperação de vontades e de aspirações, uma familia intellectual e moral, que não exhaure sua actividade no circulo dos seus interesses proprios e immediatos, senão, que, como unidade viva, tente a ampliar, no meio sicial em que se organiza e existe, o seu circulo de resonancia e de influencia, exercendo nelle uma larga, poderosa e autorizada funcção educativa.

     O projecto provê, em quadros amplos e de linhas singelas, abrindo assim, largas perspectivas ao espirito associativo das Universidades, áquelles dous aspectos fundamentaes da organização universitaria, propondo, quanto á sua vida social interna, modelos e associações de classe destinados a proporcionar contactos e fortalecer os laços de solidariedade, fundada na communidade de interesses economicos e espirituaes, entre os corpos docente e discente, e quanto á influencia educativa que a Universidade deve exercer sobre o meio social, instituindo a extensão universitaria poderoso mecanismo de contacto dos institutos de ensino superior com a sociedade, utilizando em beneficio desta as actividades universitarias.

     A extensão universitaria se destina a dilatar os beneficios da atmosfera universitaria áquelles que não se encontram directamente associados á vida da Universidade, dando, assim, maios amplitide e mais larga resonancia ás actividades universitariasm que concorrerão, de modo efficaz, para elevar o nivel da cultura geral do povo, integrando, assim, a Universidade na grande funcção educativa que lhe compete no panorama da vida contemporanea, funcção que so ella justifica, ampla e cabalmente, pelos beneficios collectivos resultabtes, o systema de organização do ensino sobre base universitaria.

     Na organização das universidades brasileiras dominou de modo precipuo e fundamental, o criterio de prover ás actuaes necessidades do nosso aperfeiçoamento techmeo e scientifico, não deixando, porém, de ser attendidas, em dispositivos destinados a execução opportuna, parcial e progressiva, as exigencias de desenvolvimento, ampliação e adaptação do systema universitario de accôrdo com o crescimento economico e cultural do paiz. demais disto, o estatuto das Universidadesbrasileiras se limita a instituir, em linhas geraes, o modelo de organização administrativa e didactica para as Universidades federaes e equiparadas, admittindo, porém, variantes, desde que orientadas por condições e circumtancias cuja interferencia, na organização e objectivos do ensino universitario, seja de manifesta utilidade. Em um paiz de tão amplas proporções territoriais como o Brasil e constituido de tantas zonas geographicas e economicas de caracteres tão accentuadamente definidos é da maior utilidade permitir, mesmo no interesse do enriquecimento formal e material da organização universitaria, que esta se deixe influenciar e modelar pelos multiplos factores, de ordem economica, geographia e espiritual, de cuja incidencia se compõe a psysionomia propria ou a caractetristica differencial de cada uma das nossas regiões. A organização universitaria esposada pelo projecto não padece, pois dos vicios da intolerancia e rigidez, que tornariam difficil, ou precaria a sua adaptação á diversidade de circumstancias do ambiente brasileiro. Ella se distingue e recommenda, ao contrario, pela flexibilidade das suas linhas e pela capacidade de adaptação resultante da amplitude e da liberdade dis seus okabis administrativos e didacticos.

     Foram, assim, regulados no projecto de accôrdo com o melhor criterio e com as tendencias modernas, os grandes aspectos technicos, scientificos e sociaes das Universidades; incorporação de institutos, disciplinas e methodos de ensino, pesquisa original, recrutamento do corpo docente, autonomia, didactica, regimen disciplinar extensão universitaria, vida social das universidades, bem como as normas administrativas a que devem obedecer, na sua organização, até que sejam incorporadas a unidades universitarias, os intitutos de ensino superior de existencia isolada e autonoma.

     Embora não se consagrando em toda a sua latitude, o projecto pelas tendencias manisfestas que revela, se deixa orientar pelo criterio da autonomia administrativa e didactica das Universidades. Seria, porém, de todo ponto inconveniente e mesmo contraproducente para o ensino, que, de subito, por um integral e repentina ruptura com o presente, se concedesse ás Universidades ampla e plena autonomia didactica e administrativa. Autonomia requer pratica experiencia e criterios seguros de orientação. Ora, o regimen universitario ainda se encontra entre nós na sua phase nascente, tentando os primeiros passos e fazendo os seus ensaios de adaptação. Seria de máo conselho que nesse periodo inicial e ainda embryonario e rudimentar da organização universitaria, se tentasse, com risco de graves damnos para o ensino, o regimen da autonomia integral.

     Este o motivo pelo qual o projecto preferiu a orientação prudente e seguros da autonomia relativa, destinada a exercer uma grande funcção educativa sobre o espirito universitario, que na sua pratica adquirirá a experiencia e o criterio indispensaveis a uma autonomia mais ampla, seja no terreno administrativo, seja no dominio didactico. Com a experiencia poderá o quadro da autonomia ir se alargando de maneira gradual e progressiva até que, finalmente, com o desenvolvimento da capacidade e da envergadura do espirito universitáriom este venha a reunir sob a sua autoridade todos os poderes de governo do grande agrupamento administrativo, technico e didactico, que consiste a universidade. A autonomia integral será, assim, obra de conquista do espirito universitario, amadurecido, experiente e dotado de seguro e firme sentido de direcção e de responsabilidade, ao invés de constituir uma concessão graciosa e extemporança, destinada antes e deseducar do que a formar, no centro universitario, o senso de organização, de commando e de governos.

     O projecto exige, para que se constitua a Universidade, a incorporação de pelo menos tres institutos de ensino superior, entre os mesmos incluidos os de direito, de medicina e de engenharia, ou ao envez de uma delles, a Faculdade de Educação, Sciencias e Letras. Assim dispoz, attendendo á maior importancia pratica das respectivas profissões e ás vantagens cultaraes representadas pela Faculdade de Educãção, Sciencias e Letras. Nem todas as instituições de ensino superior poderão ser incorporadas de momento em Universidades, sendo necessario, então, quer obedeçam a regimen technico e administrativo especial, instituido nos proprios regulamentos observadas, porém, as normas geraes que presidem á organização dos institutos universitarios. Tendo em vista, porém, que ainda poderá durar o regimen de isolamento de alguns institutos de ensino superior, o projecto contém dispositivos tendentes e attenuar esse isolamento, por meio de contactos que estabelece entre os diversos institutos de ensino, como objectivo de fortalecer entre elles os laços de solidariedade e a comunhão de idaes de aspirações, de trabalho e de cultura. A autoridade a cuja conta corre e o governo universitario se acha organizado no projecto de maneira a attender ás multiplas exigencias da organização universitaria. O Reitor e o Conselho Universitario constituem os orgãos supremos da direcção techinos e administrativa da Universidade, raros sendo os assumptos (quasi exclusivamente de ordem financeira e puramente administrativa) que dependem de decisão do ministro da Educação.

     Em cada instituto foi creado, ao lado do director e para com elle cooperar na direcção technica e administrativa, um conselho de professores, cujas amplas attribuições aministrativas e didacticas o transformam na peça central a sua etica, administrativa e disciplinar.

     Pelo actual regimen, ao director incumbiam as complexas funcções de dirigir, do ponto technico e administrativo, todos os serviços do Instituto, o que resultava a sua exaggerada e exclusiva especialização na parte puramente administrativa, não lhe sobrando tempo para orientar a parte, sobretudo importante, da organização e do funccionamento didactico do reunido sob a autoridade do directorm entre este e o conselho technico e administrativo, torna-se possivem á administração superior de cada Instituto exercer a suprema inspecção e vigilancia sobre o dominio propriamente di ensino, intervindo na sua organização didactica, acompanhando o modo por que são ministrados os cursos, orientando-os e corrigindo os seus defeitosm vicios e insufficientes.

     A direccção do Instituto deixa, assim, de ser um mero orgão administrativo e burocratico para transformar-se em apparelho de orientação technica e didactica.

UNIVERSIDADE DO RIO DE JANEIRO

     Na reorganização da Universidade do Rio de Janeiro, que constituirá o modelo para as Universidades e Intitutos equiparados, foram adaptadas as normas instituidas para o regimen universitario no Estatuto das Universidades Brasileiras. Nella ficam incorporadaos os Institutos de ensino superior da Capital da Republica, dependentes do Ministerio da Educação e Saude Publica, acrescidos da Escola de Minas de Outro Preto e da Faculdade de Educação Sciencias e Letras, criada no projecto.

     A antiga Universidade do Rio de Janeiro limitava-se ao ensino do direito, da engenharia e da medicina. Faltava-lhe para completar a sua envergadura universitaria o elemento artistico, indispensavel e obrigatorio complemento de toda cultura, que não aspira a formar apenas valores de utilidade economica, senão que tende a ser, pelo seu conteúdo e sua extensão, um authentico systema de valores espirituaes, na mais ampla latitude da expressão como deve ser o organismo universitario. Tornava-se, pois, indispensavel dar á Universidade do Rio de Janeiro themas authenticamente universitarios, incorporando á sua estructura reduzida ao esqueleto do ensino puramente profissional as grandes divisões da arte e da cultura scientifica - o que se fez, aggregando-se-lhe a Escola de Bellas Artes, o Instituto Nacional de Musica, radicalmente remodelados na sua orientação artistica e didactica, e a Faculdade de Educação, Sciencias e Letras. Esta ultima, particularmente pela alta funcção que exerce na vida cultural, é que dá, de modo mais accentuado, ao conjuncto de Institutos reunidos em Universidade, a caracter propriamente universitario, permittindo que a vida universitaria transceda os limites do interesse puramente profissional, abrangendo, em todos os seus aspectos, os altos e authenticos valores de cultura, que a Universidade conferem o caracter e attributo que a definem e individuam, isto é, a Universidade. Cumproa, porém, não esquecer na primeira tentativa que se faz de installar no Brasil um instituto de Alta Cultura não pôde ser organizada de uma vez, integralmente e de maneira exclusiva. Para que um instituto dessa orgem vingue entre nós torna-se indispensavel resultem da sua instituição beneficios immediatos, devendo a sua inserção no meio nacional fazer-se exactamente nos pontos fracos ou nas lacunas da nossa cultura de maneira que o seu crescimento seja progressivo e sem continuidade com as nossas exigencias mais proximas e mais imperativas. Essas considerações determinaram o caracter especial e mixto da nossa Faculdade de Educação, Sciencias e Letras, dando-lhe ao mesmo tempo que funcções de cultura, papel eminentemente utilitario e pratico.

     Esse caracter resulta directamente da observação do nosso estado de cultura e dos defeitos e vicios dos nosso ensino. O ensino no Brasil é um ensino sem professores, isto é, em que os professores criam a si mesmos, e toda a nossa cultura é puramente autodidactica. Faltam-lhe os largos e profundos quadros tradicionaes da cultura nos quaes as processam continuadamente a rotação e renovação dos valores didacticos de maneira a constituir para o ensino superior e secundario um padrão, cujas exigencias de crescimento e de aperfeiçoamento se desenvolvem em linhas ascendentes.

     Impunha-se, portanto, para que a Faculdade de Sciencias e Letras não se reduzisse, tendo em vista as imperiosas necessidades do presente, a um adorno ou decoração pretenciosa em casa pobre, dar-lhe uma funcção de caracter pragmatico o de accão immediata sobre o nosso estado de cultura e, neste estado, exactamente sobre aquelles pontos relativos á formação e recrutamento dos professores, particularmente os das materias basicas e fundamentaes. Dahi o destino attribuido, no noss systema universitario, á Faculdade de Educação, Sciencias e Letras. Ao lado de orgão de alta cultura ou de sciencia pura e desinteressada, elle deverá ser, antes de tudo o eminentemente, um Instituto de Educação, em cujas divisões se encontrem todos os elementos proprios e indispensaveis a formar o nosso corpo de professores, particularmente os do ensino moral e secundario, porque delles, de modo proximo e immediato, depende a possibilidade de se desenvolver, em extensão e profundidade, o organismo, ainda rudimentar, de nossa cultura. O ensaio secundario, tal como o temos no Brasil, será, ainda por muitos annos e por maiores que sejam os nossos esforços, im ensino pobre, inefficiente e muitas vezes nullo. O que lhe falra sobretudo é corpo docente de orientação didactica segura e com solidos fundamentos em uma tradição de cultura, particularmente no que se refere ás sciencias basicas e fundamentaes, sem cuja posse plena e desembaraçada se torna impossivel elevar os andares superiores da grande authentica e alta cultua.

     Na nova Faculdade, em qualquer das suas secções, será ministrado o ensino das disciplinas necessarias ao exercicio do magisterio secundario em todos os seus ramosm adaptado o systema electivo, que permite a preferencia do candidato pelo ramo de conhecimento que mais attende aos seus institutos culturaes ou ás suas necessidade technicas e profissionaes. Uma vez funccionando a Faculdade de Educação, Sciencias e Letras, será o seu curso obrigatorio para tosos quantos se proponham ao ensino secundario nos gymnasios officiaes e equiparads.

     A Faculdade de Educação, Sciencias e Letras está, como se vê, destinada a exercer uma grande influencia renovadora no nosso systema de ensino, concorrendo, de modo efficaz, para que em alguns annos de honesta e rigorosa execução se tranforme, das fundações á cupola, o arruinado edificio do nosso ensino secundario, indigano, sob todos os pontos de vista da missão que lhe é reservada em todos os paizes cultos, de elevar a cultura geral do povo ao gráo das exigencias e imperativos, cada dia mais urgentes e rigorosos, da civilicação contemporanea.

     Entretanto, a Faculdade de Educação, Sciencias e Letras, para que a sua instituição nos dê todos os seus fructos, deverá prolongar a sua actividade normal muito além da sua funcção ainda entre nós tão raras e reduzidas, de penetrar nos largos dominios da investigação original e da alta cultura literatia e scientifca.

     A incorporação da Escola de Minas de Ouro Preto  á Univerdidade do Rio de Janeiro attende ás convencionaes de uma e de outra. Escola de notorias tradições scientificas e didacticas, o isolamento physico, espiritualemente, entretanto, passará a ser associada a uma grande e aborvente organismo de cultura, com o qual passará a estar em contactos immediatos e repetidos, com que se torna possivel arejar os seus quadros scientificos e didacticos, animando-a do mesmo movimento progressivo e ascedente que o espirito universitario imprimir aos institutos coNocados sob a sua influencia e autoridade.

     A reorganização da Universidade do Rio de Janeiro, no empenho de ampliar a capacidade didactica dos institutos de ensino superior, e particulamente, de facilitar o aperfeiçoamento e a especialização em ramos variados do conhecimento, institue os mandatos universitarios, meios e instrumentos pelos quaes a Universidade de apropriam fóra dos seus muros, de todos os recursos technicos e scientificos organizados, mobilizando-os para o ensino e conferindo-lhes, assim, sem prejuizo do proprio, um novo destino da maior utilidade. Pelo mandato universitario torna-se possivel á Universidade do Rio de Janeiro utilizar, de modo efficiente, instituições technicas e scientificas altamente especializadas, como o Instituto Oswaldo Cruz, o Museu Nacional, o Instituto de Chimica, o Instituto Agronomico, o Serviço Mineralogico e Geologico, o Jardim Botanico, enriquecendo, assim, de maneira notavel, o seu equipamento technico e dos seus recursos didacticos.

Do ensino

     A parte central e substancial da reforma está porém, no regimen didactico e nas disposições relativas ao corpo docente.

     Os nossos planos de estudo ou o quadro das disciplinas cujo ensino é ministrado nos nossos institutos de instrucção não póde ser, em regra geral, mais completo. Si nelles ha vicios e defeitos serão exactamente os de excesso: disciplinas ou cadeiras em grande numero criadas em todas as reformas e algumas dellas destituidas quasi de objecto ou sem nenhum valor educativo.

     Os planos de estudo tee, porem, uma importancia subordinada ou secundaria. O que importa antes de tudo, é o professor e o regimento didactico.

     As lacunas no ensino brasileiro são, exactamente, relativas ao corpo docente e ao regimen escolar. Quanto ao corpo docente, já mostrei as providencias tomadas em relação ao do ensino secundario, cujo recrutamento se passará a fazer entre os licenciados pela Faculdade de Educação, Sciencias e Letras. Emquanto, porém, não funccionar a Faculdade, o projecto de organização da Universidade do Rio de Janeiro prescreve a criação de cursos de férias, destinados ao aperfeiçoamento dos actuaes professores de gymnasios.

     Quanto aos professores dos cursos de ensino superior, a reforma prevê varias providencias de manifesta utilidade.

     Ninguem desconhece os vicios, já que de sobejo assignalados, nos actuaes processos de escolha do nosso professorado superior. O concurso de provas, contra cuja adopção, como criterio exclusivo, se levantam sérias e fundadas objecções, soffre de vicio, fundamental e basico, de por elle não serem de ajuizamento seguro as qualidades mais essenciaes ao professor. A reforma altera, de modo profundo e radical, o systema de recrutamento do corpo docente. O concurso de provas será precedido de um concurso de titulos ou, antes de provas presconstituidas da capacidade de candidato. Até aqui o systema de selecção  se tem limitado ao conjuncto de provas constituidas ad hoc, a saber, como o proposito certo e immediato e na oportunidade precisa do concurso.

     Não são examinadas provas anteriores, isto é, constituidas desinteressadamente, sem proposito utilitario immediato, destacam as tendencias, a vocação, a capacidade e a personalidade do candidato. Além disto confiava-se á Congregação o exclusivo julgamento do concurso, desprezando a velha advertencia de não confiar exageradamente no criterio e no sentimento de responsabilidade de assembléas numerosas, mas levadas, ainda que constituidas de homens ilustres e emineptes, por interesses ou motivos de ordem precaria e ocasional.

     Na reforma procurou-se obviar a esses dous capitaes do actual systema de concursos, instituindo uma commissão examinadora de 5 especialistas, tres dos quaes serão obrigatoriamente estranhos á Congregação, por fórma a attender á exigencia de serem os especialidatas apreciados por especialistas no que se não dá no systema actual em que os examinadores conte no seu seio com o numero necessario de professores especializados na materia. Além disto, como medida de segurança contra o julgamento por maiorias occasionaes, orientadas, com tem acontecido, por influencias e motivos estranhos ao interesse do ensino, a Congregação não classificará candidatos, limitando-se a approvar ou rejeitar o parecer da commissão, o qual, quando unanime não poderá ser recusado senão por dous terços de votos. Não bastavam, porém essas providencias. O direiro á vitalicidade adquirido desde o primeiro provimento na cadeira, collocava os professores bons e os máos professores no mesmo pé de igualdade quanto aos privilegios inherentes á cathedra. A reforma estabelecer que a primeira nomeação se fará por um periodo de dez annos, após o qual terá o professor de offerecer novas provas de capacidade, dentre as quaes avultarão, certamente, as por elle dadas pelos seus trabalhos e pela sua dedicação ao ensino durante o periodo inicial. Só então, novamente julgado pela commissão é que se investirá de cathedra por titulo vitalicio. A vitalicidade será, assim a conquista não de algumas horas muitas vezes favorecidas pelo acaso, mas o resultado de dez annos de aturados esforços e trabalhos de cujo julgamento participará a pinoão universitaria, já esclarecida pelo conhecimento pessoal do professor e inteiramente familiarizada com os seus meritos scientificos e as suas aptidões e didacticas.

     Não podia se, como se vê, mais rigoros o systema de garantias, engenhado no proposito de assegurar, de modo o mais completo, a selecção do corpo docente para o ensino superior.

     Não é bastante, porém, o escolher bem o professor. Será necessario acompanhar-lhe o ensino e criar um systema de estimulos reaes, capazes de incentival-o a dar toda medida dos seus meritos. Ao conselho technico e administrativo cumpre acompanhar solicitamente os cursos, de maneira a verificar si são ministrados com efficiencia, propondo as medidas necessarias ao melhoramento do ensino quando este se revelar inefficiente ou lacunoso. Entre os estimulos mais efficazes, porém, nenhum sobreexcede ao da concurrencia. A concurrencia é o mario dos incentivos no aperfeiçoamento humano. Ha de sel-o logicamente, no ensino. A reforma não a esqueceu entre as medidas destinadas a manter elevado o nivel didactico nos institutos de ensino superior. Outra organização foi dada á livre docencia, de maneira a approveitar, de modo completo, esta ultissima reserva didactica, até hoje ainda não mobilizada, como notavel coefficiente, que se destina a ser, no progresso aperfeiçoamento do nosso apparelhamento de ensino. A reforma mobilizou-a, collocando-á em fórma de serviços, ampliando-lhe a acção nos estabelecimentos de ensino, equiparando-a, quando em funcção, á cathedra, até agora a unica rodeada de prerogativas e vantagens. Pela reforma entre a livre docencia e as cadeiras não haverá, quando em jogo os interesses do ensino, distincções de substancia e natureza; colocadas no mesmo plano, equiparadas nas regalias didacticas, tendo á sua disposição equiparadas nas regalias didacticas, tendo á sua disposição o mesmo equipamento e a mesma apparelhagem, que não pertencem á cathedra, mas á Escola e ao ensino.

     De outro lado, os mandatos universitarios, conferidos a institutos altamente especializados, constituirão os estabelecimentos de ensino superior no dever de se não manterem distantes das seguras exigencias da instrucção scientifica, accrescentando-se, assim, á concurrencia instituida pela docencia livre mais um novo estimulo, dos mais uteis e efficazes.

     Completando as providencias já enumeradas, o regimen didactico soffreu profunda e radical transformação. Todas as cautelas foram tomadas para que o ensino seja ministrado pelos processos mais adequados e mais efficazes: banidas ou reproduzidas no minimo as prelecções e conferencias e as ilustrações de maneira que o alumno aprenda observando, fazenno e praticando.

     O antiquado systema de exame final, como unica e exclusiva prova annual estupido deshonesto e degradante systema intellectual e moral de apuração de conhecimentos, tão propicio á improvização e á fraude, ao triumpho facil e deseducativo de qualidades muitas vezes secundarias e subalternas, pessimo, ainda do ponto de vista da educação porque, incurtindo na juventude uma falsa noção do systema de premios e recompensas que funcciona na vida fóra da escola, em que a victoria exige fundamentos mais solidos e tests mais demorados e exigentes, o systema de exames foi profundamente transformado. O exame final não é a prova unica. Haverá, durante o anno, provas parciaes, notas em trabalhos praticos, arguições, debates. Para chegar ao exame final, o alumno terá atravessado todas essas provas intermediarias, de maneira que a prova de fim de anno apresenta outras garantias á seriedade do julgamento do que as tão precarias que actualmente offerece, as quaes se cifra, no maior numero de caos, á felicidade no sorteio e á tolerancoa dos examinadores, que fundam a sua disciplencia no facto de ser serodia, extemporanea, e inapplicavel, como remedio, a reprovação.

     Não será, como se vê, por desconhecimento dos defeitos e lacunas reaes do nosso systema de ensino, nem por ausencia de rigorosas medidas de prevenção e de garantia, se com essas radicaes transformações e apezar dellas, continuar o nosso ensino a soffrer dos males e dos vicios que actualmente tanto o degradam e o inferiorizam.

DIREITO

     O curso de bacharelado foi organizado attendendo-se a que elle se destina á finalidade de ordem puramente profissional, isto é, que o seu objectivo é a formação de praticos do direito.

     O curso de direito foi desdobrado em dous: um dos bacharelado e outro de doutorado.

     Da sua seriação foram, portanto, excluidas toas as cadeira que, por sua feição puramente doutrinaria ou cultural, constituem antes disciplinas de aperfeiçoamento ou de alta cultura do que materias basicas e fundamentaes a uma boa e solida formação profissional.

     A philosophia do direito foi substituida pela Introdução á Sciencia do Direito, collocada no primeiro anno como indispensavel propedeutica ao ensino dos diversos ramos do direito, como na medicina a propedeutica medica procede as cadeiras de clinica, fornecendo as noções basicas e geraes indispensaveis á comprehensão dos systemas juridicos de que ella analysa e decompõe as categorias fundamentaes. A economia politica passou a ser collocada no primeiro anno, pela intuitiva consideração de que a ordem juridica é, em grande parte ou na sua porção maior e mais importante expressão e revestimento da ordem economica. As relações economicas constituindo, como constituem, quasi todos o conteudo ou materia do direito, o facto juridico passa a ser um pressuposto necessario do facto juridico. O estudo da economia deve, pois, preceder ao estudo do direito, o da ordem economica ao da ordem juridica, sendo, como são, as cathegorias juridicas as fórmas de disciplina e de ordenação da materia economica em systemas de relações sanccionada pelo direito.

     Collocadas, assim, no primeiro anno a Instrucção á Sciencia do Direito e a Economia Politica, o espirito recebe a acção preparatoria imprescindivel para abordar o estudo do direito positivo, de que ambas constituem presuppostos necessario e indispensaveis.

     Foi supprimida do curso de bacharelado a cadeira do direito romano. Aliás, esta suppressão constitue novidade apenas na lei. E' antes uma confissão do que um acção. Effectivamente, não sei se na pratica houve jamar no Brasil estudo de Direito romano nas nossas Faculdadaes. O que nellas se ensinava, com o nome do Direito Romano, eram noçães geraes de direito. Como estas noções eram acompanhadas a titulo de ilustração de citações do "Corpus Juris", passava como de Deireito Romano um curso que, real e effectivamente era de encyclopedia ou de propedentica juridica. A reforma limitou-se, portanto, a consagrar na lei uma situação de facto.

     Além disto, o direito romano constitue antes materia de um curso de alta cultura juridica do que de curso de finalidade profissional. Não seria justo, pois que, quando a duração do curso se revela insufficiente para um estudo satisfatorio do direito moderno, cujo conhecimento se torba dia a dia mais difficil, graças ao movimento de transformação que se opera no seu seio e ás multiplas differenciações que tem soffrido o tronco juridico primitico dividindo-se em novos ramos e categorias, cujo numero avulta, cada dia, com os novos processos de organização e de polarização dos interesses, não seria justo que tempo, já de si tão escasso, se desfaleasse de um periodo destinado ao estudo instituições caducas, que, ao invés de constituirem objecto de direito positivo, são antes materia de archeologia juridica.

     Os residuos uteis de direito romano, isto é, os seus elementos vivos ou que sobrevivem no direito moderno, podem ser convenientemente estudados no direito civil, no capitulo das fontes e a proposito da explanação dos diversos institutos.

     Isto não implica recusar, de modo completo, qualquer merito ao estudo do direito romano. Particularmente do ponto de vista da technica juridica o seu estudo será, de grande interesse, porque nelle, como em todas as obras primitivas e rudimentares, se deixam vêr a nú os artificios e processos symbolicos, pelos quaes o espitito humano constroe os conceitos e as categorias juridicas. Deste ponto de vista, "como razão escripta", na expressão de Leihnitz, será o estudo do direito romano, na sua parte util, fica reduzido á historia technica do direito e constituirá objecto de um  curso de alta cultura juridica, no qual predominem sobre os interesses pelo estudo de direito positivo os mais raros e menos urgentes, de estudo especulativo e philosophico dos processos de construcção e de ordenação technica do material do direito.

     No curso de doutorado, por esses motivos, isto é, por se tratar de um curso de alta cultura juridica, passou o direito romano a figurar, não porém, como estudo da regulamentação dos seus institutos juridicos, mas da sua historia internação do seus institutos juridicos, mas da sua historia interna e da sua evolução em confrento com as legislações modernas.

     No curso do bacharelado haverpa, assim, mais tempo a ser dedicado ao estudo do direito positivo, ao qual o direito romanos poucos subsidios uteis offerece, tanto se transformou, na idade contemporanea, a physionomia da ordem juridica. Em face della, ainda as partes consideradas mais vidas do direito romano fazem papel de residuos quasi archeologicos. Basta notar que o que Van Wetter estima ser a "parte viva" do direito romano (as obrigações), Kemtza "figura predilecta da sua jurisprudencia" aquella em que mais fulgura a sabedoria dos seus juristas", e Saleilles, "a obra-prima do direito quiritario", é, exactamente, , no direito moderno a que soffre as mais radicaes e profundas alterações, apresentando uma physionomia ou identificada pelos romanos, se com ella confrontados.

     Imagine-se, por alhi, o que será do regimen da propriedade quiritaria e da organização da familia romana.

     Suprima-se, igualmente, a cadeira de direito privado internacional popr falta de motivos que justifiquem a sua existencia, como disciplina autonoma, em curso profissional de direito, O seu objecto é a applicação das mesmas regras juridicas de que tratam as outras cadeiras de direito, o que lhe dá caracter particular é o facto de que se occupa da applicação das regras juridicas do accôrdo com principios especiaes. Ora, esses principios podem e devem ser estudados de modo geral no direito privado, passando a constituir a cadeira de direito privado internacional, materia de especialização e, assim, mais bem collocada no curso de doutorado.

     Tornou-se, assim possivel accrescer um anno ao estudo do direito civil, lacuna esta que de ha muito se vem fazendo sentir. No tempo que lhe é actualmente destinado, o estudo do direito civil, não chega a abranger o dos institutos vigentes. Fica, commummente, sacrificado o estudo dos contractos em especie, e do direito da familia e o das successões. Haverá, como accrescimo de mais um anno de direito civil largueza e opportunidade de estudal-o de maneira mais abrangente, comprehendendo, assim, não só o estudo dos institutos vigente, como o, tão interessante, das transformações que presentemente se operam, com frequencia cada vez crescente, nos seus conceitos e fórmas classicas.

     Separando do curso de bacharelado, o curso de doutorado se destina especialmente á formação dos futuros professores de direito, na qual é imprescindivel abrir aos estudos de alta cultura, dispensaveis áquelles que se destinam apenas á pratica do direito. O curso de doutorado se distribue, naturalmente, em tres grandes divisões: a do sireito privado, a do direito publico constitucional, e a do direito penal e sciencias criminalogicas.

MEDICINA

     Ao empenho de elevar o nivel da cultura scientifica e da capacidade technica dos nossos medicos, e de apurar conhecimentos necessarios ao alto mister de prevenir e de curar a doença, obedece, a reorganização das faculdades de medicina no Brasil, instituida na presente reforma.

     Define-se, nessa providencia, o zelo do Estado pela vida de nossa gente, e affirmam-se os seu propositos de promover o aperfeiçoamento progressivo de nossa raça.

     Nenhuma outra profissão mais interfere, que a do medico, nos destinos de uma nacionalidade, porque na medicina preventiva e curativa, em beneficio da vida, aproveitem-se as melhores conquistas do genio universal, nos vastos dominios da biologia. O vigor, a robustez e o aperfeiçoamento physico, moral, e intellectual do individuo, elementos de seu valor como unidade productiva e como factor de civilização, constituem a base de todo progresso collectivo e só podem resultar de medidas destinas á defesa do homem contra quaesquer circumstancias que o degradam. E é, quasi sempre na acção do medico, na hygiene pela amplitude de suas realizações preventicas, na therapeutica pela efficacia de seus processos modernos. na cirurgia pelos recursos de sua technica apurada, e é, acima de tudo, na eugenia pela selecção progressiva da especie humana, que se effectivam as possibilidades bemfazejas da sciencia. Accresce, para assignalar as responsabilidades da medicina brasileira, a circumstancia de ser o nosso um paiz de clima tropical, e intertropical, assim ampliada a sua nosologia em especies morbidas perculiares ás condições climatologicas, e assim difficultada a vida sadia pela aggressão de agentes pathogeneos abundantes. Terá, portanto, medico entre nós que instruir-se no estudo da doença cosmopolita, e terá, com dobrado zelo, que habitar-se no methodod de prevenção e de cura da doença propria dos paizes quntes. Attenda-se ainda no conceito unanime de que as faculdades medicas não se podem limitar ao ensino de conhecimentos adquiridos, á formação de profissionais para o exercicio da medicina applicada, mas devem prolongar sua actividade até os dominios do desconhecimento e contribuir, pela conquista de verdades novas, pelos esclarecimentos de problemas obscuros, para o progresso da sciencia e para a felicidade da vida.

     Ensinar a medicina e ampliar a um tempo, os recursos de sua acção salvadora, tal o duplo objecto que deve agora orientar á organização technica e scientifica das faculdades medicas, á que torna a pesquiza scientifica original complemento indispensavel dos processos didacticos. Nem foi outro o espirito dá presente reforma, senão o de instruir o medico nos conhecimentos indispensaveis a seu nobre mistér e de estimular a indagação scientifica original, em quaesquer dominios da biologia applicada.

     Na organização didactica adoptada, e de accôrdo com o parecer de technicos autorizados, foram attendidas as nossas tradições, as nossas necessidades mais assignaladas, os nossos recursos actuaes, e foram corrigidos, quanto possivel, os nossos defeitos e lacunas.'

     E' bem certo que nos faltam algumas condições imprescindiveis á perfeição completa do ensino medico, especialmente no que respeita a sua parte de applicação. Não possuimos hospitaes bastante amplos, e com elementos technicos sufficientes, para nelles se exercitarem os numerosos candidatos ao exercicio da medicina applicada. E, por outro lado, sendo ainda em pequeno numero os institutos de ensino medico, existentes no paiz, a limitação numerica de matriculas, que deveria corrigir a deficiencia de material technico, não poderá ser praticada, neste momento, de modo absoluto, sem prejudircar a assistencia medica necessaria em nosso vastissimo territorio. Não poderemos, é certo, permanecer no regimen actual, e consentir que a matricula no primeiro anno do curso medico exceda de 200 alumnos. Tal regimen, tratando-se de aprendizado technico-scientifico em que é essencial a instrucção individual, não só constitue o maior dos absurdos didacticos, mas leva ainda o Estado a faltar, scientemente e de animo calculado, ao compromisso de ministrar a habilitação profissional, por elle proprio offerecida.

     A maior deficiencia actual do ensino em nossas faculdades reside, sem nenhuma duvida, na desproporção entre a capacidade didactica das mesmas e o elevado numero de alumnos matriculados. A criação e docencia livre, em leis anteriores, visava corrigir diversas os resultados não correspondam aos intuitos da lei. Havia mister, dahi modificar o systema, especialmente no sentido de mais approximar o docente do professor cathedratico, de effectivar as suas attribuições no ensino, e sobretudo de erradicar o preconceito de que o docente livre seja, apenas um concurrente ao professor, a disputar-lhe alumnos e proventos, sem qualquer empenho em contribuir para o aperfeiçoamento do ensino. Assim não é, e nem assim poderá ser. O docente livre deve constituir factor de alta valia na organização didactica, bastando, para que assim seja, o aproveitamento amplo de seu esforço e de sua competencia. Mas, para tanto, é necessario que a escolha do docente livre seja baseada em elementos seguros de selecção, e ainda que a sua perseverança no esforço, as suas aspirações de attingir mais elevado posto na hierarchia profissional, sejam verificadas e estimuladas pelo Estado. Os processos, sejam verificadas e estimuladas pelo Estado. Os processos de concurso para o provimento nas attribuições de docente livre, e a revisão periodica do quadro de docentes, instituidos na presente reforma, deverão attender a essa indicação necessaria.

     Foi criterio essencial na actual reorganização promover e facilitar, o mais possivel, a especialização profissional, nos diversos ramos da medicina applicada.

     Tão vastos e complexos são os conhecimentos necessarios á pratica moderna da medicina, de tal modo e ampliara, os methodos de prevenir ou de curar a doença, que escapam ás possibilidades de uma só intelligencia, de uma unica actividade individual, o preparo technico perfeito e a cultura scientifica aprofundada em cada um dos ramos da medicina. E, entretanto, os interesses superiores da vida humana não podem prescindir pathologicos, de especialidades medicas, competencia que só poderá ser adquirida actualmente, em estudo a tirociio especializados.

     Na reforma actual foi instituido para que se effectivo immediatamente, o ensino amplo e intensido de disciplinas, que na pratica profissional constituem especializações bem definidas, e foi ainda permittida a mesma norma, a juizo do professor e do Conselho technico-administrativo, para quaesquer outras disciplinas, ensinadas nas faculdades medicas.

     Ao mesmo objectivo de ampliar a cultura medica, em determinados dominios das sciencias puras e das sciencias de applicação. Obedece a criação dos cursos de aperfeiçoamento, nos quaes se devem exercitar o esforço e competencia de professores cathedraticos, de docentes livres, de auxiliares de ensino, e ainda de profissionaes, de alto saber e larga experiencia, estranhos ao corpo docente das faculdades.

     A seriação do curso medico, e as disciplinas nelle incluidas, sofferam modificações apreciaveis aconselhadas pelo melhor criterio technico e scientifco. Foram retiradas do curso medico as cadeiras de physica, de chimica geral e mineral e de chimica organica, cujo estudo deverá ser ministrado nos dous annos do curso gymnasial superior, e, ao em vez daquellas, foram criadas as cadeiras de physyca biologia e de chimica physiologica, estas de applicação immediata aos estudos medicos. Foram tambem supprimidas as cadeiras de obstetricia, de pathologica medica e de pathologia cirurgica porque, em verdade, constituem essas disciplinas a parte doutrinaria, respectivamente, das cadeiras de clinicas obstetricia, de clinica medica e de clinica cirurgica, nada justificando o seu ensino theorico, de minimo proveito, sem applicação da doutrina ao facto concreto.

     Uma das cadeiras de clinica cirurgica foi transformada em clinica urologica, attendendo-se, assim, á exigencia evidente do exercicio profissional, sem o menor prejuizo para o ensino da cirurgia geral, ministrado em duas cadeiras.

     A circumstancia de constituirem algumas das disciplinas ensinadas nas faculdades especializações profissionaes consagradas, justifica o dispositivo que reduz a um semestre o ensino normal das mesmas, sendo organizados cursos de especializações nos quaes será ministrado ensino aprofundado daquellas disciplinas.

     A reforma procura attender, neste ponto á indicação primordial de approveitar largamente a actividade de alumnos no estudo das disciplinas que o habilitam o exercicio polichimico, ministrando-lhe, das clinicas especiaes, apenas os conhecimentos fundamentaes. E assim deve ser, porque de outro modo a pretender formar profissionaes para exercitarem todos os ramos, mesmo os mais especializados, da medicina applicada, não se conseguiria nem a habilitação sufficiente para o exercicio da clinica geral, nem a formação de especialistas com a necessaria capacidade technica.

     Entretanto, sem o proposito de formar no curso medico normal especialistas nos ramos basicos de medicina, a reforma leve em vista attender, quanto possivel, á conveniencia de, dentro do proprio curso, e tendo em vista as tendencias e preferencias do alumno, as quaes costuman ser precoces, orientar-lhe a vocação profissional no sentido ou direcção em que ella mais accentuadamente se manifesta. Os cursos de aperfeiçoamento e de especialização completarão a obra de orientação profissional no curso iniciado.

     A presente reforma procurou subordinar-se ao conceito irrecusavel de que no ensino das sciencias de applicação, qual a medicina, é indispensavel a participação directa do alumno nos exercicios e trabalhos praticos, a instrucção individual em factos concretos. Nem de outro modo será duradoura ou terá caracter utilitario a noção ensinada. O ensino collectivo, de natureza doutrinaria, deverá apenas completar o ensino pratico, e mesmo nelle cumprirá aproveitar todos os elementos de objectivação dos conhecimentos ministrados. Laboratorios de experiencia ou de pesquizas originaes, enfermaria e dispensarios dos hospitaes, salas de autopsia, constituem o ambiente em que se ha de exercitar a actividade pessoal do alumno, em que se realizará a formação technica e scientifica do medico pratico ou do pesquisador productivo.

     Outras disposições que escapam a esta enumeração synthetica, foram introduzidas no regimen administrativo e didactico das faculdades medicas, sempre com o empenho de melhorar e corrigir. E' bem claro, entretanto, que na execucação desse programma de aperfeiçoamento representarão factores primordiaes e competencia e o devotamento do professor ao ensino. De nada valeriam installações magnificas, preceitos legaes acertados, e quaesquer outras condições as mais favoraveis ao aprendizado medico, se faltasse o espirito que orirnta, o senso que dirige, o modelo que exemplifica.

ENGENHARIA

     Os defeitos do ensino de engenharia são os de todo o nosso ensino superior. Já me referi a elles no capitulo desta exposição, dedicado ao ensino geral. A materia porém, é de tal importancia e gravidade, do interesse tão capital para o Brasil, que não será demais voltar, a proposito do ensino de engenharia, a insistir sobre ella, do modo mais particular e definido. Vejamos os males e os remedios.

     Pela deploravel decadencia a que chegou o ensino secundario e pela benevolencia, levada aos extremos limites da tolerancia, na admissão, matricularam-se os estudantes nas escolas de engenharia sem preparo basico, sem formação mental.

     O sem insucesso na profissão é lançado á conta da theoria. Se tehoria, em opposição a cousa concreta, quer dizer palavra, por isso que immaterial, então é justo dizer que ha excesso de theoria, porque ha excesso de verbalismo. Mas, se theoria quer dizer a rede de conceitos que cooordena e liga os factos, então pode-se dizer que ha, no ensino, extrema pemuria de theoria.

     Desta é preciso que haja de um e outro extremo do curso. Os factos são em numero incontavel. Que importa apresental-os com profusão, si em confusão? Não é a massa das cousas exhibidas que dá valor ao ensino, mas o exercicio continuado das faculdades de coordenação desses factos.

     Podemos attribuir bôa parte da culpa nos parcos rescultados do ensino de engenharia a defeitos e organização, mantidos pelo habito e tão radicados que determinações da ultima reforma, contrariando muitos delles, não os conseguiram de todo remover, por inapplicadas.

     Nunca foi tornada effectiva, de modo systematico, a determinação de trabalhos a serem realizados pelo estudante, durante o anno lectivo. Embora fossem exigidos pelos regulamentos, não o eram com caracter imperativo que deveriam ter taes determinações, e na applicação ao tomar um caracter facultativo, praticamente se annullavam.

     A attitude do estudante, nos cursos, se tornava, desde logo, passiva. Nada o compellia á frequencia com assiduidade, nada estimava suas faculdades a uma atitude verdadeiramente activa no processo de acquisição. Nenhuma curiosidade, nenhum interesse eram despertados.

     O ensino gritava, e até agora ainda gravita, em torno dos exames, como si estes constituissem uma finalidade.

     Uma pratica abusiva e desmoralizante, que só veiu a encontrar correctivo na ultima reforma do ensino, tornava a prova oral uma burla. Da escripta é escusado falar, pois sabe todo mundo em que condições escandalosas tem sido ella sempre feita, de tempos immemoraiaes.

     O pasmoso é que, com um ensino assim deploravelmente organizado, sem nenhuma actividade por parte do estudante, durante o anno, com exames escamoteados, com professores agindo sem coordenação de esforços, o pasmoso, diziams, é que com estudantes que faziam do ensino secundario quasi só ignorancia e incapacidade para um trabalho intensivo e methodico, se conseguisse o que se alcançava. Si a média é, de facto, fraca, não se pode deixar de reconhecer que ha, saidos da escola, bom numero de profissionaes de grande merito, com uma formação que honra, não direi o nosso ensino, pois que este deveria antes, ser julgado pela média de sua producção, mas a nossa raça, e que são conforto pela média de sua producção, mas a nossa raça, e que são conforto e esperança pra os que tenham uma nova reforma.

     Uma reforma que pretencia satisfazer nossas necessidades, que seja feita para nosso meio e nossa gente, não deve perder de vista elementos de apreciação tão preciosos como estes.

     Póde-se, desde já, que o que ja de melhor é o essencial: a materia prima.

     Regosijemo-nos com isto. Ao modelal-a, não se esqueçam, porém, suas qualidades instrinsecas. O ferro, o granito, o ouro, o marmore, o chumbo, tee, cada qual seus artifices, suas ferramentas, sua technica de trabalho, suas applicações.

     Assim, trabalhe-se com os olhos voltados para a obra e do modo como ella requer.

     Resumindo, póde-se dizer do corpo discente: materia prima excellente pela intelligencia e pela curiosidade, e com uma tendencia caracteristica e pronunciada a ser rebellar contra a acceitação de verdades não povoadas; preparo prévio deficiente em mathematica e deficentissimo em tudo mais, denunciando manifesta ausencia de cultura geral; nenhuma escola de trabalho methodico; por defeitos de organização (alguns, é certo, parcialmente removidos pela ultima reforma), sem nenhuma participação activa no processo de aprendizagem; á excepção de algumas poucas cadeiras, toda a vida intellectual, no decurso do anno lectivo, fôra da influencia do professor, fóra do ensino official, trabalhos praticos quasi inexistentes, importancia desmedida attribuida aos exames.

     Volte-se, agora, para o corpo docente.

     Até a ultimo reforma, ha seis annos atraz, o processo era de verdadeira anti-selecção, isto é, pela organização inexistente e pelo processo regular de ingresso ao magistrio, eram automaticamente excluidos da competição os verdadeiros valores, sendo os concursos provas de selecção de " promessas". Eram as disciplinas grupadas em secções, e o concurso era fetio paara provimento do cargo de substituto de secção.

     Como consequencia, desde logo estavam excluidos de concorrer os profissionaes de valor, não só por ser a funcção de substituto subalterna e mal remunerada, como ainda para um especialista de merito, que tivesse consumido muitos annos para aperfeiçoar-se em uma disciplina, por ser o concurso uma prova de temer, pelo respeito que lhe infundiam as outras disciplinas da mesma secção, ás quaes não se tinha dedicado de modo especial.

     O concurso ficava, pois, aberto ás esperanças, aos moços ainda sem experiencia, sem sepecialidades, que no concurso não tinha, a perder e delle só poderiam lucrar.

     Nada mais de interessante lhe restava a fazer que esperar a vaga de cathedratico. Nem mesmo se estudioso, lhe era o estudo um conforto, uma vez que, não havendo limites de idade ou de tempo de serviço para jubilação, não havia para o substituto nenhuma indicação fundada, quanto á cadeira a vagar e a data provavel.

     A ultima reforma do ensino trouxe alteração profunda no processo de preenchimento do cargo pela extincção das secções e respectivos substitutos. O julgamento pela Congregração e a constituição da mesa examinadora, formada tambem de membros da Congregação, não constituam garantias para uma elevação immediata, como devêra ter sido, do nivel de conhecimentos a exigir do candidato. As provas dos anteriores concursos para substitutos, velavam por que no jovem candidato não se propuzessem questões mais difficies que as que lhe tinham sido propostas, dous ou tres annos antes, como alumnos, taes provas elementares continuaram a ser, pela força do habito, as exigidas dos novos candidatos.

     O significado da transformação não foi devidamente comprehendido pelos professores e pelos candidatos.

     E' preciso não calar uma difficuldade séria para a formação de um professorado capaz e que tambem esta reforma não poderá integralmente remediar.

     O professor de cadeiras technicas necessita, para dar um ensino util, estar em contacto permanente, ou, pelo menos, amedudado, com a pratica. Em uma escola de medicina, por exemplo, nada de mais facil. A menos que a escola estivesse, pela sua situação, isolada de toda agremiação humana, nunca lhe faltaria material para estudo.

     Quanto á engenharia, a situação é radicalmente diversa. Em um paiz nobre com industria incipiente, technicamente ainda nos primeiros passos e em crises periodicas, são escassas as opportunidades para o exercicio effectivo da profissão. Duas medidas se recommendam para vencer esta difficuldade. Uma dellas, de alcance mais restricto ou mais contigente, seria a da concessão de licenças, aos professores, para que pudessem afastar-se do magisterio, afim de tomar parte em empreza ou serviços publicos, ou particularesm em que tivessem opportunidade de praticar a especialidade. No mesmo proposito, severia ser facilitada aos professores a viagem de estudos ao estrangeiro. Outra medida, de effeitos mais seguros e doradouros, seria a utilização frequente, por parte do governo, do pessoal e material das Escolas de Engenharia para estudos, pesquisas e investigações.

     Para, que taes incumbencias fossem proveitosas, seria necessario dar-lhes installações convenientes não só para o fim assignalado, senão tambem para um ensino efficaz.

     A exposição até aqui feita, em que procurei explicar, projectando luz sobre alguns dos males do nosso ensino, as causas mais vicas de sua insufficiência, quasi bastaria a justificar a presente reforma.

     Parece-nos util, todavia, motivar explicitamente algumas das disposições typicas da reforma, no referente ao ensino de Engenharia.

     Suggeriu-se reduzir ao minimo a theoria, e, ao mesmo tempo, levar mais longe a especializações.

     Penso, não obstante, que o ensino das sciencias fundamentaes não deve ser reduzido, nem descurado, mas intensificado, visto como o que fundamentalmente interessa não é a extensão, e sim o estudo demorado, cujo espirito e methodos bem penetram o estudante, e em que os exercicios e as applicações sejam ameudadas e intelligentemente escolhidos, para consolidar o aprendido.

     Quanto ás disciplinas de caracter technico, julgo, por outro lado, ser preferivel a variedade, com seus aspectos typicos muito embora não descendo a minucias, á concentração do interesse em um numero restricto de disciplinas estudadas em todas as suas particularidades.

     Uma escola superior de engenharia não se propõe formar engenheiros já senhores de qualquer especialidade e menos ainda especialistas sem base. Em qualquer parte do mundo, ainda nos paizes de industria, e, portanto, de technica altamente desenvolvida, não é a isto que se propõem as boas escolas superiores. As grandes emprezas e as grandes industrias teem-se manifestado claramente nesse sentido, pois não pedem que as escolas lhes fornelam technicos completos, porquanto não é essa a funcção da escola.

     Deve-se aprender na escola aquillo que, não aprendido opportunamente, quando se tem a capacidade propria e o tempo necessario, difficilmente poderá ser adquirido pelo trabalho profissional. E' por isso que as sciencias basicas precisam ser convenientemente estudadas na escola. Um estudo ligeiro, profunctorio, não poderá salvo raras excepções, ser jamais completado por estudos feitos posteriormente. Ha exemplos dolorosos de profissionaes que, em vinte, trinta annos de assiduo trabalho de recomposição das bases não adquiridas na escola, jamais, conseguem recuperar aquillo que um ou dous annos de estudos feitos no tempo proprio lhes teria dado.

     Um dos aspectos mais typicos de enegenharia de nossos dias é a evolução no sentido scientifico. A fusão das actividades nos technicos e dos scientistas é cada dia mais intima. Nas academias de sciencias veem apresentadas amiude contribuições de technicos e nas revistas technicas contribuições de scientistas.

     Dos iniciados do ultimo seculo, foram surgindo a grande industria do aço, a electrotechnica, os motores de combustão interna, as turbinas a vapor, o concreto armado, o automovel, o aeroplano, o radio e grande numero de applicações da technica e, pode-se notar, quanto mais recentes, tanto mais rapidos os progressos e tanto mais sicientificos os meios de aperfeiçoamento.

     Para alcançar taes resultados são empregados, não os primitivos materiais naturaes, mas os artificiaes, com qualidades technicas perfeitamente definidas: são usados methodos de experimentação os mais variados: são postos em contribuição estudos theoricos os mais transcedentes.

     Se, da apreciação da importancia da technica mundial voltarmos a nossa attenção para o nosso paiz, mais permente então se nos afigura a necessidade para o engenheiro, de uma solida instrucção scientifica, ao mesmo tempo que um conhecimento profissional, antes dirigido para as linhas typicas dos differentes ramos da engenharia, que para o conhecimento minucioso de um delles.

     Não temos ainda bem definidas na economia geral da nação as linhas caracteristicas das actividades technicas, cada uma com vida propria assegurada, correndo em leito estavel e bem cavado.

     Os engenheiros, exploradores desses cursos incertos, são obrigados constantemente a buscar furos e igarapés que os conduzam as aguas de maio calado, salvando-se das aguas rasas. Máo serviço se prestaria aos joven profissionaes, vedando-se-lhes esses saltos de direcção e obrigando-os a permanecer, em risco de encalhe, no mesmo fio d'agua.

     Outro motivo pelo qual a formação na escola deve ser feita aprofundando os conhecimentos constituido, como seria mais conveniente, pelos serviços publicos ou emprezas particulares que acolhessem na vida pratica os novos diplomados.

     Finalmente, para terminar, poderemos ainda dizer que o ensino theorico é reclamado pela formação do espirito de nossa gente. Qualquer tentativa de introduzir um ensino que pretenda, pela adopção de regras e receitas, descolar do plano dos phenomenos, encontraria da sua parte viva relutancia.

     Convém, entretanto, fazer ressaltar, que sem laboratorios e gabinetes, sem experimentação continuada, nenhum progresso é de esperar da theoria. Póde-se dizer que sem ella o ensino é manco, ou peor ainda, por isso que, a nosso vêr, theoria e experimentação constituem para o progressp da techmica moderna, necessidade tão imperiora quanto o systema de locomação para a marcha humana. Não existe, a rigor, precedencia de uma sobre a outra.

     Ainda se me afiguram opportunas as considerações seguintes ácerca de um ponto que julgo da mais alta relevandoa para a efficiencia e rendimento do ensino.

     O professor não deve ser a autoridade suprema, que decide em ultima instancia. Elle apresenta os problemas e deve fazel-o de modo a interessar o alumno, a chamal-o a collaborar na pesquiza dos meios de solução, indica-lhe, não dogmaticamente, como outr'ora, a solução definitiva, senão aquella que se apresente a mais plausivel no momento. Dá-lhe a conhecer as melhores fontes de informação, estimulando-lhe o gosto pela indagação por conta propria e, no tratao sem simulações, em debate franco com o alumno, não tem pejo de dizer que ignora. Humaniza-se. Ganhando assim a confiança de seus alumnos adquire a autoridade necessaria para lhes fazer comprehender a responsabilidade, que sobre os novos pésa, de achar novas soluções para os problemas novos.

     Eis porque foi proposta a aula de debate e arguição em que para logo se estabelecerá entre professores e alumnos a corrente de entendimento e confiança que servirá para transformar a aula de prelecção, destituida de interesse, embora de criação, viva, empolgante e magnetica.

     Póde se dizer que, em essencia, os methodos de ensino constituiram a preoccupação primeira da reforma. Os capitulos referentes a organização didactica e ao regimen escolar, são, portanto, os que consubstanciam as medidas julgadas mais necessarias á melhoria do ensino. A não vitaliciedade immediata ao cathedratico depois de provido no cargo, o modo de constituição de commissão julgadora do concurso e o seu processo, as opportunidades concedidas aos docentes livres, são medidas tendentes a constituição de uma corpo docente mais capaz. Os meios de ensino propostos, a maior importancia attribua aos exercicios escolares, a exigencia de programmas concordantes, a serem integralmente cumpridos no periodo lectivo, a insistencia pela apresentação concreta de todos os conhecimentos de ordem pratica, a importancia capital attribuida á execução de projectos, condicionam medidas que deverão elevar de muito a qualidade e o rendimento do ensino. Finalmente, no regimen escolar, a obrigação para o estudante de tornar parte ectiva em todos os trabalhos escolares, fazendo desapparecer quasi o exame, que deixa de ser o acontecimento de um certo dia, para ser uma simples contagem de notas attribuidas durante os periodos lectivos, tudo isso concorre a tornar effectiva a participação do alumno no processo pedagogico.

     Este conjuncto de disposições, pouco relevantes talvez em apparencia deverá bastar a trazer grandes beneficios ao ensino nas escolas officiaes.

     Embora conservando quasi todas as cadeiras existentes, fui levado a introduzir algumas novas. Preliminarmente, por uma revisão, no quadro actual, verificou-se serem de vantagem alguns deslocamentos de disciplinas. Isto, porém, não bastava. Foi, por isto, suggerida a criação de quatro novas cadeiras a serem providas por cathedraticos, sendo que a ultima a de Photo-topographia. Technica cadastral e Cartographia, como das disposições geraes e transitorias de deprehende, não necessitará tão cedo de provimento effectiva, podendo ser feito o seu estudo ao Serviço Geographico Militar.

     Além das cadeiras referidas, foi tambem proposta a criação de outras, não providas effectivamente por cathedraticos.

     Assim, as cadeiras de Chimica technologoca, que no curso de engenheiros civis, como no de eletrecistas, dará aos estudantes e conjuncto de conhecimentos de chimica de que necessitam, e não apenas os de chimica inorganixa que lhes vinham sendo ministrados, cabendo a regencia a docentes das cadeiras de chimica, analogamente, a de Nações de Electrotechnica, que dará no curso de engenharia civil, em um só anno, um resumo do curso das tres cadeiras especializadas do curso de eletricistas, e que será regida pelos docentes das cadeiras correspondentes desde curso; a cadeira de Chimica-Physica e Electro-chimica, a ser leccionada em um periodo; a de Complementos de Mathematica e Nomographia, igualmente em um periodo, aquella a ser regida por um dos docentes de Chimica, e destinada ao curso de industriaes, a outram facultativa, a ser leccionada pelo docente que o Conselho technico-administrativo indicar.

     De momento, foram sô estas as cadeiras criadas. Fica, porém, aberto o caminho á criação de outras, sob o mesmo criterio, que dará mais elasticidade e mais variedade ao ensino, sem exigencia de provimento por cathedratico effectivo.

Outras cadeiras foram instituidas, por desdobramento nos desmembramento; a segunda cadeira de Physica, por desdobramento, de modo a ser feito o ensino por sous cathedraticos cada um incumbido de uma parte da cadeira: a de Construcção civil e architectura, constituida por partes das cadeiras de Processos e Materiaes de Construcção. Technologia das profissões elementares e de Architectura, Hygiene Saneamento; a de Pontes e grande estructuras metallicas e em concreto armado, uma parte destacada da cadeira actual de Estabilidade das construcção e Ponte e Viaductos e a outra nova: finalmente a de Photo-topographia Technica cadastrale Cartographia, para o curso de geographos.

     A cadeira de Physica foi desdobrada por constituir esta materia a de maior alcance ma formação scientifica do engenheiro.

     Collocada no limiar do curso como até o presente, e ensinada a jovens sem preparo prévio, não podendo, portanto, ser apresentada senão sob fórma elemetar, em razão da insufficiencia do ensino gymnasial, a Physica passará a ser estudada em dous annos, depois que já adquiridos os conhecimentos basicos de Calculo e de Mecanica, que permitirão um estudo mais aprofundado e proveitoso da materia. A Physica constituirá, assim,o fundamento scientifico de cadeiras como a de Resistencia dos Materiaes, Hydraulica, Motores thermicos e Electrotechnica.

     As duas cadeiras de Materiaes de construcção, Technologia das profissões elementares e de Architectura, Hygiene e Saneamento foram desmembradas para o fim de constituir tres novas cadeiras. Da primeira foi retirada a parte de Construcção civil, afim de conferir-lhe o caracter, que deve ter, de uma cadeira de Construcção em geral, instituindo nos processos mais modernos, no estudo de apparelhamento para execução de grandes obras, no de fundações e sobretudo para que os processos de construcção em concreto armado possam nella encontrar o tratamento que os progressos da sua technica reclamam. Por outro lado, a cadeira de Architectura, Hygiene e Saneamento, precisava de ser alliviada de uma parte, afim de que as questões geraes de Traçado das cidades e Urbanismo pudessem ter o desenvolvimento que a impoprtancia actual do assumpto demanda. Julguei, pois, acertado retirar desta cadeira a parte de Architectura, em que estuda, em resumo, a Historia da Architectura e as noções indispensaveis de composição e distribuição dos edificios, para juntal-a á parte de Construcção civil acima referida. A cadeira, assim criada, deveria ser, de preferencia, preenchida por um architecto, visto como se destina a criar nas Escolas de Engenharia o terreno comum de entendimento entre o architecto e o engenheiro civil.

     Finalmente a cadeira de Photo-topographia, Technica cadastral e Carthographia, do curso de geographos, criada em principio, por ser imprescindivel aos especialistas em levantementos, seja de vastas regiões, pelos processos geodesicos, seja de areas limitadas, com os minuncias do cadastro, não necessitará ser provida desde já na Escola Polytechnica.

     Até o presente concedia -se abusivamente o titulo de engrenheiro-geographo aos que terminavam o curso geral das Escolas de Engenharia, mutio embora tivessem estudado materiais desnecessarias e deixado de estudar materias essenciaes. Constitua isto o diploma preventivo. Os que não pudessem ou não quizessem continuar os estudos, obtinham, assim, um titulo que, effectivamente, os não habitava, por defficiencia de proporção scientifica e technica, ao exercicio de qualquer ramo da profissão de engenheiro.

     Embora não seja de esperar immediata e grande concurrencia a este curso, foi elle criado, na presente reforma, afim de pôrtermo ao inconveniente apontado.

     As suas cadeiras communs a outros cursos serão leccionadas na Escola Polytechnica e as demais na Faculdade de Educação, Sciencias e Letras, quando installada. Restava, entretanto, uma cadeira, a de Photo-topographia, Technica Cadastral e Cartographia, que só poderia ser ensinada em escola profissional e cujo estudo, por motivo de ordem financeira, poderá ser feito no Serviço Geographico Militar, admiravelmente equipado para dar um ensino que a Polytechnica, por falta de apparelhamento, não se acha em condições de ministrar como efficiencia.

     Um attestado de trabalhos realizados com proveito naquelle instituto será, pois, a melhor das approvações na materiam dispensando-se a escola de manter tal cadeira.

     Se a Physica é de maior importancia para a formação scientifica do engenheiro é de maior importancia para a formação scientifica do engenheiro, não póde, por isto mesmo deixar de attribuir grande revelancia a um estudo de mathematica que corresponda ás necessidades actuaes.

     Seria talvez, aconselhavel o desdobramento da cadeira de Geometria analytica calculado differencial e integral, em duas cadeiras distinctas. O projecto adopta o meio termo. A cadeira fundamental obrigatoria, será leccionada em tres peridos ao invez de dous. Com o preparo prévio, exigido pelo exame vestibular, poderá p alumno estudar no 1º periodo da escola simultaneamente, o calculo e os complementos de Geometria analytica. O cathedratico de calculo se incumbirá de sua regencia no periodo addicional e nas condições já previstas para cadeiras sem provimento effectivo.

     Além disto, porém, é instituida uma cadeira de complementos de Mathematica applicada e Nomographia, facultativa e destinada a alumnos já avançados no curso da escola, e cuja regencia será entregue a cathedratico designado Technico-administrativo.

     Com o fim de permittir que materiais dependentes de outras pudessem ser iniciadas em tempo opportuno sem esperar, uma vez que não seja indispensavel, a conclusão de uma para inicio da outra, foi instituida a divisão do anno lectivo em dous periodos distintos. Deste modo nem todas as materias teem inicio ao mesmo tempo, muito embora continuam a predominar as que se estudam integralmente no mesmo anno lectivo. Com esta divisao em periosdos é possivel fazer a seriação mais adequada das materias, sem juxtaposição de cadeira que devam ser leccionadas em seguimento.

     Mas, não é esta a unica vantagem da divisão em periodos. Para algumas cadeiras nem toda a materia leccionada é essencial a todos os estudantes que as frequentam, pois em alguns cursos pôde ser recessaria toda ella e para outros só uma parte. Distribuindo, intelligentemente a materia, póde-se conseguir que em um periodo seguinte com o que interesse a outros. Desta vantagem lançou mão e projecto na distribuição de materias nos differentes cursos.

ODONTOLOGIA E PHARMACIA

     O ensino de Odontologia e Pharmacia foi organizado em Faculdades, continuando, porém, emquanto não installadas, a ser ministrado em escolas annexas á Faculdade de Medicina. O curso foi refundido, de maneira a excluir as sciencias basicas que constituirão materias de ensino secundario, substituidas por cadeiras da maior importancia scientifica e technica na formação dos professores de Odontologia e da Pharmacia. Assim, no curso de Pharmacia foi introduzido o estudo da chimica industrial pharmaceutica, attendendo a que a antiga manipulação pharmaceutica tenco, cada dia, pela adoptação de processos technicos modernos e pela producção em grande escala, caracteristica da actual organização industrial e commercial, a tranforma-se em manipulação industrial.

     Quanto á Odontologia, as cadeiras de clinica e de prothese, a primeira foi ampliada aos importantes dominios clinicos da Clinica operatoria e da Clinica odonto-pediatrica e Orthodontia e a segunda teve o seu ensino remodelado em prothese dentaria e prothese facial e dos maxilares attendidas desse modo, as exigencias da pratica profissional, cujas tendencias se accentuam no sentido de crescenre especialização.

ESCOLA NACIONAL DE BELLAS ARTES

     O ensino superior das bellas fortes, comprehendendo os cursos de architectura, pintura e esculptura, soffreu profundas alterações, não 'só quando á adaptação da escola ao plano universitario, como quanto a criação de novos órgãos que lhe permittam corresponder aos objectivos differenciados que visam os seus cursos, tanto sob o ponto de vista technico quanto sob o ponto de vista social. No que diz respeito á architetura, o respectivo ensino, embora complexo e especializado - a ponto de, em certos paizes, ser ministrado em escolas de engenharia - necessario se torna que o seu estudo seja feito em curso didaticamente autinomo. Só assim, sem tornal-o excessivamente technico, como no caso em que o ensino é ministrado nas escolas de engenharia, ou pelo contrario, deficiente sob o aspecto technico-scientifico, como no caso em que é processado nas escolad de bellas artes, o architecto será pelo desenvolvimento em sentidos diversos (technico, scientifico e artistico) do seu preparo, uma expressão perfeitamente equilibrada de cultura.

     Póde-se affirmar talvez sem exaggero, que a palavra architectura não tinha no Brasil, até pouco tempo, significação pratica. Raros eram, entre nós, os architectos e desses mesmos, a utilidade não s efazia socialmente sentir.

     Entretanto, no passado como no presente, em todos os paizes, a sua importancia foi sempre capital, representando cada architectura a synthese de uma civilização, a somma das qualidades e defeitos de cada povo em cada época.

     Factores diversos, entre os quaes o confronto com o estrangeiro, têm ultimamente demonstrado a nossa absoluta inferioridade a respeito, collocando assim o problema em evidencia e para elle despetando o interesse publico, Esse valimento social progressivo do architecto, tendendo a uma justa regulamentação da profissão, immediatamente se reflectiu na frequencia ao curso de architectura da Escola Nacional de Bellas Artes, a ponto de no anno passado, entre 460 alumnos matriculados, 456 pertencerem áquelle curso, havendo apenas quatro nos cursos de pintura, esculptura e gravura.

     Essa desproporção é significativa. O curso de architectura não é mais um cursom e sim uma escola dentro da propria Escola de Bellas Artes. Dahi o seu desdobramento em cinco annos, abandonado o regimen anterior, em que constitua apenas um "curso geral" da Escola de Bellas Artes.

     O curso de architectuta foi, pois enriquecido de novas disciplinas, absolutamente essenciaes á formação artistica, technica e scientifca ao architecto. A seriação proposta obedece rigorasamente á necessidade de transferir o curso de architectura do phase rudimentar em que tem vivido entre nós a um plano mais elevado, em que se satisfaçam, a um só tempo,a exigencia de uma base scientifica solida e segura, como ás de uma formação technica e artistica, com raizes profundas em uma formação cultural de amplos e claros horizontes.

     Os cursos de pintura e esculptura têm sido grandemente prejudicados pelo curso de architectura quem crescendo em importancia numerica, absorveu os demais.

     Tem-se observado - 30 par de grande concurrencia de alumnos livres, admittidos por concessão especial e inscriptos mediante simples prova de desenho, prova esta dispensada áquelles que se destinam ao proprio curso de "desenho figurado" - numero diminuto de alumnos matricula-los que, além de prestar exames de admissão e acompanhar durante tres annos o chamado "curso geral", teem que estudar materias para elles desnecessarias, como geometria descriptiva, composição elementar da architectura, etc., até chegar ao curso propriamente especializado de Pintura ou Esculptura, onde os alumnos livres chegam com muito mais rapidez, menos esforço e quasi identicas vantagens. Gahi a necessidade da suppressão das cadeiras inuteis que o compunham e da criação de outras de grand projecto, no sentido das aulas de pintura e esculptura serem iniciadas no terceiro anno: a iniciativa de instituir opportunamente premios em dinheiro, bem como a de permittir que, além dos professores effectivos, seja, contractados outros, de espirito mais moderno e de proficiencia consagrada, para que os alumnos possam ter a liberdade de optar, entre uns e outros segundo suas tendencias pessoaes. Assim desde que sejam gradativamente argumentadas as exigencias para a admissão de frequencia dos cursos regulares.

EXPOSIÇÕES GERAES DE BELLAS ARTES

     Quanto ás Exposições Geraes de Bellas Artes, até ha pouco organizadas pelo antigo Conselho Superior de Bellas Artes, resentiam-se de falta de autonomia. Excessivamente tolerante em relação aos representantes de tendencias artisticas retardadas e intransigente para com as correntes de espirito moderno, não representavam essas exposições, o verdade nivel de nossa cultura artistica.

     Indispensavel era, pois, que tivessem absoluta independencia da Escola, confiara a sua organização ás associações de classe e aos proprios artistas. Só assim se garantirá a liberdade de representação de todas as tendencias, dentro de um gráo de rigorosa seleção.

INSTITUTO NACIONAL DE MUSICA

     Quando o compositor Leopoldo Miguez fundou o Instituto Nacional de Musica, em 1890 organizando o seu programma de ensino, teve o proposito de ministrar aos alumnos ensinamento artistico sufficiente para a formação de verdadeiros musicos. Mas uma série de circumstancias e de vicis, situdes, de todo estranhas aos interesses da cultura do nosso meio social e ás necessidades de educação nacional deturpou pouco a pouco aquelle programma mutilando o de disciplinas essenciaes facilitando-lhe os cursos, até emprestar, finalmente, á carreira musical entre nós objectivos de "virtuosidade".

     Ora, o ensino da musica só deve interessar ao Estado emquanto a musica constituir ua funcção da cultura, organizando, traduzindo, dando fórma, expressão e estylo e estados da alma collectiva. Seé cedo ainda para o desapparecimento do "virtuose" cumore, entretanto ao Estado emprehender um esforço no sentido de elevar e enriquecer o espirito do individuo que deseje mais tarde especializar se na "virtuosdidade" musical, proporcionando lhe uma dóse mais larga de conhecimentos, afim de dar-lhe a comprehensão da funcção social que deverá exercer.

     Dentre as Artes, é a musica que mais congrega, organiza e exalta os sentimentos collectivos. A sua applicação consciente no exercicio dos cultos nas celebrações sociaes, nos trabalhos collectivos produz aquelle effeito acima assignalado e que interessa particurlamente a um paiz como o nosso, ainda em formação e em que as mabifestações individualistas tendem a exaggerar-se.

     Partindo, pois, dessas idéas e considerando que a actual orientação didactica talvez seja das mais defficientes, é que o presente projecto, baseado nas normas universalmente adoptadas pelas escolas e institutos musicaes modernos, estabelece os seguintes cursos na estructura do Instituto Nacional de Musica:

     1º, Curso Fundamental, que deverá ministrar ensino preparatorio e basico da musica, em cinco annos, devendo ser terminado pelos alumnos aos 16 ou 17 annos de idade, sem que, todavia, a distribuição horaria das aulas pertube ou impeça a frequencia á escola primaria ou ao curso gymnasial, cujos estudos serão indispensaveis ao proseguimento da cultura musical.

     2º, Curso Geral, feito em dous annos, em seguimento ao curso fundamental e destinado a formar especialmente instrumentistas e coristas profissionaes;

     3º, Curso Superior, o unico que, por seu caracter, foi incorporado á Universidade, e se destina a formar não só professores de instrumento ou de canto, como tambem maestros, compositores e regentes.

     O ensino instrumentistas ainda poderá ser prolongado por um curso de aperfeiçoamento - o curso de virtuosidade - que permitirá o desenvolvimento da technica de virtuosidade que desejam dedicar-se á carreira de virtuose.

     Além da reorganização proposta pela presente reforma, é exigida, para a matricula no curso superior do Instituto, a habilitação nas disciplinas que constituem o ensino secundario fundamental, de modo que os candidatos admittidos a ingresso já tenham base scientifica indispensaveis á cultura artistica.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

     A creação do Conselho Nacional de Educação corresponde a uma utilidade de caracter imperioro e inadiável. Os nossos apparelhos e centros de direcção e de orientação do ensino teem um cunho accentuadamente e quasi exclusivamente administrativo e burocratico. Dahi a deficiencia do seu funccionamento em tudo quanto se refere á parte technica e didactica do ensino.

     Além disso, a orientação do ensino, em todos os seus ramos, exige vistas largas, dilatados horizontes e cultura em que se reunam os predicados de variedade e unidade. Requer, portanto, um orgão em que encontram expressão e carcater as correntes do pensamento contemporaneo, de sorte que o ensino possa ser considerado em função das exigencias e transformações do nosso estado de cultura. Ora, sómente num grupo de elite, escolhida dentre o que temos de melhor com materia de cultura e de educação, poderá exercer essas altas e nobres funcções de orientação e do conselho.

     O Conselho Nacional de Educação destina-se, portanto, a representar um grande papel no conjunto da organização administrativa e technica do ensino no Brasil, contribuindo com a sua influencia e autoridade, para que se mantenham as linhas claras, firmes e definidas, segundo as quaes a presente reforma procura orientar as actividades didacticas e culturaes dos nossos institutos de ensino.

     Demais, de modo immediato e prático, o Conselho Nacional de Educação passará a exercer funcções de superintendencia e de controle em tudo quanto se refira ás equiparações de institutos de ensino secundario e superior aos modelos officiaes.

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     Assim expostas as linhas geraes da grande reforma do ensino superior, que tenho a honra de submeter a sua approvação, cumpre-me declarar a V. Ex., finalizando esta longa exposição de motivos, que outro fundadas esperanças de que honesta e rigorosamente executada, constituirá, por certo, o mais valioso concurso do espirito revolucionario pra a grande obra de reconstrucção, que inspirada por elle e presidida por V. Ex., se processa presentemente no Brasil.

Rio de Janeiro, 2 de abril de 1931.


Este texto não substitui o original publicado no Diário Official de 15/04/1931


Publicação:
  • Diário Official - 15/4/1931, Página 5830 (Exposição de Motivos)