Legislação Informatizada - DECRETO LEGISLATIVO Nº 22, DE 1964 - Exposição de Motivos

DECRETO LEGISLATIVO Nº 22, DE 1964

Aprova o Acordo de Comércio e Pagamentos firmados no Rio de Janeiro pelos Governos dos Estados Unidos do Brasil e da República Popular da Polônia aos 19 de março de 1960.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DO MINISTÉRIO
DAS RELAÇÕES EXTERIORES.

     A Sua Excelência o Senhor

     Doutor Juscelino Kubitschek de Oliveira,

     Presidente da República.

     Senhor Presidente,

     Em aditamento à Exposição de Motivos número DEA-DAI-DP-41, de 17 de março último, tenho a honra de passar às mãos de Vossa Excelência, em sete cópias autenticadas, o texto em português do Acôrdo de Comércio e Pagamentos assinado entre o Brasil e a Polônia, no dia 19 do referido mês, no Rio de Janeiro.

     2. Conforme é do conhecimento de Vossa Excelência, as relações de comércio e pagamentos entre o Brasil e a Polônia, vinham sendo reguladas a título precário, pelo Acôrdo de Comércio de 23 de novembro de 1954 e pelo Ajuste de Pagamentos de 1º de abril do mesmo ano, ambos denunciados pelo Brasil em 1956, mas vigentes por fôrça de sucessivas prorrogações, expediente a que vinham recorrendo os Governos dos dois países a fim de evitar interrupção nas correntes do comércio polono-brasileiro durante o período em que não puderam iniciar negociações para conclusão de novos atos disciplinares de suas relações comerciais.

     3. Tais negociações foram retardadas, como se sabe, pela necessidade de serem fixados, certas normas de caráter geral, atinentes ao intercâmbio comercial do Brasil com países de economia, centralmente planificada, norma essas que obedecem a dois princípios fundamentais: 1) a necessidade de incrementar as exportações de produtos primários brasileiros para as áreas cuja capacidade de consumo ainda seja susceptível de expansão substancial; 2) estabelecimento de mercados alternativos para importação de bens de equipamentos necessários ao desenvolvimento econômico do Brasil, de sorte a evitar o agravamento de nossas relações financeiras com os países de moeda forte.

     4. A Delegação brasileira, partindo delas premissas e inspirando-se, tanto na experiência já acolhida nas negociações anteriores com a Iugoslávia, a România e a Alemanha Oriental, quanto nas linhas gerais dos Têrmos de Entendimento assentados recentemente com a União Soviética, propugnou pela elaboração de um texto que atendesse as peculiaridades do intercâmbio comercial do Brasil com a Polônia e, ao mesmo tempo, proporcionasse os meios adequados à sua expansão. Particular importância atribuiu à possibilidade de incremento dos fornecimentos do Brasil de bens de equipamento poloneses, em bases financiadas, com o que se procurou atender ao segundo dos princípios acima enunciados, ou seja, à necessidade de diversificar os mercados suprimidores de bens de capital, orientando as aquisições daquele importante item da nossa pauta importadora para os países com os quais ainda mantém o Brasil acordados de comércio em moeda gráfica.

     5. É precisamente êsse o aspecto que merece ser ressaltado nas negociações que conduziram à celebração do Acôrdo ora encaminhado a Vossa Excelência. A Delegação brasileira teve a satisfação de ver inteiramente atendida sua orientação na matéria, pela inclusão no instrumento assinado de cláusula específica sôbre importações de bens de capital poloneses, as quais se farão sob condições favoráveis de financiamento por parte do exportador. A fórmula adotada, não só permite que o Brasil passe a auferir vantagens da importação financiada daqueles bens que, de outro modo, só poderia adquirir com dispêndio de moedas fortes, como ainda, representa um incentivo às exportações brasileiras, já que o Acôrdo prevê que os compromissos assumidos sejam sempre liquidados em mercadorias.

     6. Assim é que, o Artigo II, se produzindo a norma habitual nos Acôrdos do gênero, segundo a qual não deve ser ultrapassado o limite de crédito que as Partes reciprocamente se concedem (working, balance), estabelece, por outro lado, que na ocorrência de um excesso sôbre aquêle limite, a liquidação se faça igualmente em mercadorias. Mantem-se, portanto, o princípio acautelador do sadio comportamento do intercâmbio, permitindo-se, todavia, a realização daquelas operações que, de outro modo, embora recomendáveis por seu interêsse econômico, deixaram de ser efetivadas, por virem originar ou acrescer um débito a ser coberto em moeda de livre conversibilidade. Combinam-se, dessarte, as disposições comentadas para atender aos dois objetivos visados, de criar facilidades à importação pelo Brasil de bens de capital em moeda convênio e de fomentar as importações de produtos nossos pela Polônia.

     7. Outro aspecto que desejo salientar a Vossa Excelência é o que diz respeito ao prazo de vigência de nôvo instrumento, já que uma importante modificação foi introduzida na sistemática que se vinha seguindo na celebração de acordos de comércio. Com exceção dos Têrmos de Entendimento com a União Soviética, que vigorarão por três anos os acordos bilaterais de comércio e pagamento concluídos pelo Brasil no passado tinham seu prazo de vigência fixado em um ano, sendo prevista sua renovação automática por períodos anuais sucessivos.

     8. No caso dos países de economia centralmente planificada, nos quais a produção e o comércio exterior obedecem a programas de longo prazo, tal sistema apresentava, contudo, o inconveniente de não permitir uma adequada articulação entre exportações, especialmente no que se refere aos programas de distribuição, nesses países, de bens de consumo. Assim, sempre que procurou o Brasil seguir um aumento na exportação dos seus bens de consumo para países de economia centralizada, encontrou da parte dêles resistência fundadas na estreiteza do prazo de vigência dos acordos comerciais o que lhes impedia atenuar certos contrôles administrativos ou baixar os preços de varejo daqueles produtos. Em síntese, a relativa insegurança que sentiam quanto à colocação regular e contínua de seus produtos de exportação, lhes vedava fixar programas mais generosos de distribuição dos bens de consumo importados. Do ponto-de-vista do Brasil, é inegável que, um prazo de vigência mais dilatado que o habitual, além de criar melhores possibilidades no campo das exportações brasileiras, cria igualmente as indispensáveis garantias de tranquilidade para os pagamentos de importações financiadas de bens de equipamento precedentes daqueles países, com evidente alívio de nosso balanço de pagamentos.

     9. Outro ponto que se me afigura digno de menção especial é a criação de uma Comissão Mista que, além dos encargos normalmente cometidos a êsses órgãos, recebe tarefas específicas de real significação, como sejam: 1) examinar, a pedido de qualquer das Partes Contratantes, os projetos relacionados com a importação financiada de bens de equipamento; 2) propor aos dois Governos as medidas necessárias, caso um excesso sôbre o "working balance" não seja absorvido por exportações adicionais, num espaço de tempo razoável; 3) rever anualmente as listas exemplificativas de mercadorias, anexadas ao Acôrdo.

     10. Tópico importante, para o qual ouso rogar de modo especial a atenção de Vossa Excelência, é o que diz respeito à possibilidade da extinção das obrigações pactuadas antes do período previsto de vigência normal do Acôrdo, por decisão unilateral de uma das Partes. A inserção de cláusula específica de denúncia unilateral, em qualquer tempo, foi proposta pela Delegação do Brasil, que tinha presente a hipótese de ocorrerem modificações substanciais, nos sistemas de comércio exterior das Partes Contratantes ou alterações conjunturais, que eventualmente poderiam tornar impossível o adimplemento dos compromissos assumidos ou gerar situações incompatíveis com os interêsses gerais dos pactuantes.

     11. A Parte polonêsa, entretanto, manifestou ponto-de-vista contrário à adoção de tal cláusula, alegando que a mesma viria retirar ao Acôrdo suas características de estabilidade, que tranquilizam exportadores e importadores e permitem a programação cuidadosa das transações entre os dois países, as quais, do lado polonês, se enquadram em um planejamento global de comércio exterior estatal.

     12. Pesando devidamente a questão, entendeu a Delegação do Brasil poder acolher a objeção polonesa, já por considerar que a oposição daqueles dois pontos-de-vista era uma ocorrência inevitável em negociações com países de economia centralmente planificada, com sistemas de comércio externo tão opostos ao nosso, já por entender que, na hipótese de uma imperiosa necessidade de denúncia fora do prazo previsto no Acôrdo, poderia o Brasil invocar os princípios gerais de direito para encontrar uma fórmula conciliatória, opinião que encontra apoio na doutrina e na prática internacional.

     13. Desejo, agora, registrar que os entendimentos devidos em tôrno dos níveis de comércio que podem ser atingidos na vigência do nôvo Acôrdo, permitem antecipar trocas no total de 70 milhões de dólares no primeiro ano de vigência, ou seja o dôbro do total verificado em 1959. É uma previsão plenamente autorizada tanto pela experiência colhida nos últimos seis anos, período em que as trocas comerciais entre o Brasil e a Polônia demonstram tendências ascencional, quanto pela capacidade conhecida de cada uma das Partes de absorver a produção exportável da outra em níveis mais expressivos, o que a aplicação judiciosa das estipulações do nôvo instrumento deverá determinar.

     14. Cumpre-me, finalmente acentuar, Senhor Presidente, que a duração do Acôrdo em causa por um período de cinco anos, inovação adotada, como afirmei acima, pata atender às peculiaridades do comércio polono-brasileiro, parece retirar ao instrumento o caráter de ato meramente administrativo, para inseri-lo na categoria dos acordos cuja entrada em vigor só se verifica após o referendum do Congresso Nacional.

     15. Assim entendendo, e frisando que, pelas razões expostas, o nôvo texto disciplinador do comércio e dos pagamentos entre o Brasil e a Polônia me parecem merecedor da aprovação parlamentar e da ratificação do Poder Executivo, venho rogar a Vossa Excelência que se digne encaminhá-lo ao Congresso Nacional.

     16. Desejo, ainda esclarecer que, com o fim de evitar solução de continuidade no intercâmbio comercial entre o Brasil e a Polônia, foi decidido prorrogar até a data da entrada em vigor do nôvo instrumento, os atos atualmente em vigor entre os dois países, ou seja, o Acôrdo de Comércio de 23 de novembro de 1954 e o Ajuste de Pagamentos de 1º de abril do mesmo ano.

     Aproveito a oportunidade para renovar a Vossa Excelência, Senhor Presidente, os protestos do meu mais profundo respeito. - a) Horácio Láfer.


Este texto não substitui o original publicado no Diário do Congresso Nacional - Seção 1 de 19/05/1962


Publicação:
  • Diário do Congresso Nacional - Seção 1 - 19/5/1962, Página 2478 (Exposição de Motivos)