CPMI e Ministério Público ameaçam candidatura brasileira
Carolina Canossa
Independentemente dos esforços do COB e das diversas esferas do governo brasileiro, a candidatura do Rio de Janeiro aos Jogos Olímpicos de 2016 pode ter sérios percalços. E isso não inclui apenas o rigor da análise do COI: há, em Brasília, um movimento para a criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que promete investigar a aplicação de recursos públicos no esporte.
Com 194 assinaturas na Câmara e 33 no Senado, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) e deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) protocolaram o pedido de instalação da CPMI em 18 de dezembro. Porém, um dia depois o lobby contrário à comissão passou a agir e alguns parlamentares retiraram o apoio - para a instalação das investigações, são necessárias 171 assinaturas de deputados e 27 de senadores.
Com o recesso parlamentar, a decisão ficará apenas para fevereiro, mas Dias demonstra confiança no sucesso de sua empreitada. "Houve muito lobby, não dá para negar, mas vamos voltar a mexer com ela. Essa CPMI é importante, porque ouvimos denúncias constantes de irregularidades na aplicação do dinheiro público no esporte e precisamos investigá-las", afirmou.
A ideia é investigar o porquê de, com as diversas esferas do governo dedicando cada vez mais dinheiro ao esporte, essa quantia não estar chegando à base, ou seja, escolas e atletas amadores, ao mesmo tempo em que o Brasil continua com resultados pífios nas Olimpíadas. O senador, entretanto, faz questão de ressaltar que a CPMI não visa prejudicar a candidatura do Rio-2016.
"Pelo contrário: precisamos mostrar transparência para o COI no uso de recursos públicos. Não podemos sustentar um projeto que pode encantar as pessoas, mas possui irregularidades", afirmou. Em carta aberta aos parlamentares, atletas como Ana Moser, Raí, Lars Grael e Oscar Schmidt já manifestaram apoio à criação da CPMI.
Os trabalhos no Congresso não devem ser os únicos. O Ministério Público Federal já recebeu um pedido de instauração de procedimento investigatório sobre irregularidades no COB e no Ministério do Esporte. Ironicamente a proposta partiu de um membro da Assembléia do próprio COB: Alberto Murray Neto, advogado e árbitro da Corte Arbitral do Esporte (CAS), além de neto de Sylvio de Magalhães Padilha, ex-presidente da entidade e vice-presidente do COI entre 1975 e 1979.
O argumento inicial é que o MP se debruce sobre supostas irregularidades na contratação da consultoria internacional EKS (Events Knowledge Services) para auxiliar na campanha Rio-2016. O negócio, que consumiu mais de R$ 3,5 milhões além dos 80 disponibilizados pelo governo, foi feito sem licitação. Porém, os trabalhos podem ir ainda mais longe, contemplando até mesmo problemas de repasse de verbas ocorridos no Pan-americano.
Por enquanto, o procurador federal Carlos Henrique Martins Lima ainda não se manifestou sobre o assunto, mas Murray está confiante. "Tenho municiado o MP quase que semanalmente, com documentos de toda ordem. Acredito que tudo isso ainda esteja sendo compilado", afirma o advogado.
Dono de uma postura bastante crítica com relação ao COB, que é manifestada principalmente através de um blog, Murray não tem medo de expor publicamente as suas opiniões. "Quando os encontrei (os membros do COB), na minha fala no Senado Federal, todos os membros da diretoria foram cordiais comigo e vice-versa. É uma luta de ideias e não de pessoas. O único a fingir que eu não existia e mal educadamente não me cumprimentou foi o próprio Nuzman, o que também não pegou bem para ele. Ele não é democrático e tomou a coisa como pessoal", afirma.
O evento citado por Murray ocorreu no dia 02 de dezembro. Na ocasião, irritado pela presença do oposicionista no Senado, o presidente do COB abandonou uma audiência pública com a desculpa de ter um compromisso. Vários senadores não gostaram da atitude e protestaram contra a postura do mandatário, que estava lá para responder questões sobre sua gestão no COB - o Ministro Orlando Silva também não compareceu.
A pressão então ficou em cima de Marcus Vinícius Freire, superintendente executivo de esportes do COB, que garantiu "não ter medo de CPI". Murray, por sua vez, garante: o Rio não tem chance alguma de levar a Olimpíada de 2016 e os dirigentes da entidade que rege o esporte olímpico brasileiro têm consciência disto. "Talvez alguns outros, mais incautos, possam acreditar nas possibilidades do Rio, mas o Nuzman e alguns outros mais próximos a ele sabem com certeza de que as chances são nulas. Eles também conhecem, assim como eu, como funcionam as coisas lá (no COI)", assegura.
De acordo com o advogado, a rotação dos continentes, um dos principais argumentos cariocas, nunca teve importância. O COI se basearia principalmente nas garantias de que a preparação e a realização dos Jogos não sofrerão percalços, através de instalações esportivas adequadas, boa infra-estrutura, segurança eficiente, responsabilidade social e ambiental, além de mentalidade olímpica.
Coisas que, na opinião dele, não existem no Brasil. E que Murray faz questão de propagar aos estrangeiros. "Eu envio relatórios quase que semanais ao presidente (do COI) Jacques Rogge, sobre a realidade do esporte no Brasil. Ele foi grande amigo de meu avô e eu conheço seus filhos. A reeleição do COB, ilegítima, já foi objeto de um dos meus relatórios. Ele não responde, é claro, mas sei que me ouve. Também escrevo e converso com outras pessoas importante e influentes no Movimento Olímpico", assegura.
Fonte: Gazeta Esportiva