Legislação Informatizada - DECRETO LEGISLATIVO Nº 67, DE 1975 - Exposição de Motivos
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DECRETO LEGISLATIVO Nº 67, DE 1975
Aprova os textos do Tratado de Amizade, Cooperação e Comércio e do Protocolo de Expansão Comercial, concluídos entre a República Federativa do Brasil e a república Oriental do Uruguai, em Riviera, a 12 de junho de 1975.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS Nº DAM-I/DALALC/DPB/DCTec/181/900 (B46) (B47), DE 23 DE JUNHO DE 1975, DO SENHOR MINISTRO DE ESTADO DAS RELAÇÕES EXTERIORES.
A Sua Excelência o Senhor
General-de-Exército Ernesto Geisel,
Presidente da República,
Senhor Presidente:
Na presença de Vossa Excelência e do Presidente da República Oriental do Uruguai, Senhor Juan Maria Bordaberry, tive a honra de firmar, a 12 último, com o Chanceler Juan Carlos Blanco, na cidade oriental de Rivera, um Tratado de Amizade, Cooperação e Comércio, bem como outros atos internacionais, no contexto da política de cooperação dinâmica que ora preside o relacionamento entre o Brasil e o Uruguai.
2. O Tratado de Amizade, Cooperação e Comércio representa um "acordo quadro" que contém, na riqueza de seu articulado, cláusulas de ordem política, econômica, financeira, técnica, científica, turística e de limites, abrangendo ipso facto o amplo espectro da colaboração que se faz mister incrementar entre países, como o Brasil e o Uruguai, unidos por indissolúveis nexos históricos e geográficos. A denominação de tratado foi escolhida justamente por representar, na processualística brasileira de atos internacionais, o instrumento jurídico hierarquicamente mais importante.
3.É de tal modo abrangente seu articulado, que se pode afirmar que, desde o século passado, não haviam concluído os dois países documento de igual magnitude, arrimado inclusive nas multíplices possibilidades de cooperação, informadas pela complementaridade de seus respectivos sistemas produtivos. Permitirá, assim, a ambos os Governos, dentro do dinamismo intrínseco que o caracteriza, pôr em funcionamento, de modo efetivo, mecanismos de pronta ação em todas as faixas de convergência dos dois países.
4. Cria o Tratado a Comissão Geral de Coordenação, que terá por finalidade fortalecer a cooperação brasileiro-uruguaia, analisar os assuntos de interesse comum e propor aos respectivos Governos as medidas que julgar apropriadas. Deverá reunir-se tão logo esteja em vigor aquele texto, a fim de implementar operacionalmente seus diversos dispositivos.
5. Pelo artigo IV, ambos os Governos manifestam sua satisfação pela entrada em vigor do Acordo sobre a Definitiva Fixação da Barra do Arroio Chuí e do Limite Lateral Marítimo, celebrado em Montevidéu a 21 de julho de 1972, reafirmando seus direitos e responsabilidades que, inclusive em matéria de segurança, correspondem a cada um deles naquela região fronteiriça e suas áreas adjacentes no Brasil e no Uruguai. Tal cláusula consagra a feliz política de franca inteligência entre os dois Países em matéria de fronteiras, que sempre norteou as negociações diplomáticas pertinentes.
6. Conforme o disposto no artigo V, as Partes Contratantes firmaram, concomitantemente, um Protocolo de Expansão Comercial, para lograrem a progressiva ampliação e diversificação dos fluxos de comércio recíprocos.
7. O interesse brasileiro de ampliar as relações comerciais com o Uruguai, na base da reciprocidade de tratamento e de forma a permitir aos empresários de ambos os países planejar sua produção com vistas ao comércio bilateral, ficou atendido com a assinatura do referido protocolo. Coincide, por outro lado, aquele instrumento com o desejo uruguaio de lograr um relacionamento comercial mais estreito e favorecido com o Brasil, do que o proporcionado pelos mecanismos de desgravação tarifária da Associação Latino-Americana de Livre Comércio (ALALC), e consagrá-lo com um vínculo jurídico especial, que lhe permita equilibrar o intercâmbio comercial bilateral, quantitativa e qualitativamente, ao garantir-lhe, por longo prazo e em termos preferenciais, o acesso ao mercado brasileiro de produtos uruguaios, especialmente de manufaturados.
8. O referido Protocolo estipula a entrada de produtos originários e procedentes de uma Parte, livres de gravames e restrições, exceto as que forem acordadas por negociação, entendendo-se por gravames os direitos aduaneiros e quaisquer outros encargos de efeitos equivalentes de caráter fiscal, monetário ou cambial que incidam sobre as importações. A seleção dos produtos que se beneficiarão dessas franquias tarifárias será pactuada entre as Partes Contratantes dentro de um amplo campo de liberação, que abrange as mercadorias dos Capítulos 25 a 98 da nomenclatura tarifária, isto é, a maior parte dos artigos industrializados, além de uma série de produtos agr-industriais a serem igualmente escolhidos de acordo com os interesses das Partes.
9. A fim de propiciar o equilíbrio da balança comercial bilateral, o Protocolo reconhece o princípio da reciprocidade de resultados e a situação de país de menor desenvolvimento relativo, de que goza o Uruguai na ALALC. Por outro lado, resguarda os legítimos interesses comerciais de ambas as Partes ao estipular a utilização das salvaguardas previstas no Tratado de Montevidéu, e a possibilidade de suspensão do regime de desgravação de um ou mais produtos em casos de grave prejuízo ou de utilização indevida das concessões. No caso do Brasil, essas cláusulas permitirão ação pronta por parte do Governo na eventualidade de uma conjuntura que exija a defesa de interesses econômicos regionais.
10. O instrumento firmado em Rivera estabelece um quadro jurídico bem definido, dentro do qual se implementará o programa de liberação tarifária, e os produtos objeto dessa liberação serão acordados por negociação entre as Partes, a iniciar-se antes de decorridos 90 dias da assinatura do ato.
11. Relevo especial no contexto das relações entre os dois países merece o artigo VI do tratado que dispõe que as Partes Contratantes empreenderão ações conjuntas destinadas à realização de obras de infra-estrutura de interesse comum, devendo dar impulso prioritário ao programa de desenvolvimento da Bacia da Lagoa Mirim, prevendo, nesse contexto, a celebração de um tratado. O referido documento virá criar mecanismos que possibilitem o pleno aproveitamento da região considerada, que cobre importantes partes do território rio-grandense e do leste uruguaio, dando-lhe um progresso harmônico e integrado.
12. Segundo o artigo VII, o Governo brasileiro cooperará, dentro de suas possibilidades, na construção da represa hidrelétrica de Palmar, através de financiamento para a aquisição e utilização de equipamentos e serviços nacionais. Esse artigo possibilita ao Brasil contribuir, em termos altamente relevantes, para a concretização da referida hidrelétrica, a situar-se no rio Negro, em território oriental - cuja importância é notória para o pleno desenvolvimento das potencialidades energéticas do vizinho país. Deverá produzir cerca de 300 MW, sendo intuito do Governo uruguaio iniciar o mais rapidamente possível sua construção. Atendendo ao espírito do que procede, ambos os Governos constituíram um grupo de trabalho binacional, de seis membros, que estudará meios e modos de tornar imediatamente efetiva a colaboração do Brasil no particular.
13. Procura o artigo VIII dar grande fluidez aos movimentos de capitais de ambos os países, tanto no setor público como no setor privado, demonstrando, por outro lado, o ânimo dos dois Governos em realizar acordos de complementação industrial e de criarem condições para o estabelecimento de empresas binacionais. Nesse contexto, será levada em conta a situação de país de menor desenvolvimento relativo de que goza o Uruguai, no âmbito da Associação Latino-Americana de Livre Comércio.
14. Tendo em vista o que precede, o artigo IX registra o desiderato do Governo brasileiro de estudar, com o maior interesse e simpatia, as possibilidades de estender ao Uruguai linhas de crédito para a aquisição, no Brasil, de bens de capital. Dentro desse espírito, implementando incontinenti a colaboração dos dois países a respeito, foi concedida na mesma data à República Oriental uma linha de crédito de US$ 50 milhões para a aquisição de bens de capital, que criará melhores condições para que a indústria uruguais possa impulsionar suas exportações para o mercado internacional e para o Brasil em particular.
15. Considerando a importância dos citados bens para seu processo atual de desenvolvimento, pelo artigo X o Estado Oriental concederá, no caso, o tratamento incondicional da cláusula da nação mais favorecida.
16. Os artigos XI e XII consagram o desejo de ambos os países de se prestarem assistência em matéria de produção e técnica agrícolas, podendo celebrar acordos comerciais de produtos agropecuários destinados a promover a complementação das produções nacionais. Tal dispositivo aciona as possibilidades amplas de cooperação bilateral ditadas pela complementaridade dos dois sistemas agrícolas, abrindo assim fecundas correntes de comércio no setor primário.
17. A luz da consideração supra, um grupo de técnicos uruguaios em trigo foi convidado a vir ao Brasil, como passo prévio à realização de um estudo pelo Governo oriental, que servirá de base à implementação do financiamento brasileiro à lavoura do trigo do Uruguai. Através do referido crédito, a triticultura uruguaia teria condições de elevar notavelmente sua produção, com excedentes exportáveis, que seriam adquiridos pelo Brasil aos preços internacionais. Tal fato faria ascender a novos patamares nosso intercâmbio comercial bilateral.
18. O artigo XIII estatui que o Governo brasileiro estudará, por solicitação do Governo oriental, as possibilidades de concessão de linhas de crédito para o equipamento das empresas de pesca constituidas com capitais brasileiros e uruguaios. Esse dispositivo visa criar incentivos a que empresários dos dois países se associem para a pesca comum em suas águas respectivas, o que traria inegáveis benefícios para ambas as partes. Ao mesmo tempo, sua redação atende à atual política do Governo do vizinho país de modernizar e equipar sua frota pesqueira.
19. No espírito do artigo XVI, as Partes Contratantes negociaram dois convênios um sobre transporte fluvial e lacustre, que seão objeto de Exposição de Motivos específica. O Convênio sobre Transporte Marítimo estabelece, como ponto básico, a obrigatoriedade de transporte, em navios brasileiros e uruguaios, das mercadorias objeto do intercâmbio bilateral. Tem duração de 5 anos, renovável automaticamente por igual período. Quanto ao Convênio sobre Transporte Fluvial e Lacustre, trata-se do primeiro instrumento do gênero negociado pelo Brasil nos últimos anos. Fixa normas gerais que seguem, em grande parte, o espírito do Convênio sobre Transporte Marítimo. Tem duração de 3 anos.
20. Pelo art. XV, as Partes Contratantes manifestam o desejo comum de promover dinamicamente as comunicações terrestres entre as mesmas, dando tratamento prioritário ao assunto. Tal dispositivo assume destaque especial no articulado do Tratado, uma vez que as economias dos dois países escoam seus fluxos de comércio e de turismo crescentemente por via terrestre. Complementando o referido artigo, o dispositivo XVI dispõe que o Governo brasileiro está disposto a estudar as possibilidades de concessão de assistência técnica para estudos relativos à implantação de obras rodoviárias e ferroviárias em território uruguaio.
21. Momentoso tema levantado pelo artigo XVII é o da futura colaboração brasileiro-uruguaia no setor de telecomunicações. Dispõem, com efeito, a indústria nacional de condições de prover, em quantidade e qualidade, o equipamento necessário para que a República Oriental desenvolva e torne realidade planos de expansão do ramo, de acordo com suas crescentes necessidades.
22. A cláusula XVIII versa matéria de suma importância para a cooperação bilateral, uma vez que procura viabilizar substancial economia de recursos energéticos, através da interligação dos sistemas nacionais de eletricidade do Brasil e do Uruguai. Já em 1965 foram realizadas conexões elétricas entre as principais cidades fronteiriças brasileiras e uruguais, com reais benefícios para ambas. Nesse espírito, e animados pela experiência acima, ambos os Governos acordaram fazer um estudo destinado a examinar a viabilidade de interligação dos sistemas elétricos respectivos, a processar-se entre a central termelétrica de Candiota, no Rio Grande do Sul, e a Central Hidrelétrica Doctor Gabriel Terra, no rio Negro. De parte do Brasil, foi a ELETROBRÁS encarregada de proceder ao citado estudo.
23. Atendendo ao disposto no artigo XX, de estabelecimento de estreita cooperação entre as Partes nos setores científico e técnico, vitais ao desenvolvimento de suas economias nacionais, foi celebrado um Acordo Básico de Cooperação Científica e Técnica, com o objetivo de ativar a realização conjunta ou coordenada de programas de pesquisas e desenvolvimento, a criação e operação de instituições de pesquisa ou centros de aperfeiçoamento e produção experimental, bem como a organização de seminários e conferências, intercâmbio de informações e documentação. Nesse contexto, ambas as Partes se concederão bolsas de estudo sobre os mais variados temas. O citado Acordo Básico será objeto de Exposição de Motivos específica.
24. O Artigo XXI consagra o interesse de ambos os Governos de manter vivas e ativar ainda mais as correntes turísticas de ambos os países, que constituem grande fator de integração humana entre as duas Nações, ao mesmo tempo que contribuem para o crescente entendimento brasileiro - uruguaio. Representa o turismo, ademais, o elemento propulsor do comércio e da indústria, incidindo seus benefícios também sobre o sistema viário de ambos os países.
25. Estabelece o artigo XXII que, além dos instrumentos internacionais previstos no Tratado, as Partes celebrarão, sempre que o ditarem as circunstâncias, protocolos adicionais ou outros tipos de atos internacionais sobre todos os assuntos de interesse comum. Tal cláusula denota o intuito de ambos os Governos de abranger, com o Tratado de Amizade, Cooperação e Comércio, a totalidade dos temas relacionados com o estreitamento da cooperação brasileiro - uruguaia, estando disposto a desenvolver, no futuro, iguais esforços para atender a novas situações criadas.
26. Tendo em vista o que precede, creio, Senhor Presidente, que o Tratado de Amizade, Cooperação e Comércio, bem como o Protocolo de Expansão Comercial mereceriam ser submetidos à aprovação do Congresso Nacional, nos termos do artigo 44, inciso I, da Constituição Federal, caso com isso concordar Vossa Excelência.
27. Permito-me, assim, submeter à alta consideração de Vossa Excelência os textos jurídicos acima enunciados e o teor da Mensagem pertinente ao Poder Legislativo.
Aproveito a oportunidade para renovar a Vossa Excelência, Senhor Presidente, os protestos do meu mais profundo respeito.
- Diário do Congresso Nacional - Seção 1 - 21/8/1975, Página 6078 (Exposição de Motivos)