O futuro da Política Externa, Defesa e Inteligência em debate na CREDN
Brasília – Nesta quarta-feira, 21, a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN) da Câmara dos Deputados, realizou o Seminário “Política Externa, Defesa e Inteligência na Projeção Internacional do Brasil” com o propósito de discutir os desafios que se apresentam ao país e que terão de ser afrontamos pelo futuro governo a partir de 1º de janeiro de 2019.
A iniciativa do deputado Nilson Pinto (PSDB-PA), presidente da CREDN, nasceu em março deste ano. O parlamentar que também é o vice-presidente da Comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência do Congresso Nacional (CCAI), reconheceu que o país atravessa um momento de grande expectativa por conta da troca de governo.
Na sua avaliação, as mudanças também provocarão impactos para as Relações Exteriores do Brasil. Sobre o papel do Congresso em relação as chamadas “políticas de Estado”, Nilson Pinto afirmou que “a sociedade espera de nós a contribuição para que este país ocupe o seu devido lugar no mundo”.
De acordo com o deputado, o Brasil terá de lidar com a realidade internacional em temas como o livre comércio, cooperação, imigração, combate ao terrorismo, luta contra o tráfico de drogas e armas e proteção das fronteiras. Ele defendeu ainda uma maior cooperação entre Política Externa, Defesa e Inteligência.
O Brasil no Mundo
O evento foi inaugurado com uma aula magna proferida pelo Embaixador João Clemente Baena Soares, ex-Secretário-Geral do Itamaraty e da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Ao discorrer sobre o tema “O Brasil em busca do seu lugar no mundo: nossos deveres e nossas responsabilidades como ator regional e global”, Baena abordou aspectos históricos e conceituais da diplomacia brasileira, com destaque para a América do Sul, onde o Brasil desempenha importante influência. Ele chamou a atenção para as “fronteiras porosas” e vê “necessidade absoluta” de reforço da vigilância pelas Forças Armadas.
Destacou ainda a importância da questão da água, classificada como petróleo do futuro e que deve levar o mundo a muitos conflitos bélicos. Lembrou que o Brasil detém 12% da água doce do universo e que “a água é um tema urgente, importante, que deve ser objeto de cooperação antes de ser um tema de conflito”, defendeu.
Sobre as relações do Brasil com outros países, explicou que o país tem presença global e não enfrenta rejeição no cenário internacional. “Nós temos capacidade e disposição para o diálogo. Estamos em uma situação cômoda para as relações internacionais”, explicou.
Já no âmbito do multilateralismo, lembrou que a tradição do Brasil é enorme, visto que o país é fundador e participante ativo de todos os organismos internacionais. Para Baena Soares, “o Brasil deve exercer papel harmonizador e de protagonismo, jamais coadjuvante. O país tem condições de ajudar na solução de conflitos e na construção da paz e da estabilidade do mundo – dois objetivos essenciais”, apontou.
“Ele é o único brasileiro a ocupar o posto de secretário-geral da ONU no difícil período de 1984 a 1994. Naquela época, conflitos armados atingiram o nosso continente, especialmente na América Central. Ele teve papel destacado nos processos de paz na região que perduram até hoje”, assinalou Nilson Pinto, ao agradecer as contribuições do diplomata paraense.
Diplomacia
No primeiro painel intitulado “Diplomacia, cooperação e integração: política externa e defesa na projeção do Brasil”, o Embaixador Rubens Barbosa, diretor-presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE), afirmou que o novo presidente enfrentará um cenário internacional muito conturbado, com crise do multilateralismo, globalização sob ataque e guerra comercial entre China e Estados Unidos.
“O que aconteceu nos últimos 15 anos é que o país está isolado das negociações comerciais, se atrasou em termos de inovação e tecnologia e perdeu poder e influência, inclusive perdendo espaço no comércio internacional. É preciso definir o que o Brasil quer”, cobrou.
Para o diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Abijaodi apresentou um panorama do cenário de comércio internacional e disse que o Brasil é um “player global”, com equilíbrio entre exportações industriais e de bens básicos. De acordo com ele, existe um trabalho bem feito dos exportadores brasileiros e será necessário que haja um direcionamento da política externa, que influencia todo esse cenário comercial.
Por sua vez, o General Paul Cruz, ex-diretor de Parcerias Estratégicas do Departamento de Operações de Manutenção da Paz da Organização das Nações Unidas (ONU), ressaltou que os programas estratégicos de Defesa são de longo prazo, e por isso demandam orçamentos regulares e estáveis. Ao defender investimentos, defendeu uma maior cooperação entre os setores envolvidos, operando de forma conjunta e coordenada.
Na sua opinião, o Congresso, órgãos de Defesa, de Relações Exteriores, academia e também os cidadãos devem apoiar seus marinheiros, soldados e aviadores. Para Creomar de Souza, “o Brasil precisa definir o que quer ser”.
Imagem do Brasil
O segundo painel - “A imagem do Brasil no Exterior: prós e contras de um global player” – reuniu um grupo de quatro jornalistas com vasta experiência nacional e internacional que fizeram uma avaliação dos principais temas que cobrarão a presença do Brasil na cena internacional.
Lourival de Sant’anna, por exemplo, acredita que a multiculturalidade brasileira é um ativo importante para fortalecer a inserção internacional do Brasil dentro do que é conhecido como “soft power”. Para ele, o país exerce um papel muito importante na área ambiental internacional e a história deste setor não pode ser “jogada no lixo”. O jornalista considera a Venezuela um “grande desafio brasileiro” e disse que o país vizinho não deveria ser ameaçado de invasão militar, argumento que apenas fortalece o regime chavista.
Fábio Zanini, por sua vez, acredita que o Brasil não pode ignorar a África, continente que tende a ser muito dinâmico nos próximos anos. Na sua avaliação, o país Brasil começa a ter um problema de imagem no cenário internacional e o governo Bolsonaro precisará de ter muito “tato diplomático” para aparar arestas.
Alerta semelhante foi feito pela jornalista Denise Chrispim Marin. De acordo com ela, o ambiente internacional não vive os seus melhores dias. “Viveremos tempos muito difíceis e o Brasil não deveria criar mais arestas, necessitando ter muito cuidado com as suas decisões. Estar presente em fóruns de negociação é sempre a melhor opção possível”, acredita. Para a jornalista, retirar o Brasil de organismos internacionais não contribui em nada.
Inteligência
Mediado pela coordenadora e professora da Escola Superior de Guerra (ESG), Selma Gonzalez, o terceiro painel – “A Inteligência aplicada à política externa e à defesa: desafios, ameaças e necessidades”, enfocou na importância do fortalecimento da Inteligência de Estado como ferramenta imprescindível à Política Externa e à Defesa, principalmente em relação a cooperação com os países vizinhos para o controle das fronteiras.
O analista de Assuntos Estratégicos do Ministério Público Federal André Luis Woloszyn, explicou que a inteligência aplicada à Política Externa e à Defesa é um dos fatores condicionantes do desenvolvimento e progresso do país. Para o sub-corregedor da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Eduardo de Oliveira Fernandes, as prioridades das atividades de inteligência devem ter o combate ao terrorismo no topo da agenda brasileira.
Além disso, a proliferação de armas, o tráfico humano e a narcoguerrilha também causam preocupação. O militar explicou ainda que o Brasil enfrenta brigas de facções em presídios, que acabam sendo refletidas na sociedade que podem escalar para um problema de Segurança Nacional.
Fernando Montenegro, Pesquisador do Observatório de Relações Internacionais da Universidade Autónoma de Lisboa (OBSERVARE) observou que a guerra já passou por terra e mar, e hoje envolve o ciberespaço e a produção de conteúdo. “A guerra se tornou complexa. Hoje há forças de operações especiais, embargos econômicos, propaganda”, explicou.
Diplomacia e Defesa
No último painel do evento – “A articulação política entre Diplomacia e Defesa e os seus dilemas” – o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília Juliano Cortinhas chamou a atenção para um ambiente de complexidade criado por uma maior demanda das Forças Armadas para atuação interna.
Durante o debate, o Diretor-Executivo da Escola Sul-Americana de Defesa, Antonio Jorge Ramalho, explicou que o Brasil não está imune aos problemas dos países vizinhos, uma vez que a porosidade das fronteiras e questões que afetam outras nações sul-americanas interferem no Brasil. “É preciso estabelecer um arranjo de colaboração entre nós e nossos vizinhos para maximizar a capacidade coletiva de resposta a desafios que, se não forem enfrentados, vão corroer nossas sociedades”, advertiu.
Já o presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa, Alcides Costa Vaz, destacou que o desenvolvimento institucional da área de defesa é recente no Brasil, mas que o ministério da Defesa tem expandido sua agenda internacional, evoluindo para uma maior cooperação no setor. “Esse fenômeno trouxe demandas de articulação política e projetou uma agenda externa mais ampla”, concluiu.
Documento
Nilson Pinto reiterou que um documento será elaborado pela CREDN a ser entregue ao presidente Jair Bolsonaro e aos ministros responsáveis pela Política Externa, Defesa Nacional e Gabinete de Segurança Institucional, com os diagnósticos levantados durante o evento.
O encerramento do evento contou com a presença do deputado federal eleito pelo PSL de Goiás, Vítor Hugo de Araújo Almeida, que representou o presidente eleito Jair Bolsonaro. Segundo ele, as reflexões, preocupações e ansiedades apresentadas nos diferentes painéis do seminário, serão levadas ao gabinete de transição.
Jornalista responsável: Marcelo Rech
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