Ataques a direitos democráticos preocupa parlamentares e sociedade civil

10/07/2008 00h00

A Comissão de Legislação Participativa (CLP) ouviu ontem, em reunião de audiência pública, o Ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH), sobre a onda de criminalização dos movimentos sociais. Também participaram do evento, como expositores, Gilson Cardoso, Coordenador Nacional do Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH), entidade proponente da reunião, Antonio Augusto Brandão de Aras, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Silvio Santos, representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Paulo Maldos, do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Damião Braga Soares dos Santos, representante da Coordenação Nacional de Quilombos (CONAQ), Leandro Scalabrin, Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB de Passo Fundo/RS e Gilberto Souza, representante da Comissão Episcopal Pastoral para Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz da CNBB.

A reunião, que contou com ampla participação da sociedade civil e de deputados e senadores, retratou vários casos de criminalização e vulnerabilização de integrantes de movimentos sociais ao longo de todo o território nacional. O representante dos sem-terra tratou da deliberação do Conselho do Ministério Público gaúcho, tornada pública nas últimas semanas, sobre a “dissolução” do MST, diretriz que propõe providências para impedir reuniões dos militantes, cassar seus títulos eleitorais, fechar as escolas existentes nos acampamentos e assentamentos, entre outras medidas criminalizantes e estigmatizantes contra os sem-terra, que já vêm sendo implementadas naquele estado. Leandro Scalabrin, da OAB de Passo Fundo/RS, destacou o uso, pela Brigada Militar do Rio Grande do Sul, de matilhas de cães, cavalaria, fardamento camuflado e aquartelamento de tropas no enfrentamento e repressão contra manifestações populares no estado.

Paulo Maldos, do CIMI, destacou a truculência com que os arrozeiros opositores da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, vêm agindo, valendo-se, até mesmo de minas terrestres e carros bombas, na tentativa de impedir a continuidade do processo de demarcação na região. Damião dos Santos, da CONAQ, tratou da ofensiva sofrida pelos quilombolas, em especial no Rio de Janeiro, estado em relação ao qual também foram denunciadas, pelos demais debatedores, a truculência das forças de segurança pública e operações desastrosas como a do Exército no morro da Providência e a que vitimou o menino João Roberto, protagonizada por policiais militares cariocas. Até mesmo um caso de condenação criminal de um vereador de Joinville/SC, Adilson Mariano, pelo fato dele ter sido considerado “mentor intelectual” de um protesto contra o aumento das passagens de ônibus foi lembrado durante os debates.

O Ministro Paulo Vannuchi expressou sua solidariedade para com os protagonistas das lutas populares e manifestou preocupação com o fato dos movimentos sociais, definidos por ele como “pilares da democracia”, serem tratados como caso de polícia, lembrando que, se, anos atrás, os movimentos não tivessem saído às ruas, não estaríamos hoje em uma democracia, nem existiriam uma Comissão de Legislação Participativa na Câmara dos Deputados e uma Secretaria Especial de Direitos Humanos ligada à Presidência da República.

O líder do PT na Casa, Deputado Maurício Rands, esteve presente em nome da bancada de seu partido, expressando “profunda preocupação” com algumas manifestações de órgãos do estado brasileiro anti-populares e anti-democráticas. Parlamentares do PSOL, do PDT, do PCdoB, do PSDB, do PR, do PPS, do PSC também registraram presença e engrossaram os debates.

A senadora e ex-ministra do meio ambiente Marina Silva, que também marcou presença na audiência pública, lembrou da luta ambientalista e do enquadramento de Chico Mendes, anos atrás, na lei de segurança nacional, ressaltando que os parlamentares e governantes são eleitos para representar os eleitores e não para os substituir, de maneira que não se pode inviabilizar os direitos democráticos de organização, manifestação e, sobretudo, reivindicação de direitos. Nesse sentido, Gilberto Souza, da CNBB, lembrou que hoje direitos consagrados como o direito das mulheres ao voto e à jornada de trabalho de 44 horas semanais (ao invés das antigas 48 horas) foram frutos da luta política e da participação popular, que se tenta inviabilizar hoje com decisões como a da cúpula do Ministério Público gaúcho. No mesmo sentido, Antonio Augusto Brandão de Aras, do Conselho Federal da OAB, frisou que uma democracia de fato exige uma tensão permanente entre governantes e governados, entre aqueles que têm poder e os que não o têm (inclusive poder econômico) e não podemos, sob hipótese alguma, inibir essa tensão.

Gilson Cardoso, do MNDH, propôs uma radicalização na luta por democracia. O representante do Conselho Federal da OAB clamou por uma defesa intransigente do regime democrático e da democracia popular e o representante da CNBB pediu que o Secretário-Adjunto da SEDH, Rogério Sottili, levasse essa demanda ao Presidente da República. Também foram discutidas medidas como o envio de uma representação ao Conselho Superior do Ministério Público em relação à deliberação do órgão gaúcho e a realização de audiências públicas nos estados sobre essa problemática.

O Deputado Pedro Wilson, relator da sugestão que originou esta audiência pública, propôs que a CLP acompanhasse essa questão no segundo semestre, o que foi prontamente aceito pelo Presidente da Comissão, Deputado Adão Pretto e apoiado pelo Plenário.