CTD agirá com CPI do Tráfico de Pessoas para combater abusos a jovens candidatos à carreira de atletas

Um dos mais polêmicos temas do futebol brasileiro, que trata da exportação de jovens jogadores para o exterior, foi debatido na última terça-feira (4 de junho) em audiência pública na Comissão de Turismo e Desporto, atendendo requerimento da deputada Flávia Morais (PDT-GO). A audiência, com a presença da procuradora do Ministério Público do Trabalho, Cristiane Maria Lopes, foi um desdobramento da CPI do Tráfico de Pessoas, na Câmara dos Deputados.
04/06/2013 19h00

Alexandra Martins

CTD agirá com CPI do Tráfico de Pessoas para combater abusos a jovens candidatos à carreira de atletas

Futebol de base é tema de debate na CTD

"Muitos jovens que sonham em se tornar jogadores de futebol, ricos e famosos, a exemplo de alguns de nossos craques, como Neymar, têm seus sonhos frustrados quando são dispensados pelos clubes que os contrataram", disse a deputada.

Assunto pouco divulgado pela imprensa, o problema se agrava porque a legislação ainda não protege esses jovens, alguns com 14 ou 15 anos, que muitas vezes ficam abandonados em outros países, como constatou a CPI da CBF Nike, em 2001.

Naquela ocasião, deputados que viajaram à Europa constataram que a Bélgica é uma das principais rotas para o tráfico de jovens talentos. Isso devido à "ausência de cotas para a participação de atletas estrangeiros em seus clubes, e pelo fato de a lei belga privilegiar atletas amadores de menor idade".

Atualmente, apesar de a Constituição Federal e a Lei Pelé fixarem a idade mínima de 14 anos para contratos de trabalho, isso não vem sendo respeitado quando um garoto com potencial e mesmo com 12 ou 13 anos, é abordado por clubes ou empresários.

Procuradora do Ministério Público do Trabalho que investiga esse assunto, Cristiane Maria Lopes declarou em seu depoimento na audiência pública que o esquema de saída de menores do país continua ativo. Ela revelou que o problema tornou-se mais grave, pois o Brasil, pela fama de ser "o país do futebol", está intimamente envolvido nesse esquema, atraindo jovens de outros países para aqui se profissionalizarem, mas sem garantias de respeito aos direitos humanos e dos menores e de uma vida digna. Sem dominarem o idioma, acabam explorados por expertos empresários que agem na clandestinidade.

"São menores, alguns com 13 anos de idade, trazidos por empresários, mas sem que as autoridades brasileiras tenham conhecimento dessa realidade", denunciou Cristiane Maria. "Estamos tratando de direitos de crianças e adolescentes vinculados à nossa paixão nacional, o futebol. Mas a imprensa já divulgou essa triste realidade dos centros de treinamentos que, na maioria, são criadouros de atletas, como demonstrou uma reportagem da SporTV", afirmou Cristiane Maria Lopes.

Há casos de jovens que foram entrevistado pela Procuradora, que declararam o desejo de voltar para casa. Porém, temiam ter que explicar aos pais e amigos que fracassaram no desejo de se tornarem craques. "Não estudei, e aqui (no clube), pelo menos estou ganhando um salário", declarou um desses jovens.

O respeito aos direitos humanos é colocado em segundo plano, porque o fascínio do futebol é maior e motiva o jovem sonhar se tornar famoso.
"A Lei Pelé melhorou, avançou e oferece garantias. Mas precisamos aplicar essa lei, começando por investigações nos clubes, porque a formação de atletas só pode ser praticada por clubes profissionais", disse a palestrante.

Assim como os brasileiros no exterior, esses adolescentes são mantidos em apartamentos ou repúblicas, a maioria sem condições mínimas de habitação, enquanto treinam em equipes inexpressivas.

Os que têm alguma chance assinam contratos, mas suas carreiras ficam vinculadas aos empresários, não reconhecidos pela Fifa. Já os que não revelam capacidade técnica são dispensados, "abandonados, como já se constatou, sem dinheiro e sem condições de retornarem aos seus países. Acabam em times inexpressivos e até se prostituindo para sobreviverem".

O presidente do Sport Club Corinthians Alagoano, de Maceió, trouxe à audiência pública exemplo de instituição que trabalha com a formação de jovens talentos, mas enfrenta a concorrência dos empresários.

"Precisamos construir um muro de três metros de altura e treinar com os portões fechados, pois esses empresários, sem registro na Fifa, assediam os jovens com propostas atrativas que nem sempre são cumpridas", disse o presidente do conselho do Corinthians Alagoano, João Feijó. Apresentando-se como um clube estruturado que respeita os direitos humanos dos jovens que acolhe, Feijó pediu maior fiscalização das autoridades brasileiras para conter a atuação de empresários não credenciados. "Também pedimos mudanças na Lei de Incentivo ao Esporte, para termos acesso aos recursos disponíveis. Com esse reforço financeiro, pod eremos enfrentar a concorrência dos que atualmente agem na clandestinidade", afirmou o dirigente-empresário.