Estrangeiros descobrem o Brasil

05/02/2007 23h00

MERCADO IMOBILIÁRIO
Europeus investem na compra de imóveis no litoral nordestino. Somente em 2006, os gastos desses turistas na aquisição de hotéis e condomínios somaram US$ 1,4 bilhão

Diretor de um complexo hoteleiro em Natal, Jan Von Bahr
reclama dos juros: “Não usamos financiamento de bancos brasileiros”

O clima tropical e as belas paisagens são atrativos cada vez mais fortes do Brasil. Nos últimos anos, essas características seduziram tanto os turistas que eles deixaram de vir ao país apenas com a mala de roupas. Dados do Banco Central mostram que no ano passado eles trouxeram, principalmente, dinheiro na bagagem. Os milhares de dólares não foram gastos apenas em hospedagem e alimentação, mas, principalmente, em investimentos. Apenas no ano passado, os investimentos estrangeiros diretos (IED) em atividades imobiliárias — construção de hotéis e condomínios — somaram US$ 1,4 bilhão (cerca de R$ 2,8 bilhões), valor superior ao verificado nos cinco anos anteriores (veja gráfico) e 372,72% maior que o de 2005.

Interessados nas praias e em fugir do forte inverno europeu, os estrangeiros optam por adquirir a segunda residência em terras brasileiras. A maioria passa quatro ou cinco semanas no Brasil e aluga o imóvel no resto do ano para turistas de outras partes do país. A prática vem sendo adotada com freqüência por espanhóis, portugueses, noruegueses, ingleses e italianos. De acordo com levantamentos realizados pelo Ministério do Turismo, em 2003, 5,4% dos estrangeiros que vieram ao país se hospedaram em casa própria. Em 2002, o percentual era um pouco mais baixo, 3,8%, e em 2001, 1,9%.

Apesar de estarem em trajetória de queda, os juros cobrados no país ainda assustam os investidores. Grande complexo hoteleiro inaugurado há pouco mais de um ano, o Sehrs Natal foi construído com recursos externos. O investimento de R$ 120 milhões, feito pelo grupo catalão que administra a rede de hotéis, foi conseguido com empréstimos internacionais e dinheiro das 73 empresas espanholas de diversas áreas que compõem o grupo. “Hoje não temos juros atrativos no Brasil. O que pagamos em menos de dois meses aqui aos bancos é o que se paga em um ano no exterior”, afirma Jan von Bahr, diretor-geral do Sehrs Natal. “As linhas de crédito brasileiras ainda não favorecem os investimentos”, acrescenta.

A construção de 30 mil m² na Via Costeira, avenida nobre de frente para o mar na capital potiguar, foi concluída em 22 meses. Como a cidade tem toda a infra-estrutura exigida para a atração de turismo de luxo, o Sehrs não precisou se preocupar. Mas nem sempre é assim no Brasil. Em municípios menores, faltam investimentos em logística, como asfalto, aeroportos e portos. No Programa de Aceleração e Crescimento (PAC), anunciado no último dia 22, o governo promete investir R$ 503 bilhões em infra-estrutura até 2010. As obras de logística previstas para todo o país somam R$ 58,3 bilhões e, para o Nordeste, R$ 7,4 bilhões.

Interesse
Dono da Vivenda Brasil, empresa especializada em construção de complexos residenciais e turísticos para estrangeiros, Airton Nelson comemora o interesse dos europeus pelas paisagens brasileiras. Atualmente, toca projetos no Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. “Ter uma casa de verão no Brasil é mais barato que nos destinos europeus”, afirma Nelson. Segundo o empresário, o metro quadrado desse tipo de imóvel é vendido, em Natal, por R$ 2 mil ou R$ 2,5 mil.

Só em Natal, Nelson possui sete condomínios em construção, todos à beira-mar. Cada um tem, em média, 200 casas com tamanhos que variam de 70m² a 200 m². Em João Pessoa, o empresário aguarda o “momento certo” para construir. Na capital paraibana, já tem terrenos e projetos para um hotel com campo de golfe e para um condomínio horizontal. Em Fortaleza, pretende fazer um condomínio vertical e hotéis. Os terrenos já estão todos comprados. “As obras são feitas com dinheiro da empresa e com captação de recursos com os clientes. Não usamos financiamento de bancos brasileiros”, conta.

Otimismo
Os bons resultados dos investimentos estrangeiros em imóveis no Brasil anima os especialistas. Altamir Lopes, chefe do Departamento Econômico do BC, aponta o setor de atividades imobiliárias como um dos mais promissores para o balanço de pagamentos do país este ano. Em 2006, o ingresso desses recursos no país representaram 6,3% do total investido por estrangeiros no Brasil.

Os empresários do ramo concordam. “O Nordeste ainda não descobriu seu potencial turístico”, analisa Bahr. Enquanto o turismo nordestino não ganha mais força, o conglomerado dono do Sehrs aguarda para começar a operar a central de distribuição de alimentos para hotéis da capital potiguar. O galpão onde será instalada a empresa já foi comprado e, atualmente, abriga, em seus jardins, coqueiros que abastecem o hotel. “Pelo menos parte do coco que vendemos é produzido por nós”, garante Bahr. Nelson é mais poético para definir o destino do turismo nordestino: “O Nordeste é uma pedra bruta ainda no início da lapidação.”



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Mercado em expansão

As previsões do Banco Central apontam para um aumento dos investimentos estrangeiros em imóveis nos próximos anos. Para Giuseppe Masi, da consultoria KPMG, este mercado está em fase ascendente e deve, ainda, acelerar seu ritmo de crescimento caso o Brasil seja considerado como investment grade, o que atestaria que o país é um lugar para investir. Isso favoreceria a entrada de investimentos externos. “Com esse título, grande parte dos investidores estrangeiros entrarão no país não só na área de turismo”, analisa.

Jorge Maurício Mororó, diretor da área internacional de negócios imobiliários do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Rio Grande do Norte (Sinduscon-RN), também aposta no crescimento dos investimentos estrangeiros. Segundo ele, o Brasil precisa se preparar para receber ingleses e noruegueses, o que exigirá uma forma diferente de lidar com os negócios. “Antes de mais nada eles são capitalistas e é um ótimo investimento comprar um terreno em dólar nos preços cobrados aqui”, diz . Mororó acredita que a hospitalidade do nordestino também ajuda. Para Giuseppe Masi, a estabilidade econômica e o forte potencial de crescimento da construção civil favorecem os investimentos. “Além disso, há uma saturação do espaço para construção na Europa”.

Fonte: Correio Brasiliense, 04/02/2007