"Agora é a vez das menores" - Presidente da Ocean Air diz que, para crescer, o setor aéreo tem de evitar a criação de um duopólio na divisão das rotas da Varig
Há pelo menos um ano, o administrador Carlos Hebner, de 54 anos, presidente da Ocean Air, observa de perto as turbulências que afetam a Varig. É dele a tarefa de pôr em prática um projeto audacioso: multiplicar o atual market share da empresa de 0,66% para 7% do mercado nacional até o fim do ano. Essa expansão foi planejada no vácuo da Varig, uma etapa do projeto de dominar o mercado da América Latina. A Ocean Air faz parte do grupo Sinergy, do empresário German Efromovich — dono das companhias Avianca, na Colômbia, Wayra Air, no Peru, e Vipsa, no Equador. Como o Brasil tem quase 50% desse mercado, é vital consolidar as operações verde-amarelas. O momento é favorável. No passado, a Varig emergiu da falência da Panair e a TAM e a GOL decolaram com a quebra da Transbrasil e da Vasp. Hebner conta, na entrevista que segue, que a Ocean Air estava pronta para pousar na pista de Congonhas, o mais importante aeroporto do País, quando as regras mudaram, por causa da criação da Anac. Na tarde de terça-feira 27, ele falou à DINHEIRO logo depois do jogo do Brasil contra Gana. Estava apreensivo. Disse que se o Brasil seguisse jogando do mesmo modo não chegaria ao hexa. Da mesma forma, acredita que se a Anac proteger as grandes companhias estará impedindo a competição.
DINHEIRO — Há duas semanas presidentes das principais empresas aéreas se reuniram em Brasília para disputar o espólio da Varig. Qual foi a proposta da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac)?
CARLOS HEBNER — A Anac disse que haveria uma divisão por market share de caráter precário, temporário, no caso de ocorrer o fechamento da Varig. Como isso ainda não ocorreu, não foi definida a regra e eu não posso comentar. Havia uma intenção de se distribuir por market share.
DINHEIRO — O senhor concorda?
HEBNER — Não. Acho bastante injusto. A TAM e a GOL já vinham se beneficiando da deterioração da Varig há muito tempo. Em maio de 2005, a Varig tinha 27% do mercado e hoje está com 14%. Em um ano, perdeu 13 pontos percentuais de market share, que foram incorporados pela TAM e pela GOL. Agora é a vez das menores, para se criar um equilíbrio.
DINHEIRO — Dá para repartir igualmente?
HEBNER — Não vou dizer que elas vão ser do mesmo tamanho da TAM e da GOL, mas se conseguirem certos nichos de mercado haverá mais opções para os passageiros. A falta de competitividade leva ao aumento de preço. Pode levar também à perda da qualidade do serviço. É algo pernicioso. Não é bom para o mercado ter somente duas empresas operando, ainda mais num mercado do tamanho do Brasil. Pode-se dizer que existem 17 empresas no mercado brasileiro, mas a maioria delas tem uma fatia de apenas 1%.
DINHEIRO — A Ocean Air tinha interesse em comprar a Varig, não tinha?
HEBNER — Aconteceu que havia muitos problemas com a sucessão trabalhista e fiscal. Não havia garantias de que não herdaríamos todo aquele passivo. Essa foi a orientação dos advogados.
DINHEIRO — E a Anac? Como tem se saído a agência nesses primeiros meses?
HEBNER — Ela não conseguiu trabalhar. Ficou tão envolvida no processo da Varig que ainda não mostrou a que veio. O problema da Varig caiu nas mãos da agência, sem que ela estivesse preparada para esse assunto, que virou uma grande novela.
DINHEIRO — O que dá para esperar da Anac?
HEBNER — Que a Anac faça o papel dela, como deve ser. A Anac foi criada para corrigir as falhas de mercado, promover a concorrência e proteger os interesses dos usuários. Isso nos faz crer que a posição da Anac será de evitar que haja um duopólio. Essa é a grande expectativa que nós temos.
DINHEIRO — O mercado hoje é competitivo?
HEBNER — A TAM e a GOL ganharam muito com a deterioração da Varig. Agora, iam pegar a Varig e dividir entre todas as empresas pelo market share, fortalecendo as duas ainda mais. Quando um grupo de empresas chega a 85% e 90% do mercado não há mais espaço para outros concorrentes.
DINHEIRO — Com 67% de hoje há espaço?
HEBNER — Há. O nosso crescimento é muito bom. Nos últimos meses tínhamos 1%, mas já passamos essa marca. O nosso plano é atingir até o fim do ano algo entre 7% e 8% do mercado. Mas, se a concentração fosse de 85%, ficaria muito difícil para a nossa meta.
DINHEIRO — Existem distorções?
HEBNER — Sim, porque o Brasil sempre teve quatro, cinco empresas aéreas. Mas volto a afirmar que a Anac cumprirá suas funções.
DINHEIRO — Como a Ocean Air pretende ampliar sua fatia de mercado?
HEBNER — A Ocean Air já tinha planos de crescimento desde o ano passado. É lógico que a gente vem acompanhando o desmanche do mercado da Varig, que se acelerou nos últimos meses. Isso nos abriu uma grande oportunidade. Contamos hoje com dez aeronaves Fokker 100. E temos opção de trazer outras seis aeronaves Fokker para ocupar esse espaço que está sendo deixado pela Varig.
DINHEIRO — E o futuro?
HEBNER — Queremos ser líderes da América Latina. Nós fazemos parte de um grupo de empresas que decidiu comprar empresas aéreas em vários lugares, em vez de ter um hub e daqui sair para vários países. A presença forte no Brasil é muito importante para a alimentação da América Latina. É um posicionamento estratégico.
DINHEIRO — Que rotas interessam ao grupo?
HEBNER — A partir de 3 de julho vamos voar do Nordeste para o Sul do País e para Brasília. De Porto Alegre e Curitiba para o Nordeste, onde temos uma boa entrada no mercado. Entendemos que é importante pegar um passageiro em Aracaju e fazer com que ele chegue rapidamente a Brasília ou Porto Alegre. São rotas atendidas também por outras empresas. Logo, estamos muito focados em horário, preço, conectividade e freqüências. Só nos falta pousar em Congonhas.
Revista Isto É Dinheiro — Edição 459 — Editoria Entrevista — 03-07-06