Anac pode incentivar duopólio TAM/Gol, diz economista
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) corre o risco de estimular um duopólio no setor aéreo no País. O alerta é da economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e ex-conselheira do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) Lucia Helena Salgado, com base na portaria da agência, em fase de consulta, que impõe dificuldades às pequenas empresas para a distribuição de slots (autorização para pousos e decolagens). Caso redistribua rotas da Varig conforme o peso atual das concorrentes, a Anac pode favorecer a TAM e a Gol. Ela também avalia que a agência reguladora demonstra "timidez e insegurança" ao protelar a decisão de compra da VarigLog pela Volo.
"Há uma grande oportunidade de mostrar que é uma agência independente dos interesses que ela deve regular", diz Lucia Helena. Segundo ela, até o momento a Anac ainda não deixou de lado a cultura tradicional do antigo DAC (Departamento de Aviação Civil), que enfatizava o que chama de "regulação prudencial", de proteção às empresas atuantes, principalmente as de maior porte.
A especialista considera que é "um absurdo do ponto de vista do interesse público" uma possível distribuição de rotas da Varig, no caso de eventual paralisação, levando em conta a participação atual das empresas no mercado.
"Um duopólio tende, mesmo que sem acordo objetivo, a igualar os preços num nível elevado, o que gera perdas para o consumidor", diz. Uma divisão de rotas deste tipo acabaria chancelando o duopólio e o risco das duas maiores adotarem práticas predatórias, no futuro, para evitar a entrada de terceiros concorrentes.
Lucia Helena enxerga o mesmo risco na primeira portaria da Anac, que prevê redistribuição de slots (intervalos para pouso e decolagem) em grandes aeroportos, como Congonhas, em fase de consulta pública. A portaria exige, além das condições técnicas, condições econômico-financeiras elevadas. "Uma empresa entrante, que ainda está investindo, obviamente não tem as mesmas condições de liquidez e não poderia participar do sorteio de slots", argumenta.
O especialista em aviação Paulo Roberto Bittencourt Sampaio reconhece a
possibilidade de duopólio caso a Varig saia do mercado, mas diz que permaneceriam duas empresas com qualidade. "Se isso ocorrer (o fim da Varig), termina a fase em que o governo era usado como muro de lamentações."
Segundo Sampaio, a evolução da Gol nos primeiros seis meses de vida, por exemplo, foi bem mais dinâmica do que as evoluções da BRA, OceanAir e WebJet. De forma geral, ele argumenta que algumas empresas de menor porte não fizeram investimentos significativos e seria uma injustiça com os passageiros "impor a eles uma participação de mercado artificial em favor de empresas menores, que não tenham qualidade".
Jornal A Tarde — 23-06-06