Sinal de alerta

Presidente do Comitê Organizador diz na Câmara que está preocupado com o transporte das delegações. Ele explica o estouro do orçamento, mas hipótese de CPI volta à discussão
José Cruz
Da equipe do Correio
José Varella/CB

A 113 dias da abertura dos Jogos Pan-Americanos, no Rio de Janeiro, o comitê organizador do evento fez ontem a primeira grande prestação de contas pública, durante audiência de quatro horas de duração na Comissão de Turismo e Esporte da Câmara dos Deputados. E não é o estouro do orçamento — “normal”, segundo os organizadores — nem o atraso nas obras — “tudo ficará pronto a tempo” — que tiram o sono do presidente do Comitê Organizador (Co-Rio-2007), Carlos Arthur Nuzman.
“O que me preocupa mesmo é o esquema de transporte dos atletas e das delegações”, afirmou o dirigente. “Esse é o problema mais grave em qualquer evento esportivo de grande porte, aos moldes de uma olimpíada. O sistema de transporte foi um caos nos Jogos de Atlanta (1996), mas nem por isso eles deixaram de fazer um grande evento”, consola-se.
Para realizar o Pan, de 13 a 29 de julho próximos, o Rio de Janeiro receberá delegações de 42 países, num total de 5.530 atletas, dois mil oficiais técnicos (treinadores e pessoal de apoio) e 1.252 árbitros. A força de trabalho para atender a esse público é de 15 mil voluntários, 1.200 colaboradores e 30 mil pessoas terceirizadas, além de 1.500 jornalistas das Américas. No total, serão 46.200 pessoas se movimentando durante duas semanas pelos 29 locais de competição.
“Diante de tudo isso tivemos que nos preparar para o transporte, a partir da chegada das delegações, muitas desembarcando no Aeroporto de São Paulo e se deslocando para o Rio”, explicou Nuzman. O dirigente não comentou sobre os graves problemas dos “apagões aéreos”, mas esse é um dos pontos que o próprio governo será obrigado a resolver para evitar o caos logo na chegada das delegações visitantes.

Instalações
O Brasil, segundo Nuzman, não está acostumado a receber evento tão grandioso, e esse foi um dos motivos que contribuíram para que o orçamento original do Pan crescesse em 271%, saltando de R$ 942,5 milhões (atualização sobre os R$ 388,7 milhões originais) para R$ 3,5 bilhões. “Sem tradição na construção de estádios esportivos, a própria engenharia brasileira se desatualizou sobre as especificações das obras. Depois do Maracanã, em 1950, poucos grandes estádios foram construídos, como Beira-Rio, Morumbi e Mineirão”, disse o presidente do CO-Rio.
Em termos de ginásio, de acordo com Nuzman, só o Ibirapuera, em São Paulo, o Maracanãzinho, no Rio, o Mineirinho, em Belo Horizonte, e o Nilson Nelson, em Brasília, são de grande porte. “É triste dizer isso, mas há mais de 50 anos não se constróem instalações olímpicas de alto nível no Brasil”, criticou. Para surprir essa e outras deficiências em grandes eventos esportivos, o CO-Rio se assessorou de seis empresas estrangeiras experientes em jogos olímpicos.
O representante do governo federal no Comitê Organizador, Ricardo Leyser, lembrou que os 34 esportes que serão disputados tiveram de se adaptar às exigências das federações internacionais, que, por sua vez, devem obedecer à lei das licitações. Tudo isso colaborou para o inchaço do orçamento. Foram essas adaptações e ajustes que influenciaram nos atrasos das obras, a ponto de o Rio não poder receber eventos preliminares, como estava previsto, para testar a estrutura construída para o Pan. Mesmo assim, Nuzman passa tranqüilidade: “Com segurança, todas as instalações estarão à disposição dos atletas na abertura do Pan”.

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Raio x

PARTICIPANTES
42 delegações
5.530 atletas
2.000 oficiais técnicos
1.262 árbitros

COMPETIÇÕES
34 esportes
332 torneios
29 locais de eventos

FORÇA DE TRABALHO
1.200 colaboradores
15.000 voluntários
30.000 terceirizados

PARAPAN-AMERICANOS
De 12 a 19 de agosto
1.300 atletas
700 oficiais
700 oficiais técnicos
10 modalidades
6 instalações esportivas

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As dúvidas dos números

A audiência pública de ontem, na Comissão de Turismo e Esporte, foi convocada pelo deputado carioca Brizola Neto (PDT-RJ) para esclarecer as notícias de que o orçamento dos Jogos Pan-Americanos teria crescido mais de 600%. O secretário-executivo do Comitê de Gestão das Ações Governamentais, Ricardo Leyser, apresentou dados atualizados sobre o discutido assunto, que passa, inclusive, por auditorias mensais dos tribunais de contas da União, do estado e da cidade do Rio de Janeiro.
Segundo Leyser, o orçamento original, apresentado na candidatura do Rio, era de R$ 388,7 milhões, que passou por atualizações (veja quadro) até chegar ao valor corrigido de R$ 942,5 milhões. Entretanto, com o aumentaram os investimentos em áreas estratégicas, como segurança, que ficarão como legado para a cidade, os valores cresceram muito. “Também precisamos adaptar várias praças de esportes às exigências internacionais e isso ajudou a aumentar o orçamento”, disse o dirigente. O valor final dos gastos no Pan é de R$ 3,5 bilhões, ou seja, 272% de aumento sobre o valor original (R$ 942,5 milhões).

Dúvidas
Foi o deputado tucano Silvio Torres (SP) quem mais questionou a comissão organizadora do Pan-2007 sobre as denúncias de irregularidades, apontadas por auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU). Nenhuma de suas indagações ficaram sem resposta, mas o parlamentar disse que aguardará o final dos Jogos e o parecer conclusivo do TCU para se manifestar de forma definitiva.
Entre outras críticas, Torres citou o custo das solenidades de abertura e encerramento, do Pan e Parapan: R$ 35 milhões. Já as despesas com a viagem da tocha olímpica, que sairá do México para percorrer 42 cidades brasileiras, estão orçadas em R$ 20 milhões.
O deputado mineiro Gilmar Machado (PT), da Comissão de Orçamento, disse acompanha o desembolso do governo federal, que deverá chegar a R$ 1,2 bilhão. “Vou esperar a conclusão do evento para ver se pediremos uma comissão de inquérito que investigará se gastos foram excessivos.”
Para o ministro do Esporte, Orlando Silva, que na quarta-feira também falou à Comissão de Turismo e Esporte, a culpa do estouro no orçamento é do governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso. “Contrastar orçamento do Pan do Rio de Janeiro com o realizado por outros países mostra que há fragilidade e ausência de consistência no que foi pautado em 2002. Isso gera uma série de frustrações”, afirmou o ministro. (JC)

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Orçamento da candidatura
(em R$ milhões)

Pré-dossiê da candidatura (abril de 2001) 388,7

Dossiê da candidatura (agosto de 2002) 562,9

1ª revisão do dossiê (fevereiro de 2003) 776,4

Valor atualizado (março de 2007) * 942,5

Valor total oficial ** 3.500,0

Obs.: * valor atualizado apenas da proposta original
** oficializado pelos governos federal, estadual do Rio de Janeiro e municipal do Rio de Janeiro

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Análise da notícia
Perguntas e respostas

Na medida em que se aproxima o dia 13 de julho, data da abertura dos Jogos Pan-Americanos, crescem as críticas sobre a organização do evento, no Rio de Janeiro. O mais recente relatório do Tribunal de Contas da União, por exemplo, mostra que há muitas dúvidas sobre os gastos. Mas ontem, o alto comando do Comitê Organizador, liderado por seu presidente, Carlos Arthur Nuzman, esteve em Brasília, e durante quatro horas respondeu a todas as indagações de deputados, na Comissão de Turismo e Esporte.
Poucos parlamentares, contudo, estavam preparados para debater sobre o assunto. Outros, envolvidos com compromissos de suas rotinas políticas, saíram antes da sessão terminar, mesmo com riqueza de detalhes sobre a mesa para serem explorados de forma objetiva. A prática legislativa é prolixa e, por conta disso, também perde precioso tempo.
Nos últimos cinco anos, o Brasil vive momento raríssimo ao promover esse evento olímpico continental. Da organização fazem parte segmentos dos três níveis de governo — federal, estadual e municipal —, além da iniciativa privada e serviços públicos de toda ordem — transportes, segurança, saúde, comunicações etc. São investimentos bilionários, expressivos para a economia, o turismo e projeção internacional do país.
Os excessos do orçamento, claro, têm que ser investigados, mas há outros fatores também importantes no evento. O deputado Deley, por exemplo, quis saber quanto o Pan-Americano vai faturar. Afinal, nem só de despesas se constrói os Jogos do Rio. Foi a única indagação sem resposta, porque o deputado foi embora mais cedo, interrompendo um diálogo sobre o qual ainda falta muito se saber. (JC)

Fonte: Correio Braziliense